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EuPTCVHe0871-34132012000400001

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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Efeitos Auditivos em Doentes com Tumores de Cabeça e Pescoço e Tumores Cerebrais sujeitos a Radioterapia e Terapia Combinada

INTRODUÇÃO A perda auditiva no adulto pode causar uma série de mudanças psicossociais, uma vez que, a deficiência auditiva e as dificuldades associadas à compreensão da fala prejudicam a convivência do indivíduo (1-3). A capacidade auditiva no doente oncológico de cabeça e pescoço e de tumores cerebrais pode ser perdida ou deteriorada devido aos inúmeros tratamentos a que estão sujeitos.

Os tumores que surgem na região da cabeça e pescoço são classificados de acordo com as zonas anatómicas. Estas zonas incluem a cavidade oral, orofaringe, cavidade nasal, nasofaringe, seios perinasais, hipofaringe, lábio, laringe, glândulas salivares e glândula tiróide. O local mais atingido é a cavidade oral, correspondendo a cerca de 30% dos cancros dessa região. Os pacientes que têm estes tipos de tumores necessitam de tratamento, que pode passar por cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia (3-5).

A radioterapia e a quimioterapia antineoplásica costumam ser associadas no tratamento de tumores. Esta combinação, pode proporcionar uma vantagem em termos do controlo do tumor, mas também pode produzir uma toxicidade local aumentada. Quando o paciente é submetido ao tratamento combinado, maior probabilidade de ocorrer perda auditiva, ao contrário do que acontece com o uso isolado de um tratamento. A ototoxicidade dos medicamentos juntamente com a radiação, podem levar a perdas auditivas profundas, irreversíveis, precoces ou tardias, comprometendo assim, a qualidade de vida do paciente (3,6-8).

São consideradas drogas ototóxicas os aminoglicosídeos, a carboplatina, a vincristina, a cisplatina, entre outras (1,2). A cisplatina, descoberta por Rosemberg (1965), é actualmente utilizada com grande eficácia no tratamento de tumores de cabeça e pescoço. Um dos seus efeitos colaterais é a degeneração das células ciliadas da região basal da cóclea, embora toda a cóclea possa ser afectada, tal como a estria vascular, o gânglio espiral e o nervo auditivo (8- 12).

Em relação à radioterapia, é necessário ter em conta que devido à elevada complexidade anatómica da região de cabeça e pescoço, é difícil evitar a inclusão de determinadas estruturas no campo de tratamento. As doses recebidas por algumas dessas estruturas, pode até ser maior que as debitadas ao próprio tumor, o que pode implicar alguns danos, dependendo do seu grau de sensibilidade. O labirinto, como se localiza na zona temporal da cabeça, pode receber radiação mesmo não sendo o órgão alvo, podendo provocar consequências agudas ou crónicas ao paciente (11,13,14).

O objectivo deste estudo foi explorar a relação entre as terapêuticas utilizadas nos tratamentos de tumores de cabeça e pescoço e tumores cerebrais e os possíveis efeitos adversos na audição, tendo em consideração a inclusão das estruturas do ouvido no campo de tratamento e o agente químico cisplatina.

MÉTODOS Foram acompanhados os tratamentos de 31 doentes com tumores de cabeça e pescoço e tumores cerebrais seguidos no Instituto Português de Oncologia do Porto (IPO), após aprovação e autorização da realização do estudo pela Comissão de Ética da mesma instituição. Um grupo de 15 doentes fez terapia combinada com cisplatina (grupo TC) e o segundo grupo, de 16 doentes, um tratamento que consistiu unicamente em radioterapia (grupo RT). A todos foi efectuado um protocolo de avaliação auditiva (anamnese audiológica, otoscopia e audiometria tonal) antes de iniciar o tratamento (M1), no fim (M2) e um mês após (M3) os tratamentos. Todos os doentes assinaram um consentimento informado prévio, para eventual processamento dos dados para fins de diagnóstico e investigação.

Os equipamentos necessários para a execução dos exames audiológicos, que possibilitaram a realização do estudo foram gentilmente cedidos pelo Laboratório da Área Técnico-Científica de Audiologia da Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Instituto Politécnico do Porto (ESTSP-IPP), dos quais constaram: um otoscópio (Heine 2000®), e um audiómetro clínico (Amplaid®).

A cada doente foi primeiramente realizada uma anamnese audiológica que visou averiguar a existência prévia de sintomas otológicos e vestibulares.

Posteriormente realizou-se a otoscopia para despistar afecções do canal auditivo externo e membrana timpânica e realizada a avaliação audiológica constituída por um audiograma tonal simples (na qual foram testadas as frequências 250, 500, 1000, 2000, 4000 e 8000Hz, utilizando o método ascendente). Este protocolo foi realizado antes, no fim e 1 mês após o tratamento, executados sempre nas mesmas condições e avaliador.

Excluíram-se 10 pacientes da análise estatística, devido à interrupção do tratamento, bem como desistência do estudo, sendo a sua dimensão final de apenas 21 pacientes.

Os resultados obtidos foram analisados através do programa Statistical Package for Social Sciences' SPSS versão 17.0, utilizando o teste t para amostras emparelhadas e independentes, o teste Wilcoxon e Mann-Whitney para as variáveis que não seguiram a normalidade, bem como o teste Binomial (útil nas situações que apenas se admite duas alternativas como resposta, tais como sim ou não), considerando um a=0,05.

