Apoio da comunidade residente ao desenvolvimento turístico sustentável: um
modelo de equações estruturais aplicado a uma cidade histórica do Norte de
Portugal
1. Introdução
As questões que se levantam acerca da importância do desenvolvimento
sustentável têm sido abordadas por múltiplas áreas científicas. Em 1987 define-
se pela primeira vez o conceito de desenvolvimento sustentável através do
relatório Brundtland e, desta forma, abre-se, também, a discussão em torno do
sector turístico. Neste sentido, vários autores começam a abordar esta temática
(Priestley, Edwards & Coccossis, 1996) muito devido aos graves problemas
resultantes da massificação do turismo.
No que diz respeito ao património, muitos são os exemplos de sobrecarga sobre
os recursos (van den Berg, van der Borg & van der Meer, 1995), podendo os
seus impactes serem, ou não, imediatos, dependendo, do nível de desenvolvimento
e do tipo de turismo (McDowall & Choi, 2010), da fase de ciclo de vida que
se encontram o destino (Butler, 1980), entre outros factores. Como resposta a
este problema têm sido seguidos, em alguns destinos, princípios de
sustentabilidade, isto é, formas de desenvolvimento que mantenham a integridade
social e económica das populações, bem como a perenidade do património natural,
construído e cultural, sendo esta postura ainda mais justificável tendo em
conta o carácter multissectorial do turismo (Cooper, Fletcher, Gilbert &
Wanhill, 2005).
O desenvolvimento turístico sustentável (DTS) exige uma abordagem
multidisciplinar, dada a transversalidade do sector, e pressupõe projectos e
estratégias de desenvolvimento que englobem as suas diferentes dimensões –
económicas, socias, culturais – que devem ter sempre presentes o envolvimento
dos residentes (Kuvan & Akan, 2005; Mazón, 2012; Pulido Fernández &
Sánchez Rivero, 2009).
Tal como refere Moniz (2006), nas últimas décadas vários estudos foram
realizados acerca do envolvimento e participação da comunidade local no
desenvolvimento do turismo, bem como acerca das reacções e atitudes das
comunidades face ao desenvolvimento desta indústria (Ap & Crompton, 1993;
Kitnuntaviwat & Tang, 2008; Kuvan & Akan, 2005; Perdue, Long &
Allen, 1990; Um & Crompton, 1987).
Para que exista uma estratégia bem delineada para o DTS, é imprescindível que
se realizem estudos acerca dos impactes económicos, sociais e ambientais (Kuvan
& Akan, 2005). A visão dos residentes, relativamente ao desenvolvimento
turístico e seus impactes, principalmente os que estão ligados com os
benefícios económicos, é positiva (Ko & Stewart, 2002; McDowall & Choi,
2010); mas, por outro lado, existem, cada vez mais, estudos que revelam a
presença de impactes negativos, sobre as comunidades receptoras, em várias
dimensões: culturais (Nunkoo & Ramkissoon, 2011; Sharma & Dyer, 2009),
sociais (Nunkoo & Ramkissoon, 2011) ou ambientais (Sharma & Dyer,
2009).
De um modo geral, existe cada vez mais interesse da literatura acerca do apoio
dos residentes ao DTS (Ko & Stewart, 2002) e seus antecedentes. No caso
português, principalmente, na última década, foram realizados alguns estudos
(Eusébio & Carneiro, 2010; Carneiro & Eusébio, 2011; Monjardino, 2009;
Soares, Emmendoerfer & Monteiro, 2013; Vareiro, Remoaldo & Ribeiro,
2013), que abordam a temática relativa aos impactes provocados pelo
desenvolvimento turístico. Contudo, tanto quanto sabemos, são muito escassos os
estudos que retratam o apoio dos residentes relativamente ao desenvolvimento
sustentável em cidades históricas.
