Análise das concentrações de pólen de gramíneas na atmosfera de Portugal
Continental
INTRODUÇÃO
A família Poaceae (Gramineae) é constituída por 650-700 géneros e cerca de 12
000 espécies.
São plantas que apresentam uma distribuição cosmopolita e representam quase 20%
da vegetação em todo o Mundo1, encontrando-se bem representadas na Península
Ibérica. As gramíneas fazem parte integrante da paisagem mediterrânica, onde
constituem o elemento dominante da vegetação herbácea do bosque e das pastagens
semi-naturais do montado. São plantas muito abundantes em qualquer habitatem
redor das áreas urbanas2, fazendo parte dos pastos e comunidades de plantas
infestantes de campos de cultivos. Nas zonas urbanas, são abundantes nos locais
não urbanizados e nos cursos de água3. São plantas totalmente anemófilas
(polinizadas pelo vento) e muito importantes a nível alimentar, económico,
florístico e, mesmo, a nível de saúde pública.
O pólen atmosférico no ambiente exterior é a principal causa de rinite, asma
brônquica, rinoconjuntivite e eczema nos indivíduos com polinose4. A alergia ao
pólen tem um importante impacto clínico na Europa4 e há evidência de que, nas
últimas décadas, tem aumentado a sua prevalência, particularmente na Europa
Ocidental, nos países industrializados2,4,5,6, a par do aumento da prevalência
de outras patologias alérgicas6. Cerca de 10% da população do Norte, Centro e
Leste da Europa e mais de 10% no Sul da Europa sofre de doença alérgica
induzida por alergénios polínicos5. Estudos recentes referem que 80-90% das
crianças asmáticas e 40-50% dos adultos asmáticos têm alergia ao pólen2. O
pólen proveniente de gramíneas constitui uma das principais causas de alergia
em muitos locais do Mundo4 e é uma das fontes de ?nios> mais importantes na
Europa7,8, provocando sintomas alérgicos em mais de 80% dos indivíduos com
sensibilização ao pólen4. É a causa mais importante de polinose na área
mediterrânica4,9e em Portugal, onde a sensibilização aos pólenes representa
cerca de 40% do total de sensibilizações10.
Somente um pequeno número de espécies são responsáveis pela maioria do pólen
atmosférico alergizante11,12.
Nas espécies estudadas pelos autores Prieto-Baena et al.12, a produção de pólen
vai de 14,5 x 104 a 22 x 106 grãos de pólen por inflorescência e foi superior
nas espécies perianuais. De acordo com Subiza e outros investigadores11,13, os
géneros que causam polinose pertencem à subfamilia Pooideae(Phleum, Dactylis,
Lolium, Trisetum, Festuca, Poa, Anthoxanthum, Holcus, Agrotis, Alopecurus,
Secale, Triticum, Hordeum), à subfamilia Chloridoideae (Cynodon) e à subfamília
Panicoideae(Sorghum, Paspalum e Zea). Na Galiza, Rodríguez-Rajo e outros
investigadores2referem também os géneros Avena, Arrenatherum, Vulpia e Bromus
como abundantes e causas de polinose nessa região. No Sul de Espanha, segundo
Prieto-Baena et al.12, existem outros taxa com uma importante contribuição no
espectro polínico: Holcus lanatus, Trisetaria spp., Elymus repens e Piptatherum
miliaceum.
Dado que o pólen é um factor de risco para as doenças alérgicas respiratórias,
é de particular interesse encontrar o valor limiar a partir do qual se
desencadeiam sintomas de polinose nos indivíduos sensibilizados. Segundo alguns
autores1,13, o valor limiar, concentração crítica ou umbral de reactivação
depende de múltiplos factores, como do taxon, das características regionais, do
grau de gravidade da polinose no doente, da presença de sensibilizações a
outros pólenes de plantas que polinizam simultaneamente com as gramíneas (ex.
Olea, Plantago, Rumex), do grau de intensidade dos sintomas que vai diminuindo
ao longo da estação, da presença de aeroalergénios que se encontram em
micropartículas fora dos grãos de pólen e cujas concentrações podem apresentar
grandes divergências das contagens polínicas, do grau de exposição ao pólen, da
localização do colector (altura e paisagem em redor). O valor é difícil de
estabelecer, oscilando entre os 10 e os 50 grãos de pólen/m3 de ar.
