Editorial
EDITORIAL
Editorial
Cecilia de la Garza [1] & Mario Poy[2]
[1] EDF R&D, Management des Risques Industriels 1, Av. Général de Gaulle
92140 Clamart France
cecilia.de-la-garza@edf.fr
[2] Universidad de San Andrés Centro de Investigaciones por una Cultura de
Seguridad Industrial Vito Dumas 284 B1644BID - Victoria, Buenos Aires Argentina
mpoy@udesa.edu.ar
Caros leitores,
Este número da Laboreal tem início com um artigo de Laurent Vogel na rubrica
“arqueologia do conhecimento”. Com o seu artigo “Um espelho deformante: notas
históricas sobre a construção jurídica das doenças profissionais na Bélgica”,
Vogel apresenta um trabalho notável sobre as determinantes sociais que
definiram a constituição jurídica da lista de doenças profissionais na Bélgica.
A tese central do autor é que os diferentes saberes e conceitos, como o de
causalidade, patologia e as instituições sociais, jurídicas e culturais atuam
como verdadeiros “filtros” que afetam diretamente o estatuto jurídico de
determinadas doenças associadas ao trabalho. É o caso, por exemplo, do cancro e
das patologias mentais, bem como a marginalização do trabalho feminino ou a
inclusão do trabalho dos imigrantes em verdadeiras “zonas cinzentas”. Para
ilustrar esta ideia de forma clara, Vogel assinala como a Bélgica, embora tenha
sido um país com uma forte atividade mineira, declarou a silicose como doença
profissional com um atraso muito significativo em relação a outros países com
atividade similar. Por fim, o autor conclui assinalando que, entre outros
fatores, desempenharam um papel importante a monetização dos riscos e o facto
de os sindicatos não considerarem a saúde no trabalho como um elemento de luta
e negociação, pelo menos numa primeira fase.
Este número continua com a apresentação da segunda parte do dossiê temático dos
trabalhos expostos no simpósio Ergonomic Analisys of Work and Training do
Congresso da IEA em 2012, no Recife, Brasil. Céline Chatigny faz a introdução
ao referido dossiê, retomando os objetivos e áreas de investigação que
caraterizam esse tipo de estudos acerca da problemática da formação
profissional, que mantém como eixo central a análise da atividade de trabalho.
Um dos principais pontos de interesse dos três artigos é o facto de fornecerem
reflexões recentes em torno da aprendizagem e de como proceder à sua análise.
O texto de Sandrine de Cortessis apresenta um estudo desenvolvido na Suíça
intitulado “Um dispositivo de experimentação para os avaliadores na validação
dos adquiridos pela experiência”.
Neste, faz a análise de um dispositivo de Validação de Adquiridos pela
Experiência (VAE) destinado a formalizar os conhecimentos adquiridos pela
experiência. A investigação centra-se concretamente nas modalidades de trabalho
dos avaliadores que participam neste tipo de dispositivos, mediante sessões de
regulação que lhes permitem uma ressignificação das suas estratégias de
avaliação, ajustando coletivamente a forma de atuar.
No artigo de Claire Tourmen, Annie Leroux e Sylvie Beney “O que se aprende nos
primeiros momentos do trabalho e como?” as autoras interessam-se pela questão
do tempo de aprendizagem e nomeadamente pelos primeiros momentos de
aprendizagem profissional de assistentes sociais em França. É visível como a
análise da atividade permite identificar situações significativas para a
aprendizagem que são identificadas pelos praticantes de forma distinta e em
diferentes momentos (reuniões, vivência, observação de um papel).
O artigo de Céline Chatigny, “A saúde e a segurança dos estudantes num centro
de formação profissional: Abordagens, representações e género”, apresenta uma
situação que poderia ocorrer em qualquer país entre formações e géneros. A
autora demonstra, através de um estudo das problemáticas da saúde e segurança
em centros de formação de Eletromecânica e de Cabeleireiros no Canadá, como os
alunos têm representações sumamente diferentes acerca da sua saúde e segurança
e como estas podem estar marcadas pelo género e por estereótipos sobre ofícios
femininos/ masculinos. Tal acontece, sobretudo, com as mulheres que lutam para
integrar-se em meios fortemente masculinos.
