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EuPTCVHe1647-21602012000100009

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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A Comunicação no Processo Terapêutico das Famílias de Doentes Mentais A Comunicação no Processo Terapêutico das Famílias de Doentes Mentais Introdução É universalmente aceite que a família é a unidade básica do desenvolvimento humano e onde se vivem as experiências de vida fundamentais para o desenvolvimento da personalidade. É por isso que se considera a família como uma estrutura social importante para o desenvolvimento da saúde do indivíduo (OMS: 1998; 2002). Alguns estudos sobre a família procuram respostas sobre processos extrafamiliares que influenciam as suas dinâmicas (Nunes, 1994; McLoyd, 1998). Consideram estes autores que o sofrimento psicológico resultante de um acumular de acontecimentos de vida negativos, nomeadamente a doença e, dizemos nós, concretamente a doença psiquiátrica, são factores que influenciam os processos intrafamiliares. Outros factores estranhos à família estão, também, a acentuar as dificuldades deste grupo social. Cada vez mais os peritos de saúde, nomeadamente da OMS, consideram que a saúde mental do século XXI estará depende de quadros sócio-politicos que se desenvolverão a nível mundial.

A conjuntura económica que se verifica nos países considerados desenvolvidos, trará repercussões para a saúde das populações, sendo estas, no entanto, difíceis de prever. Verifica-se, também, cortes nos orçamentos da saúde para a manutenção dos serviços e nos apoios directos aos doentes e famílias ficando estas quase como único recurso para muitos doentes mentais.

Neste contexto é importante investir-se na saúde mental das famílias para que estas sejam capazes de cuidar mais e melhor dos seus familiares doentes para que sejam capazes de fazer as adaptações necessárias nos processos de transição que as novas situações exigem e para que sejam capazes de responder às exigências que a sociedade lhes faz enquanto responsáveis pela socialização dos novos membros e equilíbrio de todos. Torna-se, por isso, necessário que os técnicos de saúde, nomeadamente os enfermeiros, estejam atentos e disponíveis para manterem um nível de comunicação eficaz, um saber ouvir peculiar na arte de bem comunicar com os familiares de doentes mentais para obter ganhos terapêuticos em todos os elementos do agregado familiar. Ao propormo-nos encontrar respostas aos objectivos por nós traçados: i) identificar de que forma o enfermeiro intervém junto das famílias para que estas se sintam apoiadas quando necessitam de ajuda para lidarem com a situação de doença na família; e ii) obter informação sobre os espaços de tempo que utilizam para ouvir as famílias, estamos a valorizar a comunicação no processo terapêutico, para que, e através do qual, se desenrolem as intervenções de enfermagem necessárias para ajudar a resolver as dificuldades sentidas pelos familiares.

Torna-se cada vez mais importante que se envolvam as famílias no processo terapêutico aumentando a quantidade e qualidade das estratégias de comunicação entre elas e os enfermeiros para aumentar as hipóteses de sucesso no processo terapêutico.

Uma comunicação eficaz também reforça na família a capacidade de fazer as mudanças que as novas situações exigem para que sejam novamente capazes de responder às exigências que a sociedade lhes faz enquanto responsáveis pela socialização e integração dos membros doentes e equilíbrio de todos. Torna-se, por isso, necessário que os enfermeiros, estejam atentos e disponíveis para um saber ouvir peculiar na arte de bem comunicar com as familiares de doentes mentais para obter ganhos terapêuticos para todos os elementos do agregado familiar. Ao propormo-nos obter informação sobre a comunicação que se verifica, durante o processo terapêutico, entre o enfermeiro e a família do doente identificado estamos a procurar, sobretudo, valorizar a comunicação no processo terapêutico, para que, através dele, se desenrolem as intervenções de enfermagem necessárias para ajudar a resolver as dificuldades sentidas pelos familiares.

A Comunicação com as Famílias de Doentes Mentais Na década de noventa do século passado houve grande investimento nos serviços de saúde no domínio da humanização dos cuidados de saúde. Nos programas desenvolvidos neste contexto valorizou-se o reconhecimento do doente ou familiar como pessoa única, com necessidades, valores, cultura e crenças específicas. Este reconhecimento é demonstrável se se reconhecer que processos de comunicação saudáveis que permitam boas relações interpessoais para o sucesso do apoio que se espera das famílias.

No Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 é reconhecido o pouco investimento que tem havido a nível da saúde mental. No seguimento deste Plano, e para tentar ultrapassar os atrasos que estão registados, várias directrizes foram emanadas pela Direcção geral de saúde sendo algumas delas com cariz Legislativo como o Decreto-Lei 8 de 28 de Janeiro de 2010, uma forma de reconhecer a necessidade urgente de ultrapassar lacunas nesta área, criando um conjunto de unidades e equipas de cuidados integrados de saúde mental. No entanto, quando contactamos com a comunidade verificamos que os serviços continuam a funcionar de forma muito semelhante. Pequenas e poucas excepções se vão notando e estas quase sempre em regímen experimental (enquanto os subsídios que lhes foram atribuídos se mantiverem).

Mesmo assim, a nossa experiencia permite-nos afirmar que, comparativamente a um passado recente tem-se verificado uma maior participação das famílias na prestação de cuidados aos doentes mentais. Com todas as dificuldades Hanson (2005) considera que tem sido reconhecido o papel importante das famílias a este nível. No entanto, é necessário que os enfermeiros se consciencializem que este envolvimento tem um custo que pode ser avaliado pela sobrecarga dos cuidadores, demonstrável através de verbalizações dos próprios cuidadores.

Também se tem verificado que os serviços de saúde mental, tanto os integrados nos hospitais de cuidados gerais, como os de especialidade ou comunitários, "não contribuem tanto como seria desejável para o alivio da sobrecarga das famílias" (Guedes, 2008:46). A autora conclui que "a sobrecarga sentida pelos familiares de pacientes psiquiátricos constitui uma dimensão importante que deve ser reconhecida pelos serviços de saúde mental, através de programas de orientação, informação e apoio, visando a diminuição do estigma e o melhoramento da qualidade de vida da família" (Guedes, 2008: 67). Acreditamos que havendo níveis de comunicação eficazes consegue atingir-se resultados mais positivos. É, no entanto, necessário estar-se atento para o facto da comunicação humana ter características que interferem nas relações interpessoais. É um processo que implica emissão e recepção de mensagens codificadas com significados para as pessoas intervenientes nas mensagens. É um processo pelo qual uma pessoa afecta o comportamento ou estado de espírito do outro (Fiske, 2002).

É pela comunicação que se consegue atingir resultado mais eficazes na humanização dos cuidados. Toda a comunicação, inclusive na não-verbal, implica afeto (Ribeiro, 2005) e é nesse afecto que o processo de comunicação que se desenvolve entre o enfermeiro, o doente e a família permite demonstrar atitudes de sensibilidade e de aceitação do outro, atitudes que permitem valorizar e investir na saúde da família que possuem no seu agregado pessoas com doença mental.

Ao escutar a família, os enfermeiros podem identificar quais as necessidades que obrigam a uma intervenção mais imediata. Conseguem ter a percepção do impacto da doença na família tanto no que se refere às percepções da doença como das alterações que esta implica nas alterações das rotinas quotidianas (Oriá; Moraes; e Victor, 2004). O enfermeiro especialista em saúde mental e psiquiátrica ao mobilizar na prática os saberes e conhecimentos científicos, técnicos e humanos, demonstrando competências clínicas especializadas, permite que "a pessoa, durante o processo terapêutico, viva experiências gratificantes quer na relação intrapessoal quer nas relações interpessoais" (Diário da República, Regulamento 129/2011: 8670).

Sabemos que a família é um sistema amplo e complexo e ao enfermeiro é pedido que saiba interagir tanto para obter resultados terapêuticos no doente identificado mas também para que possa adoptar medidas de promoção de saúde, "demonstrando níveis elevados de julgamento clínico e tomada de decisão" (Diário da República, Regulamento 129/2011: 8670), junto de todos os elementos que dela fazem parte. Também não nos podemos esquecer que as politicas de saúde, sejam da OMS, da UE ou nacionais colocam a família como foco de intervenção das medidas terapêuticas. Devemos considerar esta centralidade ora pelo seu papel nos diferentes estádios do ciclo de vida da família, ora enquanto receptora, de cuidados ou através de acções terapêuticas que visem a promoção de saúde do grupo. Quando a família não é capaz de encontrar formas de resolver os problemas que surgem no seu interior, pode apresentar sinais de descompensação psíquica, tais como níveis de stress não compatíveis com a capacidade de resolução desses problemas ou por sinais de sobrecarga emocional ou física. Para reduzir essa possibilidade, os enfermeiros devem adoptar processos de comunicação eficazes. Os momentos de interacção permitem a "construção e manutenção do vínculo entre a equipe e família, demonstrando que esses profissionais valorizam a participação da família e entendam a importância dessa ser assistida em suas necessidades" (Mielke, Kohlrausch, Olschowsky, e Schneider, 2010: 762). Na relação com a família tem ainda a possibilidade de implementar medidas de educação para a saúde.

