Estratégia tecnológica para empresas biotecnológicas brasileiras: Gerenciando
empresas em negócios de elevado risco e competição
Este artigo aborda um tema de relevância para as economias atuais, baseadas em
conhecimento, a questão da inovação tecnológica e sua relação com a competição
de empresas biotecnológicas. Partindo de um levantamento longitudinal do estado
da arte do sector privado da biotecnologia no Brasil, por meio de relatórios
setoriais e pesquisas acadêmicas sobre o setor, busca-se evidenciar a
importância de as empresas deste setor considerarem as estratégias tecnológicas
de forma a alcançarem vantagens competitivas sustentáveis, que permitam
sobreviverem e competirem em mercados de elevado risco e competição.
A tecnologia criou novas possibilidades às empresas e em diversas áreas fez
surgir novos produtos ou até mesmo um novo setor da economia, principalmente
quando a tecnologia adquiriu um status estratégico dentro destas organizações,
notadamente nos anos 1980. Nesta mesma década surgiram indústrias baseadas em
tecnologia, tais como as telecomunicações, indústria farmacêutica, indústria
química, indústria aeroespacial e a biotecnologia.
Em virtude da intensa concorrência que surgia, as empresas perceberam que era
necessário encontrar alguma fonte de vantagem competitiva que permitisse que
tais organizações se mantivessem no mercado, e encontraram na tecnologia (Friar
e Horwitch, 1985; Hsieh e Tsai, 2007) o elemento que permitiu reestruturar os
seus modelos de negócio (Teece, 2010).
A literatura acerca da estratégia sugere que as empresas precisam repensar a
forma tradicional na qual concebem suas estratégias competitivas, uma vez que
estas são formuladas com base em aspectos do micro e macroambientes do negócio.
Com base nesta análise, a empresa se utiliza da vigilância ambiental para
identificar oportunidades a serem exploradas, assim como as ameaças ao negócio.
Desta feita, a vigilância é necessária para estruturar a estratégia
competitiva, que, em essência, é a forma com que a empresa coordena seus
recursos (meios) para chegar ao seu objetivo (fim) enquanto empresa (Porter,
1980).
Em se tratando de negócios exclusivamente baseados em tecnologia, tal como os
bionegócios e independente do tamanho da empresa (Berry e Taggart, 1998), é
essencial que seus gestores considerem a tecnologia em suas estratégias, ou
seja, que façam uso de uma estratégia tecnológica (Ford, 1988). Isso se deve ao
fato de ser a tecnologia um dos aspectos mais importantes em ambientes
dinâmicos (Zahra e Bogner, 1999), altamente dependentes de venture capital
(Zahra, 1996; Beneito, 2003; Kropp e Zolin, 2005) e embasados exclusivamente em
pesquisa e desenvolvimento (P & D) [Friar e Horwitch, 1985; Zahra, 1996(a)].
Para atender essa finalidade, é necessário que se estruture um processo de
formação da estratégia tecnológica da empresa que deve tratar, segundo
Marcovitch (1991, p. 16), de «[...] medidas rotineiras que buscam elevar a
produtividade e a qualidade; projetos de inovação que garantam a tecnologia
necessária para a modernização e a expansão; e ações empreendedoras para
enfrentar rupturas tecnológicas imprevistas, promovendo alianças estratégicas
ou investindo em novas unidades de negócio». Esse planejamento envolve, também,
a definição das tecnologias de base, às quais é preciso ter acesso, as
tecnologias determinantes que caracterizam a possibilidade de diferenciação
competitiva da empresa, e acompanhar a emergência de novas tecnologias que
possam ser relevantes para o futuro da empresa. Sobre o último ponto, García-
Muiña e Navas-Lopéz (2007) demonstraram que, no caso do sucesso de empresas
espanholas de biotecnologia, atividades tecnológicas voltadas para processos de
exploração de conhecimento foram mais relevantes que capacidades tecnológicas
direcionadas à manutenção de vantagem competitiva já explorada.
No caso das empresas de biotecnologia, estas estão classificadas no setor de
alta intensidade tecnológica ' conforme a OCDE (2011) ', cujas empresas são
eminentemente caracterizadas pela alta demanda de recursos específicos e
consumidoras de altas taxas de capital.
