Homenagem a Alain Kerguelen
O DICIONÁRIO
Homenagem a Alain Kerguelen
Catherine Delgoulet [1] & Béatrice Barthe [2]
[1] LATI (EA 4469) Institut de psychologie, Université Paris Descartes 71
avenue Edouard Vaillant F-92774 Boulogne-Billancourt cedex France
catherine.delgoulet@parisdescartes.fr
[2] Université Toulouse Jean Jaurès, UFR de Psychologie Laboratoire CLLE - LTC,
UMR 5263 CNRS, Maison de la Recherche, 5, allée Antonio Machado, 31058 Toulouse
Cedex 9 France
beatrice.barthe@univ-tlse2.fr
Alain Kerguelen deixou-nos a 4 de maio de 2015, algumas palavras para fazer uma
homenagem ao nosso querido colega e amigo. Tivemos a oportunidade e o prazer de
trabalhar com Alain Kerguelen desde a sua chegada ao Laboratoire Travail et
Cognition (LTC, dirigido por Yvon Quéinnec) da Université de Toulouse Jean
Jaurès (França). Foi há 20 anos, em meados dos anos 90. Alain tinha já
concebido diversas versões do software Kronos, no âmbito das suas atividades no
Conservatoire National des Arts et Métiers e, posteriormente, na École Pratique
des Hautes Études (Paris), e ele colocou toda a sua inteligência sobre as
situações de trabalho e todo o seu saber-fazer em benefício dos nossos
trabalhos respetivos de tese. Ele aproveitou essas oportunidades para rever e
implementar continuamente novas funcionalidades na sua ferramenta que ele
queria que estivesse ao serviço dos ergónomos (investigadores ou
interventores). Alain desenvolveu, por exemplo, funcionalidades permitindo:
- uma abordagem coletiva da atividade para facilitar o trabalho de análise das
verbalizações espontâneas, a partir das «listas de atributos interpretativos»
entre enfermeiras e auxiliares de puericultura de um serviço de neonatologia
(Barthe, 1999; Barthe, 2008 );
- uma monitorização integrada de gravações vídeo para a codificação da
atividade de aprendizagem no âmbito de formações de assalariados da manutenção
ferroviária (Delgoulet, 2000; Delgoulet, 2008);
- uma abordagem longitudinal da vida dos trabalhadores para a retranscrição dos
percursos profissionais (as continuidades e ruturas) dos prestadores de
cuidados de saúde de um centro hospitalar (Gonon, 2001);
- …
Estas colaborações, cuja lista acima não é exaustiva, foram também ocasião para
desenvolver sistemas de captação em tempo real de observáveis (a partir de
dispositivos do tipo «Personal Digital Assistant», e depois a partir de
tablets) evitando assim as longas horas de retranscrição das recolhas
anteriormente realizadas em suporte papel. Elas estiveram sempre ao serviço de
um ponto de vista sobre a atividade onde as diferentes dimensões desta (gestos,
ações, verbalizações, fenómenos fisiológicos, etc.) e o seu contexto de
elaboração não podem ser interpretados uns independentemente dos outros sem
reduzir consideravelmente a compreensão do trabalho (Delgoulet, Kerguelen &
Barthe, 2000).
Evidentemente, estas evoluções do software Kronos - posteriormente Actogram
Kronos -, em estreita ligação com os problemas com que nos deparávamos para dar
conta da atividade das mulheres e dos homens no trabalho, estavam completamente
associadas a discussões, e mesmo a controvérsias sobre a forma de analisar o
trabalho: trocas sempre ricas, às vezes musculadas mas nunca isentas de traços
de humor, sobre a nossa reformulação do pedido, sobre as nossas hipóteses de
trabalho e sobre as formas como perspetivávamos a sua operacionalização na
metodologia de análise.
A exigência de Alain era grande, bem como a sua perspicácia para recuperar os
elementos pertinentes de cada situação. Alain reconduzia-nos frequentemente até
ao sentido do trabalho que queríamos analisar, sobre o que pensavam os
trabalhadores, os primeiros em causa, sobre a importância de voltar ao terreno.
Ele insistia no princípio de que a ferramenta que concebeu fosse o mais aberta
possível (sem grelha predefinida ou catálogo de critérios observáveis a priori)
e que éramos nós os responsáveis pelas inovações e escolhas que fazíamos ao
longo da investigação.
Esta subtileza e solidez da análise, de que todos beneficiámos durante as
nossas teses (Le Bris, Barthe, Marquié, Kerguelen, Aubert & Bernadou,
2012), forneceu-nos um quadro precioso e rigoroso a partir do qual tivemos o
grande luxo de criar e bordar o acordo com as nossas problemáticas e aspirações
científicas. Declarar hoje o nosso imenso reconhecimento é essencial, mas muito
insuficiente face à generosidade de que Alain fez prova durante estes anos de
colaboração e de amizade.
Catherine Delgoulet & Béatrice Barthe
Agradecemos ao comité editorial da revista Laboreal o facto de nos ter
convidado a lhe prestar homenagem.