O investimento em qualidade como fonte de vantagem competitiva
A última década tem sido representativa de um período de grandes alterações
empresariais com grande incidência na vertente da contabilidade. Segundo
Fernández (2006), os sistemas tradicionais que foram desenhados para atender
determinados requisitos informativos derivados do anterior contexto produtivo e
comercial, carecem de uma eficaz capacidade de resposta para satisfazer as
novas exigências informativas que começam a emergir devido aos novos critérios
de atuação que a tomada de decisão tem vindo a impor.
Ainda segundo o mesmo autor, é fundamental que, neste ambiente onde nasceram as
principais tendências observadas na evolução da contabilidade, sejam
consideradas as seguintes linhas de investigação:
* Novos sistemas de medida e controlo;
* Gestão mediante custos baseados na atividade;
* Gestão de custos de qualidade.
Ao representar a resposta da contabilidade às necessidades das empresas para
oferecer produtos e serviços de acordo com as preferências e necessidades dos
seus clientes, a linha de investigação «gestão de custos de qualidade»
reconhece a qualidade como uma fonte de vantagem competitiva para as empresas e
uma ferramenta valiosa para competir no mercado (Crosby, 1979; Deming, 1986;
Juran e Gryna, 1991; Dale e Plunkett, 1995).
No entanto, muitas organizações utilizam a ferramenta «custos de qualidade»
apenas para procurar soluções de âmbito operacional, motivo pelo qual obtêm
fracos resultados com os programas de custos de qualidade (Bona, 1996). Muitas
vezes esta falha ocorre devido à dificuldade dos gestores em lidar com as
informações não contabilísticas, oriundas das áreas industriais, no apoio ao
processo de tomada de decisão. Hunt (1993, p. 21) explica esta situação ao
afirmar que «muitos gerentes dependem da intuição e de julgamentos baseados na
experiência para resolver os problemas».
A importância que os custos de qualidade têm na gestão de uma empresa deve-se
ao indicador expresso em unidades monetárias e não a algum fator em abstrato.
Ora este exercício permite uma comparação objetiva entre os diversos exercícios
económicos, bem como identificar áreas com custos de qualidade elevados para
posteriores ações de correção.
Com base nisto, a ferramenta de custos de qualidade foi desenvolvida com o
objetivo de transformar informações técnicas em informações financeiras, pois
as informações dos custos de qualidade têm maior relevância e utilidade para a
tomada de decisões quando são avaliadas e divulgadas financeiramente (Junior,
2003, p. 76).
A importância desta informação financeira só faz sentido se, para conhecer os
custos associados à qualidade, for possível mensurá-los (Quirós et al., 2006).
Tal como ficou demonstrado na tese de Doutoramento do Professor Quirós (1992),
a importância que os custos de qualidade têm na gestão de uma empresa, deve-se
ao indicador expresso em unidades monetárias e não a algum fator em abstrato.
Ora, este exercício permite uma comparação objetiva entre os diversos
exercícios económicos, bem como identificar áreas com custos de qualidade
elevados para posteriores ações de correção.
Para atingir esta comparação objetiva, Feigenbaum (2001, p. 26) defende a
utilidade da mensuração dos custos de qualidade, isenta de ambiguidades, que
seja aceite e compreensível por todos os profissionais que investiguem o tema.
Assim, é normal encontrar na diversa bibliografia duas correntes de opinião
sobre a denominação dos custos de qualidade, ou seja a terminologia «custos de
não qualidade» e «custos de qualidade», conforme salienta Fernández (2006):
* A primeira corrente, encabeçada por autores de prestígio como Harrington e
Gryna, considera que o termo «custos de qualidade» não deveria ser usado,
porquanto a qualidade é rentável, e não representa custo. Logo, estes custos
surgem pela ausência de qualidade, ou seja, à não qualidade;
* A segunda corrente de opinião, sustentada pela American Society for Quality
Control (ASQC), defende a denominação de «custos de qualidade», pois estes
representam a diferença entre o custo real de um produto ou serviço e o custo
que estes poderiam atingir no caso de não haver falhas ou erros na sua
produção.