A sobrevivência destas empresas pode ser alcançada mediante seis estratégias
possíveis: a) postura de empresa pioneira que introduz novos produtos no
mercado; b) determinação dos produtos que serão introduzidos no mercado; c)
escolha do uso de fontes internas e externas de Pesquisa & Desenvolvimento
(P & D); d) decisão acerca do nível de gastos com P & D; e) seleção do
portfólio de projetos de pesquisa básica e aplicada e f) proteção das vantagens
competitivas ganhas com as atividades de P & D [Zahra 1996(a)]. Desta feita,
o bionegócio precisa articular como desenvolver, adquirir e aplicar recursos
tecnológicos para alcançar um desempenho superior [Zahra, 1996(b); Porter,
2004; Pegels e Thirumirthy, 1996].
Em se tratando do setor biotecnológico, tal como ocorre em outros setores como
o farmacêutico e/ou médico, em virtude de os produtos gerados por esta
indústria demandarem complexidades produtivas (Pisano, 2006), conhecimentos de
fronteira tecnológica (Huergo, 2006; García-Muiña e Navas-López, 2007),
necessidades de recursos de produção muito específicos, consideráveis demandas
de investimentos em P & D (Beneito, 2003; Pisano, 2006), cujos resultados são
incertos (Spekman e Davis, 2004; Pisano, 2006), é cada vez mais comum se
observar no setor biotecnológico que as empresas decidem aliar-se para criarem
algo que, sozinhas, não teriam condições (Gemünden et al., 1996; Jesús Nieto e
Santamaría, 2010; Santoro e McGill, 2005), a exemplo das parcerias
estratégicas.
Estas decisões fazem surgir novas formas estratégicas de codesenvolvimento
(Nambisan, 2014) e dependência produtiva, pelas quais estas empresas competem
cooperando (Grandori e Neri, 1999). Jesús Nieto e Santamaría (2010)
evidenciaram a importância da colaboração tecnológica, particularmente para as
pequenas empresas. A colaboração tecnológica mostrou-se muito importante para
ampliar a capacidade de inovação das pequenas empresas, no que diz respeito à
oferta de novos produtos, principalmente a partir da cooperação com clientes ou
fornecedores.
Esta forma de coopetição faz surgir uma estrutura de governança destas firmas
(Siriram e Snaddon, 2004; Santoro e McGill, 2005) em torno de um objetivo
compartilhado (Ritter e Gemünden, 2004), que, à medida que o alcançam, traz
vantagens (Porter, 2004) para todas as firmas deste aglomerado (Porter, 1989;
Bathelt, 2005; Iammarino e McCann, 2006; Menzel e Fornahl, 2007) ou rede (Calia
et al., 2007) ou deste tipo de alianças (George et al., 2002) ou da cadeia de
suprimentos (Spekman e Davis, 2004), onde estas empresas mantêm seus links
externos (Teece, 1996). Esta governança também pode ser estimulada como
consequência de incentivos governamentais (Kropp e Zolin, 2005), pelos quais o
governo pode proporcionar os recursos necessários ao desenvolvimento de um
setor industrial, notadamente em setores tecnológicos altamente dependentes de
recursos financeiros.
No entender de Solleiro e Castañón (1999), os bionegócios que conseguem
sustentar suas vantagens competitivas na América Latina alcançam tal sucesso
mediante a consideração de cinco dimensões: a) atividades inovadoras para a
empresa melhorar sua posição no mercado; b) orientação para pesquisa e
objetivos voltados à tecnologia; c) consideração das fontes tecnológicas para a
aquisição de tecnologias essenciais; d) nível de investimentos tecnológicos
para adquirir ou desenvolver novas tecnologias; e e) mecanismos organizacionais
para gerir as funções tecnológicas da empresa.
De maneira geral, as caracterizações até aqui descritas são próprias de
empresas que atuam em um limiar do conhecimento de fronteira tecnológica,
próprio da subárea da biotecnologia humana. Tendo como exemplos os grandes
centros de referência em biotecnologia, como os EUA, Alemanha e França, passar-
se-á a caracterizar e discutir as especificidades do setor brasileiro, de forma
a melhor compreender a dinâmica setorial da biotecnologia e das empresas que o
compõe, delimitando-se a subárea de saúde humana em razão de que esta congrega
o maior número de empresas brasileiras (39,7% segundo BRBIOTEC, 2011),
justificando-se a escolha para análise.
