Diferenças entre marcas nos serviços multiple-play em Portugal
Os serviços de telecomunicações abriram uma janela para o mundo e trouxeram
consigo uma difusão e oferta de serviços muito para além do convencional, de
modo a responder às necessidades dos consumidores por informação. No mercado
português, os operadores de telecomunicações oferecem serviços integrados, isto
é, em pacotes que juntam os serviços de televisão (TV), voz (telefone) e acesso
a dados (Internet). Um pacote de serviços pode ser entendido como uma oferta
comercial de um operador, incluindo um ou mais serviços numa tarifa integrada e
em fatura única (ANACOM, 2011).
Segundo a ANACOM (2011), o número de operadores multiple-play tem vindo a
aumentar ao longo do tempo: havia seis operadores em 2006 e um ano mais tarde a
oferta subiu para onze. O número de subscrições também aumentou durante 2010,
assim como as receitas provenientes dos serviços triple play (TV, Internet e
telefone). Embora a maioria dos operadores centre a sua oferta em pacotes
double play e triple play, em 2010 dois operadores já ofereciam pacotes
quadruple play; contudo, este tipo de serviços representa apenas 2% do total de
subscrições, em contraponto às subscrições triple play que são responsáveis por
70% do total da oferta.
Importa referir que apesar da grande difusão dos serviços multiple-play, estes
não estão disponíveis de forma homogénea em todas as partes do território
nacional devido à tecnologia usada, à falta de operadores e à oferta limitada
de pacotes oferecidos, pelo que as escolhas dos consumidores estão
condicionadas pelas alternativas ao seu dispor em cada região (ANACOM, 2011).
O mercado português é dominado por três grandes marcas que mantêm entre si uma
forte rivalidade. Neste contexto, este estudo tem como objetivo avaliar os três
principais operadores de serviços multiple-play como percebidas pelos seus
clientes num conjunto de cinco variáveis-chave para a literatura do marketing:
satisfação, qualidade do serviço, comunicação, lealdade e as experiências da
marca.
O estudo encontra-se organizado da seguinte forma, após esta introdução, é
apresentada uma revisão da literatura sobre as variáveis alvo do estudo.
Posteriormente, é descrita a metodologia de investigação, seguida da
apresentação dos resultados. Finalmente, é efetuada uma discussão dos
resultados obtidos, as suas limitações e propostas de investigação futura.
Revisão de Literatura
Em marketing, a lealdade tem sido amplamente reconhecida como sendo de extrema
importância (Oliver, 1999). Segundo Bodet (2008), a lealdade é um tema-chave no
marketing, devido ao aumento da concorrência, em particular na indústria dos
serviços, e ao crescente foco que as empresas colocam no seu relacionamento com
os clientes, na qual assenta a abordagem do marketing relacional. Ao fidelizar
um cliente, uma empresa estabelece uma relação de longo prazo que se espera
mutuamente benéfica para ambas a partes (Pan et al., 2012).
Oliver (1997; p. 392) define a lealdade como «um compromisso profundo de
recomprar um produto ou serviço, causando assim uma repetição da compra da
marca, independentemente dos esforços de marketing feitos pela empresa e das
influências situacionais que possuem o potencial de causar um comportamento de
troca». Mais recentemente, Picon et al. (2014; p. 747) sugerem que a lealdade é
«o grau em que um consumidor pretende repetir a compra no futuro (intenção de
comportamento futuro), expressa uma vontade atitudinal positiva em relação ao
fornecedor (lealdade afetiva) e considera esse fornecedor a única opção para
transações futuras (lealdade cognitiva)». A visão da lealdade apresentada por
Oliver (1997) e por Picon et al. (2014) baseia-se na lealdade como um
constructo multidimensional.
A lealdade é assim encarada como tendo uma componente comportamental e
atitudinal. Segundo Picon et al. (2014), a perspetiva comportamental reporta à
repetição do comportamento de compra, ou seja, os consumidores podem repetir o
seu padrão de compra devido a uma questão de hábito, barreiras à mudança, ou
simplesmente devido à falta de alternativas. Já a lealdade atitudinal, refere-
se a um estado psicológico, afetivo ou cognitivo que o consumidor obtém como
consequência da estratégia relacional com uma empresa. Caruana (2004) indica
que um consumidor pode manter voluntariamente uma relação devido aos benefícios
que recebe durante a mesma. Ambas as componentes são relevantes na aferição da
lealdade, uma vez que, por um lado, a lealdade comportamental resulta na
repetição da compra e, por outro, a lealdade atitudinal tem reflexos na
intenção de recomendar e no passa-palavra positivo.