Neste artigo, é proposto um modelo conceptual que pretende averiguar
antecedentes ao apoio da comunidade residente ao DTS de uma cidade histórica do
Norte de Portugal (cidade de Lamego). O principal objectivo é analisar as
relações entre os seguintes constructos: a ligação à comunidade, o envolvimento
na comunidade, a gestão do poder público, os custos e benefícios percebidos e o
apoio ao DTS.
2. Revisão da literatura e hipoteses de pesquisa
2.1 DTS e o apoio da comunidade local
A United Nations World Tourism Organization (UNWTO) define o turismo
sustentável como “O turismo que considera os actuais e futuros impactes
económicos, sociais e ambientais, atendendo às necessidades dos visitantes, da
indústria, do meio ambiente e das comunidades de acolhimento” (World Tourism
organization [WTO], 2005, p.12). Segundo esta organização, o desenvolvimento
deste tipo de turismo requer a participação informada de todas as partes
interessadas, bem como uma forte liderança política que garanta uma ampla
participação e construção de consenso. Trata-se de um processo contínuo que
requer uma monitorização constante dos impactes, para que possam ser
introduzidas medidas preventivas e/ou medidas correctivas (WTO, 2005).
Tem existido uma evolução positiva do conceito de DTS, uma vez que inicialmente
a problemática da sustentabilidade estava centrada, somente, em aspectos
ambientais tendo, posteriormente passado a integrar questões económicas,
sociais, culturais e factores ligados ao poder e equidade social (Moniz, 2006;
WTO, 2005).
O turismo deve respeitar os direitos e desejos dos povos locais e prover a
oportunidade para que amplos sectores da comunidade contribuam nas decisões, no
planeamento e na administração do turismo. É consensual que a participação dos
residentes no planeamento do destino é indispensável para que exista um
desenvolvimento sustentável do mesmo (Chen & Chen, 2010a; Dyer, Gursoy,
Sharma & Carter, 2007). Neste sentido, é vital que os diversos
intervenientes do processo – governos locais, políticos, gestores do património
e empresas (que, na maioria das vezes, lideram os diversos processos de
desenvolvimento) – compreendam a importância desse envolvimento, uma vez que o
sucesso de um plano de desenvolvimento sustentável depende do apoio activo da
população local (Gursoy & Rutherford, 2004; Soares et al., 2013).
No que diz respeito ao DTS, cultural e patrimonial, Garrod e Fyall (2000)
chamam a atenção para a escassez de estudos existentes, afirmando que é
surpreendente a pouca atenção académica que tem sido dada à exploração da
relação entre o turismo patrimonial e a sustentabilidade, porque os dois
conceitos, evidentemente, partilham um tema comum.
2.2 Ligação à comunidade, impactes do turismo e apoio ao DTS
A ligação à comunidade pode ser encarada como a integração e participação de um
indivíduo na vida de uma comunidade (McCool & Martin, 1994). Segundo os
autores, este conceito reflecte uma ligação afectiva ou emocional estabelecida
entre um indivíduo e uma comunidade específica. Trata-se de “um conceito
complexo, integrado e multifacetado que incorpora a relação entre as pessoas e
a sua comunidade”, abrangendo várias componentes, cujos elementos centrais
estão ligados a: emoção, afecto, significado, sentimento de união e valor
relativamente à comunidade (Nicholas, Thapa & Ko, 2009, p.395).
A ligação por parte dos habitantes à sua comunidade pode conduzir ao apoio ao
DTS. Alguns estudos são exemplo desta relação directa e positiva (Gursoy &
Rutherford, 2004; Lee, 2013 Nicholas et al., 2009), no entanto, existem outros
estudos que não encontraram uma relação significativa entre a ligação à
comunidade e o apoio ao desenvolvimento turístico (Choi & Murray, 2010;
Gursoy, Jurowski & Uysal, 2002; McCool & Martin, 1994).
