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EuPTCVHe0874-02832011000200016

EuPTCVHe0874-02832011000200016

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0874-0283
Year2011
Issue0002
Article number00016

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Coping e adesão ao regime terapêutico

Introdução De acordo com a Organização Mundial de Saúde as doenças crónicas constituem uma área de grande preocupação no panorama da saúde mundial, sendo responsáveis por grande parte da mortalidade e morbilidade observada nos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento. Além disso, estas serão a principal causa de incapacidade no mundo até 2020 e representarão a maior sobrecarga para os sistemas de saúde ( World Health Organization, 2003).

Ribeiro (2005, p. 219) refere que a emergência de uma doença crónica é um acontecimento não-normativo que constitui um poderoso agente stressor e, como tal, implica que o indivíduo a integre na sua vida, procurando um equilíbrio entre as suas atividades diárias habituais e o controlo da doença. Quando este controlo ou equilíbrio não é conseguido, a pessoa experimentará emoções geradoras de stresse, habitualmente contínuo e de alta intensidade.

A forma como a pessoa lida com o stresse está dependente quer dos recursos de que dispõe, quer das estratégias de coping que adota, as quais dizem respeito aos esforços cognitivos e de conduta que os indivíduos utilizam em circunstâncias específicas indutoras de stresse (Serra, 2002, p. 371). coping é definido como um esforço para responder a estímulos internos (reacções emocionais ao acontecimento) ou externos (o próprio acontecimento) que são avaliados como negativos ou desafiantes. Se a resposta é direcionada para o evento externo estamos perante um tipo de coping focado no problema, se, por sua vez, ela é direcionada para as reações emocionais ou estado interno do indivíduo designa-se como coping focado na emoção. Durante este processo, as acções podem ser, simultaneamente ou alternadamente, dirigidas ao stressor interno ou externo (Maes, Leventhal e Ridder, 1996). Sendo o coping um processo intencional, permite que a pessoa domine a situação stressante de forma a libertar-se dos efeitos negativos, nomeadamente, a ansiedade e depressão (Ferreira, Pais Ribeiro e Guerreiro, 2003). O tipo de coping que a pessoa adopta reflete-se nos seus comportamentos de autocuidado e, portanto, na forma como ela gere a sua situação de saúde.

Sendo assim, compreende-se que os aspectos inerentes à adesão ao regime terapêutico, principalmente, em situações de doença crónica, são de suma importância para os profissionais de saúde, pois a não adesão é responsável pelo aumento da probabilidade do insucesso das terapêuticas, por complicações evitáveis, por aumento dos gastos com a saúde e aumento da morbilidade e mortalidade, principalmente, em pessoas idosas ( World Health Organization, 2003). O enfermeiro surge como um importante agente facilitador da adaptação da pessoa à sua condição de saúde, visto ter uma relação de maior proximidade com a pessoa.

Com o objetivo de percebermos o que a evidência científica nos indica sobre a influência das estratégias de coping nos comportamentos de adesão ao regime terapêutico, procedemos a uma revisão da literatura recorrendo aos principais motores de busca como B-on, EBSCO Host, ELSEVIER, utilizando as palavraschave: coping; estratégias de adaptação; crenças; e adesão. A pesquisa foi efectuada em Português e Inglês. Foram ainda consultadas as bases teóricas em livros de referência nesta área.

Revisão da Literatura Tendo em conta a pesquisa efetuada, evidenciam-se alguns conceitos que se mostram fundamentais na compreensão da temática em análise, nomeadamente, a adaptação à doença, a representação cognitiva e emocional, as estratégias de coping e a sua influência na adesão ao regime terapêutico que passaremos a descrever.

Adaptação à doença De modo a compreender de que forma as pessoas se posicionam sobre a sua saúde e se adaptam às alterações que nela ocorrem, existem alguns modelos que pretendem explicar os seus comportamentos face a situações de doença. Dentro dos diferentes modelos de adaptação salientamos o Illness Constellation Model, de Morse e Jonhson 1991, cit. por Maes, Leventhal e Ridder (1996), que aborda quatro etapas no desenvolvimento psicológico perante uma doença.

