Contributo dos Enfermeiros na Implementação de Intervenções Psicossociais (IPS)
dirigidas a Pessoas com Doença Mental Grave
Contributo dos Enfermeiros na Implementação de Intervenções Psicossociais (IPS)
dirigidas a Pessoas com Doença Mental Grave
ENQUADRAMENTO DA PROBLEMÁTICA
Doença Mental Grave
A doença mental grave designa toda a doença psiquiátrica que, fruto das suas
características e evolução clínica, afecta de forma prolongada ou contínua a
funcionalidade de uma pessoa, comprometendo nomeadamente as suas capacidades
para realizar tarefas de subsistência, se relacionar com o meio ambiente e
participar na vida social (Decreto-Lei no 8/2010 de 28 Janeiro).
De um modo geral reportam-se a perturbações psicóticas, particularmente a
esquizofrenia, que atinge cerca de 1 % da população portuguesa e que surge
frequentemente no final da adolescência ou no inicio da idade adulta,
caracterizando-se do ponto de vista nosológico pela presença de três domínios
de sintomas: sintomas positivos, tais como alterações do pensamento e da
percepção; sintomas negativos tais como diminuição da vontade e embotamento
afectivo; e ainda, um reduzido funcionamento social ao nível dos diferentes
domínios da vida. Embora registe um curso variável, as taxas de recuperação na
esquizofrenia não ultrapassam os 20%, o que significa que a maioria das pessoas
que desenvolvem a doença experimentam uma evolução crónica ou recorrente, com
sintomas residuais e uma recuperação social bastante comprometida traduzindo
importantes necessidades de cuidados, designadamente de cuidados de enfermagem.
(APA, 2004; DGS, 2007; NICE, 2010; OMS 2002)
Em todo o mundo, a doença mental grave sentenciou durante décadas muitas
pessoas a longos períodos no hospital e a altos níveis de incapacidade. A
partir dos anos 60, movimentos sociais de defesa dos direitos das pessoas com
doença mental e progressos científicos em diferentes áreas, estiveram na base
da abordagem de saúde mental comunitária que prevê, na grande maioria das
situações, a manutenção das pessoas com doença mental grave na sua comunidade
residencial respectiva "desde que os serviços assegurem intervenções
psicossociais em combinação com o tratamento farmacológico", deste modo
favorecendo o processo de reabilitação desta população. (DGS, 2007, pg. 13).
A OMS (2002) define a reabilitação psicossocial enquanto "um processo que
oferece aos indivíduos que estão debilitados, incapacitados ou deficientes
devido a perturbação mental, a oportunidade de atingir o seu nível potencial de
funcionamento independente na comunidade, o que envolve tanto o incremento das
competências individuais como a introdução de mudanças ambientais." Neste
âmbito, as intervenções farmacológicas e de reabilitação psicossocial
complementam-se, sendo que as primeiras visam limitar a sintomatologia e
normalizar o comportamento, enquanto as segundas pretendem capacitar a pessoa
para atingir o nível máximo de readaptação funcional, pessoal, social,
profissional e familiar. (APA, 1997; Antai-Otong, 2003; Deleu, 2004; DGS, 2007;
NICE 2010)
Em Portugal, a Lei de Saúde Mental (lei no 36/98 de 24 de Julho) e o Decreto-
Lei no 35/ 99 que regulamenta os serviços locais e regionais de saúde mental,
são inequívocos quanto ao imperativo de implementação de uma abordagem de saúde
mental comunitária. Não obstante, mais de dez anos decorridos, verificam-se
escassos avanços verificados no sentido da implementação da organização
proposta, prevalecendo necessidades não-cobertas no domínio das intervenções
psicossociais incluindo a reabilitação psicossocial (DGS, 2007; Xavier, 2002).
É neste contexto que surge o recente Plano de Reestruturação e Desenvolvimento
dos Serviços de Saúde Mental em Portugal 2007-2016 (DGS, 2007), testemunhando o
empenho em ajudar as pessoas portadoras de doença mental grave a recuperar
plenamente a sua vida na comunidade, propondo o desenvolvimento e difusão de
equipas multidisciplinares de saúde mental comunitária, e recomendando uma
forte participação dos enfermeiros e de outros técnicos não médicos, com manejo
de casos por terapeutas de referência que asseguram a coordenação e
continuidade dos cuidados.
