Marketing de ideias e construção de redes: As duas vias
de atracção de recursos para novos empreendimentos
Os recursos têm um papel crítico na capacidade que um empreendedor tem para estabelecer
um novo empreendimento. As explicações sobre a forma como os empreendedores adquirem os
recursos de que necessitam têm enfatizado, ou o papel dos empreendedores como caçadores
activos de recursos (principalmente ao nível dos traços de personalidade) (e.g. Baum & Locke, 2004)
ou os constrangimentos que a disponibilidade de recursos pode apresentar à actividade empreendedora,
numa dada sociedade ou comunidade (e.g. Ring, Bigley, D’Aunno, & Khana, 2005; Busenitz,
Gómez, & Spencer, 2000). De facto, o nível de recursos disponíveis para os empreendedores de
uma dada comunidade, relativamente ao estabelecimento e desenvolvimento de novos empreendimentos,
é um determinante fundamental para a actividade empreendedora e para o dinamismo económico dessa
mesma comunidade (Johannisson, 2000). Um ambiente empreendedor favorável deve, portanto,
apresentar um valor preditivo relativamente ao sucesso de um novo empreendimento.
No entanto, mesmo em ambientes favoráveis, muitos empreendedores continuam sem conseguir
reunir as condições necessárias para criar um novo empreendimento ou para fazê-lo crescer e prosperar
no longo prazo. Por outro lado, existem empreendimentos bem sucedidos que emergem e prosperam
em ambientes bastante adversos e hostis (Thompson, 2004). De acordo com o defendido por alguns
autores, estas situações demonstram o papel que as características individuais têm na activação e
mobilização dos recursos disponíveis no ambiente, levando à necessidade de uma abordagem que
concebe o comportamento empreendedor como um resultado tanto das limitações ambientais como das
características individuais. Tal abordagem conduz a uma visão dos empreendedores enquanto
construtores activos dos seus ambientes, no sentido em que se revelam mais ou menos capazes de
activar potenciais recursos do seu ambiente, que apoiem as suas iniciativas (Smircich & Stubbart,
1985; Weick, 1979). Como tal, não podemos considerar os empreendedores como independentes
dos ambientes onde se encontram, mas também não os devemos considerar vítimas fatalistas dos
mesmos.
O objectivo deste artigo é apresentar uma abordagem que explique o modo como os empreendedores reúnem recursos vitais, por forma a criarem e desenvolverem novos empreendimentos
bem sucedidos. A abordagem é colocada ao nível das relações estabelecidas entre os empreendedores e aqueles com quem interagem tendo em conta o empreendimento. Estas relações são aqui designadas
de magnéticas para indicar o efeito de atracção que elas exercem ao ajudar os empreendedores a
adquirir recursos fundamentais enquanto elaboram e põem em prática as suas ideias empreendedoras
(recursos financeiros, humanos, de informação, tecnológicos e físicos). Ao focar a nossa análise no
domínio das relações da actividade empreendedora, não nos cingimos apenas às características
individuais ou ao contexto empreendedor. Em vez disso, assumimos uma perspectiva de interacção,
que analisa de perto o modo como o empreendedor se relaciona com os detentores de recursos
importantes de que precisa para implementar e desenvolver o seu novo empreendimento.
Este artigo contribui para o campo do empreendedorismo por três ordens de razão: em primeiro
lugar, oferece uma abordagem coerente e compreensiva – as relações magnéticas – para analisar a
recolha de recursos na fundação e no desenvolvimento de novos empreendimentos e aponta
estratégias úteis para os empreendedores melhorarem as suas capacidades de aquisição de recursos.
Segundo, apresenta diferentes vias que os empreendedores podem tomar para atrair os outros e
atraí-los a apoiarem o seu empreendimento. Terceiro, a abordagem apresentada revela, dado o seu
enfoque ao nível das relações, uma possível forma de ultrapassar os antagonismos entre os
determinantes contextuais e individuais na criação e desenvolvimento de novos empreendimentos.
Começaremos o artigo por referir a literatura que tem destacado o papel crucial da atracção
de recursos na actividade empreendedora. Depois, discutimos duas perspectivas tradicionalmente
opostas sobre o empreendedorismo e apresentamos a abordagem sobre as relações magnéticas como
uma potencial solução para abordar a natureza interaccional da relação indivíduo/estrutura. De
seguida, elaboramos o conceito de relações magnéticas e desenvolvemos a nossa abordagem sobre
magnetização de recursos baseado em duas facetas e quatro dimensões. Por último, discutimos as
maiores contribuições teóricas do artigo e referimos as implicações práticas para aqueles que estão
a tentar atrair recursos para estabelecer e desenvolver, com sucesso, novos empreendimentos.
A atracção de recursos e o sucesso dos novos empreendimentos
Atrair recursos para um novo empreendimento ou negócio é provavelmente o maior desafio
que os empreendedores enfrentam (Brush, Green, & Hart, 2001). É também o factor mais crucial
na determinação do desenvolvimento e sucesso de novos empreendimentos. Alguns autores
conceptualizaram, inclusive, o empreendedorismo, como a própria aquisição, combinação e redistribuição
de recursos que fornecem novos produtos e serviços através da criação de novas organizações e até
de novos mercados (Bygrave, 1993). É certo que a atracção de recursos vitais não é um factor
suficiente para o sucesso do empreendimento. Os empreendedores têm também de configurar
novas operações e novos sistemas organizacionais. Mas o papel dos recursos é fundamental. De
facto, novos empreendimentos emergem apenas quando os empreendedores são bem sucedidos na
mobilização de recursos em resposta a oportunidades percebidas (Aldrich & Fiol, 1994).
O papel crucial da atracção de recursos para a criação e sucesso de um novo empreendimento
requer, portanto, que os empreendedores se tornem altamente especializados na recolha e gestão de
recursos. Alinhados com esta visão, Baum e Locke (2004: 589) definiram a competência “novos
recursos” como a capacidade para adquirir e sistematizar os recursos operacionais necessários para
iniciar e desenvolver uma organização. Os empreendedores eficazes devem pois possuir uma
elevada capacidade para atrair recursos ou, como designamos na nossa abordagem, magnetizar
recursos importantes e os respectivos detentores desses recursos.
