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EuPTCVHe0874-02832012000100005

EuPTCVHe0874-02832012000100005

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0874-0283
Year2012
Issue0001
Article number00005

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Bullying e a criança com doença crónica

Introdução Segundo a UNICEF (2004), criança é definida como todo o ser humano com menos de dezoito anos, exceto se a lei nacional confere a maioridade mais cedo. Esta quando nasce precisa de proteção, depois ao longo da sua vida vai sofrendo uma socialização que a vai preparar para o seu futuro enquanto adulta. O diagnóstico de uma Doença Crónica acarreta muitas incertezas relativamente ao seu futuro e ao seu desenvolvimento. Segundo Phipps (2003), a Doença Crónica pode entender-se como toda a lesão somática que reduz de uma forma importante as capacidades da criança, produzindo sintomas e sinais, por um tempo prolongado, e da qual existe recuperação parcial.

A Doença Crónica não é por si uma realidade única, mas uma designação genérica que abrange doenças prolongadas, muitas vezes associadas a um certo grau de incapacidade. Entenda-se como incapacidade, a redução de atividade, de longo ou curto prazo, em resultado de uma situação aguda ou crónica (Phipps, 2003).

A reação da criança à doença crónica depende em grande parte do seu nível de desenvolvimento, temperamento e das estratégias de copping disponíveis; depende também das reações da família e pessoas significativas (Hockenberry, Wilson e Inkelnestein, 2006).

O impacto de uma doença crónica ou de incapacidade é em muito influenciado pela idade em que se inicia a doença. As doenças crónicas acometem crianças de todas as idades, mas os aspetos evolutivos de cada faixa etária determinam o stress e riscos para a criança. Os enfermeiros devem reconhecer que as crianças precisam ter a sua condição e suas implicações redefinidas enquanto se desenvolvem e crescem (Idem).

A saúde física e emocional da criança, assim como o seu funcionamento cognitivo e social, são influenciados pela qualidade do funcionamento da sua família, esta considerada como uma constante na sua vida. Desta forma, os cuidados prestados pelo enfermeiro devem, também, incluir a família.

A criança com doença crónica, pode levar uma vida perfeitamente normal, dentro das limitações que a patologia crónica que a criança sofre, mesmo no que se refere a frequentar a pré-escola e a escola.

A criança na idade Pré-escolar está no estágio da iniciativa no qual diversas tarefas que são realizadas nesta fase podem ser atrasadas por uma doença crónica. Esta limitação pode prejudicar a aprendizagem da criança, especialmente em termos de desenvolvimento social. O pré-escolar portador de uma enfermidade crónica, restrito à sua casa, pode apresentar uma lentificação no desenvolvimento das habilidades sociais, tão úteis nas situações de grupo ou escolares (Hockenberry, Wilson e Inkelnestein, 2006).

Pelo referido anteriormente é bastante importante que a criança com doença crónica frequente um infantário, para que esta consiga desenvolver, de uma forma saudável, as suas capacidades de socialização.

A criança em idade escolar luta para se sentir realizada e para conseguir superar os seus sentimentos de inferioridade devido à sua patologia crónica.

Nesta idade, começa a identificar-se com os seus pares e qualquer situação que as rotule como diferentes, pode afetar o seu sentimento de pertença ao grupo. O facto de passar mais tempo fora da escola devido aos tratamentos pode, de certa forma, causar dificuldades na relação social com os seus pares (Idem).

Quando estas crianças são vistas como diferentes, como fora do padrão de criança dita normal, os seus pares podem não as querer incluir no grupo, afastando-as ou mesmo agredindo-as, tornando-as, assim vítimas de bullying (Idem).

Existem cada vez mais crianças com doenças crónicas que, devido ao avanço da ciência, conseguem frequentar a escola sem que a doença seja o entrave às interações sociais. Contudo, deve então ter-se em conta que estas crianças são mais frágeis e um alvo fácil para serem vítimas de bullying.

Olweus (1994) definiu bullying afirmando que um aluno está a ser provocado/ vitimado quando ele ou ela está exposto, repetidamente e ao longo do tempo, a ações negativas da parte de uma ou mais pessoas. Considera-se uma ação negativa quando alguém intencionalmente causa, ou tenta causar, danos ou mal-estar a outra pessoa (Idem).