Tal como refere Lee (2013) a utilização dos impactes do turismo como variável
mediadora entre a ligação à comunidade e o apoio ao DTS tem sido feita por
vários autores. Os resultados referidos pelo autor são mistos, alguns autores
reclamam relacionamentos positivos e outros não, levando-o a concluir que a
“ideia de que a ligação à comunidade afecta os benefícios e custos percebidos
permanece um assunto intensamente debatido” (Lee, 2013, p.3). Tendo em conta
este enquadramento, estes relacionamentos poderão ser investigados e
confirmados no presente estudo. Assim, são apresentadas as seguintes hipóteses:
H1a: Existe uma relação positiva e directa entre a ligação à comunidade e os
benefícios percebidos do turismo.
H1b: Existe uma relação negativa e directa entre a ligação à comunidade e os
custos percebidos do turismo.
H1c: Existe uma relação positiva e directa entre a ligação à comunidade e o
apoio (dos residentes) ao DTS.
2.3 Envolvimento na comunidade, impactes do turismo e apoio ao DTS
Sendo considerado um factor crítico para o desenvolvimento de um turismo
baseado na comunidade, o envolvimento na comunidade reflecte, segundo Lee
(2013), até que ponto os residentes estão envolvidos na partilha de questões
sobre a sua vida com as suas comunidades.
Grande parte dos estudos realizados apontam para a importância do planeamento
participado, com o envolvimento de todos os stakeholders (Ap & Crompton,
1993; Gursoy et al., 2002; Gursoy & Kendall, 2006; Gursoy & Rutherford,
2004; Kaltenborn, Andersen, Nellemann, Bjerke & Thrane, 2008; Lee, 2013;
Nicholas et al., 2009) e comprovam a enorme importância que tem o envolvimento
da comunidade local no planeamento e estratégias definidas, sendo consensual
que o envolvimento dos residentes é fundamental para que exista um
desenvolvimento sustentável (Lee, 2013).
Ainda segundo Lee (2013), é escasso o número de estudos que examinam as
associações directas entre o envolvimento na comunidade e o apoio ao DTS,
argumentando ainda a existência de diversos autores a utilizarem os benefícios
e custos percebidos do turismo como variáveis mediadoras entre entes dois
constructos. O autor reclama a utilidade no exame deste relacionamento linear.
Nesta linha de pensamento, são apresentadas as seguintes hipóteses:
H2a: Existe uma relação positiva e directa entre o envolvimento na comunidade e
os benefícios percebidos do turismo.
H2b: Existe uma relação negativa e directa entre o envolvimento na comunidade e
os custos percebidos do turismo.
H2c: Existe uma relação positiva e directa entre o envolvimento na comunidade e
o apoio (dos residentes) ao DTS.
2.4 Gestão do poder público (GPP) na actividade turística, impactes do turismo
e o apoio ao DTS
A GPP desempenha um papel primordial na construção de um modelo sustentável
para o destino (Gorica, Kripa & Zenelaj, 2012; Mazón, 2012; Soares et al.,
2013). Deste modo, muitos dos problemas relacionados com a capacidade de carga,
um das grandes questões da sustentabilidade nos destinos, passam
obrigatoriamente pelas políticas públicas definidas para o sector. Muitos dos
planos estruturantes de protecção e preservação de destinos históricos têm que
ter uma liderança que, na maior parte, cabe ao poder público encabeçar. Neste
sentido, é natural que a comunidade local considere que a existência de um
planeamento turístico público concertado tem um papel preponderante na
diminuição dos impactes negativos. Assante, Wen e Lottig (2012) testaram e
confirmaram empiricamente a relação positiva entre a gestão pública do turismo
e a percepção acerca dos impactes ambientais do turismo, tendo concluído que os
residentes tendem a ser mais receptivos aos impactes do turismo se sentirem que
o poder público o gere de forma efectiva.