No campo do empreendedorismo foram já indicados vários tipos de recursos que são importantes
para a criação e desenvolvimento de um novo empreendimento. Shane e Venkataraman (2000)
referiram o dinheiro, as pessoas e a informação como os recursos básicos para actividades de start-up
e para o desenvolvimento de novos empreendimentos. Ao analisarem as relações entre os
empreendedores e as suas redes nucleares, Renzulli e Aldrich (2005) encontraram quatro tipos de
recursos relevantes para o crescimento de um empreendimento: legais, de empréstimo, financeiros
e aconselhamento de peritos. Uma tipologia de recursos mais exaustiva para as actividades
empreendedoras foi referida por Brush et al. (2001). Para estes autores, os recursos vitais para
implementar um novo negócio podem ser agrupados em seis tipos, nomeadamente, humanos, sociais,
financeiros, físicos, tecnológicos e organizacionais. De acordo com a nossa perspectiva, a abordagem
de relações magnéticas que introduzimos neste artigo pode ser aplicada à recolha de qualquer um
destes tipos de recursos, embora possamos considerar a existência de diferentes estratégias para atrair
cada um deles.
Contexto e personalidade: Dois pontos de vista sobre o empreendedorismo
O empreendedorismo não é um assunto novo nas áreas da economia (e.g. Schumpeter) e da
gestão (e.g. Drucker). No entanto, tem-se verificado um recente incremento no interesse por esta
área devido, em grande medida, à evolução da Internet e à explosão de pequenos negócios a que
assistimos no final do século XX (Formaini, 2001). Vários autores defendem que o empreendedorismo
é o verdadeiro condutor do crescimento económico nas sociedades capitalistas que dominam o mundo
ocidental (Newbert, 2005), chegando mesmo a considerá-lo o “motor do processo capitalista”
(Formaini, 2001).
Os economistas clássicos que introduziram inicialmente o conceito de empreendedorismo
(e.g. Cantillon) não deram uma atenção significativa aos indivíduos que conduziam o processo de
criação de novos empreendimentos. Para estes teóricos, a produção industrial era um dado adquirido
e, como tal, o papel dos factores produtivos individuais não requeria uma maior elaboração. Ao
contrário desses economistas clássicos, Schumpeter (1961) salientou o papel preponderante do
empreendedorismo individual, argumentando que o empreendedor é o principal responsável pela
introdução de mudança num sistema económico comercialmente organizado. Neste sentido, o
empreendedorismo passou a ser encarado como uma característica individual (McFarling, 2000).
Esta dualidade entre o que pode ser chamado como uma perspectiva macro e uma perspectiva
micro do empreendedorismo veio a estender-se a outras ciências humanas – especialmente à
sociologia e à psicologia – à medida que estas começaram a investigar esta temática. Os sociólogos
privilegiaram o estudo de factores socio-demográficos e culturais para explicar o fenómeno
empreendedor (macro/estrutural) (e.g. Steensma, Marino, Weaver, & Dickson, 2000; Katila &
Shane, 2005), enquanto que os psicólogos favoreceram uma abordagem individual de traço
(micro/comportamental), desprezando em grande medida a influência dos constrangimentos
ambientais (e.g. Crant, 1996; McClelland & Winter, 1969).
Ao nível macro, a investigação focou-se principalmente nos constrangimentos ecológicos
dos empreendedores e dos novos empreendimentos. Por exemplo, Stewart, Carland, Carland,
Watson e Sweo (2003) verificaram, num estudo comparativo entre empreendedores americanos e
russos, que as disposições empreendedoras variavam de acordo com a cultura nacional. Da mesma
forma, Blanchflower e Oswald (1998) encontraram evidências de que os constrangimentos
financeiros e de liquidez constituem as principais forças de influência na actividade empreendedora.
Nesse mesmo estudo, os resultados de testes psicológicos não se revelaram preditores significativos da
possibilidade dos indivíduos virem a ter um auto-emprego no futuro (um proxy usado pelos autores
para medir empreendedorismo). Da mesma forma, Wang e Ang (2004), numa amostra de firmas de
capital de risco em Singapura, encontraram, também, evidências empíricas de que a riqueza de
oportunidades para empreendimentos corporativos, as oportunidades tecnológicas contextuais, assim
como a hostilidade ambiental, predizem o crescimento financeiro de novos negócios. Estes autores
concluíram então que o ambiente constitui um elemento principal da actividade empreendedora,
actuando como um constrangedor ou facilitador.
A par desta abordagem macro, assistiu-se também à emergência de uma perspectiva mais
micro do empreendedorismo, que se centrou, privilegiadamente, nas características do empreendedor.
Thomson (2004), por exemplo, desenvolveu um indicador para identificar o potencial do empreendedor.
Este autor não só concebeu o empreendedorismo ao nível individual, como também enquadrou na
sua abordagem as capacidades inatas dos empreendedores. Do mesmo modo, outros tomaram uma
posição inatista face ao comportamento empreendedor (e.g. Harrison, 2005), defendendo o talento
como o seu melhor preditor. É neste sentido que Thomson (2004: 246) define talento como um
conjunto de características importantes ou capacidades inatas com que nascemos, mas que têm de
ser descobertas.
Outros autores, apesar de não defenderem necessariamente uma perspectiva inatista, consideraram diversas variáveis psicológicas como potenciais variáveis explicativas do comportamento
empreendedor. É o caso do conceito de orientação empreendedora de Lumpkin e Dess (1996), do
estudo da influência dos motivos de realização na orientação empreendedora de Sagie e Elizur
(1999), ou do efeito da paixão e da tenacidade no crescimento de um empreendimento, de Baum e
Locke (2004) [uma revisão exaustiva da literatura sobre este assunto pode ser encontrada em Baron
(2002)].
Numa tentativa de desenvolver uma visão mais global do empreendedorismo, vários autores
propuseram modelos mais integrativos para explicar a criação de novos empreendimentos (e.g.
