Gravidez e Doença de Wilson: Revisão de 3 Casos Clínicos
A doença de Wilson foi descrita pela primeira vez em 1912 por Kinnear Wilson
como"degenerescência lenticular progressiva", uma doença familiar,
neurológica, fatal, acompanhada por doença hepática crónica e cirrose (1). Só
décadas mais tarde foi descoberto o seu padrão hereditário autossómico
recessivo e, em 1993, foi identificado o gene afectado nesta patologia, o ATP7B
(2-5). Hoje em dia foram já descritas mais de 200 mutações neste gene,
responsáveis pela doença. Este gene, localizado no braço longo do cromossoma
13, codifica uma ATPase transportadora de cobre, expressa essencialmente nos
hepatócitos, actuando no transporte transmembranar de cobre. A diminuição da
função desta proteína provoca uma redução da excreção hepatocelular do cobre no
líquido biliar, resultando na acumulação hepática deste metal e lesão dos
hepatócitos. O cobre é libertado na corrente sanguínea e deposita-se noutros
órgãos, principalmente cérebro, rins e córnea. A alteração funcional da
proteína ATP7B conduz também a uma falha na ligação do cobre à ceruloplasmina,
pelo que o fígado produz e secreta apoceruloplasmina (ceruloplasmina sem
cobre), com diminuição dos níveis séricos de ceruloplasmina (6).
EPIDEMIOLOGIA
A prevalência mundial da doença de Wilson é de cerca de 30 casos por milhão de
habitantes, com aumento da incidência em áreas de consanguinidade (6). A taxa
de heterozigotos para a doença é de 1 caso por 100 habitantes, correspondendo a
uma frequência do gene de 0,3 a 0,7% (7).
Apesar da doença poder manifestar-se em qualquer idade, predomina nos jovens,
com 60 a 70% dos casos diagnosticados entre os 8 e os 20 anos, sendo mais rara
antes dos 3 e após os 40 anos (8).
Apresenta-se clinicamente como doença hepática, doença neurológica progressiva
ou doença psiquiátrica. O envolvimento hepático ocorre, em geral, antes dos 20
anos, com o pico entre os 10 e 13 anos, enquanto que o atingimento neurológico
tende a surgir após os 20 anos de idade (9).
CLÍNICA
A doença de Wilson é progressiva e fatal se não for diagnosticada e tratada
precocemente. Existem três principais formas de manifestação de doença
hepática: hepatite crónica activa, cirrose e hepatite fulminante. A cirrose é a
forma de apresentação inicial mais comum. A falência hepática fulminante, a
forma de apresentação mais rara, surge acompanhada de anemia hemolítica Coombs
negativa e falência renal aguda, que pode culminar com a morte se não for
efectuado um transplante hepático emergente (6).
As manifestações neurológicas podem variar desde alterações motoras como tremor
assimétrico (a mais comum), distonia, disartria, espasticidade, perda da
coordenação motora, a alterações psiquiátricas, nomeadamente de comportamento,
afectivas, esquizofrénicas e cognitivas.
O atingimento oftalmológico traduz-se pelo aparecimento de anéis de Kayser-
Fleischer, formados pela deposição de cobre na membrana de Descemet da córnea.
Estes observam-se em mais de 90% dos doentes com doença de Wilson sintomática e
estão quase invariavelmente presentes nos doentes com manifestações
neurológicas. No entanto, apesar de úteis no diagnóstico, não são considerados
patognomónicos da doença, excepto quando acompanhados de manifestações
neurológicas.
Clinicamente, a doença de Wilson pode ter também manifestações músculo-
esqueléticas, hematológicas, renais, cardíacas, hormonais (Tabela 1).