De qualquer forma, estas divergências de opinião são fundamentalmente de
semântica, sendo possível conciliar estas duas posturas através do mesmo tipo
de custos e, assim, propor uma classificação de custos totais de qualidade que
sirva de base ao estudo sobre a distinção entre «custos de qualidade» e «custos
de não qualidade».
Segundo Quirós et al. (2006), existe unanimidade na identificação, definição e
classificação dos custos de qualidade, independentemente das questões de
semântica anteriormente comentadas, e que podem ser observadas através da
maioria dos autores que se baseiam na classificação estabelecida por Juran em
1974:
Apesar de haver muita controvérsia à volta deste tema, julgamos que a
consistência da informação financeira das empresas só é possível alcançar
através de uma harmonização conceptual, o que facilita a análise comparativa
entre empresas e pelos diversos anos económicos, auxiliando a tomada da
decisão.
A relação dos custos de qualidade com a contabilidade
Tal como ocorreu com a qualidade, torna-se necessário que a contabilidade adote
uma atitude mais dinâmica na perspetiva de passar a desempenhar um novo papel
nas organizações, na medida em que as informações relacionadas com a qualidade
não têm sido convenientemente tratadas.
Na verdade, da observação às normas internacionais de contabilidade, ainda se
aceita que a contabilidade tenha algumas dificuldades em tratar questões
relacionadas com a ineficiência dos processos ou insatisfação dos clientes
devido ao seu fator subjetivo. Já não parece existir justificação plausível
quanto às questões que acrescentam valor e são perfeitamente quantificáveis.
Conforme observado por Bona (1996, p. 5), a globalização da economia tem
exigido bastante da contabilidade de custo tradicional. Diante desta nova
realidade confirma-se que a contabilidade passou a ter um papel estratégico
fundamental no seio das organizações, pois a determinação dos custos de
qualidade dá mais credibilidade à informação financeira.
Posto isto, coloca-se a questão de averiguar qual o setor da organização que
deverá reunir a informação para determinar os custos de qualidade, bem como
distinguir aqueles que deverão ser tratados na contabilidade como ativo
(informação quantitativa) daqueles que deverão ser tratados, e.g., no Anexo ao
Balanço e Demonstração de Resultados (informação qualitativa). Pelas razões
seguintes, segundo Quirós et al. (2006), esta função deve ser da
responsabilidade do departamento de contabilidade:
* Para que o resto da organização entenda este assunto como objetivo geral e
não apenas como responsabilidade estrita do departamento de qualidade, caso
exista;
* Para atribuir a este tipo de custos tratamento igual aos restantes custos da
empresa constantes nas demonstrações financeiras.
A recolha de dados para determinação dos custos de qualidade pode ter várias
origens: mapas de controlo de devolução de mercadorias, desperdícios,
reclamação de clientes e paragens do ciclo de produção não previstas. No
entanto, vamos abordar num dos pontos seguintes os Relatórios de
Sustentabilidade baseados na estrutura definida pela Global Reporting
Initiative (GRI), os quais divulgam os resultados que ocorreram durante o
período de relato no contexto dos compromissos, da estratégia e da abordagem de
gestão adotados pela organização.
Pelo exposto, consideramos que, para uma fácil identificação dos custos de
qualidade, será necessária uma alteração na estrutura das demonstrações
financeiras de forma a apoiar a tomada de decisão através de um amplo Horizonte
Temporal, pois o sistema de medida deve estar orientado a longo prazo. As
medidas financeiras de curto prazo têm um alcance substancialmente inferior.
Como sublinha Fernández (2006) se, por exemplo, a medida de rendimento estiver
orientada para a eficiência, o responsável estará interessado em que a taxa de
eficiência seja mensal, o que incentiva o diferimento de medidas preventivas
consideradas essenciais à redução dos custos de qualidade, tais como a redução
de tempos de espera relacionados com a modificação de equipamento no ciclo
produtivo e a preocupação em detetar defeitos marginais na qualidade.