A primeira etapa é denominada como Incerteza pois o doente tenta perceber o significado e a gravidade dos primeiros sintomas; a segunda, designada por Rutura, implica que o indivíduo tenha a consciência de que está afetado por uma doença (através do diagnóstico ou estado da doença), apresentando altos níveis de stresse e dependência dos profissionais de saúde; a terceira etapa é referida como um Esforço para recuperar o self, existindo uma tentativa para controlar a patologia, através do suporte ambiental e da implementação de estratégias de coping; a última etapa, denominada Recuperação do bem-estar, reflete uma aceitação da doença e suas consequências e de um novo equilíbrio com o meio.

Através deste modelo verificamos que a adaptação à doença crónica depende de fatores como a avaliação que a pessoa faz do agente stressor (doença), a eficácia do tipo de coping utilizado e o suporte social recebido. Diferenças individuais também podem intervir na forma e intensidade com que o evento stressante é percecionado, bem como, na seleção das estratégias adaptativas.

Leventhal et al. (1997) referem-se às reações iniciais face a uma condição crónica, reportando-se a uma série de respostas emocionais, mais ou menos comuns, que as pessoas experienciam e que se podem traduzir por choque, quando a pessoa se sente alheada da sua própria condição (sentindo-se mais observador do que participante); por conflito, na existência de pensamentos desorganizados e sentimentos de perda, raiva, desespero e impotência; e por uma fase designada de retirada, quando as pessoas tendem a usar estratégias de evitamento, com negação do problema e suas implicações. Esta retirada poderá permitir que o doente se resguarde e lentamente contactando com a realidade até que chegue a uma forma de ajustamento à doença (Franklin, 1975, cit. por Sarafino, 2002).

Representações de doença e coping Partindo do pressuposto que uma doença representa um acontecimento negativo com possível impacto na integridade e bem-estar da pessoa, o valor dessa ameaça é definido com base nas representações de doença do indivíduo (Leventhal et al., 1997). Os mesmos autores referem que as representações de doença são representações de ameaça que tanto influenciam o humor, como motivam para comportamentos que visam reduzir o potencial de ameaça da doença. Estas representações, vulgarmente designadas na literatura como cognições de doença, são as crenças implícitas de senso comum que a pessoa tem sobre a sua patologia (Leventhal et al., 1997).

O modelo de auto-regulação do comportamento, desenvolvido por Leventhal et al.

(1997), centra-se nas crenças individuais sobre a saúde/doença e nas respostas às ameaças de doença, em que as crenças que a pessoa tem acerca dos sinais e sintomas, bem como, a sua interpretação, medeiam as respostas comportamentais perante a ameaça à sua saúde. Neste modelo, os conceitos teóricos de cognição de doença e as técnicas de resolução de problemas estão associados, permitindo explicar o comportamento de coping perante uma situação patológica em que o doente é activo na sua resolução de problemas.

De acordo com Leventhal et al. (1997), perante uma doença o indivíduo fica motivado para a resolver de forma a conseguir o seu estado de normalidade ou equilíbrio. Assim, desenvolve dois processos de resposta face à perceção que faz da situação: a representação cognitiva da doença com a implementação de estratégias de coping face a essas cognições e a resposta emocional através de estratégias de coping que interfiram no seu estado de humor. Dito de outra forma, a resposta à doença apresenta, normalmente, uma primeira etapa em que uma Representação cognitiva e emocional da ameaça à saúde ou Interpretação na qual o indivíduo tenta atribuir um significado, um sentido ao problema, baseado nas cognições que ele tem acerca dessa condição. Essas cognições incluem as dimensões identidade, causa, duração, consequências e cura/controlo, sendo através delas que o indivíduo atribui o seu significado à doença. Em simultâneo, ocorrem também respostas emocionais que vão contribuir para o(s) tipo(s) de coping a adoptar. A segunda etapa é caracterizada pelo desenvolvimento e implementação do plano de acção ou coping em que o indivíduo identifica e seleciona as estratégias que lhe permitam adquirir o equilíbrio físico e emocional. Este conjunto de estratégias de coping pode estar mais focado na resolução dos problemas (coping de aproximação) ou na negação desses mesmos problemas (coping de evitamento). Por fim, na última etapa, o indivíduo procede à ponderação ou avaliação do resultado do plano de acção, verificando se as estratégias de coping utilizadas permitem que ele se adapte à sua nova condição, mantendo o máximo de bem-estar possível (Figura 1).

