Correção endovascular de aneurisma da artéria renal com a técnica de Moret:
caso clínico
Introdução
O aneurisma da artéria renal (AAR) é uma patologia rara presente em 0,01-1,30%
da população1. Atualmente, o tratamento endovascular é considerado a primeira
opção terapêutica, atendendo à elevada taxa de sucesso e baixa
morbimortalidade2,3. Existem inúmeras técnicas, desde a embolização com coils,
a utilização de stent recoberto e a embolização assistida com stent1---4. Os
autores descrevem um caso clínico de um AAR corrigido pela técnica de Moret.
Caso clínico
Mulher de 44 anos seguida na consulta de medicina interna por hipertensão
arterial não controlada com 3 fármacos (amlodipina 5 mg; lisinopril 20 mg;
hidroclorotiazida 12,5 mg). Do exame objetivo salienta-se pressão arterial no
membro superior direito de 145-87 mmHg e no esquerdo 140-80 mmHg. Antecedentes
pessoais, gesta: 3; para: 2. A doente realizou eco-Doppler e angioTC que
demonstraram a presença de AAR direita de 36 mm de maior diâmetro (fig._1). Foi
referenciada à consulta de angiologia e cirurgia vascular e posteriormente
submetida a correção endovascular do AAR. Sob anestesia local, por punção
femoral direita, utilizando uma bainha aramada RDC 6 F da Cook®e um cateter C1
5 F da CooK®selectivou-se a artéria renal direita. Foram colocados 2 fios-guia
0,018 : um no saco aneurismático, através do qual foi colocado o
microcateter, e um outro na artéria eferente ao saco aneurismático, através do
qual foi colocado um balão de 4 mm x 2 cm. Este foi insuflado temporariamente,
ocluindo o colo do aneurisma, aquando da colocação dos coils pelo microcateter
(fig._2). Primeiramente foi libertado um «detachable» coil da Cook®e
posteriormente coils Tornado, com exclusão do saco aneurismático (fig._3). O
tempo total de oclusão arterial foi de 30 minutos. Administraram-se 5.000
unidades de heparina, 1 mg de midazolam e 1 g de cefazolina. Durante e nas 5
horas após a intervenção, a doente referiu dor no flanco direito, associada a
náuseas, que remitiu com repouso, analgesia e antieméticos. Constatou-se
normalização da pressão arterial, estando medicada com lisinopril 10 mg e
hidroclorotiazida 12,5 mg. A angioTC aos 2 meses demonstrou exclusão do
aneurisma (fig._4).
Comentários
O caso descrito relata a correção endovascular de um AAR, utilizando uma
técnica simples, eficaz e segura, que permitiu o controlo da pressão arterial e
a exclusão do aneurisma.
A etiologia mais frequente do AAR é degenerativa com perda das fibras elásticas
e redução do tecido muscular liso da média3.
Outras causas são aterosclerose, fibrodisplasia e doença do tecido conjuntivo3.
Oitenta por cento dos AAR são saculares e maioritariamente assintomáticos3.
Estão associados a hipertensão arterial em 70% dos doentes e são mais
frequentes nos indivíduos do sexo feminino, como apresentado no caso clínico3.
Está indicada a correção do aneurisma: quando o diâmetro é superior a 2 cm ou a
1 cm, se associado a hipertensão arterial não controlada; se existir evidência
de crescimento aneurismático; aneurismas sintomáticos; em mulheres em idade
fértil ou grávidas independentemente das dimensões; e aquando da presença de
estenose da artéria renal hemodinamicamente significativa ou de hipoperfusão
renal3.
No tratamento de AAR poder-se-ão considerar técnicas endovasculares ou
cirúrgicas, como a cirurgia in situea cirurgia ex vivo5. Esta última seria uma
opção a considerar no caso descrito. Está indicada na correção de aneurismas
complexos, múltiplos e com atingimento de pequenos ramos distais5,6. Vários
estudos demonstram ainda que, se executada por cirurgiões experientes,
apresenta uma reduzida taxa de morbilidade, mortalidade e cura da hipertensão
arterial em 50-100% dos casos5,6.
Contudo, e apesar das vantagens descritas, optámos pelo tratamento endovascular
pela sua menor morbimortalidade comparativamente ao cirúrgico. Este inclui
várias técnicas que deverão ser selecionadas de acordo com as características
do aneurisma e da artéria permeável.
Assim, em aneurismas saculares de colo longo e estreito (com diâmetro inferior
a 4 mm), o preenchimento do saco aneurismático com coils poderá ser
suficiente3,7. Contudo, esta técnica pode ser cara e demorada2,3.
Em aneurismas com colos largos (diâmetro superior a 4 mm), como o apresentado
no caso clínico, esta última técnica não é recomendada, atendendo ao risco de
migração dos coils e manutenção da perfusão do saco aneurismático3,7. Em
doentes com esta anatomia poder-se-á considerar a colocação de stent coberto; a
embolização através das malhas do stent ou a embolização assistida com balão
(técnica de Moret).
A colocação de stent coberto tem a vantagem de excluir por completo o colo do
aneurisma, mantendo a permeabilidade do órgão alvo, mas exige a presença de uma
«landing zone» proximal e distal1,2. A existência de várias artérias no saco
aneurismático obriga à embolização destas, previamente à colocação do stent2.
Por outro lado, em artérias tortuosas e em aneurismas distais a utilização de
um stent coberto poderá ser tecnicamente difícil devido à pouca flexibilidade
dos dispositivos3,7,8. Além disso, esta técnica só está recomendada se o
diâmetro da artéria renal for superior a 6 mm, devido ao risco de trombose3.
Estas razões levaram-nos a excluir esta opção terapêutica.
A embolização assistida com stent consiste na embolização do aneurisma através
das malhas do stent2,3. Primeiramente é colocado o stent cobrindo o colo do
aneurisma e através das malhas deste procede-se à embolização3. Poder-se-á
também colocar em primeiro lugar o cateter no interior do aneurisma, libertando
posteriormente o stent, que irá manter o cateter no interior do saco. Esta
técnica permite manter a permeabilidade arterial e impede a migração dos
coils2.
A embolização assistida por balão, também denominada por técnica de Moret, é
frequentemente utilizada no tratamento de aneurismas intracranianos com colo
largo, com eficácia comprovada4. Consiste na utilização de um balão que oclui
temporariamente o colo do aneurisma, evitando a migração dos coils e
estabilizando o microcateter4. A vantagem da técnica de Moret relativamente à
embolização através das malhas do stent consiste em evitar o uso de stent e,
deste modo, obviar as complicações inerente à sua utilização (fratura,
migração, trombose). Além disso, a embolização assistida por balão é um
procedimento mais simples, económico, sendo possível a sua utilização em
artérias de pequeno calibre, razões estas que fundamentaram a nossa escolha
terapêutica.
Responsabilidades éticas
Proteção de pessoas e animais. Os autores declaram que para esta investigação
não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.
Confidencialidade dos dados. Os autores declaram ter seguido os protocolos do
seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.
Direito à privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram ter recebido
consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O
autor para correspondência deve estar na posse deste documento.
Conflito de interesses
Os autores declaram não haver conflito de interesses.