Para concluir o tema sobre a relação dos custos de qualidade com a
contabilidade, importa realçar que a pouca recetividade que os custos de
qualidade têm recebido da contabilidade deve-se, em grande parte, à falta de
ligação entre estas duas áreas de investigação. Basta que nos lembremos de que
o âmbito da qualidade nas organizações é dominado por engenheiros, enquanto a
contabilidade está afeta a gestores, o que torna difícil um entendimento comum,
que poderá ser atingido, tal como temos vindo a referir, através da
harmonização conceptual dos custos de qualidade, contribuindo desta forma para
o desaparecimento de questões ambíguas. Para isso, vamos tentar demonstrar, na
próxima secção, que o investimento em qualidade ao acrescentar valor se
enquadra no conceito de ativo da Estrutura conceptual do IASB.
Parte do investimento em qualidade enquadra-se no conceito de ativo
· Considerações prévias
Nesta secção vamos começar por pesquisar a forma de os custos de prevenção,
referenciados no Quadro_I, serem considerados investimentos em qualidade.
Acreditamos que é fundamental esclarecer este conceito para que as
demonstrações financeiras possam auxiliar na tomada da decisão. Parte daqueles
custos contabilizados na Demonstração de Resultados deverão ser transferidos
para o Balanço, possibilitando a comparação do investimento ao longo dos vários
exercícios.
Posteriormente, enquadramos estes investimentos em qualidade no conceito de
ativo da Estrutura conceptual do IASB (2010) para confirmar a hipótese de
transformar, em termos conceptuais, os custos em investimento. Assim, e segundo
a Estrutura conceptual (EC) do IASB, considera-se ativo «um recurso controlado
pela empresa como resultado de acontecimentos passados e do qual se espera que
fluam para a empresa benefícios económicos futuros», pelo que, para atingir o
desiderato proposto, vamos decompor o conceito de ativo em três elementos:
* Recurso económico controlado;
* Expectativa de benefícios económicos futuros;
* Resultado de acontecimentos passados.
· Custos de qualidade em prevenção são investimentos
De acordo com Quirós et al. (2006), é de grande importância aclarar o conceito
agregado aos custos de prevenção no contexto dos custos de qualidade. Reforçam
ainda a ideia, partilhada por muitos autores, de que investir em prevenção
implica a substituição do termo custos de prevenção por investimentos em
prevenção.
Em termos doutrinais, implicará esta ideia a determinação de um período
superior a um ano económico para contabilização do investimento, bem como a
respetiva amortização, balanceada com a duração dos benefícios económicos
futuros. Ou seja: este investimento só estará completamente amortizado quando
deixar de gerar benefícios económicos futuros.
Por exemplo, ao representarem um acréscimo de qualidade como consequência do
investimento, os gastos com formação de pessoal relacionados com a qualidade,
cujos benefícios económicos futuros sejam superiores a um ano económico, devem
ser refletidos na contabilidade como um ativo do Balanço e amortizados durante
o seu período de vida útil ' enquanto apresentarem utilidade para a
organização.
Os custos preventivos são considerados investimentos apenas quando estivermos
perante a melhoria da qualidade, sendo que os restantes casos são considerados
custos de avaliação.
No momento de selecionar os custos de qualidade pelas quatro hipóteses
apresentadas no Quadro_I, poderão ser colocadas algumas dúvidas que importa
desde já esclarecer. Assim, quando estamos perante gastos de Investigação &
Desenvolvimento para avaliar as causas de determinados erros ou defeitos,
coloca-se a questão de se saber se estes são custos de prevenção ou avaliação.
Então, se estes gastos estiverem direcionados para resolver uma questão de
determinado projeto, deverão ser considerados de avaliação e não de prevenção,
na medida em que se extinguem com a entrada em funcionamento do projeto,
podendo ser atribuídos a um ano económico específico. O que quer dizer que
estamos perante custos extintos que são contabilizados na Demonstração de
Resultados no ano económico da entrada em funcionamento do projeto que deu
origem à necessidade de investigar quais as causas dos erros ou defeitos.