O bullying pode ser conduzido por um indivíduo ' o provocador ou agressor ' ou por um grupo, e o alvo do bullying pode também ser um indivíduo ' a vítima ' ou um grupo (Idem).

A reforçar a sua definição o autor caracteriza o bullying pelos seguintes critérios: (I) a intencionalidade do comportamento, isto é, o comportamento tem um objetivo que é provocar mal-estar e ganhar controlo sobre outra pessoa; (II) o comportamento é conduzido repetidamente e ao longo do tempo, isto é, este comportamento não ocorre ocasionalmente ou isoladamente, mas passa a ser crónico e regular; (III) um desequilíbrio de poder é encontrado no centro da dinâmica do bullying, no qual, normalmente, os agressores vêm as suas vítimas como um alvo fácil.

O fenómeno bullying é um problema extremamente complexo porque não envolve simplesmente a vítima e o agressor. Tanto o grupo de colegas como os pais e professores estão de alguma forma envolvidos, porque todos têm o poder para pôr termo à situação. Cabe ao adulto não encarar estas situações como próprias da idade das crianças e estar atento aos sinais desta, podendo ajudar a cessar o seu sofrimento.

Prejuízos financeiros e sociais causados pelo bullying atingem também as famílias e a sociedade em geral. As crianças e adolescentes que sofrem e/ou praticam bullying podem vir a necessitar de múltiplos serviços, como saúde mental, justiça da infância e adolescência, educação especial e programas sociais. Subvalorizado por várias gerações, este fenómeno é hoje uma das maiores preocupações para profissionais da saúde e educação (Mendes, 2010).

Em Portugal, são conhecidas as investigações relativas a dois concelhos do norte do país, segundo o qual 21% das crianças entre os 7 e os 12 anos nunca foram agredidas, 73% são agredidas "às vezes" e 5% "muitas vezes". Diversas investigações indicam que os rapazes estão envolvidos no bullying, tanto como vítimas, quer como provocadores, mais frequentemente do que as raparigas (Olweus, 1994).

A frequência do bullying diminui com o aumento dos anos de escolaridade e os alunos mais novos são mais frequentemente vítimas e a frequência de serem ameaçados diminui à medida que aumenta a idade (Idem).

Dada a crescente prevalência de doenças crónicas na criança, no mundo atual, consideramos pertinente a investigação de bullying e a criança com doença crónica, considerando papel de relevo que os enfermeiros assumem na assistência a estas crianças e suas famílias. Deste modo, perante a temática apresentada, formulamos a pergunta de investigação que conduz esta revisão sistemática: As Crianças portadoras de Doença Crónica são mais propensas a serem vítimas de bullying do que as Crianças Saudáveis? A preocupação que norteia a revisão sistemática é a procura de evidências que permitam caracterizar esta temática, tendo em conta as perguntas que são formuladas e examinadas pelo conjunto de literatura, que recursos metodológicos são privilegiados pelos estudos, a natureza dos mesmos e a perspetiva teórica que os informa.

Tem-se como finalidade mostrar de que forma os enfermeiros podem contribuir na intervenção junto da família e da comunidade escolar, fornecendo elementos para lidar com o problema de modo a assegurar o bem-estar físico e psicológico da criança com doença crónica vítima de bullying e a atuar precocemente, por forma, a prevenir que esta situação se verifique.

Metodologia O levantamento bibliográfico sistematizado de estudos indexados nas bases de dados SciElo, LILACS, CINAHL, PubMed, Nursing Reference Center, PEPsic, Medline, ScienceDirect e PsycoInfo, publicados entre 2001 e 2010, relacionados com o tema bullying nas Crianças com Doença Crónica, foi operacionalizado através do cruzamento das seguintes palavras busca: criança, bullying, necessidades especiais, doença crónica, vitimização, violência, agressão, danos psicológicos e as suas correspondentes nas línguas inglesa e espanhola.

A amostra recolhida corresponde a artigos indexados em periódicos que foram selecionados a partir de uma leitura prévia dos seus resumos anexados, seguindo os seguintes critérios de inclusão: I) Idioma da publicação ' artigos publicados na íntegra em língua portuguesa, inglesa e espanhola; II) Limite etário da amostra ' crianças com idades compreendidas entre os zero e os dezoitos anos; III) Utilização de um grupo de crianças portadoras de Doença Crónica; IV) Utilização pelo menos de um grupo de controlo com crianças Saudáveis; V) Referências que tivessem pertinência com o tema.