Consumidores leais beneficiam as empresas ao comprar mais, ao pagar preços
premium e ao influenciarem novos consumidores através do passa-palavra positivo
(Ganesh et al., 2000). Nos serviços financeiros demonstrou-se que um aumento de
5% na lealdade dos consumidores pode levar a um aumento do crescimento nos
lucros, entre 25 a 75% (Chan et al., 2001). Aaker (1991) estudou o papel da
lealdade no processo de atribuição de valor a uma marca e verificou que esta
pode funcionar como uma barreira à entrada de novos competidores e, como tal,
resultar num importante fator de sustentabilidade. Reichheld e Schefter (2000)
referem que os custos de atrair novos clientes são consideravelmente superiores
aos custos de retenção de clientes atuais.
A lealdade à marca resulta também numa série de benefícios: como sejam uma
recomendação baseada no passa-palavra positivo e maior resistência às
estratégias de fornecedores rivais entre os consumidores leais (Oliver, 1999).
Com base no apresentado, e tendo em consideração o mercado competitivo
multiple-play,é proposta a seguinte hipótese:
H1: Os níveis de lealdade dos clientes não diferem entre as três principais
marcas.
Nos serviços onde a concorrência é feroz, não basta satisfazer o cliente, é
necessário exceder as suas expectativas. Para Oliver (1981; p. 27), a
satisfação do consumidor é o «resumo do estado psicológico quando a emoção em
torno de expectativas não confirmadas se agrupa com os sentimentos prévios de
um consumidor acerca da sua experiência de consumo». Assim, a satisfação dos
clientes é o sentimento resultante da comparação do desempenho ou do resultado
proveniente de uma oferta em relação ao que era esperado (Kotler e Keller,
2006).
O resultado da comparação entre desempenho e expectativas leva a dois
resultados possíveis: desconfirmação positiva, quando o desempenho atual
atender ou exceder as expectativas, e desconfirmação negativa, quando o
desempenho atual não corresponde às expectativas (Jones e Suh, 2000).
Chen e Wang (2009) referem que a satisfação pode ser encarada como uma
consistência na avaliação entre as expetativas em relação a um serviço e o
desempenho percebido deste. Em conformidade com esta assunção, uma avaliação
positiva do serviço é uma reação fundamental para que um cliente continue numa
relação com a empresa ou com os seus produtos, bens e serviços, sendo um dos
pilares da lealdade. Zeithaml et al. (1996) vão ao encontro desta visão,
referindo que a satisfação com o valor do produto é determinante para gerar a
lealdade do consumidor. Rahul e Majhi (2014; p. 570) acrescentam que a
satisfação não é apenas responsável pela criação de lealdade, indicando que «a
capacidade de oferecer um elevado nível de satisfação ao cliente é crucial para
os fornecedores de serviços se diferenciarem da concorrência».
A literatura conceptualiza a satisfação de duas formas distintas: a
transacional e a acumulada (Lam et al., 2004; Shankar et al., 2003). A primeira
está relacionada com a avaliação que um cliente faz após uma determinada compra
ou experiência de consumo. A satisfação global é o resultado de todas as
satisfações resultantes de transações específicas anteriores (Jones e Suh,
2000). Lam et al. (2004) referem que a satisfação global é um bom indicador das
intenções e comportamentos de um consumidor. Rahul e Majhi (2014) sustentam que
se os consumidores tiverem boas experiências no uso de serviços móveis, isso
resultará numa boa satisfação cumulativa.