Em diversos países, os enfermeiros de saúde mental e psiquiatria têm
participado activamente na reabilitação psicossocial das pessoas com doença
mental grave, respondendo de forma optimizada às suas necessidades através da
disponibilização de intervenções sistemáticas, sustentadas em evidência. Assim,
cada vez mais os enfermeiros trabalham na comunidade, acompanhando clientes nas
suas actividades quotidianas de modo a promover a sua autonomia através de
intervenções terapêuticas individuais e de grupo que visam a gestão dos auto-
cuidados incluindo a auto-regulação de sintomas e a prevenção da recaída, tais
como o treino de competências sociais, a psicoeducação e a terapia familiar
comportamental e o suporte psicossocial. (Antai-Otong, 2003; Favrod, 2004; Ian
Falloon, 1998; OIIQ, 2002;)
O grande impacto individual, social e económico da doença mental grave e a
extensa evidência da eficácia e efectividade das intervenções psicossociais
(IPS) na minimização destes impactos, que encontra tradução nas recomendações
das mais conceituadas guidelines (APA, 2004; NICE, 2010), interpela e
responsabiliza os enfermeiros de saúde mental e psiquiatria pela sua
implementação e difusão de modo a garantir o acesso das pessoas com doença
mental grave e suas famílias a este tipo de intervenções (Brooker, 2001, 2003,
2006; Gamble, 2003; Gillam e tal, 2003; Gournay, 1994, 1995). Este imperativo
justifica a realização de uma revisão sistemática da evidência disponível
quanto ao contributo dos enfermeiros de saúde mental e psiquiatria na
implementação das IPS junto das pessoas com doença mental grave.
Intervenções na Doença Mental Grave
As perturbações psicóticas são comummente tratadas com intervenções
farmacológicas, particularmente medicação antipsicótica, para a qual há
evidência bem estabelecida quanto à sua eficácia no tratamento de episódios
psicóticos agudos e na prevenção da recaída (APA 2004; Janicak et al., 1993 in
NICE, 2010). Todavia, até 40% das pessoas com doença mental grave têm uma má
resposta à medicação, continuando a apresentar moderada a grave sintomatologia
psicótica (sintomas positivos e negativos) com forte comprometimento da
funcionalidade e qualidade de vida da pessoa (Kane et al., 1996 in NICE 2010).
As intervenções psicológicas e psicossociais dirigidas às pessoas com doença
mental grave são relativamente recentes e resultaram do reconhecimento
crescente da importância dos processos psicológicos no aparecimento e
persistência da psicose, bem como do seu impacto ao nível do bem-estar
individual e funcionamento psicossocial; contribuíram ainda para o seu
desenvolvimento, as limitações das intervenções farmacológicas particularmente
a resposta limitada de algumas pessoas à medicação antipsicótica, a alta
incidência de efeitos secundários e a baixa adesão ao tratamento (APA 2004;
NICE, 2010).
No campo da clínica psiquiátrica/ saúde mental, as IPS traduzem um conjunto de
Intervenções específicas, não farmacológicas, que visam responder às
necessidades complexas das pessoas com doença mental grave (Gamble, 2003).
Quanto à tipologia das IPS, nem sempre existe na literatura unanimidade, sendo
que pode haver alguma variação consoante os autores. Brooker (2001, 2006)
avança alguns esclarecimentos para esta variação, nomeadamente o facto de
alguns grupos/ associações apenas reconhecerem aquelas intervenções para as
quais existem provas concretas de eficácia. Assim e como refere o autor:
"existem importantes e cruciais intervenções, consideradas como "boas práticas"
na gestão normal da esquizofrenia, tais como o envolvimento/contracto, a
avaliação, o suporte e a ajuda pela relação e comunicação que não estão
incluídas numa definição formal de intervenção psicossocial simplesmente porque
não foram até hoje avaliadas com rigor quanto à sua eficácia." (2001, pg 18).