FIGURA 1 ' Modelo de Leventhal de Representação e coping com a doença (adaptado de Leventhal et al., 1997)

Estes processamentos ou etapas visam o desenvolvimento de estratégias de forma a reduzir a angústia e a controlar a doença. O sistema acontece em paralelo e é recursivo, pois a eficácia de cada procedimento é reavaliada e, consecutivamente, as estratégias poderão ser alteradas sempre que necessário.

Embora os fatores psicológicos sejam importantes, Leventhal et al. (1997) também alertam para a importância que os factores sociais e culturais têm, quer nos processos de avaliação ou apreciação, quer nos comportamentos escolhidos para lidar ou controlar a situação. Petrie e Weinman (1997) também referem que fatores de natureza socio-demográfica (idade, género, nível sócio-económico e educacional, número de elementos do agregado familiar, acesso a cuidados de saúde), fatores de natureza psicológica (emocionais e cognitivos), fatores de natureza situacional (influência interpessoal dos pares e família) e fatores relacionados com a perceção dos sintomas, podem interferir na adoção de determinados comportamentos.

Maes, Leventhal e Ridder (1996) referem que crenças acerca da falta de controlabilidade de uma doença estão relacionadas com o coping de evitamento, centrado na emoção; que as crenças acerca da modificabilidade estão relacionadas com estilos de coping, mais orientados para a resolução dos problemas; e que as crenças acerca da ambiguidade dos resultados estão relacionadas com formas passivas de coping, centrado na emoção. Compreende-se, assim, que a referência que o indivíduo tem da doença (influenciado por crenças do contexto social, com a aceitação ou não da doença e dos comportamentos de doença) influencie na adoção de tipos de coping (Bennett, 2002).

Esta referência da doença resulta de esquemas cognitivos que integram esquemas préexistentes, nomeadamente, as crenças relacionadas com o tratamento, com a competência e confiança nos profissionais de saúde, com o locus de controlo na saúde e acerca das próprias competências da pessoa em lidar com a situação (Bennett, 2002). Maes, Leventhal e Ridder, (1996) propõem, ainda, um modelo (Figura 2) que relaciona as representações de doença com as estratégias de coping adoptadas e que vem, de certo modo, colmatar algumas das falhas encontradas no modelo original de Lazarus que não contemplava conceitos relacionados com as características da doença, bem como, a influência de factores externos e ambientais, como por exemplo, o suporte social. No entanto, este assenta em recentes transformações que Lazarus (2000) acrescenta ao seu modelo, nomeadamente, as intenções e metas a atingir, bem como, contributos de outros autores. Assim, perante um agente stressor, como uma doença crónica, a pessoa avalia a situação tendo em conta alguns fatores como as características da doença e tratamento, os acontecimentos de vida relacionados com a doença e as características sócio-demográficas. Esta avaliação tem também em consideração as exigências pessoais e metas a atingir, bem como, os recursos externos (tempo, suporte dos profissionais de saúde, suporte social, recursos económicos, entre outras) e os recursos internos (inteligência, características da personalidade, resiliência, locus de controlo, entre outras). Tendo em conta estas variáveis, o indivíduo empreende estratégias de coping que, por sua vez, terão consequências a vários níveis (físico, psicológico e social). A perceção dessas consequências determinará a efetividade dessas estratégias (Santos, 2006).

FIGURA 2 ' Modelo de coping na doença crónica (adaptado de Maes, Leventhal e Ridder, 1996)

