Doença Cístíca da Adventícia da Artéria Poplítea: Diagnóstico e Tratamento - A
propósito de um caso clínico
Doença Cístíca da Adventícia da Artéria Poplítea: Diagnóstico e Tratamento ' A
propósito de um caso clínico
Adventitial cystic disease of the politeal artery: diagnosis and treatment ' a
case report
Diana Teixeira*; João Correia-Simões**; Celso Carrilho***; Amilcar Mesquita****
*Interna Complementar Cirurgia Geral
** Assistente Hospitalar Angiologia e Cirurgia Vascular
***Consultor de Angiologia e Cirurgia Vascular
****Diretor de Serviço Angiologia e Cirurgia Vascular
Centro Hospitalar do Alto Ave | Guimarães
Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular
Autor_correspondente
|RESUMO|
A Doença Cística da Adventícia (DCA) é uma doença vascular rara. Os autores
apresentam um caso de uma doente de 47 anos referenciada por claudicação
intermitente gemelar com 3 meses de evolução, compatível com cisto da
adventícia da artéria poplítea esquerda. Submetida a exérese com preservação da
artéria. O diagnóstico e tratamento precoce previnem a progressão para trombose
poplítea e isquemia crítica. Contudo, o diagnóstico desta entidade é difícil. O
carácter flutuante da gravidade da sintomatologia, o aparecimento súbito após
exercício vigoroso e a recuperação tardia após repouso constituem os principais
sintomas. O tratamento de escolha é a excisão do cisto com preservação da
artéria.
Palavraschave: doença cística adventícia, claudicação intermitente
|ABSTRACT|
Cystic Adventitial disease (CAD) is a rare vascular disease. The authors report
a case of a female, 47 years old, referenced by gemelar intermittent
claudication with 3 months of evolution, compatible with adventitious cyst of
left popliteal artery. Underwent excision with preservation of the artery. The
early diagnosis and treatment is essential to prevent progression to critical
ischemia and popliteal thrombosis. However, the diagnosis of this entity is
difficult. The fluctuating character of the severity of symptoms, the sudden
appearance after vigorous exercise and delayed recovery after rest are the main
symptoms. The treatment of choice is cyst excision with preservation of the
artery.
Key words:Cystic adventitial disease, intermittent claudication
INTRODUÇÃO
A Doença Cística da Adventícia (DCA) é uma causa rara de doença vascular
(0,1%). Apresenta-se frequentemente com claudicação do membro inferior como
resultado do efeito compressivo que o cisto exerce na parede da artéria, o qual
condiciona estenose poplítea ou, ocasionalmente, iliofemoral. Pode,
ocasionalmente, manifestar-se como uma massa noutros locais nomeadamente, nas
veias safenas ou artérias dos membros superiores.
CASO CLÍNICO
Doente do sexo feminino, 47 anos, referenciada à consulta de Angiologia e
Cirurgia Vascular por quadro sintomático de claudicação intermitente gemelar
esquerda, com 3 meses de evolução. A doente não apresentava factores de risco
cardiovasculares. Ao exame objectivo os pulsos poplíteo-distais encontravam-se
presentes à esquerda mas eram abolidos com a flexão do joelho (sinal de
Ishikawa). O índice tornozelo-braço em repouso era de 1.1 à direita e 0.8 à
esquerda. Efectuada ultrassonografia com Doppler que revelou “formação cística
hipoecogénica com 14.7 mm que condiciona compressão extrínseca da artéria
poplítea esquerda com redução do calibre de 50-70%”. Efetuado estudo
complementar com Angio-TAC que fundamentou o diagnóstico | FIGURA_1 |. Proposta
para intervenção cirúrgica com abordagem posterior em forma de S da fossa
poplítea esquerda, identificando-se volumoso cisto posterior e antero-medial na
adventícia tendo sido submetida a exérese de cistos posterior, com preservação
da artéria e controlo angiográfico peri-operatório | FIGURA_2 |. A doente
apresentou resolução da sintomatologia no pós-operatório e no follow-up
efetuado ao 1º mês.
