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EuPTCVHe1647-21602015000100008

EuPTCVHe1647-21602015000100008

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1647-2160
Year2015
Issue0001
Article number00008

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Qualida

Introdução Atualmente vivenciamos um processo acentuado do envelhecimento populacional, em que a diminuição da taxa de mortalidade, o aumento da esperança média de vida e a diminuição da taxa de natalidade, são apontados como os principais fatores que explicam o grande desequilíbrio populacional, traduzido na evolução demográfica verificada ao longo dos últimos tempos, nomeadamente na Europa (Rosa & Chitas, 2010).

Para além de ser um fenómeno demográfico, o envelhecimento é também um fenómeno individual, uma experiência pessoal e profundamente existencial. Neste processo diferentes dimensões, biológica, psicológica e sociocultural interagem e influenciam-se entre si (Berger & Mailloux-Poirier, 1994). Assim sendo, nesta perspetiva de multidimensionalidade do envelhecimento, sublinha-se a necessidade de se ter em consideração modos individuais, idiossincráticos, de ser, de estar e envelhecer num objetivo de alcançar um envelhecimento bem- sucedido e com qualidade.

Definir Qualidade de Vida de uma forma global não é fácil. É um conceito amplo.

Incorpora de uma forma complexa a saúde física de uma pessoa, o seu estado psicológico, o seu nível de dependência, as suas relações sociais, as suas crenças e a sua relação com as características proeminentes no ambiente (Farenzena, Argimon, Mourugchi, & Portuguez, 2007). A perceção de Qualidade de Vida é sujeita a múltiplas influências que diferem qualitativamente e quantitativamente de indivíduo para indivíduo, e que até mesmo no próprio indivíduo pode variar ao longo do tempo (Joyce, 1990, como citado em Cavagli, Pires, & Arriga, 2001). Em 1998, o grupo de estudo da Qualidade de Vida da OMS (Organização Mundial de Saúde) define a Qualidade de Vida como a perceção que o indivíduo tem da sua posição na vida dentro do contexto da cultura e do sistema de valores onde vive, e em relação aos seus objetivos, expetativas, padrões e preocupações (como citado em Canavarro, Simões, Pereira, & Pintasilgo, 2005, p. 2).

Importa salientar que, apesar da esperança média de vida se constituir como um aspeto positivo, o facto é que nem sempre a longevidade se faz acompanhar de uma vida salutar autónoma e com qualidade (Carvalho & Mota, 2012).

Associado ao envelhecimento da população está também o conjunto de dificuldades da pessoa que envelhece, onde sobressaem a deterioração progressiva das capacidades, principalmente as funcionais, que levam frequentemente ao recurso institucional uma vez que as famílias tendem a ter menos tempo e disponibilidade para cuidar dos mais velhos, devido às alterações verificadas quer a nível organizacional, quer em termos de papéis desempenhados.

Embora a institucionalização seja a resposta social mais procurada, é facto que a mesma se constitui como um processo complexo e muitas vezes doloroso, tanto para a família como para a pessoa idosa, até porque envolve o corte com os laços até então construídos e o confronto com uma nova etapa de vida, exigindo à pessoa idosa um constante ajustamento, que poderá de algum modo interferir com a sua perceção de Qualidade de Vida.

Neste sentido, a Espiritualidade pode, eventualmente, ser vista como um mecanismo de adaptação, ajudando a pessoa idosa a gerir estas situações de certo modo stressantes, através da forma como ela utiliza a sua , as suas crenças, ou a sua relação com o transcendente ou com os outros, (Dalby, 2006; Pinto & Pais-Ribeiro, 2007), contribuindo para a redução da sensação de perda, bem como, para o aumento da esperança e da sensação de controlo da pessoa idosa, aumentando a sua perceção de bem-estar e a sua Qualidade de Vida (Crowther, Parker, Achenbaum, Larimore, & Koening, 2002).

Partindo destes pressupostos, traçou-se como objetivo geral para este estudo: analisar a relação entre os aspetos sociodemográficos e a situação de institucionalização, e a Espiritualidade com a Qualidade de Vida em idosos institucionalizados. 

Metodologia Trata-se de um estudo transversal e descritivo-correlacional, que conta com uma amostra não probabilística de 47 pessoas idosas residentes em dois lares do concelho de Viana do Castelo, que se encontravam presentes nas instituições em determinado momento e que obedeciam aos seguintes critérios de inclusão: idade igual ou superior a 65 anos; sem patologia mental grave e; aceitar participar no estudo.

Foi aplicado um protocolo de investigação constituído por: 1) questionário de caraterização sociodemográfica e de variáveis relacionadas com a situação de institucionalização, estado de saúde e prática religiosa; 2) Escala de Avaliação da Qualidade de Vida ' WHOQOL-Bref (WHOQOL-Group, 1995) na versão Portuguesa de Serra et al. (2006) que avalia a Qualidade de Vida de modo geral e os domínios: físico; psicológico; social; e meio ambiente; e 3) Escala de Avaliação da Espiritualidade de Pinto e Pais-Ribeiro (2007), sendo esta constituída por duas subescalas: crenças e esperança, e de um modo geral apresenta uma perspetiva positiva da vida, envolvendo sentimentos de esperança, otimismo e satisfação/valorização da vida.