As estratégias de coping utilizadas podem ser várias e usadas em simultâneo, dependendo, entre outras, da natureza, estádio, etiologia e crenças acerca da doença. Tanto as estratégias de coping centradas no problema, como as estratégias de coping centradas nas emoções, podem ser eficazes na redução do stresse e da angústia (Bennett, 2002, p. 103). Aliás, o facto de predominar um tipo de coping pode atuar de forma contraditória, isto é, um coping ativo, focado na resolução de problemas de forma a controlar a doença pode diminuir o bem-estar mental dessa pessoa. Compreende-se, assim, que perante uma situação de doença iminente (ex. nódulo na mama) a mulher opte por não procurar ajuda médica devido ao medo de se confrontar com uma situação ameaçadora. Este tipo de estratégia focada na emoção (medo), e não na resolução do problema (procurar saber o diagnóstico), é comummente observada pelos profissionais de saúde e como que incompreendida por parte destes. Porém, Holahan e Moss 1987, cit. por Martins (2006), referem estudos que demonstraram uma associação positiva entre o coping de evitamento e mal-estar psicológico. Este tipo de coping, segundo os autores, também poderá estar relacionado com complicações futuras (ibidem). As estratégias de coping mais confrontativas poderão ser facilitadoras da adaptação a uma nova condição de saúde. Um estudo desenvolvido por Lobão et al.

(2009) em pessoas com ostomia revelou que a adoção de estratégias de coping focadas no problema (procura de informação sobre novos materiais) foi facilitadora no processo de aceitação do estado de saúde.

No entanto, Sinzato e colaboradores 1985, cit. por Bennett (2002), verificaram que os diabéticos que utilizavam estratégias de coping ativas, focadas no controlo da sua doença, experienciavam pior bemestar e maiores níveis de ansiedade e depressão, do que aqueles que usavam estratégias de coping passivas ou de evitamento. Deste modo, evitar a angústia associada a tarefas adaptativas muito exigentes pode ajudar a manter o equilíbrio emocional, embora com possíveis complicações futuras da doença (Bennett, 2002, p. 103). Assim, em doenças que representem uma ameaça muito elevada, exigindo uma reavaliação do indivíduo e o meio (ex. cancro com metástases), o tipo de coping focado nas emoções pode ser o mais utilizado. Pelo contrário, nas situações em que as ameaças são percecionadas como menores e com maior controlo (ex. asma e diabetes), as estratégias de coping mais ativas poderão ser as mais adotadas (Maes, Levental e Ridder, 1996). Esta ideia é corroborada por Lazarus (2000) que acrescenta o facto de estes processos poderem ser compatíveis, pois sendo o coping o processo mediador da resposta emocional à situação geradora de stresse, tanto o coping focado no problema, como o coping focado na emoção, têm como fim último o restabelecimento do estado emocional.

Coping e adesão ao regime terapêutico Neste âmbito, interessa refletir de que forma as estratégias de coping adotadas interferem na adesão ao regime terapêutico.

De um modo global, podemos dizer que as doenças crónicas são instáveis ao longo da sua evolução, podendo ter períodos de exacerbação ou remissão dos sintomas.

Aliás, a mesma doença ao longo do ciclo vital pode ser percecionada de diferente modo pelo mesmo indivíduo, levando-o a lidar com ela de formas diversas e, consequentemente, a aderir mais ou menos às indicações terapêuticas. Variáveis pessoais, familiares e sociais poderão influenciar a representação de doença, o tipo de coping e, por conseguinte, a adesão.

Alguns estudos sugerem que, embora a maioria dos doentes se adaptem à sua doença crónica, não referindo maiores níveis de stresse e diminuição de bem- estar, relativamente às pessoas saudáveis, parece haver exceção nas fases iniciais e terminais da doença (Maes, Leventhal e Ridder, 1996).

Moos (1982) refere algumas estratégias que o indivíduo poderá encetar para lidar com a sua doença, e que poderão estar mais ou menos relacionadas com diferentes níveis de adesão ao regime terapêutico. Numa fase inicial da patologia, a pessoa pode negar ou minimizar a seriedade da doença, separando o lado clínico do lado emocional, de forma a ter tempo para entender o que lhe está a acontecer. Neste momento será esperável que, se as recomendações terapêuticas forem muito complexas e intrusivas na sua vida, os níveis de adesão venham a ser baixos, até porque em situações de bastante ansiedade as pessoas não estão disponíveis para receber muitas informações e instruções acerca de novos comportamentos. Beeney e colaboradores 1996, cit. por Bennett (2002), verificaram que num grupo de diabéticos recém-diagnosticados, mais de metade referiram ter sido angustiante o contacto com o diagnóstico e um quarto da amostra expressou a necessidade de apoio emocional, sugerindo um coping centrado na emoção. No entanto, outras estratégias como procurar informação sobre a doença e tratamento, e aprender a lidar com ela; traçar objectivos concretos e limitados, tentando manter as suas rotinas habituais; recrutar suporte instrumental e emocional através da sua família e amigos; perspetivar alguns acontecimentos e situações stressantes futuras, de modo a estar preparado para as dificuldades que possam surgir, e encontrar uma perspetiva regulável sobre a sua saúde, atribuindo significados às suas experiências e traçando objectivos a longo prazo, estão relacionadas com o predomínio do coping mais focado na resolução do problema e, portanto, esta predisposição para controlar a doença, perspetiva níveis de adesão mais elevados.