Por outro lado, poderá esperar-se a existência de uma relação entre a GPP e o
apoio dos residentes ao DTS. Assante et al. (2012) argumentam que a gestão
governamental e a cooperação das partes interessadas são necessárias para
atingir um consenso sobre como gerir desenvolvimentos turísticos futuros. Os
autores concluem que se os residentes percebem, por parte dos agentes públicos,
uma gestão efectiva relativamente ao controlo do turismo, tendem a terem
sentimentos positivos acerca do DTS. Tendo em conta o referido, estabelecemos
as seguintes hipóteses:
H3a: Existe uma relação positiva e directa entre a GPP na actividade turística
e os benefícios percebidos do turismo.
H3b: Existe uma relação negativa e directa entre a GPP na actividade turística
e os custos percebidos do turismo.
H3c: Existe uma relação positiva e directa entre a GPP na actividade turística
e o apoio (dos residentes) ao DTS.
2.5 Impactes do turismo e o apoio ao DTS
Ao longo das duas últimas décadas vários autores realizaram estudos referentes
à relação que se pode estabelecer entre a percepção, por parte dos residentes,
dos impactes do turismo e o seu apoio para o desenvolvimento do turismo (Gursoy
et al., 2002; Gursoy & Rutherford, 2004; Ko & Stewart, 2002; Nicholas
et al., 2009; Sharma & Dyer, 2009). Os referidos estudos, com base no
modelo de troca social, sugerem que os residentes com um impacto positivo
percebido (benefícios, por exemplo) são mais susceptíveis de apoiar o
desenvolvimento do turismo. Assim, o presente estudo tenta concentrar-se na
premissa de que o apoio dos moradores ao desenvolvimento do turismo pode ser
afectado pela percepção dos impactes (económicos, sociais, culturais e
ambientais) do turismo, tanto negativos como positivos. Ou seja, com base no
modelo de troca social, existirão sempre grupos de residentes que apoiam o
desenvolvimento do turismo quando percebem que a troca é benéfica para o bem-
estar da comunidade, enquanto que outros terão posições opostas quando sentem
que a troca lhes será prejudicial (Cañizares, Tabales & García, 2014).
Neste contexto, estabelecemos as seguintes hipóteses:
H4a: Existe uma relação positiva e directa entre os benefícios percebidos do
turismo e o apoio (dos residentes) ao DTS.
H4b: Existe uma relação negativa e directa entre os custos percebidos do
turismo e o apoio (dos residentes) ao DTS.
A Figura_1 mostra o quadro teórico deste estudo e as hipóteses propostas.
3. Metodologia
Este estudo baseia-se numa abordagem quantitativa, sob a forma de um
questionário aplicado a uma amostra de residentes da cidade de Lamego. Devido a
limitações de custos e tempo, a amostra para o estudo foi escolhida com base na
técnica de amostragem por conveniência. Foram aplicados 320 questionários, em
Outubro de 2012, nas duas freguesias urbanas desta cidade. Depois de eliminados
os questionários incompletos, foram obtidos 300 questionários válidos.
O questionário aplicado aborda os seguintes aspectos: ligação à comunidade,
envolvimento na comunidade; benefícios e custos percebidos, GPP na actividade
turística e apoio ao desenvolvimento turístico sustentável. Foram colocadas
algumas variáveis que permitem definir um perfil sociodemográfico dos
respondentes (género, idade, naturalidade, nacionalidade, habilitações,
profissão e rendimento mensal).
As escalas utilizadas para medir os conceitos foram retiradas da literatura
relevante com adaptações para o contexto em causa. Os itens foram medidos a
partir de uma escala de Likert de 7 pontos, na qual 1 significa “discordo
totalmente” e 7 “concordo totalmente”. A conceptualização e operacionalização
das variáveis pode ser observada na Tabela_1.
Para estudar o modelo teórico e avaliar as relações entre as variáveis
recorremos ao conjunto de técnicas de análise, denominadas de modelação de
equações estruturais (SEM – Structural Equation Modelling), tendo por base o
software estatístico AMOS 21.0. No caso do modelo proposto, a escolha por este
método justifica-se dado que o SEM corresponde a um conjunto de técnicas
estatísticas que permitem o teste de modelos teóricos que definem relações
causais, hipotéticas entre variáveis (Marôco, 2010).