Tabela 1 - Manifestações clínicas da doença de Wilson.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da doença de Wilson baseia-se num alto índice de suspeição e na
combinação de achados clínicos e laboratoriais. Os doentes sintomáticos têm
invariavelmente valores de cobre urinário nas 24 horas superiores a 100 µg
(normal: 20-50 µg). Os doentes com sintomatologia neurológica ou psiquiátrica
apresentam anéis de Kaiser-Fleischer. Estes estão ausentes em 50% dos
indivíduos com atingimento hepático como forma de apresentação ou pré-
sintomáticos. Os níveis séricos de ceruloplasmina estão diminuídos em 80 a 90%
dos doentes, no entanto, são normais em 10 a 20% e os indivíduos heterozigotos
para o gene também apresentam valores baixos de ceruloplasmina sérica. O exame
gold standard para diagnóstico da doença de Wilson é a biópsia hepática com
doseamento de depósitos de cobre, cujos valores são superiores a 250 µg/g de
peso seco de tecido (normal: 20 a 50 µg). Os heterozigotos têm uma elevação
ligeira deste valor, mas nunca acima dos 200 µg (Tabela 2) (10).
Tabela 2 - Diagnóstico da doença de Wilson.
Actualmente, o diagnóstico genético ainda não está disponível, dado o elevado
número de mutações do gene que se manifestam com o fenótipo desta doença. No
entanto, quando é diagnosticado um caso índex numa família, a sua mutação é
identificada e rastreada nos familiares em primeiro grau do probando (6).
TRATAMENTO
O tratamento da doença de Wilson passa pela terapêutica farmacológica durante
toda a vida e pelo transplante hepático, que corrige o defeito hepático
subjacente, reservado para os casos severos (hepatite fulminante) ou
resistentes. A escolha dos fármacos e suas dosagens vai depender da
apresentação clínica da doença. Nos doentes sintomáticos ou com doença activa a
terapêutica recomendada é com agentes quelantes (penicilamina e trientina), uma
vez que é necessário remover o cobre acumulado nos tecidos. A penicilamina é o
fármaco utilizado com mais experiência, mas, actualmente, a trientina começa a
ser usada com mais frequência, principalmente nos casos de doença neurológica
descompensada (6). A terapêutica combinada com agentes quelantes e zinco,
baseada na associação dos mecanismos de acção de bloqueio da absorção do cobre
e eliminação do seu excesso, está ainda em estudo e a sua eficácia por
determinar.
Uma vez estabilizada a sintomatologia e as alterações bioquímicas, dois a seis
meses após a terapêutica inicial, podem ser usadas doses de manutenção, para
prevenção da reacumulação do cobre. Os doentes assintomáticos no momento do
diagnóstico podem ser tratados desde o início com doses de manutenção de
qualquer um dos fármacos. À terapêutica médica deve ser acrescida uma dieta
pobre em cobre, nomeadamente com evicção da ingestão de mariscos, fígado,
chocolate e cogumelos.
Actualmente existem três fármacos disponíveis no mercado e um outro sob
investigação.
O zincoaumenta os níveis de metalotionina, uma proteína intestinal com alta
afinidade para o cobre, que se liga a este no enterócito duodenal. Desta forma,
a absorção do cobre na circulação é reduzida e este é eliminado no
turnovercelular normal da célula. Além disto, o zinco induz a metalotionina nos
hepatócitos, produzindo complexos não tóxicos no fígado e reduzindo os efeitos
nocivos do cobre livre. O zinco está indicado como terapêutica de primeira
linha nos doentes pré-sintomáticos ou assintomáticos, durante a terapêutica de
manutenção e nos doentes com envolvimento neuro-psiquiátrico, uma vez que
raramente provoca deterioração neurológica. É um fármaco bem tolerado, mas em
10 a 15% dos casos provoca irritação gástrica, que pode ser resolvida alterando
a formulação (para acetato, sulfato ou gluconato) ou a hora de administração
(11). No entanto, como os alimentos interferem na sua absorção, deve ser
ingerido fora das refeições. A dose terapêutica é de 150 a 200 mg por dia,
distribuída por três doses (Tabela 3).
Tabela_3 - Terapêutica da Doença de Wilson.