Fatores sócio-demográficos, como a idade, também podem interferir nas estratégias de coping e na adesão. Numa entrevista a jovens diabéticos que frequentavam a escola, Balfe (2007) constatou que estes integravam perfeitamente a sua doença nos seus estilos de vida. Isto era possível porque estes jovens continuaram no mesmo lugar e com o mesmo grupo de amigos durante anos, o que levou a que a diabetes fosse encarada como uma rotina e não como um problema. que para estes jovens a mudança para a universidade afastou-os deste suporte social e estrutural. A universidade apresentava-se como um novo lugar com novas pessoas e, como tal, eles tiveram que mostrar que se adaptam a uma nova realidade. Como o consumo de álcool parece assumir importância na vida estudantil universitária, os jovens diabéticos também correm esse risco para construir a sua identidade, como estudantes universitários, isto é, para responderem a uma nova identidade social desejada. Isto sugere que os jovens com doença crónica estão preocupados com o risco de desaprovação e rejeição dos outros (Balfe, 2007). Assim, adolescentes com doenças crónicas estão muito sensíveis a assumir as normas do grupo. A modificação do contexto social poderá ser determinante nos comportamentos de adesão, especialmente em determinadas idades, pois, frequentemente, os jovens tendem a repetir os mesmos comportamentos dos seus pares (mesmo que representem um comportamento de risco e um desvio ao regime terapêutico aconselhado), de forma a sentirem-se integrados (Charmez, 1983, cit. por Balfe, 2007).

Relativamente à influência do género no tipo de estratégias de coping adoptadas, embora alguns estudos sugiram que os homens privilegiem as estratégias de coping focadas no problema, enquanto as mulheres desenvolvam estratégias mais focadas na emoção (Sarafino, 2002), quando ambos os sexos têm o mesmo nível de educação, essas diferenças nas estratégias adotadas face a um evento stressante parecem não se verificar (Greenglass e Noguchi, 1996, cit.

por Sarafino, 2002).

Outras variáveis interferem também nos tipos de coping adotados. Duangdao e Roesch (2008) desenvolveram uma meta-análise, com base em 21 estudos sobre diabéticos, em que os resultados apresentados mostraram que as pessoas com diabetes têm o dobro da probabilidade de ter depressão (mais as mulheres que os homens). Este facto impede-as de realizar as suas atividades diárias, o que se reflete na qualidade de vida, na adesão ao regime terapêutico e no controlo da glicémia. Assim, os resultados estatísticos encontrados nos diabéticos que utilizam estratégias de coping de evitamento e focado na emoção, sugerem uma adaptação deficitária que está relacionada com a depressão e ansiedade, assim como, com o aumento dos níveis glicémicos. Os diabéticos que têm estratégias de coping focadas no problema, têm diminuição dos níveis de glicose, tendo por isso maior controlo glicémico. Estas pessoas apresentam menos depressão e ansiedade. Estas diferenças de género podem, em parte, ser explicadas pelo facto de ter sido encontrado na mulher um perfil mais desfavorável, em termos de representações cognitivas, e que está relacionado com o facto de haver uma tendência para que estas sejam mais propensas a distúrbios de humor, que interferirá na forma como elas percecionam a sua doença. Sousa (2003) constatou que as mulheres diabéticas se apresentavam mais pessimistas em relação à sua doença, evidenciando emoções mais negativas e percecionando piores consequências que os homens. Contudo, a associação do género a um tipo de estratégia de coping tem encontrado resultados opostos. Na tentativa de perceber como é que a mulher interpretava, se adaptava e geria os sintomas relacionados com a doença crónica, O´Neill e Morrow (2001), embora indo ao encontro da literatura que sugere que as mulheres, habitualmente, referem mais sintomas que os homens, verificaram que estas parecem usar um coping de confrontação, sendo menos propensas a adotar um coping de evitamento, mesmo perante uma doença séria e debilitante. Porém, o inverso se passaria face a uma doença assustadora ou com consequências a nível funcional. A este propósito, Burke e Flaherty (1993, cit. por O´Neill e Morrow, 2001) encontraram o predomínio de estratégias de evitamento num grupo de mulheres idosas com artrite reumatóide, estando este tipo de coping associado a piores resultados em saúde. No entanto, em doentes oncológicas, Santos (2006) verificou que, embora após os primeiros meses de diagnóstico estas tenham adoptado estratégias de tipo desânimo/fatalismo, com o decorrer da doença, passaram a optar por estratégias de confrontação ou aceitação. Entretanto, alguns estudos apontam para que as mulheres mobilizem mais facilmente o suporte social, recorrendo mais frequentemente aos serviços de saúde. Parece, assim, inconsistente o papel do género no tipo coping adotado.

