Lesões subepiteliais do tubo digestivo
Lesões subepiteliais do tubo digestivo
Subepithelial lesions of the digestive tract
António Alberto Santos
aalbertosantos6@gmail.com
As lesões subepiteliais do tubo digestivo alto são achados endoscópicos pouco
frequentes (<1%). Podem ter origem em qualquer camada parietal (intramurais) ou
secundárias a compressões de inúmeras estruturas adjacentes (extramurais).
A Ecoendoscopia (USE) é o método de eleição para caracterizar este tipo de
tumores1 permitindo definir com acuidade a sua origem intra ou extramural;
neste último grupo permite a distinção entre estruturas normais (por ex. baço
ou vesícula) e patológicas (tumores, quistos, aneurismas). Nos tumores intra-
parietais a capacidade de definir a camada de origem e as características
ecográficas (ecogenicidade, dimensões, vascularização, definição das margens e
a presença de adenopatias peri-lesionais) são critérios importantes no
diagnóstico deste tipo de tumores. A punção guiada por Ecoendoscopia, quer
através de agulha fina, quer por biópsia “Trucut” permite, em casos
seleccionados uma melhor caracterização destes tumores.
Os tumores mesenquimatosos do tubo digestivo (TMS) representam um grupo muito
heterogéneo de neoplasias cuja nomenclatura tem sido objecto de numerosas
alterações nos últimos anos. Os tumores do estroma gastrointestinal (GIST) são
o tipo mais frequente, compreendendo um grupo heterogéneo de tumores no
respeitante à sua origem, diferenciação tumoral e prognóstico. A história
natural dos GISTs é mal conhecida; são diagnosticados frequentemente em idades
avançadas, mais frequentes no estômago (60 a 70%), intestino delgado (20 a 25%)
e recto (5%) e esófago (<5%). A imunohistoquímica é fundamental no diagnóstico
diferencial através da utilização de diversas proteínas (ckit, CD34, actina,
desmina e proteína S100). Embora anteriormente se considerasse que alguns
destes tumores fossem benignos, é hoje aceite que virtualmente todos os GIST,
sobretudo com dimensões superiores a 1 cm, têm potencial de malignidade, sendo
os do intestino delgado mais agressivos quando comparados com os de localização
gástrica. A punção com agulha fina guiada por Ecoendoscopia permite obter
amostras suficientes para o diagnóstico de GIST, quando é realizada em tumores
com diâmetros superiores a 2 cm; em tumores de menores dimensões, a acuidade do
método é muito inferior, quer pela dificuldade na punção quer pela obtenção de
material suficiente.
No artigo publicado no número anterior do GE e no respectivo editorial várias
questões se podem colocar:
1. capacidade de definir o grau de malignidade deste tipo de tumores. Várias
características ecográficas (dimensões, irregularidade dos contornos,
heterogeneidade, focos ecogénicos e cavidades quísticas) são critérios úteis na
avaliação da malignidade e foram validados em diversos estudos2,3. A
caracterização imunohistoquímica e a utilização de marcadores como o Ki-67
permite aumentar a acuidade da USE na avaliação de malignidade4. Apesar do
índice mitótico (IM), unicamente avaliável através do exame da peça operatória,
ser considerado o parâmetro mais importante na classificação do potencial de
malignidade dos GIST, a USE com ou sem PAF, é útil para definir a melhor
estratégia a seguir caso a caso.
2. Valor relativo de critérios USE para definir a melhor estratégia. O grau de
subjectividade na avaliação de determinados parâmetros deve ser ponderado. Em
relação às dimensões, sobretudo em lesões infracentimétricas a sua acuidade é
baixa, mesmo em doentes submetidos a vários exames com o mesmo operador (por
ex. será que o aumento de 8 mm para 11 mm em dois exames seriados, será
critério para aconselhar exérese?). O grau de heterogeneidade é ainda mais
subjectivo para ser considerado um critério útil para a decisão (será que é
possível definir uma diferença de heterogeneidade em dois exames sucessivos?).
A dificuldade na utilização destes parâmetros para definir uma estratégia pode
ser inferida pelos resultados do próprio estudo (nos casos operados devido a
alteração das dimensões e da heterogeneidade nenhuma das lesões apresentava
alto risco de malignidade).
3. Seguimento vs Exérese. Dado o potencial de malignidade dos GIST é proposta
por alguns autores a remoção cirúrgica de todos estes tumores. Esta posição
está longe de ser consensual, pelo que a decisão deverá ser considerada caso a
caso, tendo em consideração critérios clínicos e imagiológicos e, sempre que
possível ser discutida em reuniões multidisciplinares. Em casos sintomáticos
(por ex. hemorragia digestiva e dor abdominal em tumores de grandes dimensões)
a decisão cirúrgica é consensual, exceptuando casos de elevado risco
anestésico. No entanto, na grande maioria dos casos o diagnóstico de GIST é
acidental. O que fazer nestes casos? Em tumores com dimensões superiores a 3 cm
e com critérios ecográficos que sugiram malignidade, a exérese é recomendável.
Em tumores de menores dimensões e sem critérios ecográficos de malignidade, o
seguimento é uma alternativa aceite pela maioria dos autores. Nestas situações
ointervalo recomendável é de 12 meses. Segundo os autores, os custos associados
à realização de múltiplos exames deverá ser igualmente um critério importante
na decisão. Não me parece correcto estabelecer comparações de estratégias
quando os “outcomes” são pouco ou nada conhecidos (no grupo de doentes com
tumores de baixa malignidade, qual a percentagem que irá ter doença
clinicamente significativa? Será necessário seguimento? Em que casos? Por
quanto tempo?). A resposta a estas questões será, sem dúvida o objecto de
estudos prospectivos bem validados.
4. Que tipo de exérese? É consensual que se deve optar por métodos minimamente
invasivos. Em tumores originados na muscularismucosa a remoção endoscópica é um
método seguro e eficaz, desde que se obtenham margens de ressecção adequadas;
com o advento de novos acessórios endoscópicos, será possível a ressecção de
tumores com origem na muscular própria. A utilização da cirurgia laparoscópica
com ou sem endoscopia simultânea é igualmente uma solução minimamente invasiva
a ser considerada.