A Rede Aerobiológica da Catalunha (XAC)14 criou uma escala com várias
categorias de níveis de risco unicamente para o pólen das gramíneas, onde
considera um risco muito elevado de exposição quando a concentração semanal
excede os 30 grãos de pólen/m3. Já em 1973, os investigadores Davies e Smith e,
posteriormente, em 1997, Ong e outros investigadores indicaram nos seus estudos
a concentração de 25 grãos de pólen/m3; a RPA considera a concentração superior
a 30 grãos de pólen/m3 como indutora de sintomas moderados de alergia. Em 2007,
a Rede Espanhola de Aerobiologia (REA) definiu como valor limiar a partir do
qual os doentes alérgicos às gramíneas revelam sintomas graves de alergia o
valor de 25 grãos de pólen/m3 de ar15. Todavia, a alergenicidade do pólen de
Poaceae poderá ser maior devido à reactividade cruzada16, quer entre as
diferentes espécies da família, quer entre o pólen de gramíneas e o pólen de
outras plantas filogeneticamente diferentes, como Platanus, Olea e
Parietaria13. As gramíneas, para além do seu carácter alergénico, possuem uma
capacidade de colonizar diferentes ecossistemas e de ocupar extensas áreas de
solo, graças à sua grande capacidade de reprodução7,9. Por conseguinte, é
extremamente importante quer para os profissionais de saúde, quer para o
doente, a existência de uma informação disponível sobre os níveis de pólen de
Poaceae presentes na atmosfera de uma dada região.
Os grãos de pólen provenientes dos taxa da família Poaceae, quando visualizados
ao microscópio, são morfologicamente idênticos, pelo que é praticamente
impossível a sua separação, quer ao nível genérico, quer ao nível específico;
daí que, frequentemente, se considere um único tipo polínico generalizável a
toda a família.
Por conseguinte, a homogeneidade morfológica do pólen de Poaceae faz com que
seja muito difícil determinar o período de polinização para cada espécie9. As
espécies silvestres libertam grãos de pólen mais pequenos (10-40 μm) do que as
respectivas cultivares, nomeadamente as do grupo dos cereais (40-80 μm), e são
responsáveis por desencadearem 5 a 10 vezes mais alergias. O pólen de gramíneas
caracteriza-se por apresentar uma parede fina, granulosa, e por possuir um
único poro (uma abertura simples; grão monoporado). A parede em redor do poro,
a exina, é mais espessa, formando um anel (annulus), e no centro do poro a
exina volta a ter um espessamento formando um opérculo (operculum; algo que se
assemelha a uma tampa). Em termos de polaridade e simetria, trata-se de um
grão heteropolar e radiossimétrico3.
Dada a grande importância deste pólen na patologia alérgica em Portugal e a
grande abundância destas plantas por todo o país, e dado que são poucos os
trabalhos publicados acerca deste assunto em Portugal, resolveu-se efectuar o
presente estudo que teve como objectivos: analisar e comparar a estação de
pólen atmosférico principal (EPAP) do pólen de gramíneas das diferentes
estações de monitorização continentais da Rede Portuguesa de Aerobiologia
(RPA): Porto (Norte), Coimbra e Lisboa (Centro), Évora e Portimão (Sul).
MATERIAL E MÉTODOS
Neste estudo utilizaram-se os dados das concentrações horárias e diárias do
pólen atmosférico de Poaceae monitorizado em cinco estações continentais da RPA
Porto, Coimbra, Lisboa, Évora e Portimão durante 7 anos (2002 a 2008). Os
dados de 2002 das estações do Porto e de Coimbra foram excluídos devido ao
elevado número de valores em falta. Para a localidade de Évora analisou -se
também o ano de 2001.
No Quadro_1 estão caracterizados os locais de estudo em termos geográficos,
topografia, vegetação e climatologia.
Nas várias estações de amostragem utilizou-se um colector do tipo Hirst, na sua
maioria localizados no cimo de edifícios ou em plataformas meteorológicas, a 15
-20 metros de altura relativamente ao solo. A metodologia de amostragem e a
análise das amostras (captação, preparação e leitura das amostras) utilizadas
foi a normalizada pela RPA: 1) uso de um captador Burkard Seven Day Volumetric
Spore-trape®; 2) uso de solução de silicone como meio adesivo; 3) método de
leitura das 4 linhas longitudinais com uma ampliação de 400x ao microscópio
óptico; 4) resultados expressos em número de grãos de pólen por metro cúbico de
ar. Todas as amostras foram processadas no Laboratório de Palinologia e
Aerobiologia do Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais Mediterrânicas da
Universidade de Évora.