O setor de biotecnologia no Brasil
Conforme classificação da OCDE (2013), a biotecnologia pode ser dividida nas
subáreas de saúde, agricultura, alimentação, recursos naturais, meio ambiente,
processamento industrial, bioinformática, e outros setores. E, ainda, entende-
se como empresa de biotecnologia aquela que utiliza a aplicação tecnológica
para produção comercial com base em organismos vivos, sistemas ou processos
biológicos, para a pesquisa e desenvolvimento, produção ou provisão de serviços
(OCDE, 2009).
Como tem relevância a análise a partir da biotecnologia na subárea do
agronegócio, constata-se grande literatura disponível, a exemplo de Valois
(1998), Oda e Soares (2001) e Cribb (2004), o que é justificado em razão de o
Brasil ser mundialmente conhecido como uma potência nos agronegócios. Desta
feita, embora outras subáreas da biotecnologia tenham sua importância
representada na realidade brasileira (tais como os recursos naturais,
ambientais e agrícolas, para citar alguns), tomar-se-á como foco das análises a
subárea da saúde humana, em razão da concentração de empresas nesta subárea
(39,7%).
No caso da saúde humana, o setor de biotecnologia brasileiro tem se
caracterizado com uma alta dependência de financiamento público e,
contrariamente aos postulados da OCDE (2013, 2009), por baixa capacidade de
inovação por parte das empresas biotecnológicas brasileiras. Há uma dependência
geral destas empresas de recursos das mais diversas naturezas, tais como
financeiros, humanos e de infraestrutura. Isto é explicado, em parte, pela
centralidade da produção em laboratórios públicos, a exemplo o Instituto
Butantan e a Fiocruz, pelo alto déficit comercial e baixa capacidade inovativa
da indústria nacional, e pela necessidade de aprimoramento do poder de compra
governamental como meio de estimular o desenvolvimento tecnológico setorial.
O relatório da biotecnologia disponibilizado pelo Ministério Brasileiro de
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC, 2010) aponta que a
subárea de saúde humana apresentou um déficit comercial de US$ 8,81 bilhões.
Desta forma, as empresas que não conseguem gerar retornos financeiros aos seus
investidores, normalmente são compradas por empresas maiores que se mostram
interessadas nos projetos de pesquisas nos quais as empresas vêm desenvolvendo.
Quanto aos pontos fortes acerca da estruturação setorial da biotecnologia no
Brasil, os consultores, que elaboraram o relatório Biotecsur (2008), destacam a
expansão dos cursos de pós-graduação stricto sensua partir de 2000 e a
consequente ampliação de grupos de pesquisa e publicações científicas, e a
crescente aplicação da biotecnologia em atividades econômicas.
Especificamente em relação ao setor produtivo, as limitações ao seu
desenvolvimento estão relacionadas aos seguintes fatores:
* Pequeno número de patentes depositadas por residentes brasileiros ou por
empresas brasileiras;
* Pouca expressividade do conjunto de empresas de biotecnologia enquadradas em
maioria (78%), essencialmente microempresas;
* Baixa interação universidade-empresa;
* Viés notadamente acadêmico quando da definição de políticas ao setor privado;
* Pulverização de recursos incapazes de produzirem significativas mudanças de
inovação tecnológica;
* Problemas de gestão e operacionalização de políticas públicas setoriais
(eminentemente oriundas dos Ministérios Brasileiros da Saúde e do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, além de agências de fomento
como FINEP); e
* Limitações dos processos de inovação no Brasil, que dificultam as atividades
de pesquisa e desenvolvimento (P & D).
Neste contexto da biotecnologia brasileira, encontram-se as empresas voltadas à
saúde humana que, segundo dados da Biominas (Biotecsur, 2008), em 2007,
totalizaram 16,9% do total de empresas brasileiras do setor. Ainda no mesmo
período, as empresas da subárea de saúde humana eram caracterizadas por até 10
anos de existência (total de 91,7%) e 20% das empresas desta subárea eram
empresas incubadas.