De acordo com a recente Guideline "Core interventions in the treatmente and
manegement of schizophrenia in adults in primary and secondary care" do
National Institute for Health & Clinical Excellence (NICE, 2010)
descrevemos segundo a ordem cronológica de aparecimento, as IPS para as quais
existe uma evidência já fortemente consolidada. Primeiramente, o treino de
competências sociais desenvolvido na década de 1970 visou dar resposta às
dificuldades sociais que muitas pessoas com doença mental grave apresentavam,
especialmente as institucionalizadas, suportando-se em procedimentos baseados
nas teorias comportamentais e da aprendizagem social (Shepherd, 1978). No final
da década de 1970 com a expansão da desinstitucionalização intensificou-se a
investigação sobre os factores psicossociais precipitantes de recaída,
emergindo os acontecimentos de vida stressantes e as dificuldades de
comunicação na família (alta emoção expressa), estimulando ao desenvolvimento
de intervenções familiares para prevenir recaídas (Leff et al., 1982 in NICE,
2010 ). Intervenções familiares, que muitas vezes incluíam educação relativa à
doença e que por vezes foi designada de "psicoeducação". Actualmente a
psicoeducação pode ser considerada uma intervenção per si, sustentada em
múltiplos estudos sobre os benefícios dela decorrente.
Até o final dos anos 1980, as abordagens de terapia cognitivo comportamental
(TCC) desenvolvidas inicialmente para a depressão (década de 1970), passaram a
ser aplicadas para diminuir os sintomas psicóticos de stress e posteriormente,
para trabalhar os problemas de funcionamento e da esfera emocional (Garety et
al., 2000 in NICE, 2010). Outra abordagem desenvolvida na década de 1980 e 1990
foi a terapia de reestruturação cognitiva (TCR), que difere da TCC na medida
que o enfoque é o treino das funções cognitivas, tais como a aprendizagem, o
planeamento, a atenção e memória (Green, 1993 in NICE, 2010). Foi igualmente
desenvolvida em meados dos anos 1990 uma abordagem cognitivo-comportamental
específica, que visa reforçar a compliance à medicação, correntemente conhecida
por "terapia de adesão" (Kemp et al., 1996 in NICE, 2010).
Por fim, situam-se ainda neste âmbito as intervenções de aconselhamento e de
psicoterapia de suporte e outras modalidades de promoção do ambiente
terapêutico desenvolvidas especificamente para esta população, bem como
intervenções de arte terapia nas suas diferentes formas, que começaram nos
últimos anos a ser formalmente avaliados em ensaios (Crawford & Patterson,
2007 in NICE, 2010).
Os objectivos das IPS são vastos, sendo que uma dada intervenção pode visar um
ou mais dos seguintes resultados: diminuir a vulnerabilidade da pessoa; reduzir
o impacto de acontecimentos e situações stressantes; diminuir o sofrimento e a
deficiência; minimizar os sintomas; melhorar a qualidade de vida; reduzir os
riscos; melhorar a comunicação e as estratégias de coping; aumentar a adesão ao
tratamento.
No seu todo, as IPS encontram suporte teórico e prático no modelo de
vulnerabilidade e stress, segundo o qual as pessoas desenvolvem diferentes
níveis de vulnerabilidade para a psicose, decorrentes de uma combinação de
factores biológicos, sociais e psicológicos, resultado do confronto com
factores de stress ambientais. Perante altos níveis de vulnerabilidade, baixos
níveis de stress podem ser originar problemas e inversamente, perante níveis
baixos de vulnerabilidade apenas altos níveis de stress desencadeiam problemas
(Nuechterlein & Dawson, 1984 in NICE, 2010).
Investigação recente permitiu compilar evidência sugestiva da natureza da
vulnerabilidade e de factores de stress ambientais. Como factores biológicos
foram enunciados quanto a alterações da bioquímica cerebral, designadamente na
regulação da dopamina e quanto à existência de genes conferentes de
susceptibilidade (Bromme et al, 2005; Craddock et al., 2005 in NICE, 2010).
Factores psicológicos relativos às funções cognitivas básicas foram
identificados ao nível da aprendizagem, atenção, memória e planeamento e viés
nos processos emocionais e de raciocínio, relacionados com o compromisso de
estruturas cerebrais e/ou do seu funcionamento (Garety et al, 2001, 2007 in
NICE, 2010).