Os enfermeiros, ao estimularem o desenvolvimento de um ambiente terapêutico, sabem que este ambiente irá favorecer as relações interpessoais e, por sua vez, permitir um desenvolvimento pessoal e interpessoal criando condições para que cada elemento da família possa desenvolver competências relacionais que favoreçam a sua capacidade de adaptação em fases de transição.

Em suma, consideramos importante que o enfermeiro desenvolva competências comunicacionais eficazes e explore a sua capacidade de escuta activa. É importante ter presente que trazer a família para o centro dos cuidados é um desafio para si mas é-o também para a família. Isto porque lhe reconhece o papel importante que desempenha no equilíbrio do seu familiar reconhecendo, simultaneamente, que ela própria pode precisar de ajuda nas fases mais complexas do seu desenvolvimento e nos processos de transição saúde /doença.

Metodologia O estudo que desenvolvemos seguiu os pressupostos de uma investigação do tipo exploratória-descritiva. Em todo o percurso foram seguidos os procedimentos éticos recomendados na investigação que envolve pessoas, tanto nas instituições onde os enfermeiros trabalham como com os próprios enfermeiros, após os quais fizemos a colheita de dados, sua análise e conclusões daí resultantes.

Participantes O universo do nosso estudo integra enfermeiros que trabalham em hospitais psiquiátricos e um serviço de psiquiatria de um hospital geral do distrito de Braga. A amostra é constituída por sete enfermeiros, de idades compreendidas entre os trinta e cinquenta anos. Quatro são do sexo feminino e três do sexo masculino. Todos possuem o grau de licenciado ou equivalente legal. Um possui a especialidade de enfermagem em saúde mental e psiquiátrica, outro possui o curso de mestrado em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica.

Instrumento de Colheita de Informação A escolha de um instrumento de colheita de dados foi mediada pela informação que pretendíamos obter. Nesse sentido o guião da entrevista foi elaborado por nós. As questões colocadas aos enfermeiros visavam obter resposta às questões que estavam implícitas nos objectivos previamente formulados.

Procedimentos Iniciamos a colheita de dados após a autorização das Entidades Hospitalares que recebem doentes com patologia mental em regímen de internamento completo. Como consideramos que possuidores de toda a informação podemos decidir livremente sobre as opções a tomar, aos enfermeiros que aceitaram colaborar connosco foi- lhes apresentado o projecto do estudo e foram informados dos procedimentos a adoptar para a colheita de dados: i) apresentado o guião da entrevista; ii) necessidade de gravar a entrevista; iii) sigilo sobre os dados colhidos; possibilidade de desistirem da colaboração; iv) possibilidade de serem novamente contactados se houvesse dúvida sobre a informação colhida. Após esta informação foi assinado o documento de consentimento informado.

Sendo este um estudo qualitativo de tipo exploratório recorremos a analise de conteúdo seguindo os procedimentos da teoria Fundamentada nos dados de Strauss e Corbin (2008).

Numa primeira fase os dados foram analisados com o auxílio de um software informático nvivo8.

Resultados Na análise dos dados estiveram sempre subjacente os objectivos do estudo. Após várias leituras flutuantes emergiram algumas das dificuldades que os enfermeiros enfrentam para lidar com a família dos doentes mentais. Estas dificuldades irão reflectir-se nas intervenções de promoção de saúde que consideramos necessárias para que as famílias possam lidar com a situação de doença do seu familiar com um nível de equilíbrio que lhes permita manter a integração social e familiar sem conflitos e de forma que possam sentir-se úteis e integrados no meio em que vivem.

Tornou-se evidente que um dos aspectos mais prejudicados no dia a dia do enfermeiro na relação com os familiares dos doentes centra-se na comunicação.

