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EuPTCVHe1647-21602012000200004

EuPTCVHe1647-21602012000200004

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1647-2160
Year2012
Issue0002
Article number00004

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A Personalidade das Vítimas de Violência Conjugal A Personalidade das Vítimas de Violência Conjugal INTRODUÇÃO mais de uma década que a violência é considerada um problema de saúde pública pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002). A violência doméstica engloba todos os comportamentos/omissões que tenham por objetivo proporcionar, repetidamente e com intensidade, danos físicos, sexuais, mentais, económicos ou até mesmo o homicídio, de forma directa ou indirecta a um indivíduo que habite no mesmo agregado, ou que não habitando no mesmo agregado que o agressor seja cônjuge/ex-cônjuge, ou companheiro marital/ex-companheiro marital. Esta problemática atinge mulheres, homens, crianças, jovens, idosos, deficientes e dependentes (Matos, 2002).

A violência conjugal ocorre no seio de uma relação, nomeadamente quando uma das partes recorre ao uso da força ou do constrangimento com a finalidade de promover ou perpetuar o domínio da outra parte. Neste fenómeno padece uma relação assimétrica, isto é, diferentes posições e poderes entre o casal (Alves, 2005; Nunes, 2003).

A personalidade está relacionada com os diferentes desejos, sentimentos e com a forma de expressar tais sentimentos/emoções. As pessoas diferem uma das outras pelo autoconceito, pelas suas perspectivas no que diz respeito ao mundo e ao futuro (Gleitman, Fridlund, & Reisberg, 2009). A personalidade é o que torna o indivíduo único, tendo sido identificadas cinco dimensões que distinguem a individualidade ' ModeloBig Five (Dias, 2004; Hansenne, 2003). Não um perfil delineado para as vítimas, apenas se constatam algumas características típicas, nomeadamente, serem envergonhadas, caladas, incapazes de reagir, conformadas, passivas, emocionalmente dependentes e deprimidas (Alves, 2005). Actualmente, não se investiga se a personalidade influencia a saúde, mas antes quais as circunstâncias relativas a que aspectos da saúde ou a que comportamentos saudáveis e com que implicações praticas é que a personalidade influencia a saúde. Para este tipo de investigação, o modelo dos cinco factores evidencia-se o mais adequado para ajudar a esclarecer a relação entre o self psicológico e o self fisiológico (Holroyd, & Coyne, 1987).

METODOLOGIA

Participantes A população em estudo foram as vítimas de violência conjugal, com idade superior ou igual a 18 anos. A amostra foi seleccionada através de um tipo de amostragem não probabilística obtida por conveniência, uma vez que apenas foram incluídas as vítimas de violência conjugal que estavam disponíveis ou que se voluntariaram para participar no estudo (Carmo e Ferreira, 1998).

No seguimento dos objectivos delineados para a presente investigação aplicaram- se os instrumentos de recolha de dados a 37 vítimas de violência conjugal, todos do género feminino, ou seja, correspondem a 100% da amostra, não existindo nenhum sujeito do género masculino. A idade das vítimas de violência conjugal da presente investigação varia entre os 20 e os 69 anos, sendo a média das idades que compõem a amostra de 38 anos. A maioria das vítimas são casadas (43,2%); têm filhos (81,1% - 30 indivíduos), variando o número de filhos entre 1 e 8. Na sua maioria têm o ciclo e estão desempregadas.

Instrumentos O protocolo de investigação utilizado compõem-se de: a)    Questionário sociodemográfico elaborado pelo próprio investigador que permitiu recolher informações sobre a caraterização das vítimas de violência conjugal; b)    NEO-FFI-20 desenvolvido por Bertoquini e Pais-Ribeiro (2006) para avaliar a personalidade das vítimas de violência conjugal, tendo por base o modelo dos cinco grandes fatores (Neuroticismo (N); Extroversão (E); Abertura à Experiência (O); Amabilidade (A); Conscienciosidade (C)).

Procedimento Para alcançar os objectivos em estudo foi delineado um estudo transversal descritivo.

Para a realização do presente estudo enviou-se um ofício, a solicitar a autorização para a realização do estudo a 320 locais de atendimento a vítimas de violência conjugal de Portugal, incluindo a Madeira e os Açores.

Após a obtenção dessa autorização foi solicitado o consentimento informado aos elementos que constituíram a amostra para a participação voluntária na investigação.

