A influência do género e da ocasião na frequência de consumo de vinho
1. Introdução
O vinho é considerado um típico bem de experiência (Schamel & Anderson,
2003) já que muitos dos seus atributos não são verificáveis antes do consumo,
ou a procura de informação para os conhecer implica mais custos para o decisor
do que a experiência direta com o produto (Nelson, 1970). Por outro lado, os
mercados de vinhos são tendencialmente fragmentados (Berni, Begalli &
Capitello, 2005), com uma vasta gama de produtos associados a uma grande
diversidade de marcas. Estes fatores contribuem para que o processo de escolha
do consumidor se torne mais complexo; para que os atributos extrínsecos sejam
mais importantes do que os intrínsecos; para que a perceção do consumidor sobre
o seu conhecimento da categoria de produto tenha um papel mais importante do
que a procura de informação (Park, Mothersbaugh & Feick, 1994); e para que
a ocasião de consumo assuma um papel fundamental no processo de decisão (Berni
et al., 2005).
Para além da ocasião, o género do comprador é outro fator com influência
significativa no processo de decisão de compra de bens de experiência (Park,
Yoon & Lee, 2009), considerando-se que, comparativamente às mulheres, os
homens procuram fazer a aquisição com o mínimo de esforço na procura de
informação (Laroche, Cleveland, Bergeron & Goutaland, 2003), apresentando-
se como principal justificação o chamado modelo de seletividade ' as mulheres
tendem a retirar gratificações do próprio processo de decisão em contexto de
retalho, enquanto os homens tendem a encarar a compra como um problema e a
obter de forma mais direta a solução (Campbell, 2000).
O principal objetivo do presente trabalho é apresentar e validar um modelo que
considera os efeitos mediadores de variáveis que podem contribuir para explicar
as influências do género e da ocasião na variação da frequência de consumo de
vinho. O conhecimento subjetivo é um desses mediadores, tendo já sido
estabelecido que, quer o género (Barber, Dodd & Kolyesnikova, 2009), quer a
ocasião (Barber, 2008), condicionam a importância do conhecimento no processo
de decisão. Outro efeito mediador a considerar é o das motivações, também
dependentes da ocasião (Hall, Lockshin, & O'Mahony, 2001) e do género
(Thach, 2012). Antes da formalização do modelo, proceder-se-á a uma revisão da
literatura para enquadrar as variáveis consideradas, nomeadamente situando-as
no contexto do processo de compra de vinhos.
2. Revisão da literatura
O processo de escolha do vinho depara-se com alguma complexidade, situação que
resulta, entre outros fatores, da alargada gama de produtos, da multiplicidade
de marcas e da assimetria de informação existente neste tipo de mercado. Numa
tentativa de ultrapassar este problema, o consumidor recorre às suas próprias
construções de experiências vivenciadas, ao conhecimento (objetivo e subjetivo)
e a diversas fontes de informação externas. No entanto, este recurso à
informação é influenciado pela ocasião a que se destina a compra. Lai (1991)
defende que o comportamento do consumidor é condicionado pela ocasião, a qual
influencia o leque de marcas a analisar, o grau de profundidade da pesquisa, o
tipo de informação recolhida e o orçamento para a compra. No caso específico do
vinho, diferentes investigadores referem a ocasião como fator decisivo na
escolha (Hall et al., 2001; Berni et al., 2005; Olsen, Thach & Nowak,
2007).
A pesquisa bibliográfica efetuada denota a falta de consenso sobre uma
tipologia de ocasiões de consumo. Por exemplo Dubow (1992) apresenta uma
tipologia de base motivacional, distinguindo cinco tipos de ocasiões: duas
introspetivas (para relaxar ou ajudar com o sono) e três sociais (para ser
amigável, para ser aceite, ou para comemorar). Hall et al. (2001) utilizam
cinco categorias de refeição: íntima; com amigos; em família; para comemorar; e
relacionada com atividade profissional. Por seu turno, Thach (2011) refere:
ocasiões formais, incluindo jantares formais e comemorações como aniversários,
casamentos, etc.; e ocasiões informais, como refeições com amigos/ familiares
ou simplesmente o consumo para socializar sem refeição.