Para além destes critérios, excluímos à partida, todos os artigos que consistissem revisões sistemáticas e meta-análises.

Com a leitura seletiva dos resumos dos artigos selecionados, foram recuperados os artigos originais na íntegra constituindo o corpus que delimitou o material de análise proporcionando desta forma, um tratamento mais apurado dos dados.

Após a leitura integral e analítica de cada estudo, foram identificadas as principais características, ideias chave e síntese dos resultados apurados.

Devido ao facto das bases de dados consultadas utilizarem critérios rigorosos de seleção, confiou-se na compilação dos artigos mais relevantes sobre o tema geral, obtendo um panorama detalhado da produção científica internacional (um vez que a nível nacional, não foram encontrados estudos realizados sobre o tema em questão).

Na análise dos estudos começámos por proceder à pré-análise (organização de dados, a partir da leitura exaustiva de cada artigo, compreendendo a sistematização geral das ideias principais sob a forma de quadro), seguindo-se a exploração do material (a partir da sistematização das ideias de cada artigo procedeu-se à procura de ideias convergentes e divergentes entre todos) e, por fim, procedemos à interpretação de dados (agruparam-se em categorias os temas que emergiram na análise de cada estudo).

Através do cruzamento das palavras-chave que definimos, foram então identificados um total de noventa e sete artigos, dos quais quarenta foram selecionados, tendo sido localizados dez, dos quais apenas seis preenchiam os critérios de inclusão definidos, estes constituem a amostra bibliográfica final e foram objeto de análise nesta revisão.

Dos seis artigos utilizados, para dar resposta à nossa pergunta de investigação, um foi localizado na base de dados ScienceDirect, três foram localizados na PubMed e dois foram localizados na Medline.

Resultados Com a análise dos artigos foi-nos permitida a obtenção de uma visão geral acerca das diferentes temáticas abordadas no material recolhido e sistematizado.

Assim, apresentamos primeiramente as principais características dos estudos revistos para depois fazermos a descrição dos resultados e das conclusões gerais a que cada um chegou acerca do bullying na Criança com Doença Crónica.

Principais características dos estudos Dos seis estudos selecionados, cinco são de natureza quantitativa e um utiliza conjuntamente as metodologias qualitativa e quantitativa.

Apesar de não limitarmos a data de publicação dos estudos durante a pesquisa dos artigos, os estudos encontrados reportam-se aos últimos dez anos, entre 2001 e 2010, verificando-se que um estudo é de 2001, um de 2004, um de 2006, dois de 2009 e um de 2010.

Quanto ao local de realização dos estudos, encontrámos seis países diferentes.

Dois dos estudos foram realizados nos Estados Unidos da América, um na Grécia, um na Finlândia, outro no Canadá e um outro realizado em conjunto, em França e na Irlanda.

Nos seis estudos por nós selecionados, tal como se previa, pois constituía critério de inclusão, foram incluídas crianças com idades compreendidas entre os 0 (zero) e os 18 anos. O número de elementos que compõem a amostra dos estudos, nos grupos alvo variou de 42 a 12488 crianças e nos grupos de controlo variou entre 42 e 43963 crianças.

Relativamente à técnica de colheita de dados, apurámos que foram realizadas entrevistas e questionários tanto às crianças como aos seus pais e professores.

A diversidade de instrumentos é visível tendo em conta que se observou a aplicação de escalas que permitiram avaliar aspetos de bullying, ansiedade, depressão ou de autoconceito. Apurámos a aplicação dos seguintes questionários: Revised Olweus bully/victim Questionnaire; Piers-Harris Self-concept Scale II; Revised Children's Manifest Anxiety Scale; Child Depression Inventory; Parent-Completed questionnaire: the social Skills Rating System e o Shorten Greek version of the Revised Olweus Questionnaire.

Dos seis estudos analisados todos apresentaram uma população alvo de ambos os sexos. Quanto à existência de grupo de controlo, todos os estudos tinham um grupo de controlo constituído por um grupo de crianças saudáveis; apenas dois dos estudos apresentaram dois grupos de controlo. Um dos estudos tinha como grupos de controlo um grupo de crianças saudáveis e outro de crianças portadoras de outra doença crónica; o segundo tem como grupos de controlo, um grupo de crianças saudáveis e um grupo dos irmãos das crianças portadores de uma forma de cancro.

