Influência dos valores pessoais no comportamento «verde» do consumidor
A degradação do meio ambiente já é um objeto de alarme há décadas, bem como um
exemplo das consequências ruins da utilização de recursos sem uma prévia
avaliação dos efeitos sobre as condições de vida no longo prazo. Para
Spangenberg e Lorek (2002), existe um consenso sobre o fato de a
responsabilidade para o nível, composição e impacto do consumo ser dos
habitantes mais ricos da Europa, América do Norte e Japão.
Para Peattie e Crane (2005), pesquisas têm demonstrado que os consumidores
estão se preocupando cada vez mais com o meio ambiente, e desejam comprar
produtos mais «verdes», mesmo que custem um pouco mais. Tal fato ocorre pois
muitos consumidores têm se dado conta de que suas ações, por mais simples e
quotidianas que possam parecer, são comportamentos que afetam diretamente a
qualidade do meio ambiente (Consumer International, 1998).
Com relação às preocupações ambientais dos consumidores, Zimmer et al. (1994)
identificaram sete categorias: preocupação com desperdício, vida selvagem,
biosfera, população, saúde, consciência de energia e tecnologia ambiental.
Este aumento da consciência ambiental dos consumidores se deve a uma
diversidade de fatores, como por exemplo o aumento da cobertura dada pela mídia
ao tema, o surgimento de pressão por parte de grupos ativistas, rigorosas
legislações (nacionais e internacionais), e o impacto das grandes catástrofes
industriais sobre a opinião pública (Kalafatis et al., 1999). Esses
consumidores «verdes» mostram-se dispostos a pagar mais por produtos
ambientalmente amigáveis, o que leva a grande massa de consumidores a acreditar
que estes produtos são mais caros (Peattie e Crane, 2005).
De acordo com Diamantopoulos et al. (2003) existem muitas evidências empíricas
indicando que a preocupação ambiental é um importante fator na tomada de
decisão do consumidor. Em decorrência dessa mudança de ações empresariais e
aumento da consciência ambiental surgiu o chamado comportamento «verde» do
consumidor, tema principal deste estudo, que, por sua vez, tem a intenção de
relacionar a esse comportamento os valores pessoais dos indivíduos que o
adotam, na tentativa de traçar um perfil destes consumidores.
No entanto, deve-se destacar que, apesar de haver um aumento no número de
consumidores preocupados com o meio ambiente, o mercado para produtos «verdes»
ainda é considerado pequeno. Rex e Baumann (2007) apresentam algumas possíveis
explicações para esse fato: o tamanho real do segmento de mercado de
consumidores «verdes» ser pequeno, o contexto de compra ser talvez mais
importante na decisão do consumidor do que a característica «verde» do
consumidor, e a falta de informações persuasivas sobre os produtos «verdes».
As características sociodemográficas não são suficientes para perfilar os
consumidores «verdes», sendo sugerido complementar a análise com variáveis
psicográficas (como os valores pessoais tratados neste estudo).
Dentre os desafios enfrentados pelas empresas que desejam introduzir práticas
de negócios ambientalmente amigáveis, está o fato de, mesmo se o consumidor
«comprar» os valores, crenças e comportamentos associados com «ser verde», as
contingências e fatores externos do mundo real (fora do controle da empresa)
podem forçar esse consumidor a realizar ações inconsistentes com tais práticas
«verdes» (Amine, 2003).
De acordo com Diamantopoulos et al. (2003), a literatura sobre marketing
«verde» tem procurado descrever o perfil deste segmento de mercado usando uma
variedade de variáveis que incluem medidas geográficas, culturais, de
personalidade e demográficas. No entanto, para esses autores, as
características sociodemográficas não são suficientes para perfilar os
consumidores «verdes», sendo sugerido complementar a análise com variáveis
psicográficas (como os valores pessoais tratados neste estudo).
O objetivo deste trabalho é avaliar de que maneira os valores pessoais podem
influenciar o chamado comportamento «verde» do consumidor, de forma que este
seja considerado mais ou menos ambientalmente favorável. Assim, a questão da
pesquisa é: «Quais são os valores pessoais que mais influenciam o consumidor a
adotar um comportamento verde'?». O perfil dos consumidores «verdes», que se
busca traçar através da identificação de seus valores pessoais, poderá também
ser útil a empresas, no desenvolvimento de novos produtos direcionados a este
público e da sua comunicação. Tal perfil pode também ser proveitoso para as
empresas e para os profissionais de marketing na identificação de novos
segmentos de consumidores ou nichos de mercado.