Em termos de conclusão, podemos afirmar que os custos preventivos são
considerados investimentos apenas quando estivermos perante a melhoria da
qualidade, sendo que os restantes casos são considerados custos de
avaliação.
· Recurso económico controlado
O investimento de prevenção em qualidade constitui um recurso económico
controlado pela empresa. A titularidade deste investimento confere à
organização o direito de usufruir de tais benefícios, em resultado da imagem
positiva transmitida ao mercado, já que a contabilização do investimento em
qualidade far-se-á no Ativo do Balanço, não devendo assim ser considerado, tal
como temos vindo a observar, um custo extinto refletido na Demonstração de
Resultados.
Esta titularidade do investimento em qualidade permite à organização conquistar
benefícios económicos futuros ao longo de vários exercícios económicos através
do resultado obtido entre o balanceamento dos custos de prevenção em qualidade
e a economia obtida pela eficiência demonstrada nas atividades das
organizações.
· Benefícios económicos futuros
Estes benefícios económicos futuros poderão ser obtidos de várias formas, das
quais se destaca, para além da implícita contribuição para os fluxos de caixa
da entidade, a boa imagem transmitida ao mercado decorrente da inscrição do
resultado obtido entre a economia obtida e os custos de qualidade no ativo da
empresa, e que se reflete no aumento do seu volume de negócios (Cruz, 1996).
Caso sejam vendidas a totalidade ou parte do capital social da empresa, estes
benefícios económicos futuros também poderão ser obtidos através do goodwill
(diferença entre o valor de aquisição e o justo valor dos ativos e passivos),
pois o comprador estará em condições de oferecer mais pela sua aquisição se as
perspetivas futuras forem positivas.
Assim, as sete ferramentas da qualidade (Shewhart, 1980; Ishikawa, 1985) e de
gestão (Mizuno, 1988), em conjugação com a necessidade de encontrar uma
metodologia unificada de implantação da melhoria contínua (Scheuermann et al.,
1997; Hellsten e Klefsjo, 2000; Kruger, 2001; Campagnaro et al., 2008), deverão
dar um forte contributo para o bom desempenho dos resultados da empresa,
permitindo o aumento dos fluxos de caixa da organização e respetivos proveitos.
Segundo Martínez-Costa e Martínez-Lorente (2008), quanto melhor for o processo
de melhoria contínua (em que exista uma nítida redução dos desperdícios e das
tarefas de refazer sem acrescentar valor), maior será a probabilidade de as
receitas aumentarem através da melhoria da competitividade, redução de custos
dos produtos e serviços e melhoria de um bem incorpóreo fundamental. Que é,
como vimos imediatamente atrás, a imagem transmitida a um mercado cada vez mais
exigente. Em termos de teoria microeconómica, significa reconhecer que a
expressão clássica da função procura V = f (P,R), em que V = volume de vendas,
P = preço do bem ou serviço e R = rendimento do comprador, deve ser
reformulada, fazendo intervir a qualidade na definição da mesma: V = f (P,Q,R),
sendo Q = qualidade.
· Resultado de acontecimentos passados
Um dos elementos essenciais para a construção do conceito de ativo resulta dos
acontecimentos passados.
A formação interna de colaboradores, a formação externa de fornecedores, a
comunicação de práticas de I&D a comunidades científicas, a realização de
inquéritos para apoiar a definição de prioridades estratégicas, o benchmarking
de empresas de referência, e a monitorização de indicadores de vendas ' podem
ser as modalidades adequadas às organizações detentoras no respetivo Balanço de
investimentos de prevenção em qualidade. Todas estas modalidades são
consideradas investimento para a melhoria contínua da qualidade, não estando
circunscritas apenas a um único projeto que, ao ficar concluído, absorve todos
os custos de qualidade para um ano económico concreto.