Shook, Priem, & McGee, 2003; Gartner, 1985). No entanto, de um modo geral, estes modelos
tendem a apresentar ainda uma visão incompleta do empreendedorismo, por duas grandes ordens
de razões. Primeiro, tendem a focar-se exclusivamente no processo de formação do empreendimento,
ignorando largamente o subsequente desenvolvimento do negócio e o seu sucesso no futuro.
Segundo, embora estes modelos contemplem diferentes níveis de variáveis – micro e macro –
acrescentam pouco acerca das relações entre essas mesmas variáveis (relações inter-níveis).
Relações magnéticas: Uma perspectiva de nível meso
A tendência para a dicotomização (micro versus macro) encontrada nos estudos sobre
empreendedorismo não é nova na investigação no âmbito da gestão. Na realidade, esta tendência
tem ocupado uma posição central em alguns campos de estudo das ciências organizacionais, como é o
caso do comportamento organizacional (House, Rousseau, & Thomas-Hunt, 1995; Rousseau, 1985).
Esta tendência reducionista, quer para o indivíduo, quer para o contexto, conduz-nos à necessidade de
procurar uma abordagem integrativa e multinível (Kozlowsky & Klein, 2000; Klein, Tosi, &
Cannella, 1999; Klein, Dansereau, & Hall, 1994; Hackman, 2003). As perspectivas multinível, para
além de proporem o estudo simultâneo de ambas as explicações de nível macro e micro, bem como
das relações entre os dois níveis de análise, sublinham, de igual modo, a necessidade de olhar para o
nível meso, um nível que se refere às relações através das quais os indivíduos interagem com o seu
contexto (Rousseau & House, 1994). É a este nível que posicionamos a nossa abordagem de
relações magnéticas (Figura 1).
De acordo com a nossa abordagem, os empreendedores adquirem os recursos de que necessitam através do estabelecimento de relações com aqueles que detêm recursos importantes. Estes
recursos incluem mais valias humanas, de informação, financeiras e tecnológicas que o empreendedor deve ser capaz de atrair para apoiar o seu empreendimento. A abordagem contempla também
duas vias possíveis para os empreendedores exercerem o seu efeito magnético sobre os detentores
de recursos.
A ideia de usar o magnetismo como uma metáfora para a forma como os empreendedores
atraem os recursos necessários à criação e desenvolvimento de um novo empreendimento, resultou
da nossa posição ontológica sobre a abordagem interaccional ao nível meso. Considerando a actividade
empreendedora como o resultado da interacção indivíduo/contexto, tomámos por base o trabalho de
Kurt Lewin. Para Lewin (1951), o comportamento social pode ser analisado a partir de uma visão do
espaço social como um campo magnético onde todos os elementos se encontram inter-relacionados
para simultaneamente determinarem o comportamento individual e colectivo. Como tal, os indivíduos
não são vistos como independentes dos seus contextos, mas também não é o seu comportamento
visto como mecanicamente causado por qualquer outro factor isolado. Em vez disso, o que explica
o comportamento do sistema são as relações estabelecidas entre todos os elementos no campo. De
certa forma, esta é uma abordagem possível de análise que supera a dicotomia entre as características
individuais e os constrangimentos contextuais que encontramos na literatura.
As características análogas entre um campo electromagnético e um campo social podem deste
modo ser exploradas. Martin (2003) sumariza estas características da seguinte forma: (1) é possível
explicar mudanças ocorridas num elemento do campo sem observar mudanças no estado de outro
elemento (sendo a sua causa o estado do campo como um todo); (2) as mudanças comportamentais
num elemento envolvem a interacção entre o campo e o elemento; (3) os elementos têm atributos
particulares que os tornam susceptíveis a um efeito do campo; (4) em qualquer posição, o campo é
um vector de força potencial que não está distribuída ao acaso.
Isto significa que um elemento pode exercer um certo efeito atractivo não pela sua influência
directa, mas por via da sua posição no campo social. Uma abordagem de campo magnético também
assume que os elementos num campo têm forças magnéticas diferentes devido aos seus atributos
particulares, o que vai ao encontro da nossa abordagem de relações magnéticas que propõe duas
vias através das quais os empreendedores podem atrair e adquirir os recursos vitais de que necessitam
para implementar as suas iniciativas. Na secção seguinte, explicamos em maior detalhe a abordagem
que propomos.
Marketing de ideias e construção de redes: As duas facetas das relações magnéticas
Definimos relações magnéticas como aquelas através das quais os outros se sentem propensos
a interagir com, e a apoiar, o empreendedor, disponibilizando os recursos necessários à implementação
de um dado empreendimento. Nesta secção, elaboramos a forma como um empreendedor pode estabelecer
um efeito magnético sobre aqueles de que precisa, ao introduzir duas formas conceptualmente distintas
de atracção magnética: o marketing de ideias e a construção de redes (Figura 1).
No trabalho clássico “Sobre a Alma” (De Anime), Aristóteles (1952) indicou que o movimento
de um corpo podia ser causado tanto directamente (devido a algo que não o próprio) como indirectamente (devido a si próprio). Do mesmo modo, defendemos que os empreendedores, ao levarem a
que outros se movam em direcção a si e aos seus empreendimentos, podem fazê-lo tanto de uma
forma directa como indirecta (Figura 2).
No primeiro caso, o empreendedor procura influenciar activamente os que detêm recursos
importantes (e.g. investidor, empregado com potencial valioso, financiador) para que estes apoiem
as suas actividades empreendedoras, especialmente através dos seus recursos (Figura 2a). Chamamos
“marketing de ideias” a esta faceta magnética, pois o empreendedor relaciona-se com os outros como
se estivesse a convencê-los a “comprar” a sua ideia, levando-os a sentirem-se atraídos pela mesma.
No segundo caso, o empreendedor atrai indirectamente estes recursos e aqueles que os detêm,
através da sua posição numa dada rede social (Figura 2b). Por exemplo, os detentores de recursos
importantes podem sentir uma atracção pelo empreendedor por este ocupar uma posição de intermediário
(“broker”) no que diz respeito ao alcance das suas realizações (os próprios objectivos dos outros).