Em relação à condução dos negócios, o estudo revela as principais dificuldades
dos empresários brasileiros quanto aos aspectos financeiros (notadamente
geração de caixa, obtenção de capital de giro e de recursos de fontes de
financiamento). Embora aspectos comerciais estejam diretamente relacionados aos
aspectos financeiros, os empresários pesquisados não destacaram como problema
aspectos como know-howcomercial (Biotecsur, 2008).
Rezaie et al. (2008), embora enfocando o marco legal e o ambiente governamental
e suas influências na biotecnologia brasileira, destacam a necessidade de
consideração da gestão organizacional e do desempenho organizacional. Os
autores ainda ressaltam a importância para as empresas do setor privado quanto
a observação de estratégias coordenadas e efetivas para enfrentar a dispersão
geral do setor e destacam igualmente a necessidade de que essas empresas devem
considerar a inovação como suporte para o futuro crescimento da empresa, o que
está alinhado à necessidade de consideração de uma estratégia tecnológica.
Pimenta (2008) se deteve ao estudo do processo de institucionalização da
biotecnologia humana no Brasil, especificamente pelo mapeamento dos entraves
existentes no ambiente institucional brasileiro que podem dificultar a
implantação de instrumentos governamentais voltados ao setor. A autora conclui
que o tempo necessário para absorção de tecnologias para a geração de inovações
e a metodologia de avaliação dos instrumentos governamentais estão entre os
principais entraves. No tocante ao tempo necessário para a absorção de
tecnologias, torna-se evidente a necessidade, por parte das empresas
brasileiras investigadas, da consideração de estratégias tecnológicas que
permitam a aceleração dos processos internos que conduzam a patamares mais
competitivos frente ao mercado globalizado da biotecnologia humana.
Quanto ao cenário internacional, a ABDI (2008) elaborou um estudo onde
identificou que, a partir do total de empresas de biotecnologia, o Brasil ocupa
a 11.ª posição do ranking, e é o quinto país que mais emprega no setor de
biotecnologia. A ABDI (2008) ressalta que existem gargalos a serem enfrentados,
e dentre estes destacamos a formação incipiente em inovação (especificamente
quanto à gestão e empreendedorismo) por parte dos empresários do setor; a falta
de conhecimento dos mecanismos de transferência e comercialização de
tecnologias; e a falta de foco no desenvolvimento de produtos e processos em
projetos.
O relatório setorial detalhado e atualizado apresentado em 2011 pela BRBIOTEC
(2011), demonstrou que, do total de 237 empresas de biotecnologia brasileiras,
há uma concentração de empresas em São Paulo (40,5%) e Minas Gerais (24,5%). A
subárea predominante é a de saúde humana (39,7%), cujas empresas foram fundadas
em maioria a partir de 2000 (63%), e a maioria destas são caracterizadas como
micro e pequenas empresas (56%). Destas, 25% exportam seus produtos e 86%
importam insumos (reagentes e equipamentos).
O mapa demonstra a distribuição das empresas dedicadas à saúde humana e
evidencia a concentração geográfica das mesmas em três cidades: São Paulo, Belo
Horizonte e Rio de Janeiro.
O relatório ainda aponta uma preocupação das empresas com relação a dois pontos
principais: a) a busca por recursos financeiros por meio de fontes de
financiamento; e b) a procura por proteção dos produtos por meio de patentes.
O relatório não apresenta aspectos de gestão destas empresas; porém, pela
caracterização destas, é possível perceber que se trata de micro ou pequenas
empresas, onde o planejamento de estratégias tecnológicas se faz essencial.
Atualmente, 89 empresas (33%) das empresas brasileiras na subárea de saúde
humana se dedicam ao desenvolvimento de novos medicamentos (pequenas moléculas
ou organismos biológicos), além de diagnósticos, vacinas, terapia celular,
medicina regenerativa e engenharia de tecidos, métodos avançados para
reprodução assistida, testes genéticos e moleculares (Resende, 2012).
Em seu último relatório, a Ernest & Young (2013) identificou que a questão
mais urgente no setor, tanto no Brasil como no mundo, é superar as barreiras
que impedem as empresas de médio porte em demonstrar aos investidores o valor
de retorno dos produtos em desenvolvimento. No caso brasileiro, 78% das
empresas contam com financiamento público e apenas 14% financia projetos
mediante parcerias com outras empresas ou fundos de capital de risco.
