Contributos para a definição de uma visão estratégica na construção de um
percurso profissional de sucesso
A questão que constitui o tema da edição das Noites de Sociologiado Porto de
2012 não podia estar revestida de maior pertinência, no atual contexto de
incerteza face ao futuro. As recentes alterações ao código do trabalho e a
consequente flexibilização laboral, a instabilidade profissional, as constantes
revisões em baixa dos relatórios das instituições nacionais e internacionais
que avaliam os indicadores de desempenho do nosso país relativamente às
previsões do Governo, o aumento gradual da taxa de desemprego e a ausência de
expectativas de curto e médio prazo, são indícios bem evidentes da preocupação
dos jovens licenciados, que acabam por não saber o que lhes reserva o seu
futuro profissional.
Algumas alternativas podem adiar essa indefinição, mas não a resolvem
verdadeiramente. É o caso do prolongamento dos estudos e a elevação do grau de
formação académica, que, ainda que desejáveis, mantêm os recém-licenciados numa
espécie de parque de estacionamento, adiando, desse modo, a entrada no mercado
de trabalho. É também o caso dos movimentos migratórios, que parecem acentuar-
se na atual conjuntura. Mas, neste caso, se essa poderá ser uma solução
alternativa e uma oportunidade de mudança para alguns, parece-nos que apenas
ocorrerá em última instância para outros. Podemos ainda referir o próximo
quadro comunitário de apoio ' Quadro Estratégico Comum ' para o período
compreendido entre 2014 e 2020, o qual pode trazer alguma esperança para o
futuro profissional dos nossos jovens. No entanto, ele não deixa de comportar,
ainda, uma boa dose de incerteza.
Na nossa perspetiva, um investimento pessoal e estratégico iniciado no percurso
académico e reiterado em qualquer profissão, poderá, pois, constituir a chave
para uma carreira de sucesso, apesar de todos os constrangimentos que o futuro
previsivelmente possa reservar. E esse investimento deverá passar, em nossa
opinião, e entre outros fatores, por um triângulo concetual, centrado nas
qualificações, nas competências e no marketingpessoal.
No campo das qualificações, elas constituem, sem qualquer margem para dúvida,
um dos pilares onde assenta o futuro que profissionalmente vamos construindo. A
frequência e a conclusão de uma licenciatura encerram, em si, um conjunto de
saberes adquiridos em que alicerçamos esse mesmo percurso profissional, esteja
ele relacionado ou não com a área de formação. Com um curso superior obtemos um
leque de ferramentas ' teóricas, metodológicas e práticas ' indispensáveis ao
exercício de qualquer atividade e que não teríamos, seguramente, sem a sua
frequência.
De resto, a par daqueles que prosseguem uma carreira coincidente com a área da
licenciatura, poderíamos multiplicar os exemplos de casos em que os recém-
licenciados seguem outro rumo, ora em outras áreas do conhecimento, ora em
empregos menos qualificados, mas que se afiguram uma alternativa possível num
mapa nacional caracterizado por baixos índices de empregabilidade e com taxas
elevadas de desemprego jovem. Por este motivo, afirmamos, com segurança, que as
qualificações resultantes de um curso superior desempenham um papel
determinante na construção de uma carreira de sucesso.
O mesmo acontece com os saberes e as competências adquiridos durante a
licenciatura e que se estendem e se enriquecem ao longo de todo o percurso
profissional. Falamos de competências no sentido do desenvolvimento de uma
capacidade que permita responder às necessidades e aos imprevistos da entidade
patronal, bem como da importância da flexibilidade que deve existir em prol do
tipo de atividades que nos propõem realizar, nomeadamente (mas não apenas)
através da mobilização de um conjunto de conhecimentos adquiridos com a
formação de base. Importa, por isso, distinguir aquilo que é a aquisição e
acumulação de saberes num percurso académico, seja ele de maior ou menor
duração e qualificação, daquilo que é a sua aplicação em contexto de trabalho e
a capacidade necessária ' e normalmente valorizada ' para o fazer. Não será
despiciendo afirmar que todos conhecemos autodidatas competentes e diplomados
incompetentes, o que apenas reforça a necessidade de qualificações e
competências andarem de braços dados.
Nesta linha, a realização de trabalhos ocasionais no decurso da licenciatura '
coincidentes, ou não, com a área da formação inicial ' pode comportar um
conjunto de vantagens, algumas delas já enumeradas por outros autores
(Gonçalves, Parente, Veloso, 2004: 269-270), como são disso exemplo: i) a
referência em termos biográficos no momento da seleção para um posto de
trabalho; ii) a inclusão em redes sociais de interconhecimento; iii) a
cooperação dos professores com vista ao ingresso no mercado de trabalho; iv) o
enriquecimento do curriculum vitae. Em oposição, a separação rígida entre o
mercado de trabalho e o mundo universitário, por um lado, e a desvalorização
das atividades profissionais não relacionadas com o perfil desejado, por outro,
podem constituir um forte obstáculo à entrada e/ou permanência no mercado de
trabalho.