Parece existir, também, uma relação entre género e a compra de vinho para
determinadas ocasiões. Nicholson (1990) concluiu que as mulheres escolhem
essencialmente vinho para refeições servidas em casa, enquanto os homens
dominam na escolha de vinho para em ocasiões especiais. Barber et al. (2009)
referem que as fontes de informação são percebidas de forma distinta pelos dois
géneros, consoante a ocasião de consumo. Também Thach (2012) sugere uma
interação entre género e ocasião na escolha do tipo de vinho a consumir. Para
esta autora, a diferença de género no processo de escolha de vinho pode ser
enquadrada num contexto motivacional, ou seja, homens e mulheres têm diferentes
comportamentos no consumo de vinho porque têm motivações diferentes ' os homens
estão mais interessados em discutir os aspetos técnicos do vinho, exibindo o
seu conhecimento, ao passo que as mulheres querem relaxar e socializar com os
amigos.
A literatura sobre motivações para o consumo de vinho salienta a existência de
motivos de várias ordens, como a gratificação sensorial, aprovação social,
estimulação intelectual, entre outros. Hall et al. (2001) apresentam uma
motivação negativa e um leque mais alargado de motivos positivos, como
benefícios para a saúde, benefícios psicológicos, prazer, harmonização com a
refeição, socialização e oportunidade de impressionar os outros. Na mesma
linha, Charters e Pettigrew (2008) apresentam como principais motivos para
consumir vinho o gosto, o gozo/prazer, a comida e a melhoria do humor. A estes
acrescentaram a existência de alguns motivos simbólicos, como a auto-estima ou
a projeção da própria imagem. Por sua vez, Thach (2012) invoca que, em
situações de refeição, os principais motivos apontados pelos consumidores para
beberem vinho são a melhoria da refeição e a apreciação do sabor do mesmo. No
entanto, também são apontados motivos como o relaxamento, razões sociais,
sofisticação e motivações de saúde.
No caso dos países mediterrânicos, a gratificação sensorial é referida como a
principal motivação para o consumo de vinho (Barrena & Sanchez, 2009). No
entanto, os mesmos autores salientam o facto dos consumidores mais jovens serem
motivados para o consumo de vinho por razões relacionadas com a identidade
cultural e o status social. Num estudo aplicado ao caso específico do vinho em
Portugal, Duarte, Madeira e Barreira (2010) definiram três dimensões de
motivação, designadamente o gosto/prazer, a convivialidade e performance
pessoal.
A literatura salienta o facto do conhecimento subjetivo nem sempre refletir o
conhecimento objetivo (Dodd, Laverie, Wilcox & Duhan, 2005 e Park et al.,
1994). Conhecimento objetivo e subjetivo têm efeitos diferentes no
comportamento do consumidor e na procura e processamento de informação. Park et
al. (1994) sugeriram que a experiência com o produto está mais fortemente
relacionada com o conhecimento subjetivo do que com o conhecimento objetivo.
Brucks (1985) salienta que os consumidores com altos níveis de conhecimento
subjetivo podem descartar alternativas que acreditam ser inferiores e sugere
ainda que o conhecimento subjetivo se relaciona menos com o número de atributos
examinados que o conhecimento objetivo, pois este encontra-se fortemente
relacionado com a informação.
Algumas pesquisas identificaram diferenças entre homens e mulheres no que diz
respeito ao processamento de informações e à tomada de decisão de compra.