Valores pessoais
Os valores pessoais podem ser definidos como crenças pertencentes a modos de
conduta que levam a estados finais desejáveis, transcendem situações
específicas, guiam a seleção ou avaliação de comportamento e, por fim, são
ordenados por importância, formando um sistema de prioridades de valores
(Rokeach, 1973).
Definições de outros autores vão ao encontro da proposta por Rokeach (1973),
como por exemplo a de Schiffman e Kanuk (1997), que afirma que os valores
servem como guia para comportamentos culturalmente apropriados; ou como a de
Schwartz (1994) que defende que as conceituações oferecidas para o conceito de
valores convergem no sentido de considerarem-no como as crenças associadas a
metas desejáveis e a maneiras de conduta que possibilitem o alcance dessas
metas.
Neste referencial teórico, são revisadas três diferentes metodologias de
mensuração de valores pessoais: Rokeach (1973), List of Values (LOV) de Kahle
(1986) e Schwartz (1992). A metodologia proposta por Rokeach (1973) para
mensurar os valores pessoais considera que existem dois níveis de valores: os
terminais e os instrumentais. Os valores terminais relacionam-se com os estados
finais de existência desejados, enquanto os instrumentais estão relacionados
aos modos de conduta desejáveis.
Apesar de ter se fundamentado em valores definidos por Freud et al. que
apresentavam uma grande quantidade de valores a ser considerada, o sistema de
Rokeach (1973) compreende um número limitado de valores (Soares, 2006). Os
valores terminais de Rokeach (1973) são: amizade verdadeira, amor maduro,
autorrespeito, felicidade, harmonia interior, igualdade, liberdade, prazer,
reconhecimento social, sabedoria, salvação, segurança familiar, segurança
nacional, sentimento de realização, um mundo de beleza, um mundo em paz, uma
vida confortável e uma vida emocionante. Por sua vez, os valores instrumentais
são: animado, ambicioso, amoroso, asseado, autocontrolado, capaz, corajoso,
polido, honesto, imaginativo, independente, intelectual, liberal, lógico,
obediente, prestativo, responsável e tolerante.
Outra maneira de mensurar os valores pessoais é a List of Values (LOV) ou Lista
de Valores, desenvolvida por Kahle (1986) em conjunto com colaboradores de um
grupo de pesquisa da Universidade de Chicago, sendo uma alternativa de escala
de mensuração de valores pessoais. Criada a partir de críticas feitas à escala
proposta por Rokeach (1973), a LOV baseou-se também na escala Values and
Lifestyles System (VALS), que propõe a mensuração de valores e estilos de vida
das pessoas (Menezes, 2006). Por ter apresentado uma maior facilidade de uso,
demandar menor tempo de preenchimento e uma maior facilidade de tradução e
aplicabilidade em pesquisas com diferentes culturas, a utilização da escala LOV
passou a ser considerada mais vantajosa e a substituir a metodologia de Rokeach
(1973) (Schwartz e Bilsky, 1987).
A abordagem LOV abrange nove valores terminais e instrumentais que se
relacionam aos principais papéis desempenhados pelos indivíduos no dia a dia:
sentimento de pertença, excitação, diversão, relações calorosas com as pessoas,
autorrealização, ser respeitado, sentimento de realização, segurança e
autorrespeito. Para mensurar estes valores, é necessário que o respondente os
avalie em uma lista a partir de uma escala do tipo Likert de nove pontos
(Shethet al., 2001). Abaixo, o Quadro I, mostra a escala.
Quadro I
A Lista de Valores (List of Values ' LOV)
Por sua vez, o estudo de Schwartz (1992) baseia-se na premissa de que os
valores refletem metas conscientes ligadas a três necessidades básicas humanas:
biológicas, de interação social e de funcionamento grupal.