O apoio social parece ser um dos fatores psicossociais que mais influencia na adesão (Bennett, 2002; Sarafino, 2002), pois poderá ajudar a pessoa a gerir o seu equilíbrio emocional de modo a manter o seu funcionamento face a uma situação de crise. Esta gestão do equilíbrio não é realizada somente pela pessoa afetada pela doença, mas também pelos elementos da sua família. De facto, face a uma doença, a família tende também a procurar o equilíbrio mantendo a sua dinâmica a mais próxima possível do habitual. Este padrão funciona como elemento protetor, favorecendo a resposta adaptativa ao stresse e [ ] é expresso por um conjunto de ações que integram rotinas, tradições e celebrações habituais que dão estabilidade, harmonia e significado à forma de viver (Martins, 2006, p. 77). A autora, citando McCubbin e McCubbin (1993), refere que os recursos familiares integram capacidades, forças, potencialidades, estratégias e comportamentos de coping que a família mobiliza para fazer face à situação de doença e podem ser desenvolvidos em grupo, ou individualmente, pelos seus membros. O conhecimento, a inteligência, a educação, a experiência e os traços de personalidade que influenciam o coping, como a auto-estima, o senso de humor, a mestria e a saúde física e mental, são considerados recursos pessoais. A coesão, a adaptabilidade, a organização familiar, a atitude positiva face ao problema e a robustez são considerados recursos familiares (ibidem). Santos (2006) aponta para esta correlação entre os estilos de coping adotados por doentes oncológicos e sua família quando verificou no seu estudo que tanto os doentes como os familiares optaram, preferencialmente, por estratégias mais adaptativas.

Numa meta-análise desenvolvida por Hocking e Lochman (2005), algumas pesquisas sugerem que as estratégias de coping utilizadas pelos pais são, frequentemente, seguidas pelas crianças: Gil e colaboradores, num estudo desenvolvido em 1991, verificaram que pais com estilos de coping mais ativos, evidenciando maiores comportamentos de adesão têm, igualmente, filhos mais ativos e colaborativos; Thompson e colaboradores também encontraram resultados semelhantes em 1999, em que mães cujos filhos apresentavam problemas de adaptação à doença mostravam níveis elevados de ansiedade e depressão, comparativamente às mães com filhos sem problemas de adaptação. Parece, então, que uma adaptação pobre por parte da mãe, com um predomínio de estratégias de coping paliativas (coping focado na emoção, no evitamento, com sentimentos de culpa), poderá influenciar negativamente a própria adaptação da criança com consequências a nível da adesão. Um ambiente familiar coeso é referido por Kliewer e Lewis (cit. por Hocking e Lochman, 2005) como preditor nas estratégias de coping mais ativas e portanto mais focadas na resolução do problema. Outro estudo recente encontrou uma associação entre o envolvimento e adaptação da mãe e a adesão e controlo metabólico da diabetes em crianças no início da adolescência. Os autores encontraram uma associação positiva entre o envolvimento e adaptação da mãe com bons níveis de adesão e melhor controlo metabólico nos adolescentes com diabetes ( Wiebe et al., 2005).