Para se determinar a estação de pólen atmosférico principal (EPAP) das Poaceae
utilizou-se o método descrito por Nilsson e Persson17, o qual estabelece que a
EPAP de um determinado taxon começa quando a soma das médias diárias polínicas
alcança os 5% da quantidade de pólen total anual e finaliza quando alcança 95%
da quantidade de pólen total anual, i.e., inclui 90% da quantidade de pólen
total anual.
A data do pico polínico foi definida como o dia em que se registou a
concentração mais elevada deste pólen.
A intensidade da estação foi estabelecida pela combinação de dois critérios.
1.º critério: pelo número de dias em que as concentrações médias diárias
ultrapassaram os 25 grãos de pólen/m3, valor indicado pela REA15 como
concentração a partir da qual se considera que existe um risco elevado de
exposição a este pólen causando sintomatologia nos indivíduos alérgicos.
2.º critério: usando a escala de XAC14: número de semanas do ano para cada
nível de risco (nível 0: risco nulo ou sem risco, 0 grãos de pólen/m3/semana;
nível 1: baixo risco, 0,1 4,9 grãos de pólen/m3/semana; nível 2: risco médio,
5-19,9 grãos de pólen/ m3/semana; nível 3: risco elevado, 20 -29,9 grãos de
pólen/m3/semana e nível 4: risco muito elevado, ≥ 30 grãos de pólen/m3/semana).
Para a análise da eventual existência de diferenças estatisticamente
significativas entre as estações de monitorização efectuaram-se testes não-
paramétricos: ANOVA de Friedman e teste de Wilcoxon através do programa de
estatística SPSS 17.0.
RESULTADOS
Quando se compararam os índices polínicos (os valores das contagens totais de
pólen de gramíneas anuais) verificou-se que existiam diferenças significativas
entre as várias localidades (p <0,05), com excepção dos índices de Coimbra e
Porto e de Lisboa e Portimão (p >0,05). Évora diferiu de todas as estações (p
<0,05) com os índices polínicos mais elevados (Figura_1).
Observou-se uma grande variação interanual dos índices polínicos, com Porto e
Coimbra a registarem os mais baixos níveis de pólen e Évora os níveis mais
elevados.
Évora foi a localidade com a mais elevada variabilidade, seguida por Portimão,
Lisboa, Coimbra e Porto. Esta última cidade destaca -se por ser aquela onde a
variabilidade interanual dos índices polínicos, medida através do respectivo
desvio-padrão, foi menor (Quadro_2).
A Figura_2 mostra a variação interanual das concentrações de pólen de Poaceae
nos vários locais de estudo.
O Quadro_2 apresenta as principais características da EPAP das gramíneas para
cada uma das estações de monitorização. Pela sua análise podemos afirmar o
seguinte:
No Porto, a EPAP das Poaceae teve início no mês de Abril e terminou no mês de
Agosto, obtendo-se uma duração média de 127 ± 16 dias. Em geral, a curva
polínica apresentou 2 picos de máxima concentração; um em Maio (semanas 21 -22)
e o outro em Julho (semanas 28 -29). Nos anos em que apresentou 3 picos, o
terceiro ocorreu geralmente em Junho (semanas 24 -26).
Em Coimbra, a EPAP das Poaceae teve início, nalguns anos, no mês de Março,
noutros no mês de Maio, e terminou nos meses de Julho-Agosto, apresentando uma
duração média de 115 ± 23 dias. A curva anual das concentrações apresentou 2 a
3 picos, com os mais importantes a registarem-se em Maio (semanas 21 -22) e
Junho (semanas 24 -25) e o terceiro pico, menos importante, em Julho (semanas
27-28).
Em Lisboa, de uma maneira geral, a EPAP iniciouse em Abril e finalizou em
Julho-Agosto, apresentando uma duração média de 110 ± 18 dias. A curva anual
das concentrações polínicas apresentou apenas 2 picos, um em Maio (semana 21) e
outro em Junho (semana 25), sendo o de Maio o mais importante.
Em Évora, em termos gerais, a EPAP teve início no mês de Maio e terminou em
Junho-Julho, com uma duração média de 65 ± 22 dias. A curva polínica anual
apresentou um único pico de concentração máxima que se verificou em Maio
(semana 21).
Em Portimão, em geral, a EPAP teve início nos últimos 10 dias de Abril e
terminou em Julho-Agosto, com uma duração média de cerca de 83 ± 28 dias. A
curva polínica apresentou, tal como a estação de Évora, um único pico de
concentração máxima, em Maio (semana 21).