4. Análise e discussão dos resultados
4.1 Perfil da amostra e resultados do modelo de medida
As principais características dos residentes que compõem a amostra são: a
maioria dos respondentes (51,9%) são do sexo feminino; a média de idade é de 38
anos; 35,6% têm o ensino secundário completo, e 26,0% possuem o ensino
obrigatório; a maioria dos respondentes (68,6%) residem em Lamego há mais de 20
anos e, por fim, no que diz respeito ao rendimento mensal, 67,6% têm um
rendimento inferior a 1500 euros.
No sentido de preparar os dados para a análise, procedemos a um escrutínio da
normalidade univariada, recorrendo a medidas de achatamento (kurtosis) e de
assimetria (skewness) e identificação de eventuais valores aberrantes
(outliers), tendo sido eliminados os valores causadores de perturbação. De uma
forma geral, para todos os constructos, os valores absolutos da assimetria e do
achatamento encontram-se dentro dos limites propostos por Kline (2005) (maior
valor absoluto de assimetria é 1,068 e de achatamento é 1,512, os quais dizem
respeito à variável latente custos percebidos do turismo). Assumimos, de acordo
com Marôco (2010), “que se um conjunto de variáveis apresentar distribuição
normal univariada então a distribuição condicionada das variáveis é normal
multivariada”.
Após a verificação preliminar dos dados, foi efectuada uma análise dos
constructos (e seus indicadores) e uma averiguação sobre a unidimensionalidade,
fiabilidade e validez convergente e discriminante das escalas de medida a
partir da análise factorial confirmatória.
Para o processo de estimação foi usado o método da máxima verosimilhança. Para
a utilização da técnica SEM, e do método de estimação em causa, um dos factores
relevantes diz respeito à dimensão da amostra. Neste estudo, pensamos ter
assegurado o seu uso adequado tendo em conta a dimensão da amostra ter
ultrapassado os mínimos referenciados por vários autores (Hair, Black, Babin
& Anderson, 2010), os quais variam entre 100 e 150. Além disso, o modelo de
medida é do tipo reflectivo, havendo, também, pelo menos três indicadores por
constructo (Marôco, 2010).
Como parte do processo de avaliação das escalas, procuramos apurar o desempenho
das escalas originais. Numa análise inicial verificamos que os modelos
apresentaram índices de qualidade de ajustamento afastados dos valores de
referência. Foi realizada uma análise dos índices de modificação, retirando do
modelo de medida os itens que apresentavam indícios de serem causados por mais
de uma variável latente ou que apresentavam erros correlacionados. Foram assim
eliminados dois itens da variável “Ligação à comunidade”; um da escala de
“Envolvimento na comunidade”; dois da variável latente “Apoio ao DTS” e quatro
da variável “Benefícios percebidos”. Por outro lado, a escala “Custos
percebidos”, para além de apresentar itens bastante problemáticos, no que
respeita a relações cruzadas e a erros correlacionados, apresenta falta de
validez preditiva, ou seja, falta de correlações significativas com as
restantes variáveis do modelo, sendo, deste modo, indicada a decisão de
eliminar este constructo da análise e de modificar o modelo original.
Poderemos apresentar várias explicações teóricas para a exclusão deste
constructo do modelo inicialmente proposto. A percepção dos impactes do turismo
pode variar, de modo significativo, atendendo ao tipo de destino e ao seu nível
de desenvolvimento (Kim, Uysal & Sirgy, 2013; McDowall & Choi, 2010).