COMENTÁRIOS
A DCA advém da compressão extrínseca da artéria poplítea pelos cistos mucóides
localizados na adventícia. Esta entidade foi primeiramente descrita em 1947 por
Atkins e Key. Desde essa data, têm sido descritos alguns casos de DCA afectando
principalmente indivíduos do sexo masculino com claudicação intermitente. Um
estudo retrospectivo de Jasinski et al, preconiza que a DCA afecta grandes
artérias normalmente adjacentes a articulações. A artéria poplítea constitui a
localização mais frequente (85% dos casos), mas foram reportados casos na
artéria ilíaca externa, femoral comum, radial e cubital.
A etiologia da DCA não está completamente esclarecida. Levin e Benn discutiram
4 teorias etiológicas: 1) degeneração mixomatosa sistémica (associada a doença
sistémica), 2) trauma repetido, 3) origem cística em células ganglionares
sinoviais que migraram para a adventícia e 4) cistos mucinosos com origem em
células mesenquimatosas produtoras de mucina que foram incorporadas, durante o
desenvolvimento embrionário, na parede vascular (a teoria mais defendida por
aqueles autores).[1]
A DCA é uma entidade rara, responsável por 0.1% das doenças vasculares. Afecta
maioritariamente homens, na 4ª década de vida, com claudicação intermitente.
[2,6] A sintomatologia tem um início súbito e raramente se manifesta em
repouso. Ao exame físico, os pulsos estão diminuídos ou ausentes e, raramente,
existe frémito. O índice TB está diminuído, e as pressões segmentares ou o
volume do pulso indicam uma variação de pressão ao longo da artéria poplítea.
[2,3] A ultrassonografia com doppler normalmente demonstra estenose arterial,
com cisto circundante, sendo que este não apresenta fluxo no seu interior.
Estes cistos revelam-se como massas anecogénicas ou hipoecogénicas na parede
vascular. Na angiografia os cistos revelam-se como massas distintas da parede
vascular que condicionam estenose, sendo que se forem concêntricos, a estenose
terá um aspeto de ampulheta; se forem excêntricos, aparecerão com o sinal
clássico de cimitarra. Muito embora a angiografia seja preconizada como o exame
de escolha, recentemente alguns estudos apontam a RMN como exame com
sensibilidade diagnóstica sobreponível, auferindo uma maior informação
diagnóstica. Os cistos apresentam híper-sinal na ponderação T2 e variabilidade
de sinal na ponderação T1 devida à variação na quantidade de material mucóide
do seu interior.[2,3,4,5]
Em virtude da DCA ser uma entidade rara, as opções de tratamento têm variado. O
tratamento de escolha é a exérese do cisto com preservação da artéria.[4,9] A
aspiração do conteúdo cístico e a angioplastia podem ser preconizadas para
alívio da sintomatologia, mas são ineficazes a longo prazo.[4,7-9] Nos casos em
que não é possível preservar a integridade do segmento arterial adjacente, está
indicado o encerramento com "patch" ou enxerto de interposição venoso. Muito
embora nunca tenha sido reportada, nos casos raros de trombose da artéria
poplítea, a terapêutica trombolítica deve ser instituída previamente à opção
cirúrgica.[5,6,7]
CONCLUSÃO
A artéria poplítea pode ser afetada por uma panóplia de condições patológicas,
sendo a mais frequente a aterosclerose. Os pacientes afetados pertencem a
faixas etárias mais avançadas, apresentando-se com outros fatores de risco
cardiovasculares, sendo a sintomatologia menos aguda. A dilatação aneurismática
e embolia também afetam normalmente estes pacientes mas a sintomatologia
adquire um carácter mais agudo com oclusão da artéria poplítea.[5,6]
Nos pacientes mais jovens e naqueles sem aterosclerose generalizada, o
diagnóstico diferencial inclui trauma, cisto de Baker, Doença de Buerguer, DCA,
"Entrapment" da artéria poplítea. Para que estas entidades sejam
diagnosticadas, deve haver um elevado índice de suspeita dado serem entidades
raras.[2,3,4,5]
A DCA é uma entidade vascular rara que deve ser considerada como diagnóstico
diferencial nos casos de claudicação intermitente.