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EuPTCVHe0872-07542011000300003

EuPTCVHe0872-07542011000300003

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0872-0754
Year2011
Issue0003
Article number00003

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Sinostose radiocubital bilateral congénita e agenesia congénita do músculo depressor do ângulo da boca

INTRODUÇÃO Sinostose define a união de dois ossos adjacentes. A si­nostose entre o rádio e o cúbito, geralmente na extremidade proximal do antebraço, pode assumir duas formas: congénita e adquirida. Esta última surge após um traumatismo, sendo distin­ta da congénita por ter uma etiologia, tratamento e prognóstico diferentes. A forma congénita é rara. (1,2)A primeira descrição foi feita em 1793 por Sandifort. (3)A sinostose radiocubital congénita (SRC) caracteriza-se pela posição fixa do antebraço, que varia de uma posição neutra a uma posição de hiperpronação.(4) A re­alização de actividades diárias simples pode ficar comprometida. Esta deformidade pode ocorrer isoladamente ou associar-se a outras malformações (musculo-esqueléticas, neurológicas, gastrointestinais, cardíacas) ou a síndromes genéticas.(5) A agenesia congénita do músculo depressor do ângulo da boca também é uma entidade rara.(6) O diagnóstico baseia-se no quadro clínico típico: assimetria da boca durante o choro (movi­mento descendente do lábio do lado não afectado, permanecen­do o do outro lado imóvel); restante face simétrica; lábio do lado afectado parece mais fino; rugas frontais presentes; encerramento palpebral completo e simétrico; presença da prega nasolabial. (7,8)Frequentemente, associa-se a outras anomalias congénitas.(6) Descreve-se o caso de uma menina de sete anos com SRC bilateral e agenesia congénita do músculo depressor do ângulo da boca esquerdo.

Com a descrição deste caso pretende-se, além do relato da associação de duas malformações raras (SRC e agenesia do músculo depressor do ângulo da boca), alertar os pediatras e ortopedistas para a necessidade de despiste de outras malfor­mações e síndromas genéticos que se lhes poderão associar.

DESCRIÇÃO DO CASO Descreve-se o caso de uma menina de sete anos, cauca­siana, primeira filha de pais saudáveis e não consanguíneos, fru­to de uma gravidez vigiada, com ecografias pré-natais descritas como normais. Nasceu de parto distócico (fórceps), às 40 sema­nas de gestação, com boa adaptação à vida extra-uterina, com 3730g (P75), 51cm de comprimento (P75) e perímetro cefálico de 34cm (P25).

Dos antecedentes familiares, a salientar: mãe, 32 anos, queratodermia palmoplantar, paralisia facial periférica aos sete anos que resolveu totalmente após fisioterapia; pai, 31 anos, saudável; irmão, quatro anos, queratodermia palmoplantar; avó materna com artrite reumatóide.

No período neonatal, foi constatada assimetria facial, mais evidente durante o choro, interpretada inicialmente como sendo de origem posicional. Não apresentava dismorfismos faciais. Manteve boa evolução estato-ponderal (peso no P25-50, estatura no P50) e um desenvolvimento psicomotor adequado à idade.

Aos seis meses, quando começou a bater palmas, os pais notaram que o fazia com o dorso das mãos e não com as pal­mas. Foi constatada limitação bilateral da prono-supinação. As radiografias dos antebraços revelaram SRC proximal bilateral.

Aos dezassete meses, mantinha a assimetria facial quando sorria/chorava, fazendo um movimento descendente do lábio do lado direito, mas não do esquerdo.

Não havia perda da mímica facial, do lacrimejo ou alterações da salivação. O exame neu­rológico era normal. Realizou tomografia computorizada e res­sonância magnética cranio-encefálicas cujos resultados foram normais. A assimetria facial foi atribuída à agenesia do músculo depressor do ângulo da boca esquerdo. Pelo risco de associação a outras malformações, sobretudo cardíacas, realizou um ecocardiograma que excluiu cardiopatia.

Aos cinco anos, por dificuldades na articulação das palavras iniciou terapia da fala, com melhoria. Com essa idade, repetiu as radiografias dos antebraços (Figura 1). Dado conseguir realizar as suas actividades diárias, foi protelada a correcção cirúrgica para depois dos dezoito anos.

Figura 1' Radiografia do antebraço evidenciando sinostose radioulcubital proximal congénita.

Aos sete anos, numa nova reavaliação, mantinha desvio direito da boca quando sorria, com o lábio parecendo mais fino à esquerda, resultante da agenesia do músculo depressor do ângulo da boca esquerdo (Figura 2 A). Mantinha limitação bilateral da prono-supinação, resultante da SRC (Figura 2 B e C).

Figura 2. A)Assimetria facial, evidente com o sorriso, com movimento descendente do lábio à direita (mas não à esquerda), ausência de ou­tras assimetrias faciais, presença da prega nasolabial. B) Posição fixa do antebraço bilateralmente. C) Incapacidade de realizar o movimento de pronação do antebraço, recorrendo a movimentos compensatórios da articulação do ombro.