Os modelos e estudos baseados no desenvolvimento dos destinos (Butler, 1980;
Kim et al., 2013; Perdue et al., 1990) fornecem uma visão acerca da evolução do
destino e dos impactes sentidos pela comunidade. Estes estudos realçam que, nas
fases iniciais do desenvolvimento turístico, as percepções dos residentes
concentram-se, maioritariamente, nos impactes positivos do turismo. O mesmo
resultado foi obtido num estudo realizado na cidade de Huelva, por Vargas-
Sànchez, Porras-Bueno e Plaza-Mejía (2011), no qual, tal como na presente
investigação, após a depuração do modelo, também foi eliminada a dimensão
custos percebidos do turismo. De igual forma, os autores argumentaram que este
resultado está relacionado com o ciclo de vida do destino em causa. No que se
refere a Portugal, estudos realizados acerca das percepções e atitudes, em
destinos que se encontram em face de exploração ou desenvolvimento, demonstram
que os residentes ignoram ou não valorizam os impactes negativos do turismo
(Eusébio & Carneiro, 2010; Monjardino, 2009; Vareiro et al., 2013). Segundo
um estudo realizado por Smith e Krannich (1998) a desvalorização dos impactes
negativos do turismo é ainda mais notória em comunidades rurais, como é caso de
Lamego, principalmente quando estas veem no turismo a saída para o crescimento
económico, designando a atitude destas comunidades como “tourism-hungry”.
A validez convergente, fiabilidade compósita (FC) e variância média extraída
(VME) foram calculadas para o modelo de medida (Tabelas_2 e 3). No que se
refere à fiabilidade dos constructos, os valores de fiabilidade compósita
variam de 0,874 a 0,946 (Tabela_3), valores que ultrapassam o ponto de corte de
0,70, que é o nível aceitável sugerido por diversos autores (Hair et al., 2010;
Kline, 2005). Relativamente à fiabilidade individual dos itens, todos os
coeficientes padronizados apresentam valores superiores a 0,5 (Tabela_2),
indicando uma boa consistência interna. A Tabela_3 mostra que a VME varia entre
0,584 e 0,749, respeitando o limite estabelecido pela literatura como evidência
de validez convergente (Hair et al., 2010).
A verificação da validez discriminante foi efectuada considerando os
coeficientes de correlação entre os constructos, que apresentaram valores
significativamente diferentes de 0, e os valores da raiz quadrada da variância
média extraída apresentarem valores superiores às correlações entre os
constructos (Hair et al., 2010).Todos os constructos latentes cumpriram esta
condição (Tabela_3).
Tendo por base a análise efetuada, concluiu-se que a maioria dos constructos
apresentam propriedades psicométricas adequadas. Depois de avaliar a validez e
fiabilidade do modelo de medida, o próximo passo consistiu na avaliação do
modelo estrutural.
4.2 Resultados do modelo estrutural
Para testar as hipóteses propostas, estimou-se o modelo estrutural. Os
resultados mostraram um qui-quadrado significativo – ?2(gl = 419, N =297) =
802,016, p = 0. Contudo, tendo em conta a sensibilidade da estatística do qui-
quadrado à dimensão da amostra, optou-se por avaliar a adequação do modelo
através dos índices de qualidade de ajustamento. De acordo com Marôco (2010, p.
51) os valores obtidos – ?2/gl=1,914; CFI=0,951; GFI=0,847; RMSEA=0,056; p
(RMSEA<0,05)<0,058 – revelam uma boa qualidade de ajustamento. Conforme
ilustrado na Tabela_4, o modelo estrutural estimado revelou um bom ajustamento
dos dados empíricos a quatro das sete hipóteses formuladas.
No que respeita aos resultados obtidos na avaliação do modelo estrutural, podem
ser retiradas várias constatações. Primeiro, verificamos que a ligação à
comunidade exerce um efeito positivo e directo sobre os benefícios percebidos
do turismo. Este resultado está em consonância com as descobertas de Gursoy et
al. (2002), Chen e Chen (2010a), Lee (2013). Assim, os estudos sugerem que
residentes fortemente ligados às suas comunidades, com maior probabilidade
percebem impactes positivos do turismo. No entanto, contrariamente às nossas
expectativas, a H1c não foi sustentada. Assim, não há relacionamento positivo e
significativo entre a ligação à comunidade e o apoio ao DTS. A associação entre
estes dois conceitos é feita via benefícios percebidos do turismo. Este efeito
indirecto foi, também, verificado no estudo de Chen e Chen (2010a), no entanto,
os autores comprovaram empiricamente o impacto directo ligação-apoio.