Laroche et al. (2003) sugerem que os homens são mais subjetivos e intuitivos
nos processos de tomada de decisão. A experiência reforça a confiança dos
homens no que diz respeito ao seu conhecimento subjetivo e este, por sua vez,
facilita a tarefa de avaliação. No caso específico do vinho, Barber e Almanza
(2006) evidenciam o facto dos homens se classificarem como mais informados
sobre o vinho do que as mulheres, referindo ainda que as mulheres menos
experientes estão mais preocupadas com a possibilidade de cometerem erros na
escolha de vinho do que os homens. Estes resultados são congruentes com o
modelo de seletividade, segundo a qual os homens tendem a seguir um
processamento de informação mais heurístico do que as mulheres, o qual é
bastante facilitado e reforçado por elevados níveis de conhecimento subjetivo.
3. Modelo de análise e metodologia
Este trabalho pretende avaliar em que medida o género e a ocasião de consumo
influenciam a frequência de consumo de vinho. Na sequência da revisão da
literatura, elabora-se o modelo de análise da Figura_1, com a finalidade de
avaliar se o efeito destas variáveis exógenas é mediado pelas variáveis
latentes conhecimento subjetivo e motivações. Ou seja, verificar-se-á
empiricamente se a totalidade da variância comum entre a variável dependente
(frequência de consumo) e as exógenas (género e ocasião) é devida aos
mediadores (conhecimento e motivações) (Shrout & Bolger, 2002).
As relações entre as variáveis exógenas, os mediadores e a dependente, são
apoiadas na literatura referida na secção anterior. Em alguns estudos
desenvolvidos em Portugal (Duarte & Ruivo, 1998; Teixeira, 2008) a
frequência de consumo é referida como estando associada ao género, verificando-
se que os homens consomem de forma mais regular do que as mulheres. A
associação entre frequência de consumo e ocasião é implícita, pois se
estivermos perante consumidores regulares (ou seja, que consomem diariamente ou
mais do que uma vez por semana) é expetável que tal aconteça em refeições do
dia-a-dia. Deduz-se assim as seguintes hipóteses:
H1: Os homens consomem vinho mais frequentemente do que as mulheres.
H2: Os compradores de vinho para uma refeição normal consomem mais
frequentemente do que os que compram para outras ocasiões.
A introdução do conhecimento subjetivo e das motivações como variáveis
mediadoras na explicação da frequência de consumo introduz um caráter inovador
a este modelo. As relações entre as variáveis exógenas e as mediadoras
encontram-se fundamentadas na literatura. Propõe-se que o género masculino
evidencie níveis de conhecimento subjetivo superiores ao feminino (Barber et
al., 2009; Laroche et al., 2003 e Park et al., 2009). Quanto à influência da
ocasião, considera-se que, comparativamente a outras ocasiões, o consumo numa
refeição regular está associado a uma situação de compra de familiaridade,
favorecendo-se assim a importância do conhecimento subjetivo (Barber, 2008 e
Park et al. 1994). O conhecimento subjetivo é considerado um antecedente
imediato de motivação (Park et al., 1994) e poderá mediar os efeitos do género
(e.g. Thach, 2012) e da ocasião (e.g. Berni et al., 2005) sobre as motivações.
Quanto às relações entre os mediadores e a variável dependente, elas são, em
parte, estabelecidas na literatura e, noutra parte, deduzidas a partir dela.
Segundo Park et al. (1994) o conhecimento subjetivo está associado a maiores
experiência e familiaridade com a categoria de produto, bem como a consumo mais
intenso ou frequente. A gratificação sensorial, ao estar associada ao prazer de
consumir vinho, ao gosto do sabor do vinho, à perceção de que o vinho ajuda a
realçar do sabor dos alimentos numa refeição, induz uma maior frequência de
consumo. Em sentido inverso, consumir por estimulação intelectual, ou seja,
para tirar prazer do aumento do conhecimento da categoria, estará associado a
uma menor frequência de consumo. O consumo de vinho por motivos sociais
(aprovação social e conformação) está associado à partilha de momentos com
amigos, de integração num grupo, o que implica um consumo menos frequente pois
são, supostamente, situações que ocorrem de forma menos regular.