Em relação ao dia de ocorrência do pico, observou-se uma variação entre 9 a 17
dias, dependendo do local.
O pico mais precoce registou-se em Portimão, a 3 de Maio de 2005, e o mais
tardio no Porto, a 14 de Julho de 2008. Nas localidades de Évora e Portimão, o
pico foi alcançado na semana 21 ± 1 e 21 ± 2, respectivamente, em Lisboa
ocorreu na semana 22 ± 2, em Coimbra na semana 24 ± 2 e, por último, na semana
26 ± 2 no Porto (Quadro_2).
Comparou-se, em termos estatísticos, a data do pico as várias estações e
verificou-se que a estação do Porto diferiu significativamente das de Lisboa,
Évora e Portimão e, Coimbra diferiu das de Évora e Portimão (p <0,05).
Com relação à data de início da EPAP, não se observaram diferenças
significativas entre as estações (p >0,05).
Já em relação às datas do final da EPAP, verificou-se que existiam diferenças
significativas entre Évora e as outras estações e também entre Lisboa e Porto
(p <0,05). Em termos de duração da EPAP, encontraram-se diferenças
significativas entre Évora e as outras estações (p <0,05).
Quanto ao índice relativo de pólen anual (percentagem de pólen total anual no
espectro polínico), Évora apresentou o mais elevado índice, com um valor médio
de 24,8%, e Lisboa o mais baixo, 8,6% (Quadro_2).
Concentrações > 25 grãos de pólen/m3, correspondentes a um risco elevado de
exposição ao pólen (Quadro_2), registaram -se no Porto durante 23 ± 5 dias
(entre 2 semanas a 1 mês), em Coimbra com 16 ± 8 dias (entre 2 semanas a 1
mês), em Lisboa com 34 ± 15 dias (1 mês a 2 meses), em Évora com 54 ± 9 dias (1
mês a 2 meses e meio) e em Portimão durante 39 ± 12 dias (1 a 2 meses). Em
termos comparativos, Porto não diferiu de Coimbra, Lisboa não diferiu de
Portimão (p >0,05) e Évora diferiu significativamente de todas as estações (p
<0,05).
No Quadro_3 pode-se visualizar o número de semanas de cada nível de categoria
de alergenicidade, proposto pela Rede XAC, para cada ano e estação de
monitorização.
Durante o período de estudo não ocorreram alterações significativas na EPAP das
gramíneas nas cinco localidades, com excepção na data do final da estação em
Lisboa, que mostrou uma tendência para terminar mais tarde, e no número de dias
com concentrações >25 grãos de pólen/m3 na estação de Évora, em que se observou
uma tendência para um aumento (Quadro_4).
DISCUSSÃO
Neste estudo, nas regiões estudadas, observaramse diferenças significativas em
termos de índices polínicos e uma notória variação interanual. Os índices
polínicos mais baixos reportados no Porto e Coimbra são similares aos
observados em Vinkovci (Croácia)18 e em Léon e Ourense (Espanha)19, sendo, no
entanto, superiores aos observados em Thessaloniki (Grécia), Tafileh (Jordânia)
e Tekirdag (Turquia) e por Abreu et al.20 na localidade do Porto, onde, em
geral, não ultrapassam os 1000 grãos/m3 21,22,23.
O Porto assemelhou-se ainda a Barcelona, localidade espanhola com os mais
baixos índices polínicos de gramíneas e com a mais baixa variabilidade
interanual1. Nas regiões de Lisboa e Portimão registaram-se índices próximos
aos reportados em Santiago de Compostela e Chirivel (Espanha)24,25. Évora
assemelhou-se particularmente a Badajoz, bem como a Madrid, Toledo e Ciudad
Real, onde se registaram os mais elevados níveis polínicos e as mais amplas
variações interanuais26.
O pólen de gramíneas foi detectado durante todo o ano, particularmente de Março
a Julho/Agosto, altura em que ocorre a floração da maioria das espécies de
gramíneas1,3,27.
As concentrações mais elevadas registaram-se nos meses de Maio e Junho em todo
o país, tendo nas regiões do Norte e Centro Norte ocorrido também em Julho, à
semelhança de algumas localidades da área mediterrânica (Espanha, Croácia,
Grécia, Turquia, Itália, França, Polónia)28,29. Noutras localidades da área
mediterrânica prolongou-se até Setembro e Outubro29.