Continuando com a temática da análise da atividade do trabalho e da formação,
na rubrica “resumos de teses”, Jeanne Thébault apresenta, através de um estudo
quantitativo e qualitativo, uma investigação intitulada “A transmissão
profissional: processo de elaboração de interações formativas em situação de
trabalho. Uma pesquisa realizada junto à equipe de cuidados em saúde de um
Centro Hospitalar Universitário”. Esta investigação tem como eixo central as
modalidades de interações formativas entre o pessoal interno e os recém-
chegados à equipa, no setor hospitalar. O estudo desenvolve-se, mais
concretamente, em três setores (cirurgia cardíaca, reumatologia e reabilitação)
e mostra de que forma se integra a atividade de formação na atividade
quotidiana dos profissionais envolvidos nesses setores. A autora identifica,
assim, três modalidades de interação formativa: "colocação entre
parêntesis", "aproveitar a oportunidade" e "para além
do binómio", dependendo da sua escolha da carga de trabalho e dos
imprevistos nas tarefas quotidianas dos serviços estudados.
No que diz respeito aos “textos históricos”, Régis Ouvrier Bonnaz selecionou o
texto de Karnas e Salengros “A análise do trabalho trinta anos após Ombredane e
Faverge”. Através deste texto, poderemos verificar como a análise do trabalho
em ergonomia continua a ser atual 60 anos depois. Tal como evidencia Anne
Lancry no seu comentário introdutório ao texto mencionado, os métodos evoluíram
e adaptaram-se, tendo incorporado técnicas das ciências sociais e humanas. Da
mesma forma, a análise do trabalho explorou âmbitos profissionais bastante
distintos. No entanto, quaisquer que sejam os métodos ou situações estudadas, a
análise da atividade continua a ser o cerne do problema, como resultado da
atividade desenvolvida, construída e aprendida pelos trabalhadores, seja qual
for a sua função, formação ou nível hierárquico.
No “dicionário”, e seguindo a ordem alfabética, apresentamos a letra I de
“informação” e J de “jubilação”.
Para a primeira definição – “informação” – Javier Barcenilla apresenta na sua
análise a passagem de uma dimensão física a uma dimensão mais mental do
conceito. Tal como assinalam Karnas e Salengros no texto histórico, a análise
da atividade cognitiva é um aspeto cada vez mais relevante da atividade dos
trabalhadores. Neste sentido, Barcenilla traça um percurso da construção de
modelos e técnicas específicas para poder inferir e compreender a forma como as
pessoas tratam a informação, o sentido que lhe atribuem dentro do seu contexto
laboral, a utilização que dela fazem para se adaptarem, aprenderem e
desempenharem a tarefa prescrita.
Quanto à definição do conceito “jubilação”, Corinne Gaudart propõe um percurso
histórico breve e preciso, associando as condições de trabalho e o
envelhecimento. Põe também em evidência a forma como o ciclo vital "ternário",
produto do paradigma fordista – educação, trabalho e jubilação numa idade fixa
– está seriamente a ser posta em causa nos dias de hoje. A autora volta a
assinalar a estreita relação entre trabalho e jubilação, deixando claro que
esta última é um processo construtivo (ou destrutivo) intimamente relacionado
com a atividade de trabalho e que, por isso, é determinante levar em
consideração a duração da vida profissional e o momento da jubilação. Gaudart
insiste também na necessidade de considerar a experiência laboral como
positiva, os trajetos e as carreiras profissionais como construtivos e fontes
de desenvolvimento de saberes, capacidades, experiências e saúde, para poder
chegar em bom estado de saúde à jubilação.
Assim, neste número oferecemos ao leitor conteúdos transversais em torno da
análise da atividade, da formação e de questões ligadas à saúde e ao trabalho.
Obviamente, este número não poderia existir sem um trabalho coletivo e, por
isso, gostaríamos de agradecer a todos os peritos que, com o seu trabalho,
contribuíram para a qualidade dos artigos de forma ativa e positiva.
Agradecemos igualmente aos tradutores, e em especial à Juliana Barros,
doutoranda de Selma Lancman da Universidade de São Paulo, aos revisores e a
todas as pessoas que se ocupam do design e da publicação online deste número.
Um agradecimento também a todos os autores que, com os seus trabalhos,
permitiram que um novo número da revista pudesse chegar aos nossos leitores.
Finalmente, gostaríamos de partilhar convosco duas boas notícias: a revista
aderiu à Crossref, o que permite que todos os artigos do ano de 2014 já tenham
DOI; mas ainda mais importante é referir que a Laboreal acaba de ser indexada
na SCIELO (Scientific Electronic Library Online), uma biblioteca electrónica
que integra uma rede ibero-americana de coleções de revistas científicas em
texto integral e que oferece um acesso aberto, livre e gratuito.
Boa leitura,
COMO REFERENCIAR ESTE ARTIGO?
De la Garza, C. & Poy, M. (2014). Editorial. Laboreal, 10(2), 7–9. http://
dx.doi.org/10.15667/laborealx0214cdgpt