Tais valores encontram-se listados a seguir em ordem alfabética:
•Autodireção: independência nas escolhas das ações, da criação e da
exploração;
•Benevolência: preservação e melhoria do bem-estar das pessoas com as quais
se tem frequente contato pessoal;
•Conformidade: deriva da necessidade dos indivíduos inibirem inclinações que
possam ser perturbadoras do bom funcionamento do grupo;
•Estímulo: excitação, mudanças na vida;
•Hedonismo: prazer associado à satisfação de necessidades do organismo;
•Poder: status, prestígio, conquista ou preservação de posição dominante;
•Realização: sucesso pessoal, demonstração de competência, aprovação da
sociedade;
•Segurança: harmonia e estabilidade, que pode ser social, de um relacionamento
ou pessoal;
•Tradição: respeito, comprometimento, aceitação de costumes e ideias que são
impostas pela cultura ou pela religião;
•Universalismo: compreensão, tolerância e proteção do bem-estar das pessoas e
do meio ambiente.
Através da realização de pesquisas em dezenas de países diferentes, Schwartz
(1992) percebeu que as ações tomadas na busca de cada tipo de valor têm
consequências psicológicas, práticas e sociais que podem ser compatíveis ou
conflitantes em relação à busca de outros tipos de valores.
Comportamento «verde»
Não há consenso sobre o que seria o «verdadeiro» perfil de um consumidor
«verde», mas sim uma diversidade de resultados que emergem de diferentes
estudos que buscam descrever o consumidor «verde» (D'Souza et al., 2007). Isto
ocorre por tratar-se de um assunto relativamente novo, o que faz com que os
conceitos a respeito do comportamento «verde» ainda não estejam precisamente
definidos ou sedimentados.
Uma das definições identificadas na literatura defende que o consumidor «verde»
é aquele que, além da variável qualidade/preço, considera também, no momento da
escolha por um produto, a variável ambiental, optando por produtos que não
agridam ou que sejam percebidos como não agressivos ao meio ambiente, no lugar
dos percebidos como agressivos (Makower, 1993; Portilho, 2005). A maior parte
das discrepâncias entre as definições acerca do comportamento «verde» reside
nas razões para sua adoção.
A «consciência ecológica» por si só não é suficiente para suscitar um
comportamento «verde». É preciso também apresentar uma «preocupação ambiental»
ou «comprometimento» com as questões ecológicas.
Por exemplo, para Straughan e Roberts (1999), bem como para Kalafatis et al.
(1999), o comportamento «verde» decorre basicamente da «consciência ecológica»,
ou seja, da impressão que as pessoas têm de que muitas de suas atitudes
influenciam diretamente na preservação e qualidade do meio ambiente. Já
Moisander e Pesonen (2002) conceituam o comportamento «verde» como sendo uma
forma de comportamento eticamente orientada que é motivada não apenas pelas
necessidades pessoais do consumidor, mas também pela sua preocupação com o bem-
estar da sociedade em geral. Sob a luz desta interpretação, entende-se que a
«consciência ecológica» por si só não é suficiente para suscitar um
comportamento «verde». É preciso também apresentar uma «preocupação ambiental»
ou «comprometimento» com as questões ecológicas.
Em uma definição que se pode considerar mais completa, Chan e Lau (2000)
consideram a «consciência ecológica» ' à qual eles dão o nome de «compreensão
ecológica» ' e a «preocupação ambiental» como sendo alguns componentes do
comportamento «verde», mas não os únicos. Para eles, também constituem o
comportamento «verde»: o «efeito ecológico», que pode ser entendido como uma
espécie de apego emocional ao meio ambiente e que não está diretamente
relacionado à consciência ecológica ou à preocupação ambiental; e a «intenção
ecológica», que corresponde à intenção de proteger o meio ambiente. O conceito
de «intenção ecológica» baseia-se na «Teoria da Ação Fundamentada», segundo a
qual as intenções são os indicadores mais relevantes do comportamento
imediatamente correspondente (Ajzen e Fishbein, 1973).
Gilg et al. (2005), por sua vez, ao realizarem um estudo acerca de consumo
«verde» e estilos de vida sustentáveis, relacionaram o termo a comportamentos
regularmente tidos como exemplos de consumo «verde». Os autores focaram as
seguintes atividades: adquirir produtos, tais como detergentes, que têm um
impacto ambiental reduzido; evitar produtos com aerossóis; adquirir produtos de
papel reciclado; comprar produtos orgânicos; comprar alimentos produzidos
localmente; adquirir produtos em lojas locais; comprar produtos que remuneraram
justamente seus produtores; buscar produtos que utilizam menos embalagem; e
utilizar sacolas próprias, ao invés de sacolas plásticas fornecidas pela loja.