Finalmente, foram reconhecidos como factores sociais e ambientais de risco para
a esquizofrenia, nascer e crescer em ambientes urbanos, ter sofrido traumas e
precariedade social na infância e adolescência, importantes consumos de
cannabis, experiencias de migração e acontecimentos de vida stressantes
(Arsenault et al., 2004; Read et al., 2005; Van Os et al., 2005 in NICE, 2010).
De acordo com este modelo, as intervenções, sejam farmacológicos ou
psicossociais, têm como objectivo proteger um indivíduo vulnerável e reduzir a
probabilidade de recaída, reduzir a gravidade do episódio psicótico e tratar os
problemas associados com sintomas persistentes. As IPS podem ainda ter como
objectivo melhorar especificamente aspectos psicológicos e sociais do
funcionamento e deste modo reduzir a longo prazo na vulnerabilidade de um
indivíduo.
A evidência aponta hoje para uma conjugação de intervenções farmacológicas e
psicossociais adaptadas às necessidades das pessoas com doença mental grave e
suas famílias, sendo que a ênfase tem sido colocada numa abordagem mais
abrangente, sustentada numa formulação multidisciplinar das situações e numa
prática reflexiva, conjugando intervenções farmacológicas e psicossociais
(British Psychological Society, 2007).
Âmbito desta Revisão
Apesar da evidência de que as IPS são globalmente eficazes no alívio dos
sintomas da doença mental grave e na melhoria do funcionamento psicossocial com
marcada redução da incidência de recaídas, em muitos países e particularmente
em Portugal a sua implementação é escassa e descontinuada não estando estas
intervenções acessíveis à maioria das pessoas afectadas por este tipo de
doenças (DGS, 2007).
Em Inglaterra, desde a década de 1990 que esforços têm sido desenvolvidos para
formar e treinar profissionais de saúde mental em IPS de forma a garantir que
estes são oferecidos onde são mais necessários e onde podem ter mais impacto.
Os enfermeiros de saúde mental comunitária (clínicos e professores) que
constituem o maior grupo de profissionais de saúde mental neste país, têm
liderado com sucesso este processo através de iniciativas de formação e de
investigação (Bradshaw & Mairs, 2007; Brooker, 2001, 2006; Couldwell &
Stickley, 2007; Gournay, 1994,1995; Hewitt & Coffey, 2005; Stacey &
Rayner, 2008).
Também a comissão para a reestruturação e desenvolvimento dos serviços de saúde
mental (DGS, 2007, pg. 130) declara a necessidade de formação e treino dos
profissionais de saúde mental de modo a permitir-lhes responder às necessidades
clínicas e psicossociais das pessoas com problemas de saúde mental, através da
formação em serviço, mas também "acções que promovam a introdução de mudanças
na formação pré e pós graduada das várias disciplinas, que permitam uma melhor
preparação dos profissionais em aspectos essenciais dos cuidados de saúde
mental do futuro."
Todavia em Portugal, dados divulgados em Maio 2010 pela equipa de projecto dos
cuidados continuados integrados de saúde mental mostram que, contrariamente ao
que se verifica nos países onde o modelo de saúde mental comunitária está
implementado, o número de enfermeiros a exercer nos contextos dos cuidados de
saúde mental é em termos absolutos muito baixo, mas também, proporcionalmente a
outros profissionais que compõem as actuais equipas multidisciplinares de saúde
mental.
"Uma revisão actual das prioridades de saúde mental recomenda um enfoque nas
pessoas com doença mental grave. Para enfrentar este desafio, os enfermeiros de
saúde mental precisam adquirir habilidades de gestão de casos e de intervenções
psicossociais. Têm havido alguns desenvolvimentos excelentes na educação e na
prática de enfermagem [...] Hoje, a geração de enfermeiros de saúde mental
comunitária deve abandonar seu trabalho com pacientes com neuroses e ser
ajudado na aquisição de novas competências [...] O corpo docente também precisa
mudar, focalizar-se mais na clínica e abandonar certas ideologias redundantes."