A população alvo de cada estudo diferencia-se no que respeita à sua doença crónica. Um estudo debruça-se sobre as crianças com Epilepsia, outro estuda este fenómeno nas crianças com Cancro, outro nas crianças Obesas e os restantes não procedem à especificação da doença crónica de que a criança é portadora.

Resultados dos estudos Dos seis estudos por nós analisados, as categorias que mais se evidenciaram foram a incidência do bullying nas crianças, a forma que o bullying pode assumir e a quem as crianças vão contar que foram vítimas de bullying.

Incidência do bullying nas crianças A incidência do bullying nas crianças é um dos aspetos mais importantes e mais estudados, foram encontradas referências à incidência do bullying em cinco dos seis estudos por nós utilizados.

Os autores Lahteenmaki et al. desenvolveram um estudo em 2001 que teve como objetivo ter uma ideia geral dos problemas escolares que as crianças com cancro têm e concluíram que 31.7%., numa amostra de 43 crianças, informaram ser vítimas. Dos grupos de controlo, o grupo dos irmãos das crianças com cancro, num total de 28, 10.9% apresentaram-se como sendo vítimas e no grupo das crianças saudáveis, 8.3% referiram-no, num total de 103 crianças. Estes autores referem ainda que as crianças doentes, reportam três vezes mais que são vítimas do que as crianças saudáveis.

O diagnóstico das crianças, a idade que tinham aquando do diagnóstico e o género, não revelaram ser preditores de maior vitimização. Quanto mais tarde for diagnosticada a doença, maior é a prevalência de serem vitimizadas, e quanto mais desfavorável for esse diagnóstico, também.

Janssen et al. tinham como objetivos, neste estudo realizado em 2004, relacionar o peso com as diferentes formas de bullying. Ficou evidente que o grupo de crianças com excesso de peso é três vezes mais vítima de bullying do que o das crianças saudáveis. Um total de 29.3% dos rapazes obesos e 38% das raparigas obesas são vítimas de bullying enquanto nas crianças com um peso normal, esta percentagem é de 11.4% e 10.1%, respetivamente. As crianças que são bullies representam, nos rapazes com peso normal, uma percentagem de 11.3% e nas raparigas de 5.9%, nas crianças obesas esses valores sobem para, respetivamente, 27.8% e 10.6%. As crianças que falaram ser vítimas/bullies são, nos rapazes com peso normal, 3.7% e nas raparigas 2.2% enquanto nas crianças obesas são, respetivamente, 8% e 7.4%. Estes autores mostram-nos que a prevalência de ser vítima aumenta com o aumento do Índice de Massa Corporal (IMC) nos rapazes com idades compreendidas entre os 11 e 12 anos mas nas raparigas, tende a aumentar nas idades dos 13 aos 14 anos. Ficou evidente que esta prevalência aumenta com o aumento do IMC em todas as faixas etárias, mas mais no género feminino. Como no estudo de 2001 desenvolvido por Lahteenmaki et al., os autores conseguem relacionar que a vitimização em crianças obesas não incluía o facto de serem de diferentes raças, género, cor ou religião. Também se verificou que, independentemente do género, houve uma relação entre a categoria do IMC e o ser bully/vítima, onde na classe dos 15/16 anos eram mais prováveis de serem bullies que as crianças com peso normal.

Num outro estudo, realizado por Cleave e Davis em 2006, que teve como objetivo testar a hipótese de que a criança com necessidades especiais de saúde estava associado com o ser vítima, bully ou bully/vítima, verificaram que o grupo de crianças com necessidades especiais de saúde, era mais vitimizadas que o grupo de crianças saudáveis, apresentando um valor de 42.9%, em relação ao grupo de controlo com 32.4%. Neste estudo, mostrou-se que as crianças portadoras de necessidades são mais propensas a serem vítimas mas também a serem elas próprias bullies em relação a outras crianças. Ficou, também, bem evidente nos estudos acima referenciados, realizado por Lahteenmaki et al., de 2001 e realizado por Janssen et al., em 2004.

Também o facto de ser bully/vítima ficou associado à criança com uma necessidade especial de saúde, também demonstrado no estudo realizado por Janssen et al., em 2004, ligando isso a problemas emocionais, de comportamento ou a uma limitação funcional.