Relativamente à variabilidade dos parâmetros temporais da EPAP início,
duração e final constatou-se o seguinte: 1) O início foi mais precoce no
litoral, Porto e Lisboa, e mais tardio no interior sul, em Évora. O final da
EPAP foi por seu turno mais precoce em Évora comparativamente às outras
cidades. Em geral, terminou durante o mês de Agosto no Norte e em Julho no Sul
do país. A cidade do Porto apresenta similaridades com as localidades de Vigo,
Santiago de Compostela e Ourense (Espanha) em termos de características da
EPAP, diferindo no entanto destas por apresentar índices polínicos mais
baixos2,28.
Este facto poderá dever-se à proximidade do rio Douro e do oceano Atlântico que
exercem um efeito negativo sobre as concentrações de pólen atmosférico20.
Efeito análogo terá condicionado a EPAP das gramíneas em Lisboa. Esta cidade,
tal como outras regiões de clima mediterrânico, apresenta concentrações
polínicas totais mais baixas em comparação com as do interior11,14.
2) Quanto à duração da EPAP, Évora apresentou a EPAP mais curta, tendo esta
diminuído de Norte para Sul. Em geral, a duração foi média (entre 75 e 150
dias) nas cidades do Porto, Coimbra, Lisboa e Portimão, e curta (<75 dias) em
Évora. Existe uma relação entre a duração da estação polínica e as fontes
polínicas, na medida em que uma estação de curta duração resulta de pólen
proveniente duma única ou poucas espécies em floração simultânea com
consequente uniformização da curva polínica, i.e, caracteriza-se por um aumento
da concentração levando a um pico máximo, seguido de um decréscimo3. É o caso
da curva polínica de Évora. O pólen de uma estação com duração média expressa a
grande diversidade de fontes polínicas e consequente distribuição temporal das
fenologias dos inúmeros géneros e espécies, cada um dos quais com uma fenologia
particular (cada uma liberta o pólen num momento próprio).
Normalmente apresentam curvas irregulares, com vários picos que reflectem tais
diferenças fenológicas ou processos de transporte regional ou a longa
distância3,12. É o caso das curvas polínicas do Porto, Coimbra e Lisboa.
No que concerne à variabilidade inter-espacial da EPAP, à semelhança do que
sucede em Espanha, a mesma reflecte as diferenças na vegetação, uso do solo,
latitude, altitude, clima7,28,30e taxa de urbanização de uma dada região1.
A variabilidade interanual da fenologia das gramíneas, a nível local, enquanto
reflexo das variações anuais das condições meteorológicas27, suportam as
observações de Galán et al.31, segundo os quais as espécies de gramíneas de
ciclo curto florescem em Maio e as espécies de ciclo longo o fazem
posteriormente. Neste sentido, no Sul do país temos predominantemente espécies
de gramíneas de ciclo curto e, no Norte, espécies de ciclo longo.
De uma forma geral, os picos polínicos de Poaceae ocorreram mais cedo nas
regiões do Sul do país, verificando-se um gradiente temporal no sentido Sul
Norte. A uma escala mais alargada, os picos de floração das gramíneas nas
regiões do Norte, Centro e Este europeus ocorrem no início de Maio e acabam em
finais de Julho. Na área mediterrânica, a floração começa e acaba normalmente
mais cedo4, cenário concordante com o observado no presente estudo.
A percentagem de representação do pólen de gramíneas na atmosfera das várias
localidades (≥10%), apesar de significativa, quando comparada com a de outros
tipos polínicos, como Quercus, Pinaceae, Olea e Urticaceae, é relativamente
reduzida, com excepção de Évora. Esta baixa representatividade poderá estar
associada à reduzida dispersão do pólen de gramíneas, onde mais de 90% do mesmo
permanece próximo da planta, repercutindo-se numa baixa representatividade nas
amostras dos colectores32.
Contudo, não deixa de confirmar a predominância das gramíneas no extracto
herbáceo da vegetação em todas as localidades estudadas, dado que o pólen de
gramíneas constitui um dos tipos predominantes de pólen de herbáceas nos
espectros polínicos atmosféricos, juntamente com o tipo Urticaceae (que inclui
o tipo Parietaria).
Neste aspecto, do conjunto de localidades estudadas, Évora constitui excepção
devido às suas características de cidade rural. Nas áreas rurais, os totais
sazonais, as concentrações médias diárias e as concentrações máximas diárias
são superiores às registadas nas áreas urbanas.