Aparentemente os enfermeiros não demonstram uma atitude pró-activa, apenas reactiva como podemos confirmar no seguinte extracto "À medida que a família vem ter comigo tenho necessidade de introduzir com eles algum esclarecimento para o apoio ao doente quando sair do internamento" (E1), ou "eu conheci a senhora e por acaso a senhora aproximou-se de mim" (E1). Aparentemente os enfermeiros manifestam alguma dificuldade de mobilizar para a clínica alguns saberes e conhecimentos científicos, técnicos e humanos que lhe possibilitassem fazer um julgamento e tomada de decisão consentânea com a situação. Parece-nos ser eticamente que actue porque "por acaso a senhora aproximou-se de mim". Um julgamento clínico para uma tomada de decisão adequada a cada caso implica uma observação atenta, uma interpelação das pessoas, uma antecipação na identificação das necessidades das pessoas.

Ao trabalhar com famílias o enfermeiro precisa conhecer os padrões de interacção que se verificam entre os vários elementos. A família, enquanto composta por vários elementos, tem de ser vista como vários membros em interacção. Wright & Leahey (2002) consideram que os indivíduos são melhor compreendidos no seu contexto social. Este contexto, sendo difícil de recriar, pode ser observado na interacção entre os seus membros e através do impacto que se observa nas expressões não-verbais quando se questiona um elemento da família em presença dos restantes ou pelo menos, dos significativos. Será, por isso, de todo conveniente ajustar-se tempo e espaço para que se possam realizar encontros entre o familiar doente, outros familiares e o enfermeiro para obtenção de informação importante sobre os padrões de comportamento da família, ou seja, de expressões que manifestam por comportamentos verbais ou não-verbais que possam contribuir para uma abordagem terapêutica com vista a uma melhor qualidade de vida de todo o agregado. Na resposta a esta necessidade, ainda que identificada "entendo que a família é um complemento importantíssimo e basilar na compensação e no estadio do equilíbrio que o doente deve vivenciar fora do contexto do internamento" (E3), dificilmente obtém os resultados desejados porque "nós interagimos com a família e procuramos, senão com a presença física pelo menos via telefone" (E3). Ao aceitar o contacto telefónico como uma via salutar para promover a saúde dos elementos da família, corre-se o risco de identificar as suas necessidades através de uma visão limitada e parecendo que a única solução aceitável para aquela família é "A ajuda que eles pedem é para prolongar os internamentos" (E3).

As consequências de uma alta indesejada por parte dos familiares poderia ser melhorada se estivessem implantados na comunidade os cuidados integrados em saúde mental para se evitar que "O doente quando está aqui internado e vai embora, vai com acompanhamento familiar mas muito pouco acompanhamento domiciliário (E3). Outras vezes as famílias "nem sabem os recursos a que têm direito"(E3). Este desconhecimento favorece a que "Muitas vezes nós temos um doente um mês, dois meses, três, está equilibrado, vai para o exterior e passado pouco tempo está novamente porque não tem os apoios devidos".

Atribuem-se responsabilidades para todos os lados "(...) é da família, da comunidade, é em termos de psiquiatria, (...) nunca respostas" (E4). O regulamento de competências especificas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental prevê que o enfermeiro forneça antecipadamente orientações para promover a saúde mental e prevenir ou reduzir o risco de perturbações mentais (RCEEEESM, 2010). Pode dizer-se que nem todos os enfermeiros que trabalham nos serviços de saúde mental e psiquiatria sejam especialistas. No entanto, os que existem devem fazer os planos adequados, orientar os enfermeiros de cuidados gerais e acreditar que competências que se desenvolvem em contexto da clínica, essencialmente quando o processo de cuidados se caracteriza pela mobilização de boas práticas.

A prática do enfermeiro está muitas vezes condicionada pela manutenção do status quo. Encontramos expressões que nos lembram os escritos do meio do século XX quando se começava a delinear a importância da família na recuperação do doente mental "Nós tentamos ver o doente enquadrado no seu meio, daí que tentamos sempre que possível, englobar a família, embora nesta unidade nem sempre isso é possível (...) é parte integrante do doente e mesmo quando surgem dúvidas nós telefonamos à família" (E6). Este nosso entender é reforçado quando ouvimos "A minha relação com os familiares é mais na parte da alta (...) Procuramos fazer ensinos, nomeadamente aquando da alta" (E6). Estas medidas de intervenção são também confirmadas por outros enfermeiros.