Os empreendedores podem também tornar-se muito procurados se possuírem uma posição de elevado
status numa dada rede social. Nestes casos, o efeito magnético do empreendedor é particularmente
indirecto. A esta capacidade dos empreendedores parecerem ser capazes de construir activamente as
suas próprias redes, designamos “construção de redes”.
Nas secções seguintes será explicado, de uma forma mais aprofundada, como cada uma destas
facetas pode ajudar os empreendedores a obterem mais recursos, sendo também apresentadas as
dimensões incluídas em cada uma delas.
Marketing de ideias: A faceta directa das relações magnéticas
O marketing de ideias refere-se às relações magnéticas onde o empreendedor procura intencionalmente o contacto com os detentores de recursos-chave, tentando atrair deles esses recursos,
bem como o compromisso necessário para que estes apoiem a sua iniciativa. Para adquirir os
recursos necessários para novos empreendimentos e negócios, o empreendedor terá de “vender” as
suas ideias àqueles que lhe podem fornecer aquilo de que precisa. Surpreendentemente, existe pouca
investigação sobre empreendedorismo que contemple a questão de como podem os empreendedores
melhorar a forma como vendem as suas ideias para reunirem os recursos de que precisam, sendo a
referência de Baron e Markman (2000) à persuasão e influência, uma notável excepção.
Dada esta falha considerável nos estudos de empreendedorismo, baseámo-nos em literatura
fora do campo do empreendedorismo para melhor elaborar as dimensões subjacentes ao marketing
de ideias. Particularmente útil é o conceito de “marketing de assuntos” (Dutton & Ashford, 1993).
O marketing de assuntos refere-se ao comportamento dos indivíduos direccionado para influenciar
a atenção dos outros e a sua compreensão relativamente a determinados assuntos (Dutton & Ashforth,
1993: 397). Dutton, Ashford, O’Neill e Lawrence (2001) analisaram empiricamente o marketing de
assuntos numa amostra de gestores e sistematizaram um conjunto de “movimentos” que os gestores
usavam para vender os seus assuntos pessoais e despoletar a mudança organizacional. Mesmo
reconhecendo todas as diferenças que existem entre empreendedores e gestores, podemos, ainda
assim, conceber a actividade dos empreendedores como a de vender “um assunto” a outros, um assunto
que é, neste caso, o seu próprio empreendimento. Assim, a literatura sobre marketing de assuntos constitui
um bom enquadramento para o refinamento teórico sobre o que podem os empreendedores fazer para
estabelecerem relações magnéticas directas com interlocutores importantes.
A partir da análise desta literatura, consideramos duas dimensões principais para descrever a
faceta de marketing de ideias: a capacidade de comprometimento e a persuasão. Apresentamos, de
seguida, uma explicação sobre cada uma delas.
Capacidade de comprometimento. A literatura recente no âmbito da gestão tem vindo a focar
os processos que levam as pessoas a envolverem-se totalmente e de forma produtiva, entusiasta e
enérgica, numa determinada tarefa ou projecto (Csikszentmihalyi, 2003). Estes autores têm feito um
esforço para compreender os mecanismos através dos quais as pessoas se sentem envolvidas com
uma certa actividade, ideia ou projecto. Dutton (2003) considera as “relações de elevada qualidade”
como tendo uma influência importante sobre a forma como se sentem no seu trabalho, pessoas
energizadas e comprometidas. Também no caso dos empreendedores, a capacidade de comprometer
os outros é certamente uma capacidade crítica. Só a partir do momento em que alguém se sente
comprometido com um determinado projecto ou empreendimento é que decidirá apoiá-lo activamente.
Assim, para serem eficazes no marketing de ideias, os empreendedores devem tornar-se, antes de
mais, indivíduos capazes de comprometer os outros com os seus projectos.
As pessoas tornam-se comprometidas (“engaged”) quando sentem que podem desempenhar
papéis nos quais agem em conformidade com o seu verdadeiro self (Kahn, 1990). Isto significa que,
quando uma pessoa percebe que vale a pena e se sente útil e valorizada, tende a comprometer-se
mais com o apoio a um determinado projecto. Neste sentido, ao interagirem com os detentores de
recursos importantes os empreendedores devem também estruturar as suas comunicações com conteúdos
dotados de significado para esses outros, por forma a conseguirem atraí-los directamente. Tal é
possível fazendo com que os outros associem um significado pessoal ao empreendimento que o
empreendedor lhes está a vender. A utilização de significados enquanto se vende um assunto pode
mais facilmente levar a que os outros desenvolvam acções relacionadas com esse mesmo assunto
(Dutton & Ashford, 1993). Como tal, ao venderem as suas ideias, os empreendedores devem comunicar
aos outros um retrato claro da sua posição (Bird & Brush, 2003), comprometendo-os, deste modo, por
via do recurso a significados distintos, consoante o seu interlocutor. Por exemplo, enquanto o foco do
significado para um investidor financeiro deve incidir sobre o retorno do investimento, o significado
utilizado para atrair um potencial colaborador deve estar relacionado com a possibilidade de o
empreendimento lhe garantir um projecto de carreira aliciante. Os significados apresentam, contudo,
uma natureza contextual e específica. Certos investidores podem, por exemplo, entender como
mais relevante a exequibilidade do empreendimento a longo-prazo do que o retorno a curto-prazo
dos seus investimentos. Isto apoia a ideia de que o “marketing de significados” deve ser cuidadosamente
analisado antes da interacção com qualquer detentor de recursos.
Conjuntamente com o esforço de comprometer os outros, os empreendedores devem também
preocupar-se com a redução dos potenciais factores que podem levar as pessoas com quem interagem
a deixarem de estar comprometidas com o seu empreendimento. Um elemento que pode conduzir a
que as pessoas se afastem de um determinado projecto é a insegurança. A insegurança gera
ansiedade, diminuindo a energia que poderia, de outra forma, ser canalizada e traduzida em maior
comprometimento (Kahn, 1990). Um clima seguro, pelo contrário, estimula o significado e o comprometimento (May, Gilson, & Harter, 2004). Isto é particularmente preocupante para os empreendedores
porque, dado o carácter arriscado da sua actividade, raramente são capazes de fornecer uma segurança
objectiva àqueles com quem interagem (Shane & Stuart, 2002). A literatura sobre empreendedorismo já
abordou acções estratégicas que podem ser desenvolvidas para superar esta perda de comprometimento
que deriva de uma elevada percepção de risco.