Segundo, os resultados mostram que o envolvimento na comunidade apresenta uma
associação positiva e directa com o apoio ao DTS. Contrariamente aos resultados
de Nicholas et al. (2009), este relacionamento mostrou-se significativo para a
amostra em estudo, ou seja, os resultados parecem indicar que a participação,
pela comunidade residente, nos processos de planeamento/gestão e tomadas de
decisão relativamente ao desenvolvimento turístico influencia o nível de apoio
ao DTS. As conclusões da investigação realizada por Lee (2013) apontam, também,
nesse sentido, mostrando uma associação positiva, mas indirecta, entre estes
dois constructos. Neste contexto, o autor argumenta a possibilidade de se
utilizar o envolvimento na comunidade para avaliar, de forma efectiva, o apoio
ao DTS, ou seja, indo de encontro ao que intuitivamente parece lógico, conclui-
se que os residentes mais envolvidos nas suas comunidades manifestam, com maior
probabilidade, apoio ao DTS. Contudo, os resultados do presente estudo
contrariam a investigação do autor referido no que respeita à ligação entre o
envolvimento e a percepção dos benefícios do turismo, isto é, a H2a não foi
suportada pelos dados.
Em terceiro lugar, a GPP apresentou um efeito positivo directo nos benefícios
percebidos. Tal como foi enunciado na revisão da literatura, Assante et al.
(2012) comprovaram a ligação entre estes dois conceitos, concluindo que haverá
uma atitude mais positiva face aos impactes do turismo se os residentes
sentirem que existe uma gestão eficiente por parte do poder público. Por outro
lado, a rejeição da hipótese que relacionava directamente a GPP e o apoio ao
DTS contraria os resultados obtidos por Assante et al. (2012). No nosso caso,
os resultados indicam que a ligação entre estes dois conceitos se faz através
da variável mediadora benefícios percebidos do turismo.
Finalmente, em quarto lugar, os resultados indicam a existência de uma relação
positiva e directa entre os benefícios percebidos e o apoio ao DTS. De igual
forma, o estudo de Lee (2013) comprovou empiricamente esta associação
concluindo que, ao aumentar os benefícios percebidos, com maior probabilidade
os residentes mostrarão o seu apoio a iniciativas de DTS. Ko e Stewart (2002)
relacionaram os impactes positivos do turismo com as atitudes para
desenvolvimentos turísticos adicionais, demonstrando uma associação directa e
positiva entre ambos.
Como já foi referido, ao modelo proposto inicialmente foi necessário introduzir
algumas reespecificações (resultantes dos valores dos índices de modificação),
sendo a principal a eliminação da variável latente custos percebidos do
turismo. Para além das justificações já apontadas, é de referir que diversos
autores descobriram a inexistência de relacionamentos significativos entre a
ligação à comunidade e os custos percebidos (Chen & Chen, 2010a; Lee, 2013)
e, entre o envolvimento na comunidade e os custos percebidos (Lee, 2013). Num
outro estudo, Chen e Chen (2010b) concluem que os residentes, ao determinarem
as suas atitudes relativamente ao desenvolvimento do turismo, colocam maior
importância nos benefícios do que nos custos do turismo. No caso português,
Monjardino (2009) constatou a forte valorização dada aos impactes positivos e o
desprezo aos negativos por parte dos residentes nos Açores.
Na Figura_2, apresentamos a representação gráfica do modelo final, com os
coeficientes padronizados e os valores de R2 para as variáveis benefícios
percebidos e apoio ao DTS. Podemos verificar que o envolvimento na comunidade
apresenta o maior poder preditivo do apoio ao DTS. As restantes variáveis
exógenas (ligação à comunidade e GPP) contribuem de forma muito modesta e
apenas indirectamente, através dos efeitos positivos sobre os benefícios
percebidos.