O consumo «verde» se limitaria à escolha de produtos «verdes», à substituição
de uma marca por outra e ao aumento da reciclagem. Por outro lado, o consumo
sustentável consistiria em um conceito bem mais amplo, que abrange as decisões
de consumir menos ou não consumir. O comportamento sustentável não exclui,
entretanto, as atitudes típicas do comportamento verde.
Deve-se também destacar a relação entre os conceitos de consumo «verde» e
consumo sustentável feita por Gonçalves-Dias e Moura (2007), que ressaltam as
diferenças existentes entre eles. O consumo «verde» se limitaria à escolha de
produtos «verdes», à substituição de uma marca por outra e ao aumento da
reciclagem. Por outro lado, o consumo sustentável consistiria em um conceito
bem mais amplo, que abrange as decisões de consumir menos ou não consumir. O
comportamento sustentável não exclui, entretanto, as atitudes típicas do
comportamento verde.
Ao se fazer uma comparação com a definição de consumo sustentável apresentada
no Simpósio de Oslo em 1994 («o uso de bens e serviços que respondem às
necessidades básicas e proporcionam uma melhor qualidade de vida, e ao mesmo
tempo minimizam o uso de recursos naturais, materiais tóxicos e emissão de
rejeitos e poluentes em seu ciclo de vida, de forma a não comprometer as
necessidades das gerações futuras»), pode-se verificar que o consumo «verde» é
uma das formas de se obter um consumo sustentável.
O consumo sustentável não será abordado em profundidade neste artigo. No
entanto, ele se faz útil no entendimento das principais críticas feitas ao
comportamento «verde». Como por exemplo a afirmação de Gonçalves-Dias e Moura
(2007, p. 7): «por mais genuína que seja a preocupação com o meio ambiente, o
consumo verde' acaba sendo uma estratégia fechada em uma tendência ou
modismo». Adicionalmente, tem-se a posição de Paavola (2001), que defende que o
comportamento «verde» está relacionado principalmente a produtos elitizados,
destinados apenas a uma pequena parcela da sociedade. Finalmente, para Connolly
e Prothero (2008), deve-se entender o consumo «verde» como sendo um processo
que leva as pessoas a se sentirem mais responsáveis e poderosas por lideram com
riscos relacionados a elas próprias e ao ambiente de uma forma geral.
Este estudo se baseou em uma combinação das definições de consumo «verde»
propostas por Makower (1993), Portilho (2005) e por Moisander e Pesonen (2002).
O comportamento «verde» é considerado uma forma de comportamento eticamente
orientada, motivada não apenas pelas necessidades pessoais do consumidor, mas
também pela sua preocupação com a variável ambiental (preocupação em não
agredir ou diminuir a agressão ao meio ambiente) e com o bem-estar da sociedade
em geral no que diz respeito, intrinsecamente, à preservação do meio ambiente.
Cabe ressaltar também que por «comportamento» entendem-se, nesta definição,
apenas as ações relacionadas ao consumo que busquem ter o menor impacto
ambiental possível; não sendo considerado o conhecimento dos consumidores
acerca da questão ambiental.
Métodos da pesquisa empírica
Esta pesquisa busca entender a relação entre duas áreas de estudo distintas
(valores pessoais e comportamento «verde»), por meio de um estudo descritivo
quantitativo em uma amostra de consumidores escolhidos de acordo com o critério
de conveniência. Quanto à forma de coleta dos dados, foram usados questionários
autoadministrados na forma impressa. Os respondentes faziam parte da população
de alunos de graduação de uma universidade pública no interior do estado de São
Paulo, Brasil.
Com relação à hipótese deste estudo, pesquisas feitas em alguns países indicam
que alguns valores particulares voltados para metas sociais têm forte impacto
sobre ações políticas relacionadas ao meio ambiente (Ester et al., 2004). Com
base nessa informação, pode-se inferir que alguns valores pessoais voltados
para metas sociais ' como por exemplo o valor universalismo, descrito por
Schwartz (1992) ou a dimensão coletivismo, tratada por Hofstede (1991) ' têm
influência sobre atitudes do consumidor em relação ao meio ambiente, da mesma
maneira que sobre as ações políticas. Em outras palavras, pode-se esperar que
valores relacionados aos conceitos de universalismo ou coletivismoexerçam
influência positiva sobre a adoção de práticas consideradas parte do
comportamento «verde».