A ANPROTEC (2014) divulgou no XXIV Workshop da ANPROTEC um estudo que
evidenciou, com base nos dados do relatório da Biominas, que as empresas de
biotecnologia seguem a tendência geral do setor de biociências como um todo. O
estudo ressaltou que as empresas brasileiras são frágeis no que se refere a
produção de patentes, marketing e gestão do negócio. Na pesquisa realizada com
39 empresas localizadas no Rio de Janeiro, identificou-se que 26 empresas
contemplaram o mercado internacional em seus planos de negócio, 24 estudaram o
mercado quanto aos competidores, 28 declararam conhecer os preços do mercado,
26 definiram seus posicionamentos estratégicos, 24 possuem uma estratégia
formal de preços e 12 possuem um responsável pela inteligência de mercado.
Em termos institucionais, o Brasil ainda não oferece uma estrutura adequada, um
marco regulatório adequado e também um mercado desejável para que tais empresas
se desenvolvam com maiores taxas de crescimento nos próximos anos. Em especial,
no caso da produção de medicamentos, o Sistema Único de Saúde pode representar
o principal cliente de empresas farmacológicas, conforme Reis et al. (2015).
Para o desenvolvimento de novas drogas, é comum o estabelecimento de parcerias
no formato de rede, como forma das empresas lidarem com as incertezas e a
complexidade do processo inovativo neste setor. Mesmo contando com uma base
acadêmica forte, a comunidade científica desta área sofre com o desenvolvimento
de novas drogas, o que acontece em virtude de ser um processo que necessita de
muito tempo, muito investimento e é de elevado risco (Torres-Freire et al.,
2014).
Em relação às áreas de nano biotecnologia, organismos geneticamente
modificados, transgênicos, terapia gênica, clonagem, células-tronco e controle
biológico em agricultura, a participação brasileira no quadro geral de
registros de patentes, no período de 1998 a 2007, é nula, dado que nenhuma
empresa brasileira ou mesmo instituições brasileiras se encontram de entre os
depositantes (ABDI, 2014).
Quanto às características dos bionegócios brasileiros, a Fundação Biominas
(2011) publicou um relatório setorial onde se identificou que a maioria das
empresas é jovem (38% possui entre 2 a 5 anos de idade), microempresas (54,2%)
com faturamento anual máximo de R$ 1 milhão. O modelo de negócios destes
bionegócios se caracteriza pela comercialização de produtos desenvolvidos
internamente (66%) ou pela prestação de serviços (62%). Identificou-se, de
entre os empresários participantes da pesquisa, que 45% dos bionegócios possuem
como prioridade o desenvolvimento de inovações disruptivas[1] e que para 62,9%
dos empreendedores o desenvolvimento e a comercialização dos produtos
inovadores é o principal parâmetro de sucesso da empresa.
Anteriormente (Biominas, 2007), as empresas que participaram da pesquisa
relataram que possuíam dificuldades no processo de aquisição de máquinas e
equipamentos. Além do grande problema da falta de profissionais qualificados,
enfrentavam dificuldades em lidar com o processo regulatório e de propriedade
intelectual (o que requer assessoramento jurídico). As empresas relataram,
ainda, sentir grande dificuldade com aspectos de know-how comercial e de
obtenção de financiamento (Biominas, 2007). No novo relatório setorial
(Biominas, 2011), os maiores desafios dos bioempreendedores residem na captação
de recursos financeiros (52%) para investimento em P & D (83%), a exploração
de novos mercados (34,7%) e a ampliação da infraestrutura empresarial (32,7%),
para citar os três principais.
Como obstáculos a serem superados pelos bionegócios brasileiros participantes
do relatório setorial (Biominas, 2011), os bioempresários relatam que as
empresas iniciam suas atividades sem ter uma noção clara do mercado de atuação
em função da utilidade e valor gerado para o cliente. Os bionegócios carecem de
conhecimento para caracterizar a procura dos seus produtos no mercado e
conhecer os critérios de compra do mercado-alvo, etapa da definição estratégica
da bioempresa que não é considerada e acaba por gerar investimentos
equivocados.