Algumas destas estratégias salientam a necessidade de criar uma “ilusão” de segurança. Aldrich
e Fiol (1994: 651) indicaram que os empreendedores devem concentrar-se no enquadramento do
desconhecido, por forma a torná-lo credível. A ideia é agir “como se” o empreendimento fosse já
uma realidade. O conceito de visão empreendedora, proposto por Bird e Brush (2003), pode
também ajudar-nos a derivar formas frutíferas para reduzir a incerteza e aumentar o comprometimento
dos detentores de recursos com o empreendimento. Uma visão empreendedora é uma imagem
mental dos produtos, serviços e organização, que o empreendedor pretende alcançar. A visão
empreendedora inclui uma imagem do futuro, tal como é visto pelo empreendedor, e serve para
demonstrar a “quem vê”, um futuro possível onde são preenchidos os valores correntes ou as necessidades
ainda não alcançadas (Bird & Brush, 2003: 8). Os empreendedores eficazes expressam normalmente
estados futuros usando desenhos, metáforas, gráficos e histórias. Ao fazê-lo, estão a criar o contexto
interactivo para levar a que os outros se sintam cada vez mais comprometidos com a sua ideia. Os
detentores de recursos assim comprometidos, ao sentirem-se atraídos pelo papel que podem
desempenhar no novo empreendimento, mais provavelmente o poderão apoiar.
As capacidades psicológicas positivas de um empreendedor jogam também um papel importante
na redução das ameaças percebidas e dos medos sentidos por parte dos detentores de recursos, que podem
surgir enquanto investem o seu tempo, dinheiro e esforço no empreendimento. As capacidades
psicológicas positivas dos empreendedores como a auto-eficácia (Markman & Baron, 2002), o
optimismo (Cooper, Woo, & Dunkelberg, 1988), a proactividade (Lumpkin & Dess, 1996) e a
esperança (Jensen & Luthans, 2003), têm sido encontradas como estando relacionadas com o
comportamento empreendedor e/ou sucesso do empreendimento. Apesar destes estudos não se
focarem na questão específica do comprometimento de detentores de recursos, é fácil prever o seu
efeito positivo na qualidade das relações magnéticas dos empreendedores, dado que estas capacidades
têm sido apontadas como tendo um papel positivo e determinante nos processos de mudança organizacional
(Cameron & Caza, 2004).
De salientar que, a capacidade de envolver os outros, não se refere explicitamente a uma forma
intencional de persuasão por parte do empreendedor para que os outros apoiem o seu empreendimento.
No entanto, poderíamos acrescentar que os empreendedores também podem e tentam explicitamente
persuadir e influenciar os detentores de recursos de que precisam. Este tipo de atracção será, de seguida,
desenvolvido ao longo da discussão da segunda dimensão do marketing de ideias – a persuasão.
Persuasão. As competências sociais de um empreendedor, tal como a capacidade para
comprometer os outros, têm um papel importante na atracção de recursos vitais. Primeiro, as
competências sociais estão relacionadas com o capital social, estando por isso associadas à
obtenção de acesso a importantes redes sociais e recursos (Shane & Cable, 2002). Segundo, as
competências sociais determinam também a actividade empreendedora porque, a partir do momento
em que um indivíduo obtém acesso a uma dada pessoa ou rede, são essas competências sociais que o
conduzem ao alcance dos seus objectivos. Nas palavras de Baron (2002):
«...se os empreendedores não forem capazes de formar uma boa primeira impressão
nestas pessoas, ou de as persuadir da validade das suas ideias ou novos produtos, eles não
irão obter o suporte – financeiro ou outro – que estão à procura» (p. 248)
As competências de persuasão assumem um papel fundamental para os empreendedores
conseguirem obter o apoio de que necessitam por parte daqueles que detêm recursos relevantes (i.e.
para exercerem um efeito magnético sobre eles). A persuasão refere-se à capacidade de mudar as
atitudes e o comportamento de outros na direcção desejada (Baron & Markman, 2000). Vender
uma ideia requer elevadas competências de persuasão, no sentido de despoletar um movimento, no
sentido do novo empreendimento, por parte daqueles que detêm determinados recursos-chave. Nos
seus esforços para “vender” a sua ideia aos outros, o empreendedor pode usar várias estratégias de
persuasão. Tendo como base o trabalho sobre o marketing de assuntos (Dutton et al., 2001), consideramos
duas estratégias de persuasão como relevantes para descrever o modo como os empreendedores
vendem as suas ideias. Estas estratégias são: (1) apresentar a ideia com a lógica de um plano de
negócios e (2) apresentar o empreendimento como estando associado a outros assuntos valorizados
por quem detém os recursos.
A primeira estratégia de persuasão refere-se à apresentação de planos de negócio formais, de
números simbólicos, e de gráficos, que reforçam uma imagem de lógica e coerência da actividade
empreendedora. Esta é uma forma muito importante de ganhar legitimidade e os empreendedores
devem usá-la extensivamente para persuadir investidores de capital, conhecidos especialistas de
negócios e recursos humanos valiosos (Ames, 1989; Rich & Gumpert, 1985). Esta é, portanto, uma
estratégia potencial para atrair recursos para o novo empreendimento.
A segunda estratégia, chama a atenção para a necessidade de associar directamente as actividades
empreendedoras aos interesses dos detentores de recursos. Dutton et al. (2001) identificaram a relação
entre assuntos como uma estratégia usada pelos “vendedores de assuntos” em que estes associavam
deliberadamente um assunto a outras ideias que estavam a circular na organização. Nós estendemos
esta estratégia ao marketing de ideias empreendedoras e, defendemos especificamente, que o
empreendedor deve relacionar a sua ideia empreendedora a assuntos que são previamente conhecidos
como sendo do interesse daqueles que detêm os recursos. Ao fazê-lo, o empreendedor permite que
o investidor crie uma expectativa de resultados positivos, que resultará no estabelecimento de uma
relação de apoio. As expectativas de resultados positivos são conhecidas na literatura da psicologia
como sendo fortes determinantes motivacionais (Vroom, 1964). Assim, para obter um efeito magnético
directo sobre os detentores de recursos importantes, os empreendedores devem persuadi-los, associando
a actividade empreendedora aos próprios interesses dos detentores de recursos.