Findo o percurso de recolha de dados junto da amostra obtida, iniciou-se a etapa referente ao tratamento estatístico. Para tal, recorreu-se ao software informático SPSS 19.0 Base Windows, começou-se por construir a base de dados de acordo com os instrumentos utilizados onde foram inseridos os dados recolhidos.

Para tal, recodificaram-se os itens que eram cotados de forma invertida; de seguida efectuou-se o cálculo do valor das variáveis de acordo com os autores dos instrumentos utilizados.

ANÁLISE DOS RESULTADOS A prevalência da violência conjugal é um problema complexo que não será facilmente resolvido. Assim, o objectivo central deste estudo foi conhecer As características e a personalidade das vítimas de violência conjugal em Portugal.

Os dados obtidos nesta amostra revelam que as vítimas de violência conjugal portuguesas: são do sexo feminino; têm idades compreendidas entre os 20 e os 69 anos; casadas; com filhos, nomeadamente, entre 1 e 8 filhos. No que concerne às habilitações literárias prevalece o ciclo. Na sua maioria encontram-se desempregadas, embora indiquem que não dependem economicamente do agressor.

Quanto aos tipos de violência predominantemente praticados são a violência psicológica e a violência física. O detalhe da violência física de que as vítimas normalmente são alvo é o uso da força física por parte do agressor. o detalhe da violência psicológica mais executado contra a vítima é o agressor chamar-lhe de nomes, insultá-la e atribuir-lhe amantes. Enquanto o detalhe da violência sexual que o agressor aplica à vítima é a obrigação em esta ter relações sexuais contra a sua vontade. Por norma o agressor não possuía nem utilizou armas no momento da violência; estes são na sua maioria consumidores de álcool, mas não consome estupefacientes. As situações violentas foram presenciadas por menores e a vítima ficou com ferimentos ligeiros. O local onde foi praticada a violência foi na residência particular do casal e o motivo da agressão esteve relacionado com o estado alterado do agressor devido ao consumo de álcool e/ou drogas.

No que concerne às dimensões de personalidade que caracterizam as vítimas de violência conjugal, estas apresentam valores elevados ao nível da conscienciosidade e neuroticismo. De seguida surge a extroversão, a amabilidade e, por fim, a abertura à experiência

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A literatura indica que os resultados obtidos em várias investigações realizadas no sentido de caracterizar as vítimas de violência conjugal não permitem tirar conclusões claras e objetivas (Costa e Duarte, 2000).

No que concerne à caracterização da amostra e tendo por base os dados estatísticos mais recentes relativamente às vítimas de violência conjugal, recolhidos pela APAV em 2010, o presente estudo confirma que a violência conjugal é praticada maioritariamente contra as mulheres, uma vez que a amostra não inclui nenhum indivíduo do sexo masculino.

Relativamente à idade das vítimas esta varia entre os 20 e os 69 anos, englobando assim as faixas etárias (entre os 26 e os 45 anos) descritas na literatura como sendo o predominante.

Conclui-se que o estado civil que prevalece nesta amostra é casado, corroborando com o estado de arte. Os dados obtidos confirmam que o tipo de família é nuclear com filhos, acrescentando-se com a presente investigação que o número de filhos varia entre 1 e 8 filhos por vítima.

No que concerne às habilitações literárias nesta amostra a maioria tem o ciclo e o nível de ensino superior, sendo este último o predominante de acordo com a teoria, logo neste estudo os resultados obtidos não corroboram na totalidade. Contrariamente ao estado de arte a maioria encontra-se desempregada e depois surgem as mulheres que se encontram empregadas, no entanto as participantes no estudo não dependem economicamente do agressor.

Tendo por base, novamente, os dados descritos pela APAV (2010), ao nível da violência conjugal, os tipos de violência mais praticados são os maus-tratos psicológicos e os maus-tratos físicos, corroborando com os resultados obtidos no presente estudo.

A vitimização conjugal múltipla, de acordo com Pinto (2009), consiste em maus tratos físicos; isolamento social; maus tratos emocionais, verbais e psicológicos; recurso a privilégios masculinos ou femininos; ameaças; violência sexual; e controlo económico. Os dados auferidos acrescentam ao estado de arte os detalhes de cada tipo de violência (física, psicológica e sexual) que são frequentemente exercidos contra a vítima. Assim, ao nível da violência física o agressor na maioria das vezes utiliza a força física contra a vítima; relativamente à violência psicológica constata-se que homem insulta e atribui amantes à mulher; e, por fim, no que diz respeito à violência sexual o mais comum é o agressor obrigar a vítima a ter relações sexuais contra a sua vontade.