Discussão dos Resultados O enfermeiro tem necessidade de desenvolver habilidades que lhe permita fazer observações relevantes quando trabalha com famílias (Wright e Leahey, 2002).

Segundo as autoras é importante que saiba reconhecer que as intervenções junto da família podem estar condicionadas pela relação que existe entre os seus membros. No entanto, independentemente dessa interrelação, é necessário reconhecer que as famílias que passam por qualquer situação de doença precisam, geralmente, de algum tipo de ajuda. Os desajustes às rotinas do dia-a-dia são mais difíceis quando se trata de doença mental. Ao analisarmos o conteúdo das entrevista emerge a noção de que não reconhecem os limites da sua intervenção, como demonstram as palavras de E1: "a própria família às vezes tem... precisa de apoios exteriores a eles. Daí, às vezes, têm algumas dificuldades e daí eles pedem ajuda. Às vezes pedimos nós em documento oficial, para estudar o caso de cada doente...". O enfermeiro não pode ficar apenas como mediador entre os vários técnicos de saúde na ajuda à família. Pode e deve ser interventivo, desenvolver competências de intervenção junto da família para que possa cuidar a família neste processo de transição.

O enfermeiro é um mediador nos processos de intervenção terapêutica ajudando a criar sinergias necessárias à adaptação dos membros da família à situação de doença. Por isso, é-lhe pedido que acompanhe e execute projectos de investigação que validem as suas intervenções e lhe proporcione um permanente desenvolvimento das suas competências comunicacionais e intervenções baseadas em evidências científicas.

Se são capazes de identificar algumas necessidades das famílias pois referem que "Pedem ajuda, nomeadamente com o tipo de cuidados que precisam de prestar ao doente" (E7), continuando "A maior necessidade que eles têm é de informação.

O que é que se pode fazer; o que é que se pode fazer; o que resulta o que não resulta; que tipo de comportamento podem adoptar; às vezes aquele que parece correcto é o menos terapêutico" (E7), não é deontologicamente correcto que se afirme "Em termos práticos são cuidados dirigidos ao doente por falta de recursos humanos e de tempo. Penso que falta de tempo para nos sentarmos com os familiares" (E7).

De acordo com o Decreto-Lei 8/2010, de 26 de Janeiro, o enfermeiro, enquanto membro activo nas equipas de cuidados continuados integrados de saúde mental é responsável pela promoção e reforço das capacidades das famílias, habilitando- as a lidar com as situações decorrentes das incapacidades causadas pela doença.

Cabe ao enfermeiro avaliar a família e ajudá-la na procura de soluções e estratégias para lidar com as duvidas, o preconceito, o estigma e toda a incerteza que a doença mental pode implicar.

Conclusões As actuais políticas económicas não são favoráveis à implantação das medidas preconizadas na legislação vigente. Não encontramos cuidados continuados em psiquiatria. O doente que é internado em situação aguda, ao ter alta do serviço onde esteve internado vai directamente para o seu domicílio sem uma avaliação adequada das condições do seu grupo familiar e das condições que o meio lhe propicia. Os familiares vivem muitas vezes situações complicadas que passam desde não aceitarem a doença, a sentirem o estigma social, por condições estruturais da própria família que lhes dificulta a convivência (Gomes, Martins e Amendoeira, 2011). Muitas vezes têm necessidade de se reorganizarem relativamente às suas rotinas, às dificuldades financeiras, ao desgaste físico e emocional causado pela convivência e pelos cuidados que vão prestando ao doente. Aos enfermeiros é pedido que saibam identificar os momentos em que se devem aproximar da família para que esta sinta abertura para colocarem estas ou outras dificuldades e para que possam analisar cada situação per si pois cada família tem necessidades e características específicas. As intervenções planeadas para intervir na família devem considerar o fortalecimento das relações familiares porque, além de facilitarem as abordagens ao doente, nomeadamente a sua adesão terapêutica, permitem evitar novas possíveis crises na família. noutros estudos feitos junto de famílias com doentes mentais como os de Colvero (2004), confirmaram que as acções dirigidas à família permitiram melhorar o relacionamento entre os familiares e os doentes, aumentaram o nível de adesão ao tratamento e manifestaram atitudes mais positivas perante a vida (Colvero, 2004). É neste sentido que se torna importante desenvolver-se competências comunicacionais na área da saúde mental, onde se valorize a comunicação não verbal, se saiba interpretar o não dito, se saiba dar um significado às mensagens da família. A comunicação em saúde mental não fica limitada à existência de um emissor e de um receptor. É um processo interactivo que envolve sentimentos e do qual se espera que existam mudanças nas pessoas envolvida.