Construção de redes: A faceta indirecta das relações magnéticas
A construção de redes refere-se ao tipo de relações magnéticas onde o empreendedor
indirectamente, embora de forma deliberada, cria uma tal posição nas suas redes sociais, que leva a
que outras pessoas tendam a procurá-lo e a fornecer-lhe os recursos de que ele precisa para estabelecer
um novo empreendimento.
Ao contrário do conceito de marketing de ideias, onde parece existir uma escassa investigação
sobre o tópico, as redes sociais foram, desde há muito, identificadas como um factor determinante
para o empreendedorismo (Aldrich & Zimmer, 1986). Para além de ajudarem a explicar o porquê dos
empreendedores abrirem com sucesso novos negócios (Renzulli, Aldrich, & Moody, 2000), as
redes sociais são também um factor importante para compreendermos o desenvolvimento de novos
empreendimentos (Ostgaard & Birley, 1996).
No entanto, muitos destes estudos abordaram as redes empreendedoras segundo uma visão
bastante estática e apriorística. Ruef, Aldrich, e Carter (2003), por exemplo, analisaram a estrutura
de equipas fundadoras de novos empreendimentos olhando apenas para características estáveis e
imutáveis, tais como, o género, a etnicidade ou a experiência profissional. Ao tomarem tal posição,
estes autores não focalizaram o potencial dos empreendedores eficazes para interagirem com a sua
rede de uma forma bidireccional, nem conceberam a posição na rede como algo que pode ser activamente
construído.
Nós, pelo contrário, encaramos a faceta “construção de rede” numa perspectiva plástica e
mutável de posições na rede. Neste sentido, mesmo que os empreendedores não consigam ou não
possam associar-se a uma determinada pessoa de que precisam, podem sempre mudar a sua
posição na rede e, através do aumento da centralidade ou densidade, atrair aquela pessoa de uma
forma indirecta. Por essa razão, considerámos este tipo de relação magnética como sendo indirecta.
De seguida, serão exploradas as duas dimensões principais desta faceta magnética: a posição
na rede e a legitimidade. Acreditamos que estas dimensões podem fornecer pistas estratégicas sobre
como podem os empreendedores indirectamente aumentar os seus efeitos magnéticos sobre aqueles
de quem precisam.
Posicionamento na Rede. As redes têm constituído uma área proeminente em estudos sobre o
empreendedorismo (Johannisson, 2000). Esses estudos têm sublinhado a estrutura da rede social como
uma mais valia importante para actividades empreendedoras, chegando mesmo a considerar os contactos
de rede como o factor primordial do quanto um novo empreendimento alcançará o sucesso (MacMillan,
1983). Parece assim que, uma boa posição na rede está associada, em grande medida, a uma maior
probabilidade de sucesso de empreendimentos inovadores (Smith-Doer, Manev, & Rizova, 2004).
Particularmente relevante para o empreendedorismo é a posição do empreendedor na rede.
Yang (2004) aludiu ao “positional embeddedness” para se referir à posição de um elemento na
estrutura global de uma rede e aos efeitos que essa posição provoca no acesso desse elemento à
informação. O nosso argumento aqui é o de que os empreendedores que se mostram capazes de
construir melhores posições na rede, têm uma maior probabilidade de atrair para os seus projectos
aqueles que são detentores de recursos importantes.
Duas grandes perspectivas têm dominado a literatura sobre posição em redes sociais: enclausuramento da rede (“network closure”) e buracos estruturais (“structural holes”) (Burt, 2000). O
enclausuramento da rede reflecte-se na densidade da rede do empreendedor e na centralidade do
empreendedor na rede. A densidade da rede diz respeito ao grau em que a rede de um indivíduo
está completa, no sentido em que todas as relações possíveis entre a vizinhança do indivíduo estão
presentes (Scott, 2000). A densidade reflecte, assim, o nível de conectividade entre os elementos
de uma dada rede (Yang, 2004). Se uma elevada densidade facilita ou limita as actividades
empreendedoras é ainda uma questão em debate. Alguns defendem que uma rede densa deve estar
negativamente associada a uma orientação empreendedora, pois reforça a conformidade e a
interdependência (Yang, 2004). Outros, pelo contrário, vêem a densidade como um factor positivo de
influência sobre a inovação, dada a comunicação em profundidade e a troca de informação que promove
(Nahpiest & Goshal, 1998). Para além disso, empreendedores com uma rede de elevada densidade
estão mais propensos a encontrar fornecedores de recursos na sua rede central de negócio (Renzulli
& Aldrich, 2005), não tendo, portanto, que perder tempo e esforço na procura em redes exteriores.
Talvez menos discutíveis sejam os benefícios da centralidade na rede para os empreendedores. A
centralidade refere-se à extensão em que uma pessoa ocupa um papel principal numa rede em
termos do quanto ela interage e troca recursos com outros. Dito de outra forma, a centralidade diz
respeito ao grau em que um indivíduo se encontra no meio de outros, nessa mesma rede (Cross &
Parker, 2004).
Os buracos estruturais propõem uma perspectiva diferente sobre a posição na rede. Estes
buracos constituem lacunas que existem entre contactos não redundantes e representam as oportunidades de intermediação (“brokerage”) (Burt, 1992). Posições intermediárias são portanto posições
importantes, uma vez que os intermediários têm acesso ao controlo de certos projectos e recursos
que unem pessoas de diferentes redes. Isto acontece porque os indivíduos que ocupam posições
nos buracos estruturais são aqueles que conhecem, participam e exercem controlo sobre as oportunidades mais compensadoras (Burt, 2000: 355). De acordo com esta perspectiva, uma posição na
rede favorável à actuação do empreendedor deriva mais de ligações muito frequentes e heterogéneas do que de um pequeno conjunto de ligações fechadas e fortes, o que realça a vantagem das
ligações fracas (“weak ties”) encontrada nos estudos clássicos de Granovetter (1973).