Cada protocolo foi administrado num único momento de avaliação por dois estagiários das instituições devidamente instruídos e treinados para a recolha dos dados, através da entrevista que demorou cerca de 30 minutos. Foram salvaguardados os princípios éticos e os direitos fundamentais do anonimato, do sigilo e da confidencialidade. Recorreu-se ao consentimento livre e informado por parte dos residentes que foi obtido após ser fornecida toda a informação relativamente aos investigadores, à natureza da investigação e objetivos da mesma.

Resultados A amostra constitui-se por 47 idosos com idades compreendidas entre 72 e 96 anos, sendo que 80,9% (n=38) são do sexo feminino. A grande maioria encontra-se na faixa etária acima dos 80 anos (n=34), enquanto os restantes 27,7% (n= 13) têm idades compreendidas entre os 65 e 79 anos. Apresentam uma média (M) de idades de 83,23 anos, com um desvio padrão (DP) de 6,55 anos. São maioritariamente viúvas (53,2%), com frequência de escolaridade básica (53,2%), reformadas, mas que em tempos desenvolviam atividades domésticas ou então estavam desempregadas (39,1%), que corresponde ao setor não classificado. A esmagadora maioria dos idosos é crente (95,7%) e 88,89% dos crentes são seguidores da religião católica.

Quanto à situação de institucionalização, verifica-se que em média os idosos encontram-se institucionalizados 5,49 anos e a maioria referiu que o seu ingresso no lar se deveu a uma opção pessoal (46,8%), seguido de 17,0% dos idosos que referiu perda de autonomia e 14,9% com problemas de saúde, e com valores menores morte do conjugue, isolamento, problemas familiares ou falta de rede social. Para, além disto, também foi referido que realizam várias saídas do lar, entre elas algumas para se dedicarem à prática religiosa.

No que se refere ao estudo da Qualidade de Vida, é possível constatar que, de um modo geral estes idosos percecionam uma Qualidade de Vida razoável. No entanto, o domínio ambiental apresenta os valores mais baixos, o que poderá estar relacionado com a dificuldade de adaptação ao ambiente no lar (Tabela_1).

A Espiritualidade dos idosos participantes é bastante significativa, uma vez que apresentam um valor médio de 3,18. No entanto, são indivíduos com mais crenças do que esperança, ou seja, as crenças religiosas/espirituais, a relação com a e com o transcendente são mais valorizadas por este grupo de idosos (Tabela_2).

Tanto a Qualidade de Vida como a Espiritualidade podem estar relacionadas com as caraterísticas sociodemográficas do indivíduo, bem como, com aspetos relacionados com a situação de institucionalização, estado de saúde e prática religiosa. Assim, a partir da análise bivariada, os resultados indicam que as variáveis sociodemográficas e a prática religiosa parecem não ser determinantes na Qualidade de Vida dos indivíduos. O mesmo não acontece em relação ao estado de saúde, uma vez que os resultados mostram melhor Qualidade de Vida percecionada pelos idosos saudáveis em relação aos doentes, em relação ao domínio global, ao domínio físico, domínio psicológico e domínio social. Por sua vez, a Espiritualidade parece ser diferenciada tanto pelo género e escolaridade, assim como pela prática religiosa. As mulheres apresentam valores médios de espiritualidade global e crenças superiores comparativamente aos homens. Também os indivíduos sem escolaridade são os que têm mais crenças quando comparados com os outros. O mesmo não acontece em relação à prática religiosa, sendo os indivíduos com mais frequência semanal de práticas, aqueles que têm mais crenças (Tabela_3).

Embora seja moderada, a partir do cálculo do coeficiente de correlação de Spearman, foi possível verificar uma correlação positiva e estatísticamente significativa entre o domínio social da Qualidade de Vida e a esperança, o que indica que quanto maior esperança melhor é a perceção de Qualidade de Vida no domínio social (Tabela_4).

Discussão Quanto à Qualidade de Vida, os domínios físico, psicológico, ambiental e das relações sociais são índices importantes para a perceção de Qualidade de Vida da pessoa idosa. Todos eles apresentam valores aproximados, sugerindo os resultados, de um modo geral, que estes idosos percecionam uma Qualidade de Vida razoável, sendo o domínio psicológico aquele que apresenta o valor mais elevado e o domínio ambiental o valor mais baixo. Alguns estudos efetuados neste âmbito (Netuveli & David, 2008; Irigary & Trentini, 2009; Lima, Lima, & Ribeiro, 2010; Cimirro, Rigon, Vieira, Pereira, & Creutzberg, 2011) também fazem referência à importância destes domínios para a Qualidade de Vida dos mais velhos. No presente estudo, o domínio ambiental obteve a pontuação mais baixa da Qualidade de Vida. Este domínio engloba questões de segurança física, ambiente no lar, recursos económicos, cuidados de saúde e sociais, oportunidades de adquirir novas informações e competências, participação e/ou oportunidades de recreio e lazer, ambiente físico e transporte.