Apesar de na presente pesquisa não terem sido empregadas as metodologias de
Schwartz (1992) e Hofstede (1991), pode-se observar que o universalismo de
Schwartz (1992) e a dimensão coletivismo de Hofstede (1991) parecem relacionar-
se com os valores «senso de pertencer ou participar» e «relacionamento caloroso
com os outros» da metodologia LOV. Pode-se esperar, portanto, que tais valores
influenciem positivamente o comportamento «verde».
Portanto, na presente pesquisa, são consideradas duas variáveis principais: os
valores pessoais dos consumidores e o comportamento «verde». Nesta pesquisa, a
escala LOV foi empregada na mensuração da variável «valores pessoais dos
consumidores». Tal escolha é justificada pelo fato de a escala LOV compreender
um menor número de valores do que escalas como a de Rokeach (1973) e a de
Schwartz (1994) e ser, portanto, mais fácil e rapidamente preenchida.
Os itens da escala utilizados foram retirados do estudo de Menezes (2006), que
utilizou a escala na língua portuguesa. Para mensurar a importância de cada um
dos valores, usou-se uma escala intervalar, de 1 a 7, na qual 1 representa que
o valor não é nada importante para o respondente e 7 que o valor é muito
importante para o respondente.
Para a definição de um método de mensuração de comportamento «verde» para esta
pesquisa, foram tomados como base os estudos de Chryssohoidis e Krystallis
(2005), Gilg et al. (2005), Grunert e Juhl (1995), Straughan e Roberts (1999),
e Thogersen e Ölander (2002). Foram escolhidas 15 afirmações para avaliar o
comportamento «verde», as quais se encontram no Quadro II.
Quadro II
Componentes do comportamento verde desta pesquisa
Os respondentes eram convidados a indicar com que frequência realizam cada uma
das 15 ações «verdes» por meio de uma escala de 1 a 7 (o número 1 indicava que
ele nunca a realizava, enquanto o número 6 indicava que ele sempre a
realizava). O comportamento «verde» correspondeu à soma das respostas que os
respondentes atribuíram aos 15 itens da lista de ações «verdes». A esta soma,
decidiu-se dar o nome de «Greendex», considerado o indicador da intensidade do
comportamento «verde» e, posteriormente, utilizado como a variável dependente
na análise de regressão múltipla.
Essa técnica multivariada é adequada quando o objetivo é examinar a relação
entre duas ou mais variáveis independentes métricas e uma variável dependente
métrica, e foi aqui empregada para compreender a relação entre as dimensões de
valores pessoais (variáveis independentes) e o comportamento «verde» dos
respondentes (Greendex).
Resultados
Foram coletados 100 questionários completos, número considerado adequado para
realizar a análise de regressão múltipla: como são nove variáveis independentes
(os noves valores pessoais), o número mínimo de elementos da amostra deveria
ser ao menos 45 [cinco observações para cada uma das nove variáveis
independentes, segundo sugestão de Hair et al. (1995)].
Com relação à identificação de valores extremos (observações muito afastadas
das demais ou inconsistentes com elas), utilizou-se o cálculo da distância de
Mahalanobis (D2) para detetar a sua presença na base de dados. Essa abordagem
para detetar valores extremos envolve uma avaliação multivariada de cada
observação de um conjunto de variáveis, medindo a distância em um espaço
multidimensional de cada observação do centro da média das observações.
Observou-se que os indivíduos 17 e 82 foram considerados muito incoerentes com
os demais elementos da base de dados e, dessa forma, foram excluídos da
amostra, sendo os demais 98 questionários utilizados nas análises da pesquisa.
São agora apresentados os resultados da análise de regressão múltipla efetuada
para compreender a relação entre as dimensões de valores pessoais e o
comportamento «verde» dos respondentes. A Tabela 1 mostra as estatísticas
descritivas para a variável dependente da pesquisa.
Tabela 1
Estatísticas descritivas da variável dependente
Como são 15 variáveis e a escala utilizada possui 7 pontos, o valor mínimo para
a variável «Greendex» é de 15 pontos (15 vezes 1), o valor máximo é de 105 (15
vezes 7) e o valor intermediário é de 60 (15 vezes 4). Quanto maior o valor
observado nesta variável, mais «verde» ou ecologicamente correto pode ser
considerado o comportamento de consumo do respondente.