5. Conclusões
Este estudo procurou investigar o apoio dos residentes ao DTS através da
proposta de um modelo que considerou como antecedentes a ligação à comunidade,
o envolvimento na comunidade, a GPP e os impactes percebidos do turismo
(benefícios e custos). Um dos objectivos fundamentais desta investigação foi
contribuir para a compreensão acerca das percepções dos residentes, e sua
ligação, envolvimento e apoio, relativamente ao DTS. Ao explorar antecedentes
do apoio dos residentes ao DTS, esta investigação estende o estudo realizado
por Lee (2013), uma vez que incluiu também a visão dos residentes acerca da
gestão feita pelo poder público. A nível internacional, diversos estudos têm
sido realizados sobre as atitudes dos residentes face ao turismo e seus
impactes (Vareiro et al., 2013), contudo, a nível nacional, tanto quando
sabemos, não existe nenhum estudo que aborde estes conceitos no âmbito da
sustentabilidade do património em pequenas cidades históricas.
Procuramos contribuir para a literatura que enfatiza a importância da análise
das percepções dos residentes, como um dos principais grupos de stakeholders a
considerar em iniciativas de planeamento turístico (Cañizares et al., 2014).
Nesse sentido, e com base na teoria dos stakeholders, os resultados obtidos
reforçam o papel crucial das comunidades locais nos processos de tomada de
decisão e planeamento para a sustentabilidade do desenvolvimento turístico. Por
outro lado, este estudo tem subjacente uma abordagem baseada na teoria da troca
social na medida em que se procurou, através do modelo proposto, os factores
que influenciam o apoio dos residentes ao DTS, logo, fornecer pistas para
compreender como as atitudes deste grupo são formadas e mais bem geridas.
Considerando as implicações para os gestores, decisores políticos e poder
público, algumas recomendações práticas podem ser apontadas. Para estes e
outros stakeholders, compreender as variáveis preditoras do apoio prestado
pelos residentes ao desenvolvimento turístico é crucial, essencialmente porque
o sucesso e a sustentabilidade de qualquer projecto de desenvolvimento vai
depender de um activo apoio das populações locais (Gursoy & Rutherford,
2004; Cañizares et al., 2014). Por um lado, revela-se importante que as
decisões de estratégias e políticas de turismo tenham em consideração a criação
de programas que incentivem a ligação e o envolvimento da comunidade local. Por
outro lado, é útil também que a gestão do poder público na actividade turística
seja feita de forma efectiva, porque, conforme se concluiu neste estudo, tanto
num caso como no outro, a percepção das comunidades locais acerca destes
factores irá afectar o apoio por eles dado ao DTS.
Este estudo apresenta algumas limitações que deverão ser colmatadas por futuros
estudos. Uma delas tem que ver com o tipo de amostra (de conveniência) e com o
facto de se referir apenas à análise de uma cidade. Outras limitações estão
associadas à forma de obtenção dos dados, nomeadamente a escolha por um estudo
de corte transversal, bem como a utilização de informantes-chave únicos (os
residentes). Devemos referir que a eliminação de alguns indicadores no processo
de depuração do modelo de medida poderá imputar alguma fragilidade às escalas
originais. Este estudo pode ser expandido com a introdução de novas variáveis
ligadas ao desenvolvimento sustentável do património. Tendo presente a
tendência de crescimento deste destino, é muito provável que a comunidade
venha, no futuro, a sentir os impactes negativos inerentes ao desenvolvimento
turístico. Neste sentido, consideramos crucial a realização de pesquisas
longitudinais, uma vez que as percepções e atitudes dos residentes, que neste
momento são extremamente positivas face ao desenvolvimento do turismo, muito
provavelmente poderão vir a alterar se mediante a evolução do ciclo de vida do
destino.