Nestas, a biodiversidade é reduzida e as plantas, no caso das gramíneas, formam
comunidades sinantrópicas33.
Da análise dos resultados acerca da intensidade da estação polínica das
gramíneas (Quadro_3), verificou-se que foi a sul do país que se registou um
maior número de dias em que a concentração ultrapassou o valor limiar a partir
do qual se desencadeiam sintomas de alergia nos indivíduos sensíveis
(concentrações > 25 grãos de pólen/m3). Foi também a sul que se registaram as
concentrações mais elevadas e onde, por conseguinte, a estação das gramíneas
foi mais intensa. Por sua vez, através da análise do número de semanas de cada
nível de categoria de alergenicidade, proposto pela Rede XAC, para cada ano e
estação de monitorização e aceitando-se que se desenvolve alergia a partir de
um nível médio, os locais citados por ordem decrescente de alergenicidade
foram: Évora, Lisboa, Portimão, Porto e Coimbra. Porém, se considerarmos os
níveis 3 e 4, os locais mais problemáticos para os doentes foram Évora,
Portimão e Lisboa, as estações do Sul do país.
No entanto, o desencadeamento da alergia respiratória dependerá da
predisposição genética e do grau e forma de exposição aos aeroalergénios28. O
valor limiar de risco alérgico poderá variar em função da susceptibilidade
individual da população exposta. Vários trabalhos reportaram o desencadeamento
de sintomas alérgicos quando a concentração de pólen de gramíneas atingiu 10
grãos/m3 4.
No respeitante às alterações na fenologia da estação polínica (Quadro_4),
verificou-se que ao longo destes anos de estudo houve alterações na data do
término da EPAP na localidade de Lisboa e no número de dias com concentrações
médias diárias superiores a 25 grãos de pólen/m3 na localidade de Évora. Para
além dessas alterações na fenologia, apesar de em termos estatísticos a
tendência não se revelar significativa, verificou-se que os índices polínicos
tenderam a diminuir, com excepção para Coimbra, onde aumentaram, provavelmente
devido a um efeito do índice anual de 2007, que foi excepcionalmente elevado
comparativamente com os dos outros anos. Esta tendência para o decréscimo
parece estar associada aos anos de fraca pluviosidade, nomeadamente durante a
Primavera, pois de acordo com os boletins climatológicos, publicados pelo
Instituto Nacional de Meteorologia, as Primaveras de 2003 a 2007 foram secas,
com excepção de 2008, a mais chuvosa desde 2001. A seca tem um efeito negativo
no ciclo biológico das plantas, na medida em que impede a germinação de muitas
sementes e conduz à quebra do vigor no crescimento e na intensidade da
floração26. Tal constatação é reforçada pelos reduzidos índices polínicos de
2005, reflexo da extrema secura dos anos de 2004 e 2005 (em Setembro de 2005
Portugal encontrava-se em situação de seca grave a extrema e a Primavera de
2005 foi a quarta mais seca desde 1931)34. Efectivamente, e segundo as
observações de Makra et al.35, as gramíneas, quando sujeitas a temperaturas
elevadas são submetidas a stress hídrico no período mais seco do Verão,
constituindo um factor limitante à produção de pólen.
CONCLUSÕES
Este estudo permitiu dar a conhecer a distribuição sazonal do pólen de
gramíneas na atmosfera de várias localidades portuguesas. A monitorização
aerobiológica do pólen das gramíneas continua a merecer a atenção por parte da
comunidade científica devido à sua elevada representatividade e alergenicidade,
bem patente em diversas regiões da Europa e noutras partes do Mundo. Nas várias
localidades estudadas de Portugal Continental, o pólen de gramíneas foi
detectado na atmosfera durante todo o ano, sobretudo entre Março e Julho, com
índices polínicos e flutuações interanuais equiparáveis às de outras
localidades da região mediterrânica. Constataram-se diferenças na EPAP quanto
ao início, duração e intensidade justificáveis pela localização geográfica,
composição do coberto vegetal herbáceo e clima peculiares de cada localidade.
Conclui-se que nas regiões do Sul de Portugal, interiores e de ambiente rural,
o risco de exposição ao pólen de gramíneas é maior, uma vez que os doentes
alérgicos estão sujeitos a uma exposição prolongada a este tipo polínico em
concentrações particularmente elevadas.
O presente estudo constitui uma mais-valia no domínio da prevenção e tratamento
da doença alérgica respiratória em doentes com sensibilização ao pólen de
gramíneas.