A satisfação do cliente é também considerada como um constructo afetivo (Spreng
et al., 1996), pois reflete o nível de sentimento positivo do cliente
relativamente a uma marca (Deng et al., 2010). A satisfação é importante, dado
ajudar as empresas a alcançarem objetivos financeiros e de mercado (Oliver,
1997) e, ao satisfazerem os seus clientes, é expectável que estes se tornem
leais (Oliver, 1999). Homburg e Giering (2001) afirmam que a satisfação do
cliente é uma questão fundamental no marketing, uma vez que clientes
satisfeitos podem transformar-se em clientes leais, o que constitui um garante
de rentabilidade, o que é crucial para a maioria das empresas. McDougall e
Levesque (2000) acrescentam que consumidores satisfeitos desenvolvem
comportamentos de lealdade e uma disposição para repetir o consumo de uma
marca. Tendo em conta que a satisfação reflete o grau de sentimento positivo de
um consumidor em relação a um fornecedor de serviços móvel, é importante saber
a opinião dele sobre os seus serviços (Rahul e Majhi, 2014).
Devido à competitividade verificada no mercado multiple-play é proposta a
seguinte segunda hipótese:
H2: Os níveis de satisfação dos clientes não diferem entre as três principais
marcas.
A qualidade do serviço é reconhecida como um dos principais elementos que
afetam a retenção de um cliente e a rentabilidade da organização no longo prazo
(Zeithaml et al., 1996). Para além disso, Low e Lamb (2000) indicam que a
qualidade do serviço é fundamental para o desenvolvimento de marcas fortes,
pois melhora a superioridade percebida das marcas.
Parasuraman et al. (1988; p. 15) definiram qualidade do serviço como «os juízos
dos consumidores acerca da excelência ou superioridade de uma empresa». Neste
contexto, a qualidade do serviço é determinada pela impressão global do
consumidor sobre o desempenho do serviço, os sistemas de entrega de serviço e a
experiência global do consumidor (Ko e Pastore, 2004). Devido às
características dos serviços face aos bens, ou seja, a sua intangibilidade,
heterogeneidade, perecibilidade e ao facto de a sua produção ser inseparável do
consumo, a avaliação da qualidade de um serviço é mais complexa que a avaliação
da qualidade de um bem.
Os estudos existentes na área dos serviços consideram a qualidade do serviço
como sendo um constructo multidimensional (Kang, 2006; Yoon e Suh, 2004).
Adotando a escola de pensamento americana, Parasuraman et al. (1988),
desenvolveram a escala de qualidade SERVQUAL, onde a qualidade do serviço é
composta por cinco dimensões – fiabilidade, tangibilidade, sensibilidade,
garantia e simpatia – que são muito importantes para a diferenciação das
empresas face aos serviços dos principais concorrentes (Bharati e Berg, 2005;
Kemp, 2005; Yoo e Park, 2007), podendo estimular os consumidores a comprarem
mais, tornarem-se menos sensíveis ao preço e promoverem o passa-palavra
positivo (Venetis e Ghauri, 2004).
Outra perspetiva para a conceptualização da qualidade é sugerida pela escola
nórdica, que encara este constructo como sendo bidimensional, incorporando a
qualidade técnica e funcional (Grönroos, 1984). A qualidade técnica é
resultante do resultado líquido da avaliação do serviço, já a qualidade
funcional pode ser vista como a avaliação subjetiva da interação com o serviço.
Segundo Buttle (1996), as principais divergências prendem-se com o número exato
de dimensões e a sua adaptação a distintos setores de serviços. Para este
estudo, adotou-se a conceptualização de qualidade proposta por Parasuraman et
al. (1988), porque a sua perspetiva é mais ampla, permitindo uma maior
liberdade na exploração das suas dimensões.
Na indústria automóvel, ao analisar o processo de reclamações, Stafford et al.
(1998) verificaram que a fiabilidade do serviço era a dimensão mais importante
na diferenciação das empresas. A qualidade nos serviços pode assim ser
utilizada como uma forma de diferenciação e vantagem competitiva, atraindo
novos clientes e aumentando a quota de mercado.
Coloca-se, assim, uma terceira hipótese no mercado multiple-play:
H3: Os níveis de qualidade de serviço percebidos pelos clientes não diferem
entre as três principais marcas.
A comunicação pode ser considerada uma condição necessária para a existência de
uma relação (Duncan e Moriarty, 1998), é um aspeto fundamental no
desenvolvimento de um relacionamento e as marcas despendem de uma grande
quantidade de esforços nesse processo.
Andersen (2001) refere que o marketing relacional realça a importância da
comunicação, troca de informação e conversação e do diálogo no desenvolvimento
e gestão das relações de marketing, tendo um papel importante na compreensão
das intenções e capacidade de um parceiro de troca. Odekerken-Schröder et al.