Desta forma, ao concentrar a nossa atenção, por exemplo na realização de
formações internas e externas respetivamente a funcionários e fornecedores,
estamos perante um acontecimento passado que permite reconhecer um ativo. A
formação obriga que a organização recorra a encargos indispensáveis à formação
dos seus colaboradores e fornecedores (Morrow, 1996), nomeadamente coaching[1].
O elemento constante no conceito de ativo «em resultado de acontecimentos
passados» está contido no investimento de prevenção em qualidade.
Como conclusão, podemos salientar que os investimentos em prevenção de
qualidade satisfazem o conceito de ativo.
As duas secções seguintes deste artigo servirão de apoio à quantificação dos
custos relacionados com a melhoria da qualidade, pelo que propomos a utilização
de dois instrumentos de gestão: relatórios de sustentabilidade baseados na GRI
e sistema de informação de custos de qualidade baseado nas atividades.
Relatório de Sustentabilidade da GRI
Os relatórios de sustentabilidade baseados na estrutura definida pela GRI
divulgam resultados e consequências que ocorreram durante o período relatado no
contexto dos compromissos, da estratégia e da abordagem de gestão adotados pela
organização (Diretrizes para a Elaboração de Relatórios de Sustentabilidade,
2000-2006). Os relatórios podem ser utilizados para objetivos relacionados com
o tema em análise, nomeadamente a avaliação da execução de sustentabilidade
relativamente a padrões de desempenho, bem como comparação do desempenho no
âmbito de uma organização ou entre diferentes organizações, ao longo do tempo.
É esta evolução que se pretende quantificar.
As Diretrizes dos Relatórios da GRI consistem em princípios que definem o
conteúdo do relatório e asseguram a qualidade da informação relatada. Inclui
ainda um conjunto de informações padrão, compostas por indicadores de
desempenho e outros tópicos a divulgar. Os indicadores de desempenho contidos
nas Diretrizes fornecem definições, orientações para compilações e outras
informações para auxiliar os responsáveis pela elaboração dos relatórios e para
assegurar a coerência na interpretação dos indicadores de desempenho.
A Parte 2 das Diretrizes para a Elaboração de Relatórios de Sustentabilidade
apresenta informações relevantes e indispensáveis para a maioria das
organizações, bem como para a comunicação de três tipos de informação padrão:
* Perfil: informações que estabelecem o contexto geral para a compreensão do
desempenho da organização, tais como a sua estratégia e governação;
* Abordagem de Gestão: informações que indicam a forma de abordar um
determinado conjunto de aspetos;
* Indicadores de Desempenho: produzem informações comparáveis sobre o
desempenho económico, ambiental e social da organização.
Para que os investimentos que contribuem para a melhoria contínua em qualidade
possam ser transpostos para as demonstrações financeiras, e para que as
organizações que contribuem com mais qualidade devam ser reconhecidas no
mercado onde atuam, são precisamente estes Indicadores de Desempenho da área
económica que pretendemos analisar e quantificar.
Importa ainda referir que a missão da GRI é fazer com que todas as organizações
encarem os relatórios de sustentabilidade como uma prática idêntica à
elaboração dos relatórios financeiros, já que os Indicadores de Desempenho são
informações qualitativas e quantitativas sobre as consequências ou resultados
associados à organização e que podem ser comparáveis ao longo do tempo.
Seguidamente, com o propósito de mostrar a importância dos Relatórios de
Sustentabilidade para o tema em análise, apresenta-se uma breve análise ao
Relatório de Sustentabilidade de 2008 da empresa Sonae Distribuição, SGPS, SA
(2008), cujo objetivo foi estudar o impacto que o investimento em qualidade tem
na redução das falhas relacionadas com a satisfação dos clientes e consequente
aumento das receitas, representando a fonte da vantagem competitiva. Neste
sentido, Alex Brigham (Sonae, 2011, p. 30), Diretor Executivo do Ethisphere
Institute, salienta que «numa época em que as empresas se esforçam por manter
uma vantagem competitiva, boas práticas traduzem-se em melhores negócios e
melhores negócios significam lucros. A Sonae reconhece o importante papel que
as boas práticas desempenham na reputação da marca que, em última análise, é o
ativo mais valioso de uma empresa».