Uma vez que a pontuação média observada foi igual a pouco mais de 58 pontos,
percebe-se que os respondentes tendem a adotar, de uma forma geral, um
comportamento de consumo que pode ser considerado pouco «verde» ou
ecologicamente correto. As variáveis independentes, por sua vez, têm suas
estatísticas descritivas apresentadas na Tabela 2.
Tabela_2
Estatísticas descritivas das variáveis independentes
Ao analisar a Tabela_2, verifica-se que o valor pessoal «diversão e prazer na
vida» foi o que recebeu os maiores escores (média igual a 6,29). Por outro
lado, o valor pessoal menos importante foi o «autorrespeito» com escore médio
igual a 6,02. Uma vez que as variáveis independentes do modelo já estavam
definidas (as nove variáveis do questionário relacionadas aos valores
pessoais), adotou-se uma abordagem confirmatória para especificar o modelo de
regressão.
Para responder a questão da pesquisa (quais são os valores pessoais que mais
influenciam o consumidor a adotar um comportamento «verde»?), os coeficientes
de regressão do modelo especificado devem ser analisados. A Tabela 3 apresenta
o resumo do modelo de regressão estimado para verificar a influência dos
valores pessoais no comportamento «verde».
Tabela 3
Resumo do modelo de regressão
Torna-se necessário lembrar que, como o presente estudo utilizou uma amostra de
conveniência formada por 98 estudantes, não foram efetuados o teste F para o
coeficiente de determinação e o teste t para os coeficientes de regressão.
Dessa forma, os resultados encontrados referem-se somente à amostra utilizada,
não devendo ser generalizados para a população da pesquisa.
O R2 apresentado na tabela acima é o coeficiente de determinação, que diz
quanto da variável dependente é explicada pelo modo de regressão. Neste caso,
16,1% da variabilidade no valor do «Greendex» são explicados pelo modelo de
regressão, i.e., pelas variáveis independentes. Tal valor pode parecer pequeno,
mas deve-se considerar que, em pesquisas sociais, um modelo matemático
dificilmente consegue capturar toda a variância de uma variável dependente,
pois são muitas as possíveis influências em um dado comportamento (neste caso,
o comportamento «verde») e as variáveis estudadas podem ter sua
operacionalização dificultada.
Se forem observados estudos na área de ciências sociais aplicadas, é possível
perceber que os valores de R2 apresentados são, na maioria, abaixo de 0,40.
Isso acontece devido à grande complexidade das relações das variáveis nessa
área de pesquisa. Mesmo com tais dificuldades operacionais, o modelo utilizado
nesta pesquisa conseguiu explicar mais de 16% da variação no comportamento
«verde».
A partir dos coeficientes obtidos, tem-se o modelo de regressão:
Greendex = 86,976 ' 1,0521 Senso de pertencer ' 0,707 Excitação + 1,309
Relacionamento caloroso com os outros + 1,337 Autorrealização ' 1,751 Ser
respeitado ' 0,419 Diversão e prazer na vida ' 0,372 Segurança + 1,864
Autorrespeito ' 4,907 Sensação de êxito + e
Os valores pessoais que apresentaram coeficiente positivo e, portanto, têm
influência positiva na adoção de um comportamento de consumo ambientalmente
favorável, foram: autorrespeito, autorrealização, e relacionamento caloroso com
os outros. Em outras palavras, pessoas que atribuíram maior importância a estes
valores apresentaram maior propensão a assumir um comportamento de consumo
«verde». Já os valores sensação de êxito, ser respeitado, senso de pertencer,
excitação, diversão, e prazer na vida e segurança apresentaram coeficiente
negativo e influenciam negativamente o comportamento «verde».
Independentemente de terem apresentado coeficiente positivo ou negativo, as
variáveis dependentes com maior influxo sobre o «Greendex» foram os valores
sensação de êxito e autorrespeito, enquanto os com menor influência foram
segurança e diversão e prazer na vida. Menezes (2006), em seu estudo sobre
valores pessoais e consumidores internacionais de vinho orgânico, afirma que a
compra de vinhos orgânicos segue o mesmo padrão da compra de produtos orgânicos
em geral.
Se for considerado que os consumidores de produtos orgânicos muitas vezes
também se enquadram na categoria de consumidores «verdes», uma comparação entre
os dois estudos se torna possível. Ao confrontar os resultados obtidos pelo
presente estudo e pela pesquisa de Menezes (2006), percebe-se que os valores
pessoais tidos como os mais influentes, tanto sobre a compra de vinhos
orgânicos quanto sobre a adoção de um comportamento «verde», foram os mesmos.