(2003; pp. 178 e 180) definiram comunicação como «as perceções de um consumidor
do ponto em que um retalhista mantém os seus consumidores informados através de
comunicação direta», enfatizando a perspetiva do cliente. A abordagem do
marketing relacional enfatiza a comunicação como sendo a troca de informação e
o diálogo no desenvolvimento e gestão das relações de marketing (Andersen,
2001).
A satisfação com a informação pode ser definida como «a satisfação do juízo
subjetivo acerca da informação usada na escolha de um produto» (Spreng et al.,
1996; p. 18) e é o resultado da avaliação do consumidor sobre os esforços de
comunicação de marketing de uma organização (Peng e Wang, 2006). As expetativas
podem ser geradas de formas distintas, mas as mais importantes são as criadas
com base na informação oferecida pela organização, pois são expetativas
controladas por esta. Neste estudo, a comunicação foi conceptualizada pela
forma como os fornecedores de serviço comunicam com os seus clientes de forma
clara e regular. É esperado que, num mercado competitivo, os esforços de
comunicação desenvolvidos pelas três principais marcas não difiram
substancialmente entre si.
Pelo que há que verificar a quarta hipótese:
H4: Os esforços de comunicação percebidos pelos clientes não diferem entre as
três principais marcas.
O conceito de experiência da marca tem captado a atenção dos responsáveis do
marketing, uma vez que os consumidores procuram marcas que lhes ofereçam
experiências únicas e memoráveis (Zarantonello e Schmitt, 2010).
As experiências da marca foram definidas por Brakus et al. (2009; p. 53) como
«respostas internas e subjetivas de consumo (sensações, sentimentos e
cognições) e respostas comportamentais invocadas por estímulos relacionados com
a marca, como sejam o design da marca, identidade, embalagem, comunicação e
meio ambiente». As experiências acontecem sempre que os consumidores procuram
por produtos, compram ou consomem um produto ou serviço (Arnould et al., 2002).
As experiências da marca são formadas por quatro dimensões: sensorial, que está
relacionada com os estímulos visuais, auditivos, tácteis, gustativos e
olfatórios criados por uma marca; a dimensão afetiva inclui as sensações
criadas pela marca e os seus laços emocionais com os consumidores; a dimensão
comportamental refere-se às experiências corporais, estilos de vida e
interações com a marca; e, finalmente, as intelectuais incluem a capacidade de
uma marca suscitar pensamentos convergentes e divergentes nos consumidores
(Brakus et al., 2009).
Cada vez mais os consumidores procuram estímulos, pois estes resultam em prazer
e satisfação. Assim, quanto mais agradáveis as experiências, maior a
probabilidade de os consumidores as quererem repetir e quanto mais experiências
uma marca desperte, maior a satisfação de um consumidor em relação a essa
marca. Brakus et al. (2009) referem que uma marca que provoque uma boa
experiência de consumo conduz à satisfação e à lealdade.
Desta forma, propõe-se a seguinte última hipótese:
H5: As experiências da marca provocadas nos clientes pelas três principais
marcas não diferem entre si.
Metodologia de Investigação
Esta investigação foi implementada tendo em consideração os três principais
operadores de serviços integrados de telecomunicações. No mercado português, os
operadores multiple-play oferecem serviços num pacote que pode integrar TV, voz
(telefone) e Internet. Segundo a ANACOM (2011), o número de subscritores destes
serviços aumentou durante 2010, bem como as receitas de ofertas triple play
(TV, Internet e telefone). Trata-se, pois, de um mercado competitivo onde
diversos operadores procuram aumentar as suas quotas de mercado através de
campanhas de marketing agressivo. Como tal, espera-se que os três principais
operadores tenham desempenhos semelhantes, tendo em consideração o elevado
índice de concorrência no setor.
Para a recolha de dados foi elaborado um questionário desenvolvido com base na
revisão de literatura. As medidas utilizadas foram traduzidas de inglês para
português, tendo sido utilizado o sistema de dupla tradução. Foram efetuadas as
alterações necessárias para melhorar a clareza e assegurar o correto uso das
escalas. Antes da sua aplicação final, foi efetuado um pré-teste com o objetivo
de validar o instrumento de medida.