A literatura salienta que na maioria dos casos não recurso a arma na prática do crime (APAV, 2010). Os dados obtidos no presente estudo corroboram com os resultados da APAV, uma vez que a maioria das vítimas nega o recurso a arma aquando do momento da agressão.

Costa e Duarte (2000) referem que as pessoas alcoólicas têm uma maior predisposição para praticar a violência conjugal, verificando-se tal facto em 56,8% da presente amostra. A APAV (2010) constatou que a probabilidade de ocorrência da violência é maior quando o agressor é dependente de substâncias (álcool, drogas), contrariamente, neste estudo apenas uma minoria das vítimas afirma que o agressor é consumidor de estupefacientes.

A existência de violência na família de origem (emitida pelos pais através de maus-tratos ou de uma disciplina severa; assim como terem assistido aos maus- tratos conjugais) provoca consequências diretas ou indiretas no indivíduo, podendo este vir a ser violento na conjugalidade (Fernandes, 2002). Daí a relevância em se identificar se os atos violentos foram praticados na presença de menores, verificando-se que em cerca de 59,5% dos casos os filhos assistiram à violência conjugal exercida entre os seus progenitores.

Almeida (2009) refere que as consequências para a pessoa vítima de violência conjugal são diversas e de extrema gravidade. Todavia, o estudo revela que a maioria das participantes ficou com ferimentos ligeiros.

Dias (2004) menciona que o local onde frequentemente se pratica a violência conjugal é no domicílio onde habita a família, realçando igualmente este facto o presente estudo. Sendo a residência particular do casal o local onde a maioria das mulheres admite ter sido alvo das agressões.

Quanto ao motivo da agressão o que é mais realçado é o consumo de álcool e/ou drogas não legais, o que vai de encontro a um dos motivos que as abordagens centradas no indivíduo defendem (Cunha, 2009).

Desta forma, atingiu-se o primeiro objetivo a que o estudo se propôs: descrever a caracterização das vítimas de violência conjugal.

O segundo objetivo centrou-se na descrição das dimensões da personalidade das vítimas de violência conjugal, concluindo que a dimensão com maior predominância é a conscienciosidade, ou seja, são indivíduos zelosos e disciplinados, apresentando características como honestidade, engenhosidade, cautela, organização e persistência.

De seguida, os dados demonstram que o neuroticismo também está fortemente presente na personalidade das vítimas de violência conjugal, isto é, são pessoas que evidenciam instabilidade emocional e, por isso, tendem a ser bastante preocupados, melancólicos e irritados; geralmente são ansiosos e apresentam mudanças frequentes de humor e depressão; e tendem a sofrer de transtornos psicossomáticos e apresentar reações muito intensas a todo tipo de estímulos.

Em terceiro lugar, as vítimas de violência conjugal apresentam como características de personalidade a extroversão, simbolizando assim que são pessoas ativas, com alto nível de energia, disposição, otimismo e afetuosidade.

De seguida surge a amabilidade como fator de personalidade presente nas características das vítimas, espelhando deste modo pessoas que são socialmente agradáveis, calorosos, dóceis, generosos e leais.

Por fim, identifica-se a abertura à experiência como fator de personalidade enraizado neste tipo de amostra, ou seja, são mulheres com flexibilidade de pensamento, fantasia e imaginação, interesses culturais, versatilidade e curiosidade (Silva, Schlottfeldt, Rozenberg, Santos e Lelé, 2007).

CONCLUSÃO Tendo em consideração os dados obtidos neste estudo é possível concluir que os estudos nesta área são pertinentes pois permitem identificar grupos de risco que possam ser alvo de acções de prevenção e intervenção, assim como se poderá identificar as principais características e os traços de personalidade predominantes nas vítimas. No seu conjunto, estes resultados demonstram o quão importante é o reforço das equipas técnicas, ao nível do apoio psicossocial a estas mulheres, uma vez que apresentam-se desprovidas de qualquer suporte afectivo e emocional. Este aspecto deverá revestir-se de singular importância uma vez que, sem uma adequada estrutura mental, será muito difícil para estas mulheres reerguerem-se e reiniciarem a sua vida em tranquilidade.

Com a presente investigação esperamos ter contribuído de alguma forma para um aprofundamento do conhecimento sobre as características e a personalidade das vítimas de violência conjugal, podendo auxiliar na intervenção técnica com estas vítimas.


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