Consequentemente, estabelece-se quatro hipóteses de relações entre os
mediadores e a variável dependente:
H3: Os compradores com maior conhecimento subjetivo consomem mais
frequentemente.
H4: A motivação por gratificação sensorial tem um efeito positivo sobre a
frequência de consumo.
H5: A motivação por estimulação intelectual tem um efeito negativo sobre a
frequência de consumo.
H6: A motivação social tem um efeito negativo sobre a frequência de consumo.
Para se proceder à verificação empírica do modelo de análise foi concebido um
inquérito a uma amostra de 600 compradores de vinho numa cadeia de
hipermercados nas regiões de Grande Lisboa e Grande Porto (300 inquiridos em
cada região). O questionário, administrado por entrevistadores de uma empresa
de estudos de mercado, obteve informações sobre o(s) vinho(s) adquirido(s); a
(principal) ocasião a que se destinava(m); fatores que influenciaram a escolha;
e fontes de informação utilizadas. Deste conjunto de questões, apenas a ocasião
é considerada neste estudo. Na secção seguinte, o questionário incluiu as
medidas das variáveis latentes representadas na Figura_1. Finalmente, uma
terceira secção registou as caraterísticas sociodemográficas do comprador,
entre as quais o género.
No que respeita à operacionalização das variáveis da Figura_1, a ocasião é uma
variável dicotómica, medindo o efeito sobre as variáveis endógenas da ocasião
refeição normal por comparação com as outras ocasiões. No caso do género,
representa-se o efeito de ser homem, comparativamente a ser mulher. Quanto às
variáveis latentes, os itens de conhecimento subjetivo seguem a proposta de
Barber (2008), enquanto as motivações são representadas pelas três dimensões
positivas propostas por Rossiter e Percy (1991): Intelectual (estímulos
intelectuais, trocas de conhecimentos); Sensorial (despertar de sensações,
prazer, gosto); Social (o consumo como facilitador da interação com o outro e
da aprovação social). Partindo do trabalho de Henley e Donovan (2002), tendo
também em consideração os itens utilizados por Duarte et al. (2010) e por
Teixeira (2008), os autores desenvolveram 15 itens, cinco por cada dimensão,
todos medidos numa escala de concordância de cinco pontos (1= concordo
plenamente; 5= discordo plenamente). Os itens destas três dimensões, bem como o
conhecimento subjetivo, foram avaliados num teste a 217 consumidores através de
análise fatorial confirmatória, do qual resultou uma redução do tamanho das
escalas utilizadas neste trabalho: as dimensões de motivação passaram de cinco
a três itens cada, enquanto a variável conhecimento subjectivo passou de cinco
a quatro. Para verificar se as variáveis exógenas exercem uma influência direta
e/ou indireta sobre a frequência de consumo, os respetivos efeitos serão
avaliados num modelo de equações estruturais com recurso a bootstraping, de
acordo com as indicações de Shrout e Bolger (2002).
4. Resultados
A Tabela_1 sintetiza as principais caraterísticas dos 600 compradores
inquiridos e das respetivas compras. Podemos verificar que os compradores têm
uma idade média de 48 anos e são predominantemente homens (65%), com curso
superior (43%), trabalhando por conta de outrem (51%) e são consumidores
regulares ' 39% fazem-no diariamente e 85% pelo menos uma vez por semana.
Apesar desta frequência declarada, a quantidade adquirida no dia do inquérito
foi reduzida, já que 2/3 dos compradores adquiriram, no máximo, duas garrafas.
A maioria comprou vinho tinto maduro (57%) com destino a uma refeição normal
(62%).
Antes de avaliar o modelo da Figura_1, é necessário validar as medidas das
variáveis latentes. De acordo com as indicações habitualmente seguidas na
literatura (Fornell & Larcker, 1981; Hair, Black, Babin, & Anderson,
2010), um constructo considera-se válido quando, cumulativamente: a escala é
precisa (fiabilidade compósita maior do que 0,7); o constructo tem validez
convergente (variância extraída média maior do que 0,5); há validez
discriminante entre os diversos constructos ou dimensões (a média dos
coeficientes padronizados de regressão de um fator com os respetivos itens é
superior às correlações desse fator com qualquer um dos restantes).