O questionário que resultou do pré-teste foi distribuído a 1200 consumidores de
serviços multiple-play em quatro cidades de Portugal. Foram recolhidos 845
questionários, o que corresponde a uma taxa de resposta de 70,42%. Desses 845
questionários, 90 não foram considerados por não terem indicação da marca do
operador de serviços ou por os operadores não pertencerem a nenhuma das três
principais marcas analisadas neste estudo. Outros 10 foram eliminados por mau
preenchimento, resultando numa amostra final de 745 questionários (taxa de
resposta útil de 60,08%).
Foi adotada uma abordagem quantitativa para analisar as respostas ao
questionário, tendo sido utilizada estatística descritiva com recurso ao SPSS
20.0 e análise confirmatória de fatores através do AMOS 20.0 para validação do
modelo de medida. As hipóteses de pesquisa foram testadas com recurso à análise
de variância ANOVA.
Tratando-se de um estudo sobre marcas, foi pedido aos consumidores que
indicassem qual o seu operador de serviços atual, o tipo de serviço e o custo
do mesmo à data. Os itens usados para medir os cinco constructos foram obtidos
de acordo com as seguintes fontes: a lealdade foi avaliada através de quatro
itens adotados de Chiou (2004) e Lin e Wang (2006), onde dois itens avaliam a
resistência à mudança e os outros dois a lealdade atitudinal; a satisfação foi
medida recorrendo a Chiou (2004), visando a confirmação de expetativas e
satisfação geral; a dimensão fiabilidade da qualidade do serviço de Stafford et
al. (1998) foi utilizada para avaliar a qualidade do serviço; a comunicação de
marketing foi estimada por quatro itens do estudo de Spreng et al. (1996),
medindo respetivamente a informação acerca dos custos, sobre novos produtos, a
clareza e a satisfação dos consumidores; as experiências da marca foram
avaliadas usando a escala de doze itens de Brakus et al. (2009), onde são
captadas as dimensões sensoriais, afetivas, comportamentais e intelectuais das
experiências causadas pela marca. Todas as escalas utilizadas foram do tipo
Likert com sete pontos onde «discordo totalmente» e «concordo totalmente»
serviram como âncoras.
Por uma questão de confidencialidade, as três marcas analisadas designam-se por
Alfa, Beta e Gama.
Resultados e Análise
As distribuições das 745 respostas obtidas das três principais marcas são
respetivamente 26,2%, 54,8% e 19,1%. A demografia dos inquiridos foi avaliada
pelo género, idade, habilitações e profissão. No total, 47% dos inquiridos são
do género masculino e 53% do feminino, sendo que 14,2% dos consumidores tinha o
9.º ano, 33,3% o 12.º ano e 52,5% possuem um grau académico superior. Quanto à
situação profissional, 63,7% são trabalhadores por conta de outrem, 4,6%
trabalhadores independentes e 20,3% são estudantes.
A caracterização do serviço consistiu na identificação da marca do operador, no
tipo de serviço subscrito (single play: TV, Internet ou telefone; double play:
TV + Internet, TV + telefone, Internet + telefone; ou triple play: TV +
Internet + telefone) e no preço do serviço subscrito.
O pacote triple play é aquele com maior número de subscrições, substancialmente
mais que os pacotes double play e single play conjuntamente, conforme Gráficos
I e II.
Dos Gráficos_III e IV, verifica-se que a maior parte dos consumidores tem
subscrito um serviço com um custo associado entre os €30 e os €44,99. No caso
da empresa Beta, os serviços com preços até €30 têm maior peso do que o das
duas restantes marcas. Para cada uma das três marcas, a percentagem de
consumidores com um serviço subscrito acima dos €60 oscila entre os 6% e os 8%,
ainda assim superior ao número de consumidores que pagam menos de €15, que não
excede os 5% para qualquer das três marcas.
Antes de testar as hipóteses, verificou-se a normalidade das variáveis pelos
coeficientes de assimetria e curtose univariada e multivariada (Marôco, 2010).
A existência de outliers foi avaliada pela distância de Mahalanobis.