O coeficiente de regressão da variável «senso de pertencer ou participar» foi
negativo e o da variável «relacionamento caloroso com os outros» foi positivo.
Isso significa que a hipótese foi parcialmente confirmada.
Com os resultados acima, pode-se verificar a hipótese deste estudo, que afirma
que valores relacionados aos conceitos de universalismo ou coletivismo («senso
de pertencer ou participar» e «relacionamento caloroso com os
outros»)exerceriam influência positiva sobre a adoção de práticas consideradas
parte do comportamento «verde». O coeficiente de regressão da variável «senso
de pertencer ou participar» foi negativo e o da variável «relacionamento
caloroso com os outros» foi positivo. Isso significa que a hipótese foi
parcialmente confirmada.
Considerações finais
Este artigo tinha por objetivo verificar a existência de uma relação entre os
valores pessoais dos consumidores e a intensidade do seu comportamento de
consumo «verde». Uma vez confirmada a existência de uma influência dos valores
pessoais sobre a adoção de atitudes «verdes», pretendia-se avaliar que valores,
entre os nove estudados, teriam maior influência positiva bem como os que
teriam maior influência negativa.
Com a realização da análise de regressão, constatou-se que a relação entre as
variáveis independentes «valores pessoais» e a variável dependente
«comportamento verde», representada neste trabalho pelo índice chamado
«Greendex», embora pareça pequena (16,1%) de fato existiu e que, dentre os nove
valores, três exerceram influência positiva e seis influência negativa. Dessa
forma, foi obtido um avanço nas pesquisas sobre comportamento «verde», buscando
analisar sua relação com uma importante influência no consumo ' os valores
pessoais.
Com relação à confirmação parcial da hipótese deste estudo, que previa que os
valores «senso de pertencer ou participar» e «relacionamento caloroso com os
outros»exerceriam influência positiva sobre a adoção de práticas consideradas
parte do comportamento «verde», Ester et al. (2004) indicam que as décadas de
pesquisa sobre questões ambientais ainda possuem muitas questões sem resposta.
Uma dessas questões lida com o relacionamento mútuo entre valores ambientais,
atitudes ambientais e comportamentos ambientais. Outro tipo de questão focaliza
a avaliação do impacto desses valores e atitudes nos comportamentos. Este
estudo procurou fornecer explicações para as ações ambientais com base nos
valores pessoais dos consumidores.
Das limitações deste trabalho, cabe destacar o uso de uma amostra não
probabilística, escolhida por critérios de conveniência, que resultou na
impossibilidade de realizar generalizações dos resultados obtidos na amostra
para toda a população da pesquisa (o que seria realizado por meio dos testes de
significância estatística). Como os elementos da amostra não foram escolhidos
aleatoriamente, não houve como avaliar com precisão o erro amostral (Churchill,
1991), não sendo possível colocar limites na precisão das estimativas.
Portanto, estudos futuros deveriam buscar repetir as análises aqui descritas em
amostras probabilísticas, com vista a buscar a generalização dos resultados
alcançados.
Adicionalmente, como limitação da pesquisa, ressalta-se que, na determinação do
conceito de comportamento «verde» adotado neste estudo, optou-se por considerar
componentes do comportamento «verde» apenas as ações, desconsiderando fatores
como a consciência dos problemas ambientais ou a preocupação com o meio
ambiente. No entanto, como se verificou na revisão da literatura, há ainda
obstáculos (como por exemplo os preços mais caros de alguns produtos
ecologicamente corretos) que impedem que pessoas com consciência e preocupação
ambiental adotem um comportamento tão «verde» quanto gostariam. Um estudo que
considerasse a consciência e a preocupação ambiental na mensuração de
comportamento «verde» poderia, portanto, chegar a resultados diferentes.
Outra sugestão para estudos futuros é adotar escalas de mensuração de valores
pessoais mais abrangentes. A escala LOV de valores pessoais tem as suas
vantagens ' como por exemplo mais rapidez e facilidade no momento da coleta dos
dados, bem como da sua análise também. No entanto, o fato de a escala ser
limitada a um número reduzido de valores pode levar grande parte dos
respondentes a considerar todos os valores igualmente importantes o que, em uma
análise de regressão posterior, implicaria na ausência de uma relação forte
entre as variáveis independentes e a dependente.