A penicilaminamobiliza o cobre através da sua acção quelante, formando
complexos com este metal, que são depois excretados na urina. Além disto,
também induz a metalotionina a nível hepático, promovendo o sequestro do cobre
livre intracelular. A dose inicial é de 1000 a 1500 mg por dia, dividida por
duas a quatro doses, 1 hora antes ou 2 horas após as refeições. Pode ser
iniciada em doses mais baixas, 250 a 500 mg/dia, aumentando progressivamente,
para uma melhor tolerabilidade. Este fármaco induz uma deficiência de vitamina
B6, pelo que deve associar-se 25 mg de piridoxina diariamente. Os doentes
hepáticos podem notar uma melhoria clínica após 6 a 8 semanas de tratamento,
mas pode demorar 6 a 12 meses (12). Os efeitos adversos podem ocorrer em 10 a
20% dos doentes (13), e podem ser precoces ou tardios. Os primeiros, que
ocorrem até às três semanas de tratamento, são as reacções de
hipersensibilidade (febre, rash cutâneo, linfadenopatia e proteinúria) e a
depressão medular com anemia aplástica, neutropenia e trombocitopenia, que
devem levar à interrupção do fármaco. Durante o tratamento está recomendada uma
monitorização regular do hemograma e da proteinúra devido aos efeitos adversos
descritos. Os efeitos laterais tardios podem ocorrer anos após o uso da
penicilamina e incluem atingimento cutâneo (alterações degenerativas, elastosis
perforans serpiginosa) ou alterações imunológicas (reacções lupus-like,
miastenia gravis, síndrome de Goodpasture). Uma deterioração neurológica
inicial, descrita em 20 a 50% dos doentes com apresentação neurológica, pode
surgir na terapêutica com penicilamina, que deve ser imediatamente substituída.
A trientina, tal como a penicilamina, é um quelante de cobre, que promove a sua
excreção urinária e, como tal, pode ser usada como alternativa à penicilamina.
Parece ter um efeito quelante um pouco mais fraco e provocar menos efeitos
laterais. A dose inicial deve ser de 1200 a 1800 mg/dia, dividida em duas a
três doses diárias e a dose de manutenção de 900 a 1200 mg/dia, ingerida fora
das refeições. Os efeitos adversos descritos são a pancitopenia, raramente, e a
anemia sideroblástica com siderose hepática, nos casos de deficiência de cobre
por terapêutica excessiva. Reacções de hipersensibilidade e alterações renais
não foram descritas. A frequência de deterioração neurológica é inferior à da
penicilamina (inferior 20%).
O tetratiomolibdato de amónioé um fármaco ainda sob investigação, que apresenta
dois mecanismos de acção. Quando tomado às refeições, liga-se ao cobre no lúmen
intestinal, impedindo a sua absorção. Fora das refeições é absorvido e promove
a formação de complexos de cobre e albumina, que são depois metabolizados no
fígado e excretados na bílis. Este fármaco foi proposto para o tratamento
inicial de doentes com apresentação neurológica da doença de Wilson (14). Estes
doentes parecem apresentar deterioração neurológica mais raramente e cerca de
15% apresentam efeitos laterais moderados, tais como, toxicidade medular e
elevação das enzimas hepáticas, ambas transitórias e reversíveis com a
suspensão da droga.
Quando o tratamento é iniciado, deve ser realizada uma vigilância apropriada da
parte neurológica e hepática, com exame físico dirigido e testes bioquímicos da
função hepática. Durante o uso de quelantes, a excreção do cobre urinário
durante 24 horas deve ser monitorizada (2 vezes no primeiro ano, depois
anualmente), esperando-se um valor de 3 a 8 µmol (200-500 µg), indicativo de
uma correcta adesão à terapêutica. No caso do uso de zinco, este valor deverá
ser inferior a 1,2 µmol (75 µg). Durante todos os tratamentos devem ser medidos
os níveis de ceruloplasmina livre e de cobre sérico, que permitem avaliar a
eficácia terapêutica.
O prognóstico dos doentes de Wilson com atingimento hepático que aderem ao
tratamento é excelente, mesmo quando a cirrose está presente no momento do
diagnóstico (6).
Com a eficácia crescente destas terapêuticas também a capacidade reprodutiva das
mulheres com doença de Wilson foi melhorada e, como tal, a gravidez é mais
frequente. Esta parece não afectar o curso da doença e o principal problema que
se coloca é qual a terapêutica mais adequada, uma vez que a segurança destes
fármacos na gravidez não esta garantida (Tabela_3).
Os autores descrevem 3 casos de doença de Wilson e gravidez, vigiada na sua
instituição, e discutem as controvérsias do uso dos medicamentos para o
tratamento da doença de Wilson durante a gravidez e lactação.