(Gournay, 1994)
Dezasseis anos nos separam destas palavras pronunciadas em Inglaterra, portanto
dificilmente encontraríamos uma mensagem mais actual para os enfermeiros de
saúde mental e psiquiatria portugueses.
Há pois necessidade de uma revisão sistemática da evidência disponível para
compreender de que modo os enfermeiros de saúde mental e psiquiatria têm
contribuído para a implementação de cuidados diferenciados, especificamente das
IPS, que permitam às pessoas com doença mental grave não ser afastadas da sua
comunidade residência e viver com a máxima saúde e bem-estar possíveis.
Objectivos
Esta Revisão Sistemática da Literatura pretende responder às seguintes
questões:
1. Como têm os enfermeiros de saúde mental e Psiquiatria (ESMP) contribuído
para a implementação de IPS para pessoas com doença mental grave?
2. Que factores facilitadores e que obstáculos/dificuldades têm sido
encontradas na implementação de IPS para pessoas com doença mental grave?
3. Que efeitos da implementação de IPS têm sido identificados nas pessoas com
doença mental grave e suas famílias, assim como nos ESMP que as desenvolvem?
Metodologia
No sentido de responder aos objectivos, surge a necessidade de fazer uma
revisão sistemática da literatura. Nesta revisão sistemática de literatura foi
formulada a pergunta de investigação em formato PI[C]O (Melnyk & Fineout-
Overholt, 2005): Em relação às pessoas com doença mental grave como têm os
enfermeiros de saúde mental (População), contribuído para a implementação
(Outcome) das intervenções psicossociais (Intervenção)?
Protocolo de pesquisa:
(Severe, Serious, Enduring, and Mental Illness) OR (Severe, Serious, Enduring,
and Mental Health Problems);
(Psychiatric, Mental Health and Nurs);
(Psychosocial Interventions);
[(Severe, Serious, Enduring, and Mental Illness) OR (Severe, Serious, Enduring,
and Mental Health Problems) AND [(Psychiatric, Mental Health and Nurs*) AND
(Psychosocial Interventions)].
Bases de dado electrónicas observadas: EBSCO (CINAHL Plus with Full Text) e
(MEDLINE with Full Text). Foram procurados artigos científicos publicados em
Texto Integral e/ou apenas Abstract, publicados entre 2000/01/01 e 2010/05/31,
Resultado: 9 Artigos.
Como critérios de inclusão aceitaram-se todos os artigos que fizessem
referência, directa ou indirectamente, à implementação por enfermeiros de saúde
mental e psiquiatria de intervenções psicossociais para pessoas com doença
mental grave e/ou seus cuidadores primários, na comunidade ou em contexto de
internamento, incluindo aqueles que envolviam enfermeiros em programas de
formação/treino formal neste tipo de intervenções psicossociais. Todos os tipos
de metodologia foram incluídos, metodologia quantitativa e/ou qualitativa ou
revisão sistemática da literatura, que clarificassem quais os factores
facilitadores e os obstáculos/dificuldades na implementação das IPS e efeitos
da implementação das IPS nos clientes e suas famílias, assim como nos
enfermeiros que as desenvolvem.
Nos critérios de exclusão inseriram-se os artigos sem recurso a trabalho
empírico, os artigos repetidos nas duas bases de dados e com data anterior ao
ano 2000.
Resultados e Discussão
Para tornar perceptível a metodologia utilizada explicita-se no Quadro 1 a
listagem dos 6 artigos incluídos nesta revisão e que no seu conjunto
constituíram o corpus de análise para a elaboração da discussão e respectivas
conclusões.
Quadro nº1 - Artigos Publicados Incluídos na Revisão da Literatura
Implementação de IPS para Pessoas com Doença Mental Grave - Contributo dos ESMP
De acordo com a generalidade dos artigos consultados para esta revisão da
literatura e que ultrapassa os 6 artigos seleccionados podemos afirmar que os
enfermeiros [ingleses] têm contribuído significativamente para a implementação
de IPS para pessoas com doença mental grave e suas famílias, nomeadamente
através de iniciativas formativas de diferentes tipos (Brooker, 2001, 2003,
2006; Gournay, 1994,1995; Forrest, 2004), tais como formação em serviço (Ewers,
2002; MacCann, 2005), formação formal pré-graduada (Stacey & Rayner, 2008)
e formação formal pó-graduada (Bradshaw & Mairs, 2007; Couldwell &
Stickley, 2007; Hewitt & Coffey, 2005).