Hamiwka et al., em 2009, realizaram um estudo que tinha como objetivo determinar a prevalência de comportamento de bullying nas crianças e adolescentes com epilepsia comparado com outras crianças sem qualquer doença neurológica e explorar se os possíveis fatores ligados à epilepsia poderiam ou não ser preditores de ser bully ou vítima. Neste estudo, que tem como grupo alvo as crianças portadoras de epilepsia, mostrou que das 59 crianças com epilepsia, 42 % eram vítimas de bullying, 15% eram, elas próprias, bullies e 9% eram bullies/vítimas. O grupo de crianças com outra patologia crónica teve como incidência 18%, 10% e 5% respetivamente. No grupo de controlo, o grupo de crianças saudáveis, teve como valores de prevalência, respetivamente, 21%, 4.8% e 0%. Mais uma vez se revela que, como nos estudos dos anos 2001, 2004 e 2006 realizados por, respetivamente, Lahteenmaki et al., Janssen et al. e Cleave e Davis, as crianças portadoras de uma doença crónica, são mais vítimas que as crianças saudáveis ou com uma outra doença crónica. Não foi possível associar fatores específicos de epilepsia e o risco de poderem ser vítimas ou bullies.

Neste estudo verificou-se que existiam diferenças socioeconómicas e de escolaridade nos pais das crianças dos diferentes grupos. Os pais das crianças com epilepsia eram, na sua maioria, pessoas com um estatuto socioeconómico inferior e com escolaridade também inferior em relação aos pais dos outros dois grupos.

Não foram encontradas diferenças significativas no que diz respeito à diferença de capacidades sociais, problemas comportamentais, ansiedade, depressão e autoestima entre as crianças vítimas nos diferentes grupos. Suspeita-se que o bullying possa estar sub-representado na população e que as crianças com epilepsia estão atualmente sob um risco maior de serem vítimas.

Em 2010, no estudo realizado por Sentenac et al. que englobou crianças de França e da Irlanda, apresentou como objetivo descrever a frequência do bullying, comparar a associação entre alguns fatores familiares e vitimização e documentar o risco adicional de vitimização de acordo com o nível de doença da criança. Nos grupos-alvo constituídos por crianças com doença crónica com restrições nas atividades da escola e um outro grupo de crianças também com doença crónica mas sem restrições nas atividades da escola, mostrou que 34.2% dos dois grupos, eram vítimas, não havendo uma diferença significativa entre os dois. O grupo de crianças saudáveis informou ser vítima de bullying numa percentagem de 25.9%. Este estudo vai ao encontro dos estudos anteriores de 2001, 2004, 2006 e 2009, no que diz respeito às crianças com patologia serem mais vitimizadas.

Estes autores também chegaram à conclusão de que a comunicação entre pares era mais fácil nas crianças saudáveis.

Verificaram que em França existe uma maior prevalência de bullying do que na Irlanda.

O facto de serem vítimas ficou também associado a um fraco suporte social e a uma dificuldade de comunicação entre as crianças e os seus pais, interligando também o facto de serem portadoras de uma doença crónica. No estudo realizado em 2009 por Hamiwika et al., também tinha ficado demonstrado que existem diferenças nos pais das crianças dos diferentes grupos.

Formas de bullying Este importante aspeto foi desenvolvido em dois dos estudos por nós analisados.

Janssen et al., no estudo realizado em 2004, evidenciam que existem associações entre o aumento do IMC e as agressões verbais, agressões essas que são: chamar nomes, gozar ou dizer graças. Nas raparigas foi verificado que havia uma associação entre o aumento das agressões físicas com o facto do aumento do IMC, quanto maior for o aumento do IMC, mais agressões verbais sofriam.

Observou-se que existe uma estreita relação entre vitimização e obesidade em todas as idades estudadas, mas a relação entre a obesidade e ser bully foi observada apenas nas idades compreendidas entre os 15 e 16 anos.