A centralidade na rede e as posições de intermediário encontram-se ambas no coração do
conceito de relações magnéticas. Ao incrementar estas medidas de rede, os empreendedores
produzem um efeito magnético indirecto sobre os detentores dos recursos-chave de que podem
precisar, podendo mesmo ser procurados e serem-lhes fornecidos recursos por indivíduos em
relação aos quais os empreendedores não estavam, sequer, cientes.
Para se tornar útil na prática, a faceta “construção de redes” considera os empreendedores
como construtores activos e intencionais das suas posições na rede. Assim, a investigação deve
focar-se numa melhor compreensão da forma como os empreendedores constroem as suas posições
na rede, e da forma como essas posições potenciam os seus efeitos magnéticos sobre os detentores
dos recursos de que necessitam.
Cross e Parker (2004) apontaram importantes linhas orientadoras para aumentar as capacidades
da rede social, tanto a nível individual como organizacional. Ao nível institucional da criação de
novos sectores de actividade, Aldrich e Fiol (1994) indicaram que a capacidade para atrair recursos
é um subproduto da legitimação organizacional. Com o objectivo de explorar melhor as possibilidades dos empreendedores para melhorar as suas relações magnéticas indirectas, viramo-nos
agora para uma discussão mais alargada destas estratégias, na análise da próxima dimensão de
construção de redes – a legitimidade.
Legitimidade. A concepção da actividade de um empreendedor enquanto possuidora de um
elevado status, representa um papel crítico no processo de atracção de recursos. Os estudos sobre
empreendedorismo têm mostrado que indivíduos com um elevado status encontram mais facilmente
fornecedores de recursos nas suas redes sociais do que indivíduos com um baixo status (e.g. Renzulli
& Aldrich, 2005). No entanto, mesmo os indivíduos com um elevado status que criam novos
empreendimentos, enfrentam geralmente uma grande adversidade na obtenção de legitimidade
social devido, principalmente, à ausência de evidências prévias acerca das suas novas actividades
(Gartner & Low, 1990). Assim, o caminho primário disponível para os empreendedores na obtenção
de legitimidade empreendedora é um processo interpessoal para alcançar a confiança dos outros,
no decorrer do processo de organização do novo empreendimento (Aldrich & Fiol, 1994).
A confiança é um factor fundamental na definição da posição na rede de um determinado
indivíduo (Cross & Parker, 2003), constituindo, portanto, uma ferramenta básica para ajudar os
empreendedores a ganharem status e legitimidade numa rede. Por isto, podemos conceber o
processo de obtenção de legitimidade por um empreendedor como um efeito do tipo “bola de
neve”. Os empreendedores vêem incrementada a sua legitimidade à medida que ocupam posições
mais centrais nas suas redes, o que, por sua vez, leva a um aumento de legitimidade.
Devido à importância da legitimidade no lançamento de um novo empreendimento, muitos
empreendedores estabelecem alianças e parcerias com firmas maiores e de status mais elevado, não
apenas para directamente obterem acesso a recursos preciosos mas também (e talvez principalmente)
para obterem maior legitimidade e tornarem-se mais atractivas em relação a potenciais clientes,
empregados e investidores (Stuart, 2000; Alvarez & Barney, 2001). É portanto claro que, tanto os
factores cognitivos (i.e. o quanto um novo empreendimento é conhecido numa rede), como os
factores sociais e valorativos (i.e. quanto um novo empreendimento é visto como desempenhando
actividades de elevado status), se revelam de grande importância para o desenvolvimento e o
sucesso de novos empreendimentos.
Tal está em concordância com as proposições de Aldrich e Fiol (1994) que viram a implementação de novos sectores de actividade como factores promotores de legitimidade ao longo de duas
dimensões principais: cognitiva e sociopolítica. A legitimação cognitiva refere-se à difusão do conhecimento acerca de um novo empreendimento e pode ser medido pelo nível de conhecimento público.
A legitimação sociopolítica refere-se ao processo através do qual um empreendimento é visto como
adequado e correcto (em termos valorativos), tendo em conta as normas sociais, leis e valores em
vigor. Neste sentido, com o objectivo de promover o sucesso dos seus empreendimentos, os empreendedores devem tentar construir redes pessoais e profissionais que influenciem positivamente o seu
nível de legitimidade.
Discussão
Sabemos hoje que é necessário mais do que uma “garagem e uma ideia” para lançar um
empreendimento bem sucedido (Audia & Rider, 2005). Bem pelo contrário, tem sido verificado
que o processo de criação de um novo negócio é um evento eminentemente social, estando, portanto,
longe do retrato lendário do empreendedor de garagem isolado. A nossa abordagem baseia-se nesta
perspectiva, ao elaborar teoricamente os processos através dos quais os empreendedores atraem os
recursos vitais, por parte dos detentores desses recursos, para criarem e desenvolverem os seus
empreendimentos.
Apresentámos duas vias principais através das quais os empreendedores exercem um efeito
magnético sobre aqueles que detêm os recursos de que os empreendedores necessitam. Por um lado,
os empreendedores podem procurar directamente os detentores desses recursos e “vender-lhes” a
ideia, criando um efeito de atracção que irá levá-los a apoiar o empreendimento. Por outro lado, os
empreendedores podem atrair indirectamente os detentores de tais recursos através da sua posição
numa dada rede social, tanto em termos da sua posição estrutural como em termos da legitimidade
alcançada. Na via directa, o que acontece é uma espécie de um “efeito boomerang” onde a atracção
pelo empreendimento surge apenas depois de um contacto directo com o detentor de recursos, contacto
esse que é propositadamente efectuado pelo empreendedor. Na via indirecta, os empreendedores são
procurados pelos outros, mesmo sem terem previamente contactado com eles. Em vez disso, são os próprios
detentores de recursos que, ao tomarem conhecimento sobre o empreendimento e a sua actividade,
procuram o empreendedor.
