Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

EuPTCVHe1646-107X2009000200001

EuPTCVHe1646-107X2009000200001

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-107X
Year2009
Issue0002
Article number00001

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

Produtividade, Sociedade, Ciência e Política Produtividade, Sociedade, Ciência e Política

Provavelmente, uma das actividades mais nobres da intervenção dos investigadores experimentados é o contributo que estes dão para a formação das novas gerações de pesquisadores. Com o presente texto iremos abordar um dos aspectos associados à responsabilidade colectiva dos pesquisadores mais experientes, nomeadamente no que se refere ao apoio que devem proporcionar aos que se iniciam no processo de investigação e divulgação do conhecimento adquirido.

Presentemente, são muitos os livros disponíveis para assistir os mais novos no processo de preparação dos manuscritos, para posteriormente serem submetidos à revisão de pares e, consequentemente, serem publicados. A participação dos avaliadores mantém-se, tal como sempre, uma das componentes mais importantes para a garantia de publicações de qualidade. Na realidade, a qualidade científica das revistas está mais dependente da acção dos avaliadores do que propriamente da política editorial. No entanto, este é um processo que nos tempos que correm tende a evidenciar algumas fragilidades, uma vez que nem sempre os mais experimentados se comportam como verdadeiras referências para os mais novos, deixando mesmo, por vezes, transparecer a ideia de um certo facilitismo no que se refere aos processos de divulgação dos conhecimentos.

Em parte, os pesquisadores, assim como aqueles que desenvolvem as suas práticas profissionais como docentes no ensino superior, estão, mais do que nunca, sujeitos a mecanismos de pressão para que apresentem índices elevados de produtividade científica. É do conhecimento geral que as instituições, independentemente do estrato sociopolítico em causa (Universidade ou Governo) exigem produção, mas em contrapartida não se preocupam em proporcionar as condições, físicas e financeiras, necessárias para que essa possa efectivamente acontecer, tanto em termos quantitativos como, fundamentalmente, em termos qualitativos.

Na sociedade contemporânea a actividade profissional de investigador, em muito, ultrapassa a mera realização das tarefas inerentes à concepção, execução e divulgação dos resultados obtidos com os estudos. A prática científica é algo que resulta de um processo de aquisição de competências e que se caracteriza por ser razoavelmente lento. A qualidade da relação que os mais experientes estabelecem com os mais novos, de algum modo influencia e determina a qualidade que se deseja melhorada em cada geração que se segue.

Presentemente, a nível global, na academia, vive-se um momento conturbado no que se refere ao grau de exigência no domínio da produção científica. Foram introduzidos parâmetros de competitividade na academia e na comunidade científica, em geral, e que, eventualmente, tiveram alguns efeitos nefastos, como por exemplo, uma ênfase no número de publicações, independentemente da sua qualidade, mas que estejam, preferencialmente, em bases de indexação. Tal facto conduziu à emergência do negócio das publicações, uma vez que as revistas cobram verbas para publicar os estudos e, posteriormente, esses mesmos trabalhos podem ser vendidos pelas empresas, normalmente multinacionais, que ficam detentoras dos direitos autorais dos trabalhos submetidos. Em suma as multinacionais ganham ou capitalizam duplamente: 1) num primeiro momento ao cobrarem aos autores para publicarem os seus trabalhos e; 2) ao venderem esses trabalhos a outros estudiosos interessados em consultar esses textos. No entanto, em momento algum partilham as receitas geradas com as vendas.

Em ciência, o grande objectivo é o aprofundamento teórico nas mais diversas áreas de intervenção. Presentemente, assistimos a um aumento expressivo no número de trabalhos científicos publicados, mas que, infelizmente, não vão encontro dos propósitos mais nobres da prática científica. A literatura dita científica tende a evidenciar um empobrecimento teórico e uma tendência para a mecanização da produção de trabalhos. Como exemplo, podemos referir o facto de os autores procurarem de uma forma quase sistemática explorar múltiplas alternativas de potenciar as suas bases de dados através de várias publicações.

Para isso recorrem à fragmentação dos dados de tal maneira que, por vezes, para além do rigor da aplicação das técnicas estatísticas e da elegância dos textos apresentados, em nada contribuem para o enriquecimento do conhecimento quer em geral quer específico. Isto é feito introduzindo pequenas alterações ao texto, mantendo o grosso da revisão bibliográfica para assim garantirem mais uma publicação. Esta estratégia é complementada com a submissão a revistas diferentes com pequenas e subtis versões dos mesmos trabalhos e que acabam sendo publicados em revistas diferentes. A falta de organização por parte dos editores das revistas torna este tipo de prática viável.

também a tendência de fazer e refazer os mesmos trabalhos, com amostras diferentes, mas respondendo às mesmas perguntas e encontrando repetidamente as mesmas respostas, com as diferenças que inevitavelmente resultam do facto de os indivíduos estudados serem diferentes. Mas no geral, os mesmos autores perpetuam a sua actividade nas questões de carácter geral, sem evidenciarem predisposição para aprofundar as questões que emergem dos estudos previamente realizados por si. Esta forma mecânica de produzir ciência é na sua essência evidência de debilidades teóricas, mas fundamentalmente representam mudanças na ética da prática científica.

É urgente que os editores e directores de revistas assumam um papel activo e estudem formas de se adaptarem às novas realidades impostas aos investigadores.

O que vem a ser praticado resulta das condições de trabalho e produtividade científica impostas a quem faz da prática científica a sua forma de vida.

Talvez seja tempo de, uma vez por todas, entendermos que a ciência e a sua viabilização são, na sua essência, actos políticos, e por esta razão é de todo relevante que os cientistas se organizem e intervenham, activamente, na política para assim poderem ter uma voz na definição dos critérios a serem aplicados na promoção de boas práticas científicas.

José Vasconcelos Raposo Professor Catedrático


Download text