Em 2009, no estudo realizado por Didaskalau, Andreou e Vlachou, onde os objetivos foram: explorar a extensão e os diferentes tipos de bullying e vitimização entre os estudantes que recebem apoio ao nível da educação especial, os autores mostram que no total dos 173 alunos (dos dois grupos, um de crianças com necessidades especiais de educação e o outro de crianças saudáveis), 25.8% informaram ser vítimas, 13.3% informaram ser bullies e 1.15% serem bullies/vitimas. Este estudo focalizou-se mais na diferenciação dos diferentes tipos de bullying cometidos pelas crianças assim como o estudo de 2004 desenvolvido por Janssen et al.. Não foi possível determinar a associação entre potenciais consequências do bullying (como sintomas de depressão, aumento da ansiedade, baixa autoestima) e o facto de serem vítimas ou bullies.

Desta forma, e segundo o que foi identificado pelas crianças vítimas com 38.2% e pelas bullies com 30.9%, o tipo de bullying mais frequente são os pontapés, o bater, o empurrar e o ameaçar. O tirar dinheiro e outros bens foi menos revelado pelos bullies (4.1%) que pelas vítimas (19.4%), mas quando se fala de bullying verbal, os bullies foram quem mais reportou com 18.2% contra 11.3% das vítimas. Os boatos e o isolamento foram identificados com semelhante frequência tanto pelos bullies (14.2% e 22.3% respetivamente) como pelas vítimas (13.8% e 21.9% respetivamente).

Quebra de silêncio A quebra do silêncio foi evidenciada em apenas dois dos estudos analisados.

Didaskalau, Andreou e Vlachou conseguiram no seu estudo, realizado em 2009, mostrar a quem as crianças vítimas de bullying vão reportar as suas queixas.

Dos 25.8% das vítimas, 20.5% não diz a ninguém que é vítima de bullying enquanto 40.2% contam a alguém. Destes, a maioria prefere dizer a pessoas que conhece (62.3%), dos quais 33.1% tem tendência a falar com os pais, 19.7% com os professores, 18.5% com o diretor da escola, 7.3% com psicólogo, assistente social ou outros profissionais e apenas 6% aos seus pares.

A maioria das crianças vítimas (69.5%) acha que contando as suas experiências a alguém isso as ajudará e 82.3% delas diz que deveria de haver uma política escolar contra o bullying.

Em 2010, no estudo realizado por Sentenac et al. que englobou a França e a Irlanda, ficou também concluído que é mais fácil à criança vítima de bullying, informar o pai do que a mãe.

Estes autores verificaram ainda que as crianças mais jovens falam mais sobre o facto de serem vítimas que as crianças mais velhas, isto tanto nas crianças portadoras de doença crónica como na criança saudável.

Discussão Em 2001 Lahteenmaki et al. efetuaram um estudo no qual demonstraram que as crianças com doença crónica são mais vítimas de bullying que as crianças saudáveis este facto foi corroborado pelo estudo efetuado por Janssen et al.

demonstrando mais uma vez, em 2004, que as crianças que têm algum tipo de doença prolongada são mais propensas a ser vitimizadas. Em 2006 no estudo realizado por Cleave et al., que, em consonância com os estudos anteriores, tinha como objetivo demonstrar se as crianças com doenças crónicas eram mais vítimas de bullying do que as crianças saudáveis, também conseguiram demonstrar que as crianças com doença crónica eram mais propensas a ser vítimas de bullying. Para além deste facto, ficou evidente que as crianças portadoras de uma doença crónica, além de serem mais vitimizadas, com o decorrer do tempo têm tendência a adotar comportamentos de violência para com os seus pares tornando- se também bullies, ou seja, as crianças portadoras de uma doença crónica são ao mesmo tempo vítimas e bullies. O facto de ser bully/vítima ficou associado à criança com uma necessidade especial de saúde, ligando isso também a problemas emocionais, de comportamento ou a uma limitação funcional, o que foi referido anteriormente também foi corroborado pelos estudos desenvolvidos por Lahteenmaki et al., Janssen et al. e Cleave et al. publicados nos anos de 2001, 2004 e 2006.

No estudo publicado em 2009 efetuado por Hamiwka et al. demonstra que existem diferenças socioeconómicas entre os pais das crianças portadoras de uma doença crónica e os das crianças saudáveis, sendo que estes últimos possuem, na sua maioria, mais recursos económicos e uma escolaridade superior. Este fator não ficou associado ao facto de as crianças com doença crónica serem mais vitimizadas, voltou-se a verificar o mesmo no estudo publicado em 2010 realizado por Sentenac et al..

Foi também demonstrado que as crianças mais jovens são mais frequentemente vítimas que as mais velhas, esta evidência é relatada tanto na criança portadora de doença crónica como na criança saudável.