Sem negar o papel fundamental da Universidade, do Estado, dos empregadores e de
outros agentes sociais, percebe-se, pelo que expusemos, que o investimento
pessoal se afigura nuclear na construção de uma carreira de sucesso. A
aquisição de saberes e a acumulação de experiência resultam, por isso, em dois
excelentes indicadores a ter em conta para uma boa estratégia de
marketingpessoal, já que nos permitem tomar consciência das nossas limitações '
que queremos eliminar ou minimizar ' e dos nossos pontos fortes ' que desejamos
potenciar, rumo a patamares de excelência profissional.
O marketingpessoal representa um conceito que deve, pois, ser trabalhado
continuamente ao longo de qualquer atividade, mas é, igualmente, um conceito
que pode ser adotado e adaptado logo no momento da formação escolar. Não se
trata de construir uma personagem profissional de cariz fictício; trata-se,
antes, de definir uma visão proeminentemente estratégica e de acionar os
mecanismos necessários para alcançar objetivos pessoais, que possam,
paralelamente, ir de encontro aos objetivos da entidade empregadora.
Com uma boa estratégia de marketingpessoal são também adquiridas algumas
vantagens face aos nossos pares, que podem revelar-se extremamente úteis no
momento da seleção de candidatos ou da avaliação de desempenho. Referimo-nos,
por exemplo, à comunicação interpessoal, à configuração de uma densa malha de
relacionamentos e à edificação de uma forte imagem pessoal. Para tal, podem ser
deixadas no traçado académico e profissional algumas marcas (i) de otimismo
(sabendo aceitar críticas construtivas), (ii) de empatia (valorizando o
trabalho dos outros), (iii) de espírito de equipa, (iv) de solidariedade
(pessoal e profissional), (v) de visão estratégica (propondo soluções
inteligentes) e (vi) de liderança (tentando exercer uma boa influência nos
outros), entre outras, capazes de fomentar uma imagem e uma visibilidade
profissionais que abram caminho a uma carreira bem-sucedida3.
Não é difícil vislumbrar, portanto, que uma estratégia que congregue o melhor
de cada um dos conceitos referidos poderá, mais facilmente, responder às
exigências dos empregadores e aos desafios com que nos deparamos em qualquer
profissão. Em simultâneo, uma estratégia visionária contribuirá, seguramente,
para a obtenção de melhores resultados pessoais e profissionais, num mercado de
trabalho cada vez mais seletivo e em que os desafios parecem aumentar em
proporção direta ao decréscimo das oportunidades. O caminho é estreito e
sinuoso, mas a sua consciencialização e consequente adaptação terão fortes
impactos no reconhecimento pessoal, social e profissional.
No atual contexto laboral, a polivalência de funções, a adaptação à
modernização tecnológica, a capacidade de aplicarmos e correlacionarmos saberes
teóricos e saberes práticos e a disponibilidade para nos voluntariarmos em
determinados momentos são fatores-chave para o sucesso pretendido. Dito de
outra forma, impõe-se a criação de um perfil de banda larga, que junte saberes
escolares a outros instrumentos transversais de aquisição de conhecimentos, que
possibilite a aprendizagem de saberes procedimentais, que permita
operacionalizar saberes relacionais e, ainda, que seja capaz de alargar as
capacidades de interagir, comunicar e cooperar (Parente, 2004: 305-306). Um
perfil capaz, enfim, de construir um percurso profissional de sucesso.
Notas
1 O presente artigo resulta de uma comunicação feita nas Noites de Sociologiada
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, no dia 25 de maio de 2012.
2 Sociólogo. Técnico Superior de Sociologia da Câmara Municipal de Santo Tirso
(Santo Tirso, Portugal). Investigador do Instituto de Sociologia da Faculdade
de Letras da Universidade do Porto (ISFLUP) (Porto, Portugal). Endereço de
correspondência: Câmara Municipal de Santo Tirso, Praça 25 de Abril, 4780-373
Santo Tirso, Portugal. E-mail: rsantos@cm-stirso.pt ; rsantos@letras.up.pt
3 Estes e outros pontos-chave que podem contribuir para um marketing pessoal de
excelência podem ser consultados, por exemplo, em: http://marketingpessoal.org/
128-marketing-pessoal-excelencia/