A principal razão da opção por esta empresa reside no facto de ser bastante
representativa a nível nacional, tanto pelo seu volume de negócios, como pelo
número de clientes que atrai. Estes consideram ainda que a dimensão da empresa
implica uma responsabilidade social acrescida pela forma como incentiva a
população a adotar hábitos de consumo responsável. Os dados necessários para o
estudo foram obtidos através da consulta do site da empresa.
Logo no início do relatório é referido «que a história de sucesso da Sonae
Distribuição tem assentado sobretudo na qualidade», o que se torna um fator de
motivação para abordar este assunto, pois esta empresa representa um marco de
sucesso. A estratégia de crescimento assenta no aproveitamento seletivo de
oportunidades e permanente inovação, a nível dos formatos, dos conceitos e dos
produtos. Para além disto, «o sucesso do crescimento está também relacionado
com a forma eficaz como comunica e divulga as suas marcas, o que se comprova
através da notoriedade da insígnia Continente, que se encontra entre as cinco
marcas mais recordadas durante o ano de 2008, de acordo com um estudo
desenvolvido pela Publivaga (Marktest) que analisa as marcas mais reconhecidas
pela população portuguesa».
Enquadrado no investimento de prevenção em qualidade, e para melhor compreender
as expectativas dos clientes, foi realizado um inquérito com a intenção de
melhorar a qualidade dos serviços prestados e reduzir possíveis falhas. Os
questionários foram realizados a clientes através de 402 entrevistas
telefónicas aleatórias a clientes dos hipermercados Continente (134), Modelo
(134) e supermercados Modelo Bonjour (134), realizadas entre os dias 26 e 28 de
fevereiro de 2009, por uma entidade independente.
Da Ficha Técnica do Questionário aos Clientes importa salientar que o principal
objetivo a alcançar centra-se no «conhecimento das práticas de âmbito ambiental
e social desenvolvidas pela Sonae Distribuição consideradas mais importantes
pelos clientes e medição da notoriedade das iniciativas sociais realizadas»,
conforme Quadro_II. Foi utilizado o método por amostragem não probabilística,
sendo o nível de confiança de 95,5% e o erro associado à amostra de cerca
4,91%.
Destas práticas de âmbito ambiental e social, e de forte contributo para a
melhoria contínua da qualidade, foram questionados os seguintes temas:
* Iniciativas sociais com maior notoriedade (Leopoldina e Missão Sorriso);
* Proteção do ambiente e apoio à comunidade;
* Escolha do Jornal Modelo como meio de acesso à informação;
* Conhecimento dos Relatórios de Sustentabilidade da Sonae Distribuição;
* Medidas adotadas para proteção do ambiente e consumo de menos água e energia;
* Ações para assegurar a qualidade dos produtos;
* Produtos disponibilizados para promover uma alimentação saudável.
Neste âmbito, a Sonae Distribuição tem investido no desenvolvimento de
processos e comunicação que permitam um consumo mais informado e sustentável,
sendo de destacar a Gama Bio, cujos produtos biológicos estão isentos de
pesticidas prejudiciais à saúde, bem como a Gama Equilíbrio, cujos alimentos
apresentam um perfil nutricional otimizado. Todos estes desenvolvimentos
carecem de avultados investimentos na melhoria contínua da qualidade.
Para garantir uma melhor qualidade nos produtos e serviços oferecidos, foi
desenvolvido um conjunto de medidas preventivas, das quais se destacam:
* Manutenção dos sistemas de gestão de segurança alimentar;
* Programa de auditorias;
* Análise laboratoriais;
* Análises sensoriais.
Conforme se comprova através do Quadro_II, a faixa etária que demonstra melhor
conhecimento da atividade desenvolvida pela empresa situa-se entre os 35 e os
44 anos. Em termos globais, as faixas que demonstram menor interesse situam-se
entre os 18 e os 24 anos e superior a 65 anos.