O facto de o domínio ambiental apresentar o valor mais baixo pode estar relacionado com o facto de a instituição assumir, em muitos casos o controlo de diversos aspetos da vida da pessoa idosa, entre eles, os cuidados de que necessita de uma forma competente, humana e atempada, e o direito à liberdade religiosa e espiritual (Ferreira, 2009).

Com os resultados obtidos neste estudo foi possível conhecer a importância da dimensão espiritual para estes idosos, com a subescala crenças a apresentar um valor médio total (3,51) um pouco superior à da subescala esperança (2,96), o que indica que estes idosos têm mais crença que esperança, sendo então as crenças religiosas/espirituais, a relação com a e o transcendente mais valorizadas por este grupo de idosos. Este facto vai ao encontro dos pressupostos que estiveram na base da construção do instrumento de avaliação da espiritualidade utilizado neste estudo, referindo Pinto e Pais-Ribeiro (2007) que uma grande parte das pessoas atribui o conceito de Espiritualidade à religiosa.

A importância da dimensão espiritual/religiosa pode ter na sua génese razões de ordem cultural. Numa sociedade com raízes judaico-cristã é notória a marcada prática religiosa (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007). No entanto, este dado pode indicar que as crenças religiosas/espirituais se assumem como um mecanismo de adaptação a circunstâncias adversas da vida. Acreditar num ser superior, que escapa à perceção dos sentidos, numa entidade protetora auxiliadora de momentos que podem gerar algum tipo de stress, pode constituir-se como uma experiência adaptativa (Silva, 2005). Também para Pinto e Pais-Ribeiro (2007), a espiritualidade apresenta-se como uma estratégia de coping, a forma como as pessoas utilizam a sua e as suas crenças pode ajudá-las a superar diversas situações, entre elas as menos positivas. Estas situações podem emergir de alterações que vão surgindo no decorrer do processo de envelhecimento, como os sentimentos proporcionados pela mudança para uma nova situação de vida ou ainda perante um estado de doença, entre outros.

Perante os resultados encontrados torna-se evidente a importância da dimensão espiritual no ser humano. Embora seja moderada, é verificada uma correlação positiva e estatisticamente significativa entre o domínio social da Qualidade de Vida e a subescala esperança, o que indica que quanto maior a esperança melhor é a perceção de Qualidade de Vida no domínio social. A capacidade de esperança e otimismo perante a vida parece relacionar-se com a perceção de Qualidade de Vida, até porque a Espiritualidade se apresenta como uma dimensão capaz de mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com potencial cientificamente reconhecido para melhorar a Qualidade de Vida dos indivíduos (Saad, Masiero, & Batistela, 2001).

Conclusão Parece fundamental considerar que em idades avançadas a inquietude desencadeada pelo confronto com a possibilidade de finitude, faz com que haja um maior desenvolvimento da Espiritualidade, que por sua vez tende a envolver sentimentos de gratidão pela vida, bem como esperança que facilita o confronto com os desafios impostos pelo processo de envelhecimento. Os idosos estudados apresentam de um modo geral uma Qualidade de Vida razoável, não se demostrando relações com aspetos sociodemográficos, nomeadamente o género, grupo etário, escolaridade e também a prática religiosa. O mesmo não acontece em relação aos aspetos relacionados com o estado de saúde, verificando-se que os idosos saudáveis apresentam valores médios de Qualidade de Vida superiores. Pelo contrário, os idosos doentes parecem apresentar valores médios de Espiritualidade e crenças superiores. A esperança demostrou ser uma variável importante pela sua ação moderadora, no domínio social da Qualidade de Vida do idoso residente em lar, observando-se uma correlação positiva e estatísticamente significativa entre a dimensão social da Qualidade de Vida e a dimensão horizontal (esperança) da Espiritualidade.

Assim sendo, torna-se pertinente considerar a dimensão espiritual como um aspeto relevante para a Qualidade de Vida dos idosos, uma vez que as pessoas que perspetivam uma melhor Qualidade de Vida são aquelas que também têm mais esperança no futuro e o encaram com mais otimismo.

Implicações para a Prática Clínica É fundamental que se contemple na prestação de cuidados aos mais velhos que se encontram a residir em lar, a dimensão espiritual como parte integrante do processo desenvolvimental, tão importante como as dimensões biológica, psicológica e social. A Espiritualidade poderá ajudar a pessoa idosa a gerir o seu processo de envelhecimento, muitas vezes acompanhado de situações desencadeadoras de stress, reduzindo a sensação de controlo e esperança que muitas vezes uma situação de institucionalização pode causar, contribuindo de forma positiva para o percurso de um envelhecimento bem-sucedido.


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