Embora a literatura aponte para que as variáveis sociais e psicológicas possam interferir no tipo de estratégias de coping adotadas, bem como, na adesão às recomendações terapêuticas (Hocking e Lochman, 2005), os investigadores sugerem alguma cautela na avaliação das situações pois, para além de múltiplos estudos padecerem de muitas limitações, estas variáveis estão, por sua vez, dependentes de muitas outras que interagem entre si de diferentes modos, em diferentes contextos.

Parece, no entanto, consensual que as estratégias de coping de tipo ativo (focado no problema) favorecerão os níveis de adesão, pois estarão mais relacionadas com situações percecionadas pela pessoa como controláveis, enquanto que as estratégias de coping mais passivas (focadas na emoção) estarão associadas a um pior ajustamento psicológico e, como tal, a uma baixa adesão ao regime terapêutico (Santos, 2006).

Esta multiplicidade de fatores que interagem de variadas formas, torna-se um desafio permanente na investigação científica para o profissional de saúde que tenta promover a adesão. Desta forma, o acompanhamento da pessoa no seu processo adaptativo ao longo da doença exige que o profissional de saúde esteja sistematicamente atento e inteirado do significado daquela doença, naquele momento, para aquele indivíduo, bem como, do tipo de coping utilizado. O contexto familiar e social também deverá merecer especial atenção. Desfocar a atenção das características médicas da doença para a focar na perceção individual do doente, pode representar um passo importante na compreensão do seu comportamento e na implementação conjunta de estratégias que possam promover a adaptação do indivíduo à sua doença e a adesão ao regime terapêutico aconselhado.

Conclusão A realização desta revisão de literatura vem demonstrar a relação que existe entre o modo como as pessoas lidam com as situações de stresse e a adoção de comportamentos promotores de saúde.

De um modo geral, vários estudos apontam para que a existência de muitas alterações de vida aumente a vulnerabilidade à doença. No entanto, o mesmo acontecimento pode ser vivenciado ou não como agente stressor, dependendo da pessoa que o avalia e resultante da interação que ocorre entre esta e o seu meio ambiente. Sendo o coping entendido como um esforço para responder a estímulos (internos ou externos) que são avaliados como negativos ou desafiantes, encontramo-nos, não perante uma resposta instintiva ao problema, mas sim na presença de um processo intencional da pessoa para se adaptar a uma nova situação. O indivíduo assume, então, um papel ativo na resolução dos seus problemas, com vista a reduzir sentimentos de angústia e a aumentar o controlo da doença.

Embora de forma pouco consistente, as variáveis sócio-demográficas parecem influenciar as estratégias de coping adotadas. Relativamente ao género, alguns dos estudos referem que as mulheres são mais propensas a distúrbios de humor, elegendo preferencialmente o coping focado na emoção, principalmente se numa fase inicial da doença, esta é percepcionada como bastante ameaçadora. A idade também parece influenciar as estratégias adotadas, sobretudo, nos jovens, pois estes têm tendência a seguir o comportamento dos seus pares. O contexto social é também identificado como um dos aspectos que poderá determinar o modo como as pessoas reagem a determinadas situações stressantes.

Verifica-se que as estratégias de coping adotadas interferem diretamente nos comportamentos de adesão. Os estudos sugerem que estratégias de coping do tipo ativo (focadas no problema) estarão relacionados com maiores níveis de adesão, enquanto que as do tipo mais passivas (focadas na emoção), estarão associadas a menores níveis de adesão.

O stresse, as estratégias de coping e a adaptação à doença, especialmente no que respeita à doença crónica, são aspetos que estão fortemente interligados e que influenciam, e são influenciados, pela adesão ao regime terapêutico.

Neste sentido, perceber a forma como as estratégias de coping interferem no contínuo saúde/doença, permite-nos aumentar o conhecimento e a performance nesta área de intervenção, ajudando as pessoas a aperfeiçoar as suas competências de coping, bem como, a melhorar os seus comportamentos de autocuidado.


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