Das ações desenvolvidas pela Sonae Distribuição, e inteiramente relacionadas
com o investimento em qualidade, foram identificadas pelos clientes como mais
importantes, as seguintes:
* As medidas adotadas para proteção do ambiente e consumo de menos água e
energia (56%);
* As ações implementadas para assegurar a qualidade dos produtos (42%);
* Os produtos disponibilizados para promover alimentação saudável (41%).
Numa atitude preventiva, foram realizadas em 2008 diversas ações de
monitorização e controlo de desempenho:
* 296 auditorias de segurança alimentar;
* 1020 inquéritos de autoavaliação de segurança física;
* 281 auditorias de conformidade nas áreas de Vendas, Compras e Inventários;
* 95 auditorias a ruturas de artigos em folhetos.
Foi criado o Projeto Cliente Seguro (Análise de Risco de Segurança na Ótica do
Cliente) com o principal objetivo de minimizar a probabilidade de ocorrência de
acidentes com clientes. Para isso, foi efetuada uma análise dos riscos que
podem ocorrer durante um processo de compra. Permitiu também incrementar o
nível cultural de segurança dos colaboradores e transmitir aos clientes uma
perceção de segurança quando frequentam as lojas. Foram aprofundadas áreas de
risco e desenvolvidas as ações constantes no Quadro_III.
Estando perfeitamente enquadradas na melhoria contínua em qualidade, todas
estas ações de investimento em prevenção tiveram um forte impacto no
crescimento da empresa. Assim, ao aumento de 18% do número de clientes semanais
em 2008, correspondeu um crescimento de 25% do volume de negócios da empresa
(Quadro_IV), o que indica que o grau de satisfação do cliente tem melhorado,
com reflexos no aumento do consumo dos clientes.
Em conclusão, contata-se que o investimento em qualidade, ao ter forte reflexo
nos resultados líquidos do exercício, enquadra-se nos três elementos (recurso
económico controlado, benefícios económicos futuros e resultado de
acontecimentos passados) do conceito de ativo já investigado anteriormente,
representando uma verdadeira fonte de vantagem competitiva.
Sistema de informação de custos de qualidade baseado nas atividades
Segundo Quirós et al. (2006), só um sistema de custos baseado em atividades
(Activity Based Costs) pode proporcionar informação apropriada para reduzir os
custos e melhorar a qualidade ' o que se torna fundamental para compreender
como se gera a vantagem competitiva.
Por um lado, é necessário atuar sobre as atividades geradoras dos custos, a fim
de atingir a melhoria contínua. Por outro, é possível estabelecer uma relação
causa-efeito entre as atividades e produtos, de tal forma que ao maior consumo
de atividades correspondem maiores custos.
Estes sistemas ABC mencionam que são as atividades, e não os produtos ou
serviços, os geradores de custos, pelo que esta filosofia assenta em duas
importantes reflexões.
Por um lado, é necessário atuar sobre as atividades geradoras dos custos, a fim
de atingir a melhoria contínua. Por outro, é possível estabelecer uma relação
causa-efeito entre as atividades e produtos, de tal forma que ao maior consumo
de atividades correspondem maiores custos.
Desta forma, a correta gestão de custos implica a distinção das atividades que
acrescentam valor daquelas que não acrescentam, em função da sua atuação em
relação ao produto ou serviço. As atividades são consideradas de valor
acrescentado, se forem estritamente necessárias à obtenção do produto ou
serviço (e.g., expedição de uma ordem de compra), bem como se aumentarem o
interesse do cliente pelo produto ou serviço (e.g., corretos acabamentos). A
atividade sem valor acrescentado não exerce influência sobre a apreciação do
cliente (e.g., armazenamento de produtos acabados).
As empresas devem centrar a sua atenção nas atividades que acrescentam valor, a
fim de obter o produto ou serviço logo à primeira e de acordo com as
expectativas do cliente. As atividades sem valor acrescentado representam um
manancial de ações (e.g., inspeção de matérias-primas) enquadradas nos custos
de avaliação, que poderiam ser eliminadas se o órgão de gestão da empresa
investisse adequadamente em custos de prevenção para analisar, e.g., os
fornecedores com padrões de qualidade mais elevados. Neste caso evitavam-se os
custos de avaliação relacionados com a inspeção de matérias-primas.