RESULTADOS A amostra final do estudo foi constituída por 21 pacientes, 82% do género masculino e 18% do género feminino, com um mínimo e um máximo de 26 e 82 anos de idade respectivamente e uma média de 56,45 ± 11,75 anos.

O número de tratamentos de radioterapia interpolou de 28 a 35 dias e a dose de radiação variou de 53 a 70Gy, média de 63,95Gy, estando as doses de radiação média de cada ouvido, com respectivo mínimo e máximo, descritas na Tabela_1. Em relação à quimioterapia, o número de ciclos alternou de 1 a 7 e a dose média de cisplatina por cada paciente (grupo TC) foi de 419,83mg/m2, variando de 184 a 910,25mg/m2.

Os gráficos_1 e 2 apresentam os resultados das médias dos limiares auditivos por frequência testada nas três avaliações efectuadas, em ambos os ouvidos uma vez que não se verificaram diferenças significativas interaurais, para o grupo TC e para o grupo RT respectivamente, não se tendo verificado diferenças estatisticamente significativas por frequência em cada grupo (valor p>0,05).

Foram comparados os limiares auditivos entre grupos, no fim dos tratamentos, obtendo-se resultados estatisticamente significativos para as frequências 4000 e 8000 Hz (Teste t amostras independentes, valor p<0,05). A sintomatologia recolhida via questionário evidenciou o surgimento de sintomas como mucosites, radiodermite, otite média, perfuração timpânica, otalgia e acufenos e o agravamento dos mesmos entre o início e o fim dos tratamentos em 45% dos pacientes do grupo TC e 41% dos pacientes do grupo RT (gráfico_3), estatisticamente significativo para ambos os grupos (Teste Binomial, valor p<0,05). Foi ainda calculada a relação entre a dose de radiação nas estruturas do ouvido e a perda auditiva nos grupos de tratamento (gráfico_4).

DISCUSSÃO No grupo TC, em 94,4% dos casos verificou-se uma relação directamente proporcional entre a dose de radiação na cóclea e a perda auditiva (gráfico_4), sobretudo nas frequências agudas (gráfico_1). No entanto, esta relação positiva se verifica em 31% dos casos do grupo RT (gráfico_4), tendo-se verificado diferenças significativas entre grupos (p<0,001). Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas nas frequências de 4000 e 8000Hz para ambos os ouvidos (valor p<0,05), representando no audiograma uma diferença de aproximadamente 8dB no fim do tratamento e de 10dB um mês depois. Alguns pacientes que participaram no estudo tinham idade superior a 65 anos e por isso apresentaram limiares auditivos compatíveis com perda auditiva derivada da idade (presbiacusia), no entanto, consideramos que tal foi contornado uma vez que foram analisadas variações desses limiares durante os tratamentos e não o seu valor absoluto. Outro dado que consideramos importante ressalvar diz respeito à monitorização da sintomatologia, em ambos os grupos verificaram-se evidências estatísticas (Teste Binomial, valor p<0,05) que confirmam o surgimento e progressão do número de sintomas durante os tratamentos, nomeadamente em 41% dos pacientes sujeitos a RT e em 45% dos pacientes sujeitos a TC (gráfico_3).

Os resultados sugerem que a perda de audição média do grupo TC é superior à perda de audição média no grupo de RT. A elevada incidência da perda auditiva nas frequências agudas deve condicionar o planeamento do tratamento de RT, reduzindo a dose à cóclea com o objectivo de minimizar a perda auditiva neurossensorial irreversível, sobretudo quando são utilizadas as duas modalidades de tratamento. Apesar das cócleas e das trompas de Eustáquio não serem incluídas no volume alvo, recebem doses mensuráveis de entrada e saída do feixe primário e da radiação dispersa. Na literatura, a incidência da perda auditiva e a destruição das células ciliadas, em pacientes sujeitos à quimioterapia com cisplatina, pode variar de 3 a 100%. A grande variação dos efeitos ototóxicos entre os estudos, está relacionada com os diferentes métodos utilizados para a avaliação auditiva. Todavia, existem outros factores como, a localização do tumor, a idade do paciente, a perda auditiva pré-existente, a exposição ao ruído e a susceptibilidade individual (6,7,15-17).

É importante a implementação da monitorização auditiva de rotina em todos os doentes oncológicos de cabeça e pescoço, para identificar, diagnosticar e intervir precocemente, de forma a proporcionar-lhes melhores condições de vida.

Sugere-se paralelamente que se estabeleça uma dose limite às estruturas auditivas pois foi possível observar efeitos agudos na combinação da radioterapia e quimioterapia com cisplatina (18,19).

Este estudo esteve limitado pelo número reduzido de indivíduos incluídos na amostra e pelo curto período de follow-up, pelo que surge a necessidade de continuar a avaliação de um maior número de pacientes e por um período de tempo mais longo para determinar os efeitos tardios. O tratamento não se deve basear somente na recuperação biológica, mas também no bem-estar e na qualidade de vida do paciente. Neste sentido, desde o início dos tratamentos, a preocupação com a audição e sintomas derivados dos mesmos devem ser valorizados.


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