CASOS CLÍNICOS
Caso clínico nº 1
Mulher de 39 anos, primigesta, com doença de Wilson diagnosticada há 1 ano, na
sequência de investigação familiar por diagnóstico da mesma patologia num
irmão. Apresentava hepatite crónica na biópsia hepática, cobre hepático elevado
(386,47 µg/g peso seco), anéis de Kayser-Fleischer, ceruloplasmina baixa (9 mg/
dL), cobre sérico (7,3 µmol/l) e urinário (2,142 µmol/24 horas) elevados, pelo
que iniciou terapêutica com trientina. Efectuou estudo genético, tendo sido
identificadas duas mutações do gene ATP7B, também encontradas no irmão. Um ano
depois ficou grávida e iniciou vigilância pré-natal às 15 semanas de gestação,
estando medicada nessa fase com 1000 mg de trientina por dia, que manteve até
ao final da gravidez.
Foi efectuada vigilância obstétrica quinzenal até às 27 semanas e depois
semanal, até ao fim da gestação. Realizou amniocentese às 20 semanas por idade
materna avançada, cujo resultado foi normal (46,XY). Detectada brida amniótica
na ecografia das 21 semanas, que persistiu até ao final da gestação, sem qualquer
complicação.
Durante a gravidez não surgiu sintomatologia de novo relativamente à doença de
Wilson. Analiticamente, apresentava ceruloplasmina baixa (15 mg/dL), cobre
sérico normal, cobre urinário adequado para doentes em tratamento com agente
quelante (5,3 µmol/24h) e função hepática normal.
Às 37 semanas realizou-se uma cesariana por rotura prematura de membranas e
apresentação pélvica em primípara, com extracção de recém-nascido do sexo
masculino, 2930 g de peso e Índice de Apgar (IA) 9/10. O puerpério decorreu sem
incidentes, mantendo a mesma dose de trientina e com aleitamento materno.
Caso clínico nº 2
Mulher de 29 anos, primigesta, com doença de Wilson diagnosticada aos 16 anos,
após episódio de falência hepática fulminante com hemólise severa,
encefalopatia hepática e ascite, que reverteu com terapêutica médica.
Apresentava anéis de Kayser-Fleischer, ceruloplasmina sérica baixa, cobre
urinário e hepático elevados. Inicialmente tratada com penicilamina, mas, após
quadro de febre e trombocitopenia, esta foi suspensa e iniciada trientina (750
mg/dia), com boa tolerância e sem efeitos laterais.
Iniciou vigilância pré-natal às 14 semanas de gestação, altura em que se
encontrava medicada com trientina (750 mg/dia) e assintomática. Durante toda a
gravidez apresentou ceruloplasmina baixa (inferior ao limite de detecção),
cobre urinário adequado para doente em tratamento (5,33 µmol/dia) e função
hepática normal. No terceiro trimestre da gravidez a dose de trientina foi
reduzida para 500 mg/dia.
A gestação cursou sem complicações, com vigilância obstétrica quinzenal até às
30 semanas e semanal até às 36 semanas, altura em que ocorreu rotura prematura
pré-termo de membranas (RPPM). Foi efectuada cesariana por falha de indução,
tendo sido extraído um recém-nascido saudável, do sexo masculino, 3400 g de
peso e IA 9/10. O puerpério decorreu sem complicações e a mãe amamentou a
criança.
Caso clínico nº 3
Mulher de 35 anos, primigesta, com doença de Wilson diagnosticada aos 31 anos,
após investigação familiar por diagnóstico da doença numa irmã. Encontrava-se
assintomática, com ceruloplasmina sérica baixa (inferior ao limite de
detecção), cobre urinário elevado (5,9 µmol/dia), cobre sérico e função
hepática normais e biópsia hepática com infiltrado inflamatório e cobre hepático
elevado. Iniciou terapêutica com penicilamina (900 mg/dia) e piridoxina (20 mg/
dia). Efectuou consulta préconcepcional aos 32 anos. Iniciou vigilância pré-
natal às 6 semanas de gestação e manteve terapêutica com 900 mg/dia de
penicilamina até ao parto. Foi diagnosticada diabetes gestacional às 29
semanas, que foi controlada com dieta. A gravidez decorreu sem outras
complicações. Os parâmetros clínicos e analíticos da doença de Wilson também se
mantiveram estáveis.