A literatura sobre empreendedorismo não tem abordado, explicitamente, até à data, a existência
de vias directas e indirectas que os empreendedores possam utilizar para atrair recursos críticos. A
identificação destas duas vias constitui a principal contribuição deste artigo. Para além disso, o artigo
apresenta uma outra contribuição teórica, ao adoptar uma abordagem relacional de nível meso na
análise da atracção de recursos. A investigação sobre empreendedorismo tem privilegiado, ou as
características individuais, por um lado, ou os constrangimentos ambientais, por outro. A nossa
abordagem sublinha a relação – tanto directa como indirecta – entre o empreendedor e o seu meio para
explicar a forma como os empreendedores atraem recursos importantes para novos empreendimentos.
Assim, não nos focamos nem nos traços de personalidade nem nos constrangimentos sócio-económico-culturais. Em vez disso, salientamos as relações que os empreendedores estabelecem com o seu meio
como uma explicação de como eles atraem recursos para as suas actividades empreendedoras.
Apesar do valor analítico da nossa abordagem, estamos cientes que as duas facetas magnéticas
não deverão ser totalmente independentes uma da outra. Outros estudos já demonstraram, por
exemplo, que os recursos sociais são por vezes alavancados para obter outros tipos de recursos, como
os financeiros (Starr & MacMillan, 1990). Da mesma forma, afirmámos que os empreendedores
podem aumentar a atracção de recursos vitais através do estabelecimento de parcerias e alianças
com organizações de status mais elevado que lhes garantam maior legitimidade (uma relação
magnética indirecta). No entanto, os empreendedores podem depender de relações magnéticas directas
para alcançar aquelas parcerias e alianças. Por exemplo, as identidades sociais podem deliberadamente
tornar-se salientes para o detentor de recursos pela forma como o empreendedor enquadra o
empreendimento. Por outras palavras, o quanto os empreendedores estabelecem relações de
comprometimento e de persuasão com os outros, determina, em grande medida, as relações indirectas
que se formam. O mesmo tende a ocorrer na direcção oposta. Relacionamentos magnéticos indirectos
podem também influenciar a extensão e a qualidade das relações directas. Por exemplo, se o
empreendedor se liga apenas a redes de baixa densidade, ele tem provavelmente menos oportunidade
de estabelecer relacionamentos magnéticos directos. Em suma, as duas facetas da abordagem de
relações magnéticas são válidas analiticamente, mas ambos os tipos de relação actuam, na vida
real, de uma forma totalmente integrada.
Um grande desafio para a investigação futura é compreender como tendem a ocorrer sequencialmente ao longo do tempo estas diferentes relações. Os autores têm separado o processo empreendedor em fases ou passos, como o pré-arranque, o arranque e o pós-arranque (Shane, Locke, & Collins,
2003; Baron, 2002). Apesar de todos os tipos de relações magnéticas serem dignos de atenção em
qualquer uma das fases, alguns podem mostrar-se mais cruciais em determinadas fases do que noutras.
Os efeitos magnéticos directos são certamente fundamentais quando o empreendimento ainda não
alcançou o nível necessário de legitimidade e notoriedade e a sua posição na rede não é ainda
vantajosa (fases de pré-lançamento e de lançamento). No entanto, à medida que o empreendimento
aumenta a sua legitimidade, as relações magnéticas directas reduzem, provavelmente, o seu papel.
Estas proposições têm, contudo, de ser ainda empiricamente testadas.
Uma última contribuição deste artigo prende-se com as implicações práticas da abordagem
das relações magnéticas. Acreditamos que empreendedores, capitalistas, professores de empreendedorismo e estudantes de gestão em geral, podem beneficiar de uma abordagem que explique o modo
como os empreendedores atraem os recursos de que necessitam para desenvolverem os seus empreendimentos. Para tal, sistematizámos algumas estratégias que os empreendedores podem utilizar para
melhorar o seu potencial de atracção de recursos durante a criação de novos empreendimentos (Tabela 1).
Estas estratégias têm em conta as duas facetas da abordagem de relações magnéticas que
discutimos: o marketing de ideias e o posicionamento na rede. As estratégias para aumentar a
eficácia do marketing de ideias envolvem a capacidade para comprometer com ideia a empreendedora
os detentores de recursos importantes, tornando saliente o modo como eles podem integrar o seu
apoio ao empreendimento com os seus próprios quadros mentais e interesses pessoais. Adicionalmente,
o empreendedor deve também evidenciar a forma como o seu empreendimento se relaciona com
questões correntes da sociedade/mercado e deve despoletar uma expectativa positiva acerca dos
resultados das suas actividades para si próprio, para os próprios detentores de recursos, e para a
sociedade de uma forma geral. Os efeitos magnéticos indirectos de posicionamento na rede podem
ser alcançados através do estabelecimento de ligações relacionais com detentores de recursos relevantes
e as suas comunidades. Os efeitos indirectos podem também ser desenvolvidos através do aumento
da legitimidade do empreendimento. Ao estabelecer parcerias e alianças com organizações de status
elevado e tornar conhecida a existência e actividade do empreendimento, os empreendedores estão
a aumentar o seu potencial de atracção indirecta.
Conclusão
Apresentámos neste artigo uma abordagem para analisar o modo como os empreendedores
podem atrair recursos para criar e desenvolver novos empreendimentos. A abordagem contempla
duas formas conceptuais distintas sobre a atracção de recursos em contextos empreendedores: uma
directa e uma indirecta. Embora a investigação sobre empreendedorismo tenha já abordado o papel
crítico de recursos na formação de novos empreendimentos, o seu enfoque tem sido, fundamentalmente, ou ao nível da disponibilidade de recursos existentes numa dada comunidade (macro), ou
de como os traços de personalidade influenciam a aquisição desses recursos (micro). A nossa abordagem de relações magnéticas contribui para esta literatura ao salientar como estes dois tipos de
explicação se podem relacionar entre si. A tónica é assim colocada nas relações que o empreendedor
estabelece com os detentores de recursos importantes, situando-se abordagem num nível meso.
Não negamos o papel dos traços de personalidade nem os constrangimentos do ambiente social e
financeiro, mas acreditamos e esperamos ter demonstrado como uma abordagem de nível meso
traz novos elementos para melhor compreendermos o modo como os empreendedores podem mais
eficazmente atrair os recursos de que necessitam.