Os critérios de atuação do sistema em análise pressupõem que as atividades para
prevenir, avaliar e corrigir falhas internas e externas adotem as etapas
descritas na Figura.
Podemos descrever as etapas do modelo descrito na figura anterior da seguinte
forma:
* Determinação dos custos diretos e indiretos pelos Centros de
Responsabilidade;
* Repartição dos custos de qualidade pelas atividades detetadas nos Centros de
Responsabilidade;
* Eleição e cálculo do custo unitário do cost-driver de cada atividade;
* Análise das atividades que não acrescentam valor para serem eliminadas;
* Comparação entre vários anos económicos dos cost-drivers que acrescentam
valor à qualidade para observar o progresso alcançado na sua execução;
* Determinação do custo de má qualidade, representado pela diferença entre o
custo da atividade e a melhor realização dessa mesma atividade;
* Através do somatório de todos os custos das atividades, determinar o Custo
Total de Qualidade.
Pelo exposto, constatamos que uma boa gestão das atividades origina uma
melhoria contínua da qualidade, sendo a sua utilização como medida de execução
o verdadeiro objetivo do modelo, o qual ambiciona uma adaptação rápida e
coerente dos sistemas de gestão e controlo ao novo paradigma (Kaplan, 1988).
Conclusão
A principal conclusão que se pode retirar do presente estudo centra-se na ideia
de que o investimento em prevenção, ao acrescentar valor em termos de
qualidade, preenche os requisitos do conceito de ativo: recurso económico
controlado, benefícios económicos futuros e resultado de acontecimentos
passados.
Desta forma, a charneira entre o que é qualidade e o que não é qualidade
encontra-se no conceito de valor acrescentado. Se aceitarmos que a qualidade
acresce valor ao produto, serviço ou atividade, então estaremos perante um
investimento em qualidade. Caso contrário, a atividade, ao não acrescentar
valor, gera custos de não qualidade.
Este aspeto ficou bem ilustrado no Relatório de Sustentabilidade da Sonae
Distribuição, SGPS, SA, pois às ações de investimento em qualidade (e.g.,
formação aos colaboradores e Projeto Cliente Seguro), monitorização e controlo
de desempenho, realizadas em 2008, corresponderam a um aumento de volume de
negócios de cerca de 25% e de visitas semanais de clientes às suas lojas de
cerca de 18%.
Este acréscimo de receitas está perfeitamente relacionado com a capacidade de
investimento incorpóreo que a empresa tem, nomeadamente, em formação interna e
externa, estudo sobre as preferências dos clientes, análise de processos e
avaliações com outras empresas do ramo (benchmarking). O sucesso empresarial
derivado de acontecimentos passados (conceito de ativo) permite atingir o
equilíbrio financeiro.
Facilmente as organizações internacionais reconhecem os investimentos em
qualidade como fazendo parte do ativo da empresa, só que, em termos de
tratamento contabilístico, não têm idêntico procedimento. Daí o contributo que
pretendemos dar com a elaboração do presente artigo.
Quanto à fiabilidade na mensuração do custo do investimento, existem algumas
dificuldades que necessitam de uma investigação futura mais profunda
Então, se por um lado não existem dúvidas sobre o enquadramento dos
investimentos em qualidade no conceito de ativo, por outro lado as condições de
reconhecimento (Norma Internacional de Contabilidade 38 e Diretiva 2003/51/CE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho) nem sempre são plenamente
satisfeitas. Quanto à primeira condição, não existem dúvidas de que a qualidade
é fundamental para um bom desempenho económico da organização. Quanto melhor
qualidade, melhor resultado económico. Quanto à fiabilidade na mensuração do
custo do investimento, existem algumas dificuldades que necessitam de uma
investigação futura mais profunda.