Realizou-se cesariana às 38 semanas por apresentação pélvica em primípara, com
extracção de um recém-nascido saudável, do sexo masculino, 3450 g de peso, IA
9/10. Puerpério sem complicações, com aleitamento materno.
DISCUSSÃO
Previamente à introdução da penicilamina, as gestações nas mulheres com doença
de Wilson eram infrequentes, devido à redução da fertilidade provocada pela
doença. Actualmente, com o diagnóstico e início precoce da terapêutica, as
taxas de fertilidade melhoraram (15). Desta forma, a gravidez na mulher com
doença de Wilson apresenta-se como um desafio. O objectivo da terapêutica na
grávida será manter o controlo adequado da doença, evitar a teratogenicidade no
feto e prevenir a interferência na cicatrização da ferida operatória no caso de
cesariana.
Brewer e col. (11) relatam uma série de 19 mulheres tratadas com acetato de
zinco durante 26 gestações, das quais resultaram 24 crianças normais, uma com
defeito cardíaco congénito e uma com microcefalia. Defendem, por isso, que o
zinco é o agente de escolha durante a gravidez, devido à sua segurança para o
feto e que deverá ser mantido na dose de 50 mg, 3 vezes ao dia. Desconhecem-se
efeitos teratogénicos em animais e humanos com este fármaco.
Scheinberg e Sternlieb (16) relatam uma série de 18 mulheres tratadas com
penicilamina durante 29 gestações, das quais resultaram 29 crianças normais.
Sternlieb (17) faz uma revisão de casos publicados de grávidas com doença de
Wilson, tratadas com agentes quelantes. Recolheu 111 casos de mulheres tratadas
com penicilamina, durante 153 gestações, das quais resultaram 144 recém-
nascidos normais, 2 abortos terapêuticos (um caso de hipertensão portal e
varizes esofágicas e outro caso de espinha bífida), 2 abortos espontâneos e 3
recém-nascidos pré-termo. Foi descrito um caso de manosidose, um de fenda do
palato e uma morte fetal in útero. Reuniu 17 casos de mulheres tratadas com
trientina, durante 22 gestações, das quais resultaram 19 recém-nascidos
normais, tendo-se procedido a um aborto terapêutico e um dos fetos apresentava
isocromossoma X.
A segurança do uso da trientina durante a gravidez não está bem definida, uma
vez que a sua experiência é mais limitada. Estudos em animais sugerem uma
potencial teratogenicidade deste fármaco. A penicilamina pode ter efeito
teratogénico em animais e humanos, tais como síndrome de cútis laxa,
micrognatia (18) e foi já descrito um caso de embriopatia severa por
penicilamina (19). No entanto, pensa-se que os efeitos teratogénicos dos
agentes quelantes não se verificam nas doentes de Wilson, uma vez que as doses
necessárias nesta patologia são inferiores às dos doentes com cistinúria (17).
A American Association for the Study of Liver Diseasessugere que o tratamento
deve ser mantido durante a gestação e a dose deve ser reduzida em 25 a 50% da
dose prégestacional, particularmente no terceiro trimestre, para permitir uma
melhor cicatrização da ferida operatória, no caso de ser necessária uma
cesariana (6). A interrupção da terapêutica associa-se a um alto risco de
episódios hemolíticos com insuficiência hepática, falência hepática fulminante e
morte materna (20,21). Portanto, parece que o risco de interromper a
terapêutica é substancialmente maior do que o risco de teratogenicidade.
Também durante o aleitamento materno a terapêutica da doença de Wilson deverá
ser mantida, pois não têm sido descritos efeitos nocivos para o bebé, apesar
das concentrações de cobre e zinco noleite materno poderem estar reduzidas
(17).
Os três casos descritos neste artigo vêm corroborar a importância da manutenção
da terapêutica da doença de Wilson. Não ocorreu qualquer agravamento materno da
doença nem nenhuma complicação na gravidez. De qualquer forma, seria importante
a realização de estudos prospectivos para comparar a eficácia e segurança dos
fármacos disponíveis para o tratamento da doença de Wilson, durante a gravidez.