Posteriormente, efetuou-se uma análise confirmatória de fatores (CFA) onde os
itens foram agrupados de acordo com as suas escalas conceptuais. Foram
examinados os índices de modificação, os resíduos padrão e as estatísticas de
adequabilidade (CFI), de modo a detetar potenciais problemas com itens. Em
seguida, os itens foram analisados num contexto teórico de cada escala e foram
removidos os itens com base na sua relevância quantitativa e estatística
(Mentzer et al., 2001). Como resultado desta análise, foram retirados seis
itens correspondentes às experiências da marca.
Todos os itens utilizados apresentaram loadings aceitáveis e variâncias médias
extraídas (AVE) para todos os constructos superiores a 0,5 (Bagozzi e Yi,
1988), o que sustenta a existência de validade convergente. Para avaliar a
fiabilidade, foram calculados os coeficientes de alfa de Cronbach e a
fiabilidade compósita (CR) para cada um dos constructos. Os alfas de Cronbach
obtidos são fiáveis uma vez que excedem a recomendação de 0,70. Os níveis de
fiabilidade compósita também estão de acordo com os valores desejáveis (Bagozzi
e Yi, 1988). Todas as hipóteses foram testadas utilizando as escalas
purificadas. A Tabela_I apresenta os itens e as propriedades das medidas.
Utilizando o estimador de máxima verosimilhança (ML), examinou-se a validade
dos constructos e a validade convergente. Os resultados obtidos para o modelo
de medida indicam a adequabilidade dos dados ao modelo, pois os valores de
RMSEA, NFI, TLI e CFI estão bastante acima do critério mínimo de aceitabilidade
(Marôco, 2010). A Tabela_II apresenta as propriedades do modelo de medida.
A validade discriminante foi calculada ao comparar a raiz quadrada da variância
média extraída (AVE) para cada constructo com os valores de todas as
correlações entre os constructos (Fornell e Larcker, 1981). Na Tabela_III é
possível observar a matriz de correlações entre constructos.
As cinco hipóteses formuladas (H1 a H5) visam comparar as diferenças nas
perceções que os clientes de cada um dos três operadores de serviços triple
play têm acerca das variáveis consideradas: lealdade, satisfação, qualidade do
serviço, comunicação e experiências da marca. Para testar as hipóteses foi
utilizada a ANOVA. Uma das condições deste teste é a premissa da homogeneidade
de variância, onde a hipótese nula assume que não há diferenças de variância
entre grupos. Para testar a homogeneidade de variâncias foi conduzido o teste
de Levene (ver Tabela_IV).
Para as variáveis lealdade, comunicação e experiências da marca, o teste F de
Levene é de 1,645; 0,745 e 1,239, respetivamente, com um p-value superior a
0,05 para os três casos. Podemos concluir que não existe uma diferença
significativa entre as variâncias desses três grupos. A premissa de
homogeneidade de variâncias está assim confirmada.
Para as variáveis satisfação e qualidade do serviço, o valor de F para o teste
de Levene é de 5,483 e 5,234, respetivamente, com um p-value inferior a 0,05.
Assim, ao rejeitar-se a hipótese nula da assunção de homogeneidade de
variâncias, podemos utilizar a estatística F ajustada. Dois tipos de
ajustamento são oferecidos pelos testes Welch e Brown-Forsythe (ver Tabela_V).
Se o rácio F mostrar ser significativo com a estatística Welch ou Brown-
Forsythe, um teste post-hoc apropriado pode ser requerido, tal como o teste
Games-Howell, indicado quando a premissa de igualdade de variâncias não é
verificada. Utilizando as estatísticas Welch e Brown-Forsythe, verificamos que
em ambos os testes, e para ambas as variáveis, os seus F ajustados são
significativos. Como o p-value é inferior a 0,05 para todas as situações,
podemos rejeitar a hipótese nula e avançar para a comparação das médias entre
os grupos.
Assim, utilizou-se a ANOVA de modo a comparar as diferenças percebidas pelos
clientes das três principais marcas triple play para cada uma das cinco
variáveis consideradas (ver Tabelas_VI e VII).
A ANOVA revelou um resultado estatisticamente significativo para um nível de
significância de 5% para as seguintes variáveis: lealdade; satisfação;
qualidade do serviço e experiências da marca. Avançou-se então para os testes
post-hoc de Scheffe no caso das variáveis lealdade, comunicação e experiências
da marca, devido às diferenças de tamanho da amostra entre os grupos, e de
Games-Howell no caso das variáveis satisfação e lealdade, por não terem
verificado a assunção de homogeneidade de variâncias.