O aspeto físico da criança é uma característica que pode influenciar o facto de a criança vir a ser ou não vítima de bullying. Este aspeto ficou demonstrado no estudo desenvolvido por Janssen et al. em 2004, onde foi evidenciado que o facto de a criança ter um aspeto diferente, ser obesa ou ter excesso de peso, é suficiente para que esta seja vitimizada, contudo esta vitimização não incluiu o facto de serem de diferentes raças, cor ou religião.

Os estudos referem que o tipo de bullying mais utilizado é o bater, o dar pontapés, o empurrar e ameaçar. Nas raparigas, o mais frequente são as ameaças verbais, facto este que ficou comprovado pelos estudos realizados por Janssen et al. em 2004 e por Hamiwka et al. em 2009. Constata-se portanto que estas crianças são essencialmente alvo de um tipo de bullying verbal, físico e emocional.

Conseguiu-se também verificar que muitas das vítimas contam as suas experiências a grande maioria aos pais e a outros adultos significativos nas suas vidas. Poucas são as crianças que contam aos seus pares, estes resultados ficaram bem evidenciados nos estudos realizados por Didaskalau et al. em 2009 e posteriormente corroborados por Sentenac et al. em 2010.

Conclusão A análise dos artigos selecionados permite-nos concluir que as crianças com doença crónica são mais vítimas de bullying que as crianças saudáveis verificando-se que o tipo de bullying mais utilizado é o bater, o dar pontapés, o empurrar e ameaçar e que nas raparigas, as ameaças verbais são o mais frequente.

Verifica-se que o bullying é um fenómeno presente nos dias que correm, pelo que, cada vez mais as pessoas precisam de ser sensibilizadas para este acontecimento e é nesta sensibilização que o enfermeiro tem um papel muito importante, pois este pode e deve intervir junto dos pais, escola e comunidade.

O enfermeiro de família tem um papel fundamental no desenrolar desta intervenção, visto que tem uma relação de proximidade com a família e com a comunidade escolar. O enfermeiro deve intervir da mesma forma, tanto nas famílias onde os seus filhos são vítimas de bullying, como nas famílias em que os filhos praticam atos de violência com outras crianças, pois não é solução apenas intervir junto da família que a criança é vítima de bullying, porque o agressor encontrará rapidamente outra vítima. Contudo, o enfermeiro deverá ter algum cuidado na forma como vai intervir junto das famílias, porque muitas vezes, as respostas dadas aos pais relacionadas com os acontecimentos de violência que envolvem os seus filhos são mais prejudiciais do que benéficas, e podem comprometer o futuro dos seus filhos, tanto a curto, como a longo prazo.

O enfermeiro tem o papel preponderante de alertar as associações de pais para o fenómeno bullying, para que as famílias possam ver esta associação como um meio de apoio para a situação pela qual o seu filho está a viver.

O enfermeiro deverá também, explicar aos pais que os seus filhos os veem como modelos, eles adotam todas as posturas que os pais têm, sobretudo a opinião dos pais sobre outros, a ética, os seus valores, a sua ideologia, por isso o enfermeiro deve alertar os pais que devem ter em conta o que dizem quando os filhos estão presentes e ter em conta que estes percebem a linguagem não-verbal e que as crianças ouvem o que lhes é dito e o que os pais comentam entre si.

Como foi referido anteriormente a criança com doença crónica, devido a internamentos e a tratamentos, tem períodos de ausência na escola, e quanto maior foi essa ausência, mais difícil vai ser retomar a rotina das aulas o que pode resultar em fobia escolar. Se a criança retorna para a escola com alguma mudança física óbvia, tal como a perda de cabelo, amputação ou cicatriz visível, cabe ao enfermeiro preparar os colegas da escola para que estes lidem com normalidade, com as mudanças que notam na criança, evitando assim um processo de exclusão dessa criança evitando que esta seja vítima de bullying.

Com este trabalho conseguimos efetivamente mostrar, baseando-nos em dados científicos, pois efetivamente é do senso comum que as crianças com doença crónica são vítimas de bullying, que estas crianças são vitimizadas com maior frequência que as crianças saudáveis e conseguimos também realçar o importante contributo que nós enfermeiros poderemos oferecer para conseguir travar este fenómeno da nossa atualidade.


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