A par com as iniciativas formativas, múltiplos estudos de natureza
investigativa e investigações têm sido levadas a cabo pelos ESMP,
principalmente os educadores, no sentido de produzir evidência relativa à
implementação das IPS para as pessoas com doença mental grave e suas famílias,
das quais têm derivado indicadores e instrumentos de avaliação dos resultados,
recomendações de vários níveis e orientações para o futuro.
Os ESMP têm envolvido de modo crescente, nos programas de formação e treino em
IPS, as pessoas com doença mental grave e suas famílias, contribuindo
activamente para o seu "empowerment" e "recovery". Couldwell & Stickley
(2007, pg. 630) descrevem algumas dessas actividades:
• "Participação no desenvolvimento curricular;
• Membro de painéis de validação;
• Representação no comité de gestão do curso;
• Condução de sessões do curso;
• Co-autoria em artigo reflexivo sobre IPS."
Factores Facilitadores e Obstáculos
Dificuldades têm sido registadas na implementação de IPS para pessoas com
doença mental grave e suas famílias, fruto de variados factores tais como falta
de recursos e tempo e dificuldade em assegurar a supervisão (Devane et al.
1998, a Rolls et al. 2002 in Couldwell & Stickley, 2007); défice de suporte
organizacional relacionado com a inexistência de planos de implementação e de
estratégias de formação por insuficiente informação dos gestores e equipas, mas
também em termos da alocação de recursos, de educação e ausência de controlo e
fiscalização (Brooker et al, 2003).
Inversamente os factores facilitadores identificados pela literatura sugerem o
recurso a supervisão contínua e actualização permanente dos conhecimentos e
habilidades (Baguley et al. 2000). Particularmente relevante para a
implementação das IPS com sucesso é manter o ESMP- gestor de caso responsável
por um número mais reduzido de clientes de forma a introduzir mudanças na sua
prática.
Finalmente tem sido sugerido aos professores trabalharem numa maior proximidade
com os contextos clínicos, contribuindo designadamente para a criação e
desenvolvimento de estratégias que favoreçam a mudança das práticas (Gournay,
1994,1995; Brooker, 2001; 2006).
Efeitos nas Pessoas com Doença Mental Grave, suas Familias e nos ESMP
São reconhecidos, entre outros, os seguintes efeitos decorrentes da
implementação das IPS nas pessoas com doença mental grave e suas famílias:
melhoria do estado de saúde global; redução da sobrecarga do cuidador; melhoria
da sintomatologia psicótica e do funcionamento social; diminuição das taxas de
recaída; desenvolvimento de estratégias de coping; maior capacidade de gerir os
sintomas da sua doença; níveis mais baixos de ansiedade [dos familiares
também]; melhoria da qualidade de vida. (Brooker, 2003; Ewers, P. et al., 2002;
Couldwell & Stickley, 2007; McCann & Bowers, 2005; O'Neill et al.
2008).
Os efeitos da implementação das IPS ao nível do conhecimento, habilidades e
atitudes dos ESMP são referidos em diferentes estudos, com impacto quer ao
nível das práticas clínicas, quer ao nível da satisfação e bem- estar com
redução dos níveis de ansiedade e bem-estar, e aumento da satisfação
profissional (Couldwell & Stickley, 2007; Gamble 1995; Lancashire et al.
1997; O'Neill et al. 2008).
Conclusão e Implicações Futuras para a Investigaçâo
Da literatura consultada parecem emergir dois caminhos prioritários para a
investigação futura em torno desta problemática.
O primeiro passa por um maior conhecimento da perspectiva dos clientes
relativamente à definição daquilo que serão resultados de sucesso dos cuidados
prestados pelos ESMP, concretamente das IPS, com base nas suas experiências e
vivencias pessoais. O segundo consiste na compreensão do processo de mudança
vivido pelos ESMP, aquando da implementação das IPS, relativamente às pessoas
com doença mental grave e suas famílias.