As comparações post-hoc com recurso ao teste de Scheffe para a Lealdade indicam
que as médias para os clientes Alfa foram significativamente diferentes das dos
clientes Beta. No que concerne ao constructo Satisfação, o teste de Games-
Howell revelou diferenças estatisticamente significativas entre os clientes
Alfa e Beta e entre os clientes Alfa e Gama. O teste post-hoc de Games-Howell
para a Qualidade do Serviço indicou diferenças estatisticamente significativas
entre os clientes Alfa e Gama. Finalmente, o teste de Scheffe para as
Experiências da Marca indicou que os clientes Alfa diferem dos clientes Beta e
Gama.
O Gráfico_V complementa a análise a cada um dos três principais operadores
triple play, oferecendo uma perspetiva visual sobre as perceções dos seus
clientes relativamente às cinco variáveis examinadas neste estudo.
Discussão
O objetivo do estudo foi avaliar quais as perceções que os clientes têm acerca
do seu operador de serviços integrado (triple play) para as variáveis
examinadas: lealdade, satisfação, qualidade do serviço, comunicação e
experiências da marca. Os resultados obtidos indicam claramente que existem
diferenças entre as três principais marcas.
A lealdade foi a segunda variável com menor impacto nos clientes para as três
principais marcas. Embora se possa assumir que estes se sentem no geral ligados
ao seu operador, a intensidade dessa relação não tem uma correspondência direta
com os seus índices de satisfação, de qualidade de serviço percebida ou dos
esforços de comunicação que o operador tem para com o seu cliente, podendo
estar relacionada com as experiências que a marca oferece e cria na mente do
consumidor. Os clientes Beta emergiram como os mais leais, existindo uma
diferença significativa entre os clientes Beta e os clientes Alfa, sendo os
últimos menos leais. Não foram encontradas diferenças significativas nos níveis
de lealdade entre os clientes Gama e os clientes Alfa ou entre os clientes Gama
e os clientes Beta.
Existem diferenças significativas nos índices de satisfação dos clientes Beta e
Gama para os clientes Alfa. Estes últimos são os menos satisfeitos e essa
diferença é estatisticamente significativa. Entre os clientes Gama e Beta não
foi encontrada uma diferença significativa, contudo os primeiros obtiveram uma
média superior no seu índice de satisfação.
Os clientes Gama percecionam o seu serviço como sendo de qualidade superior em
comparação com os clientes das duas restantes marcas, porém essa diferença só é
estatisticamente significativa em relação à Alfa.
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os
clientes das três marcas, no que se refere à comunicação. No geral todos
avaliam a informação disponibilizada pelos operadores como sendo correta, clara
e regular no que se refere ao serviço prestado.
As experiências da marca são um conceito relativamente novo. Dos resultados
obtidos, é possível concluir que as marcas ainda não oferecem experiências que
evoquem muitas sensações nos seus clientes, talvez devido à novidade do
conceito ou à própria natureza dos serviços a que estão associadas.
Ainda assim, este estudo revela que existem diferenças estatisticamente
significativas entre os clientes Beta e Gama para os clientes Alfa. As
primeiras duas marcas são claramente entendidas como sendo mais emocionais,
esta situação pode advir de uma série de fatores como sejam as campanhas
publicitárias, a interação com os centros de clientes, as cores e o design da
própria marca, uma vez que as experiências da marca surgem sempre que os
clientes interagem com algum estímulo relacionado com a própria marca. Neste
domínio, os clientes Beta entendem a sua marca como sendo aquela que
proporciona mais estímulos.
Genericamente, os clientes Alfa têm uma perceção estatisticamente diferente dos
clientes Beta para a lealdade, satisfação e experiências da marca e dos
clientes da Gama para a satisfação, qualidade e experiências da marca. Os
clientes Beta e Gama não têm perceções dos seus operadores significativamente
distintas entre si para nenhuma das variáveis examinadas. Não foram encontradas
diferenças significativas da comunicação que cada um das três marcas tem com os
seus clientes. Embora os clientes Gama sejam os que apresentam uma maior média
no que à satisfação, qualidade e comunicação diz respeito, os seus clientes não
são os mais leais, sendo esses os da marca Beta. Uma explicação plausível pode
ser o facto de Beta ser a marca que evoca mais experiências de entre as três
avaliadas.