DISCUSSÃO A SRC, deformidade rara(1), com incidência desconhecida(9), resulta da falha na segmentação longitudinal entre o rádio e o cúbito que ocorre, normalmente, na sétima semana de gesta­ção(4,10). As causas são desconhecidas, podendo resultar de mu­tações espontâneas ou de uma base de transmissão genética ( casos com história familiar positiva e associação com algu­mas síndromes genéticas).(4,5) A SRC, embora presente ao nascimento, frequentemente é diagnosticada quando se verifica limitação da prono-supinação(10), numa idade média de seis anos (seis meses a 22 anos).(5) Não existe predomínio por nenhum sexo.(10) É maioritaria­mente bilateral (60- 80%).(4,10) Embora possa ocorrer isoladamente, num terço dos casos, associa-se a outras malformações: musculo-esqueléticas (poli­dactilia, sindactilia, hipoplasia do primeiro dedo das mãos, fusão dos ossos cárpicos, luxação da anca, anomalias dos joelhos e hiperlaxidez ligamentar), gastrointestinais, cardíacas e neuro­lógicas(1,10). Também se pode associar ao síndroma de Apert, síndroma de Carpenter, artrogripose, disostose mandibulofacial, acrocefaloindactilia, síndroma de William, síndroma de Klinefel­ter, síndroma de Holt-Oram e síndroma fetal alcoólico.

Os défices funcionais, resultantes da rotação anormal do antebraço, dependem da gravidade da deformidade (relaciona­da com o grau de pronação fixa) e da bilateralidade. Nos casos ligeiros, os défices são, geralmente, compensados pelos movi­mentos das articulações adjacentes (escapular, gleno-umeral e radio- cárpica)(9), nos graves (bilaterais e com hiperpronação fixa), os movimentos compensatórios poderão ser insuficientes, podendo haver incapacidade para a realização de actividades simples como comer, escrever ou segurar objectos.

(1,4,10,11) Embora seja assintomática e indolor, pode surgir dor se ocorrer subluxação da cabeça do rádio, comum na adolescên­cia, pelo que está indicado um controlo radiológico regular. Em doentes com mais idade, a dor pode surgir nas articulações ad­jacentes, devido aos movimentos compensatórios.(9) O tratamento cirúrgico tem como objectivo restabelecer a rotação do antebraço e prevenir a recorrência da anquilose.(10)As indicações, embora controversas, incluem a presença de hiperpronação e bilateralidade, com deformidade grave.

(1,4) A de­cisão deve ter em conta a limitação funcional, a capacidade de realização das actividades diárias, o ambiente socio-cultural e a profissão que o doente pretende exercer.(1,10)Alguns autores re­comendam a correcção cirúrgica entre os quatro e os dez anos.(1)No caso descrito, apesar da bilateralidade, a criança conseguia realizar todas as suas actividades, pelo que a correcção cirúrgica foi protelada.

Frequentemente, a correcção por exérese da barra não é bem sucedida, pelo que a maioria dos autores recomenda a os­teotomia de correcção com fixação em prono- supinação neutra/ funcional.

A agenesia do músculo depressor do ângulo da boca é uma anomalia facial minor, presente desde o período neonatal, carac­terizada pela assimetria facial durante o choro. Tem uma etiolo­gia multifactorial. É mais frequente do lado esquerdo e no sexo masculino (2:1).(6) Pode ser diferenciada da verdadeira paralisia facial com base na apresentação clínica típica, descrita anterior­mente. A electromiografia dos músculos faciais pode ajudar no diagnóstico.

É frequente a associação a outras malformações (70%): cervicofaciais (48%), cardiovasculares (44%), esqueléticas (22%), genito-urinárias (24%), do sistema nervoso central - SNC - (10%) e gastrointestinais (6%).(6,8) Estas crianças também po­derão apresentar progressão ponderal e atraso psicomotor. Pelo exposto, é recomendada a pesquisa de malformações as­sociadas, particularmente cardiovasculares, a todos os recém­-nascidos com assimetria facial durante o choro.

No caso descrito, foram excluídas malformações do SNC e cardiopatia. Mas em associação à agenesia do músculo depressor do ângulo da boca, a criança apresentava uma malformação esquelética (SRC).

COMENTÁRIOS FINAIS A SRC, deformidade rara do antebraço, geralmente proximal e bilateral, pode associar-se a outras malformações musculo-esqueléticas, neurológicas, gastrointestinais ou cardíacas e a síndromes genéticas. A realização das actividades diárias pode ficar comprometida. Nos casos de deformidade severa, com hiperpronação e bilateralidade, o tratamento deverá ser cirúrgico, entre os quatro e dez anos.

A agenesia do músculo depressor do ângulo da boca é uma anomalia facial rara, sendo mais frequente à esquerda. Está pre­sente desde o nascimento, embora o diagnóstico seja, frequentemente, tardio. Distingue-se da paralisia facial verdadeira pela sua clínica típica: movimento descendente do lábio do lado não afectado durante o choro, permanecendo o outro lado imóvel; ausência de outras assimetrias faciais; presença de rugas frontais, encerramento palpebral completo e simétrico, presença da prega nasolabial.


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