Outro desafio consiste na escassez de empresas que elaboram um planejamento
estratégico, o que em parte se explica pelo fato de a bioempresa ter-se
originado por um técnico da área (com formação na área de ciências da vida) e
com raras exceções com formação também em administração de empresas ou pela
presença de um diretor administrativo que se dedique às questões
administrativas da bioempresa, ou seja, as bioempresas pouco se utilizam de
práticas sofisticadas de planejamento estratégico. Conforme o relatório
(Biominas, 2011), as empresas que não possuem um planejamento definido (em
relação aos prazos e metas) enfrentam dificuldades quanto à estimativa do
montante de investimentos necessários para os anos seguintes, não estabelecem
precisamente a dinâmica de crescimento e, principalmente, não conseguem
estabelecer como será gerado o fluxo de caixa da empresa.
As limitações das empresas biotecnológicas brasileiras quanto à geração de
patentes, o que reflete a pouca atenção à definição das estratégias
tecnológicas, implicam o baixo quantitativo de geração de patentes, que está
presente no estudo realizado por Loureiro e Dias (2015). As principais
estratégias das empresas brasileiras estão viradas para a proteção comercial do
mercado brasileiro, uma vez que os EUA são o maior depositário de patentes
biotecnológicas no Brasil. Este, por sua vez, destaca-se no registro de
patentes oriundas da indústria (tal como em tecnologias para a produção de
bioenergias).
Sugestões para os bionegócios e aos bioempresários Brasileiros
A tendência mundial no setor de biotecnologia, em função de ser um setor
altamente exigente em termos de recursos diversos e altamente especializados
(como por exemplo: humanos, tecnológicos, financeiros), de elevada complexidade
e pelas características próprias setoriais já nominadas, faz com que as
bioempresas se organizem de forma estratégica, tais como em parcerias
estratégicas, arranjos produtivos locais, redes, ou ecossistemas de inovação.
Ou seja, em formas estratégicas de meso-nível (o nível de governança de
diversas empresas, tal como ocorre em arranjos produtivos locais ou clusters
industriais)[2] que as permitam desenvolver suas inovações, muito em função da
captação de recursos (Biominas, 2011).
No entanto, no Brasil ainda é pouco usual tais formas de cocriação, muito em
função de uma questão da cultura empresarial em desenvolver dentro da empresa e
ter o controle sobre o que está sendo desenvolvido no nível interno. As
empresas poderão ter de enfrentar problemas em função de comportamentos
oportunísticos (Williamson, 1979), que embora sejam celebrados contratos, ou
mesmo por meio de proteção de patentes, as empresas podem decidir em não abrir
o desenvolvimento de uma inovação a outras prováveis parceiras, o que atrofia o
desenvolvimento de novas descobertas, com maior velocidade e de maneira
colaborativa.
Percebe-se, portanto, que são eminentemente tarefas do administrador do
bionegócio, a captação de recursos e a visualização de oportunidades no
mercado. Percebe-se que o valor do bionegócio é a apropriação de uma
oportunidade de negócio, tarefa que requer ampla coordenação dos recursos
internos da empresa por parte do seu bioempresário. No segundo momento, o
bioempreendedor poderá identificar o mercado potencial para seu produto por
meio do uso dos conhecimentos de estratégia.
Em relação à captação de investimentos (Biominas, 2011), as dificuldades
sentidas pelos bionegócios brasileiros somam-se com os bionegócios de outros
países, uma vez que em grande parte os investimentos são de origem pública e
países como os EUA, França, Canadá, Irlanda, Bélgica, Espanha, Suíça, Reino
Unido, Coreia do Sul e Suécia são os países que possuem maior financiamento
público à biotecnologia. Frente às dificuldades de financiamento público,
percebe-se o surgimento de novas relações entre os setores público e privado de
forma a partilhar custos, riscos e resultados das inovações (Freitas et al.,
2013).
No caso brasileiro, organismos como CNPq, Capes, FINEP e MCT buscam fomentar a
biotecnologia brasileira por meio de políticas científicas e tecnológicas
nacionais. Mesmo assim, o Brasil não pode ser considerado importante player no
cenário biotecnológico internacional em função do elevado investimento feito
pelos países desenvolvidos neste setor. A nível nacional, seria interessante
delimitar áreas prioritárias de desenvolvimento e destinar recursos públicos
para o desenvolvimento setorial, a partir de expertise gerada por áreas
específicas no território nacional (Freitas et al., 2013).