Implicações Práticas
O mercado do multiple-play em Portugal é altamente competitivo, sendo dominado
por três grandes marcas que têm entre si ofertas próximas em tipos e preços do
serviço. Não sendo a amostra representativa das atuais quotas de mercado, deve
ser realçado o facto da marca com maior peso nesta amostra ser uma das que
obtém maiores índices nas cinco dimensões analisadas.
Os resultados demonstram claramente que menores experiências, esforços de
comunicação, qualidade e satisfação se traduzem igualmente numa menor lealdade
do consumidor. Os responsáveis pelo marketing das empresas devem assim
considerar estas variáveis na elaboração dos seus planos de marketing.
A aposta na qualidade pode ser encarada como fundamental, sendo que um mau
serviço (o serviço verificado ser inferior ao esperado) pode não gerar
implicitamente lealdade, mas conduzirá quase garantidamente a uma não
satisfação e, consequentemente, a um eventual comportamento de mudança. Um bom
nível de serviço é um pré-requisito para a satisfação e fidelização de
clientes. O esforço de comunicação das marcas foi a variável que não registou
diferenças significativas, o que significa que, do ponto de vista atual, os
clientes encontram-se satisfeitos com a comunicação de eventuais serviços,
alterações de tarifário e detalhe das faturas dos três operadores.
A experiência da marca é uma das variáveis que merece um esforço na sua
exploração. Isto é particularmente válido no mercado português, onde diversas
marcas recorrem a slogans e campanhas publicitárias que apelam a uma componente
mais sensorial (mudança de logótipo e cor tradicional associada à marca),
comportamental, intelectual (campanhas com base no humor) e afetiva (mais perto
do que é importante).
Algumas campanhas conduzidas neste mercado destinaram-se claramente a tornar
marcas de serviços tradicionalmente «aborrecidas» e indiferenciadas, em marcas
emocionais, geralmente presentes noutro tipo de mercados, conseguindo assim
criar um nível de diferenciação. Pode assumir-se que os consumidores são
sensíveis às diferenças das experiências das marcas, pelo que podem ser
exploradas como mecanismo de diferenciação.
Estas variáveis devem ser exploradas no sentido de gerar satisfação, ou seja,
exceder as expetativas dos clientes, uma vez que se encontra bem documentado o
seu posterior impacto na lealdade.
Limitações e Pesquisas Futuras
Este estudo contém algumas limitações. Estando o setor das comunicações em
permanente evolução, quer através da oferta de novos tipos de tecnologia (cabo,
fibra ótica, 3G, 4G), quer através de novos tipos de oferta em pacotes
(quadruple play com telemóvel e Internet móvel), é importante ter em
consideração tais fatores na hora de analisar os resultados, dado que a recolha
de dados foi feita no final de 2012 e no início de 2013, pelo que a
investigação apenas avalia as ofertas mais comuns à data da recolha de dados.
Estudos futuros deverão considerar já este novo tipo de oferta e a expetativa
de oferta de tecnologia futura por parte dos seus operadores.
Outra limitação da investigação prende-se com a amostra obtida, que não é
representativa da distribuição das quotas de mercado das três principais marcas
a nível nacional, estando condicionada à oferta existente à data nas cidades
onde foi recolhida, o que vai ao encontro do referido pela ANACOM (2011) de que
os serviços multiple-play ainda não estão disponíveis em todo o território
nacional de igual forma.
Estudos futuros poderiam ser conduzidos, com vista a elaborar o desempenho das
marcas ou de serviços no que refere exclusivamente à qualidade e suas
dimensões. Poderia ser interessante verificar a relação entre o número ou tipo
de reclamações e a qualidade percebida por dimensão, de modo a comparar se a
qualidade medida por indicadores de desempenho (por exemplo, rácios de
reclamação) encontra correspondência na qualidade medida por «diferença de
avaliações» como exemplo da escala utilizada neste estudo.
Por último, um estudo ao longo do tempo poderia ser uma mais-valia, não só
porque seria possível estabelecer uma relação entre os esforços das marcas e as
perceções dos clientes, como também avaliar a evolução da marca ao longo do
tempo em comparação com um período prévio e com as restantes marcas.