Assim, face ao que observamos, e reportando-nos aos objectivos que oportunamente enunciamos, cabe-nos dizer que é necessário fazer-se muito trabalho a este nível nos serviços de psiquiatria para que as famílias recebam a atenção que merecem e precisam. Identificamos que o enfermeiro intervém junto das famílias se estas se dirigem a eles. Se as famílias não os procuram, a abordagem é feita quase exclusivamente no momento da alta e apenas para entregar a carta dirigida ao médico que vai dar continuidade aos cuidados em consultas de ambulatório e as receitas dos psicofármacos que irão continuar a ser administrados ao doente no domicílio. Acreditamos que muitas vezes não o fazem ora por vergonha ora por receio de lhes ser atribuída a responsabilidade da doença do seu familiar e da não adesão terapêutica do doente. Recordamos que noutro estudo feito por nós tínhamos observado que "as famílias revelam não saber o que fazer porque não sabem nada sobre a doença ou sobre com o lidar com o familiar" (Gomes, Martins e Amendoeira, 2011). Face ao primeiro objectivo parece que o enfermeiro se esquece que investir na promoção da saúde mental das famílias com pessoas doentes mentais, ajudando-as a fazer as adaptações necessárias nos processos de transição que as novas situações exigem e a serem capazes de responder às exigências que a sociedade lhes faz enquanto responsáveis pela socialização dos novos membros e equilíbrio de todos pode ser feito através de intervenções terapêuticas como disponibilizar-se para as ouvir. Relativamente ao segundo objectivo averiguamos que são muito poucos os momentos dedicados a esse fim. Para comunicar é preciso estar presente e os enfermeiros manifestam alguma dificuldade na gestão do tempo para as intervenções terapêuticas mais direccionadas aos familiares. Esta conclusão surge de expressões como a de um enfermeiro: "Penso que falta de tempo para nos sentarmos com os familiares" (E7). Neste sentido também é importante recorrer-se de outras estruturas, nomeadamente a rede de cuidados continuados em saúde mental. Talvez não estejam ainda implantados como a legislação preconiza mas também é verdade que se pode começar a implementar medidas desde que haja vontade de quem está nos contextos da prática. É aqui, essencialmente, que actuam os enfermeiros de família numa filosofia de enfermagem de família que é "... o processo de cuidar das necessidades da saúde das famílias (...) e tem por objectivo a família como contexto, a família como um todo, a família como um sistema ou a família como uma componente da sociedade" (Hanson, 2005: 8).

Neste contexto o enfermeiro de saúde mental tem necessidade de se focar "na promoção da saúde mental, na prevenção, no diagnóstico e na intervenção perante respostas humanas desajustadas ou desadaptadas aos processos de transição, geradores de sofrimento, alteração ou doença mental" (Regulamento 129/2011) através de processos de comunicação eficazes.

Todo o investimento que é feito com a família em termos de saúde não é um direito da família, é um recurso que vai ser útil para melhorar a sua qualidade de vida e, por isso, a sua saúde mental.

Por isso os enfermeiros devem reflectir sobre os seus procedimentos junto deste grupo de risco. Parece-nos importante, e necessário, investir na formação contínua orientada para o conhecimento das famílias, das suas singularidades e das novas políticas de saúde que propõem uma actuação onde a família é o centro da atenção em saúde. Não é suficiente mobilizar recursos pessoais e do meio para agir eficazmente.

É importante que as entidades de saúde se consciencializem que o ensino de enfermagem nos cursos de licenciatura não é suficiente para munir os enfermeiros das competências complexas para trabalhar nesta área. As equipas de enfermagem devem ser constituídas por enfermeiros de cuidados gerais sem prescindir de um número, que deve ser avaliado em cada serviço, de enfermeiros com formação especializada em saúde mental e psiquiátrica, cursos que devem privilegiar os cuidados às famílias contemplando a sua singularidade na diversidade cultural.

No entanto, toda a formação que o enfermeiro possa adquirir terá sentido se conseguir fazer a sua transferibilidade para os contextos da prática, adaptados a cada situação concreta.


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