Os três fatores de motivação, bem como o de conhecimento subjetivo, foram
sujeitos a análise fatorial confirmatória com recurso ao software IBM SPSS Amos
21. Considerou-se apenas uma amostra de 523 compradores, correspondendo aos que
responderam a todas as variáveis manifestas. O modelo de medida inicial revela
uma qualidade de ajustamento que, de acordo com Marôco (2010) pode ser
considerada sofrível: χ2/g.l.=4,008; CFI=0,938; GFI=0,936; RMSEA=0,076; P
[RMSEA≤0,05]<0,001. Os índices de modificação sugeriam a retirada do modelo dos
itens Pretendo conhecer muitas marcas de vinho e O vinho facilita a minha
interação com os outros (pertencentes às dimensões Estimulação Intelectual e
Social, respetivamente) por apresentarem relações cruzadas com outros fatores.
Com a retirada destes itens do modelo, a sua bondade de ajustamento melhorou
significativamente, apresentando agora uma boa qualidade: χ2/g.l.=2,911;
CFI=0,969; GFI=0,964; RMSEA=0,061; P[RMSEA≤0,05]<0,091. Como se pode verificar
na Tabela_2, todas as variáveis latentes apresentam FC>0,7 e VEM>0,5.
Por sua vez, a Tabela_3 demonstra a validez discriminante de todas elas.
Podemos, assim, considerar que estamos em presença de medidas válidas. É
evidente nesta tabela que a gratificação sensorial é o fator de motivação mais
saliente, sendo a motivação social pouco importante. Quanto ao conhecimento
subjetivo, apresenta valores próximos do ponto médio da escala.
Admitida a validade das medidas das variáveis latentes, o passo seguinte é a
avaliação do modelo da Figura_1. Como foi referido, segue-se aqui as indicações
de Shrout e Bolger (2002) para avaliar se as variáveis exógenas têm um efeito
direto e/ou indireto sobre as variáveis dependentes, utilizando-se o método de
bootstraping (com 2000 amostras) para calcular a significância e os intervalos
de confiança dos estimadores dos efeitos diretos e indiretos. Incluindo todas
as relações diretas possíveis na sequência variáveis exógenas mediadores
variáveis dependentes, o modelo estrutural apresenta boa qualidade de
ajustamento (χ2/g.l.=3,017; CFI=0,953; GFI=0,953; RMSEA=0,062; P
[RMSEA≤0,05]<0,026). No entanto, constatou-se que nenhum dos efeitos diretos
das variáveis exógenas era significativo (0,182≤p≤0,979), pelo que o modelo foi
reconfigurado, considerando-se que o conhecimento subjetivo medeia
completamente qualquer eventual efeito da ocasião ou do género sobre as
motivações.
O novo modelo melhorou ligeiramente a sua bondade de ajustamento, como se pode
comprovar pelas seguintes estatísticas e índices: χ2/g.l.=2,843; CFI=0,953;
GFI=0,951; RMSEA=0,059; P[RMSEA≤0,05]<0,058. A Tabela_4 sintetiza os efeitos
sobre a frequência de consumo e sobre as variáveis mediadoras, apresentando
também os respetivos valores de variância explicada. Globalmente, o modelo
explica cerca de 39% da variação da frequência de consumo. A ocasião apresenta-
se como a variável com efeito direto mais significativo sobre a frequência,
seguindo-se o efeito da gratificação sensorial. Com efeitos altamente
significativos, mas de magnitude inferior, apresentam-se a estimulação
intelectual (efeito negativo) e o conhecimento subjetivo (efeito positivo). Por
último, verifica-se um efeito bastante reduzido do género, enquanto a motivação
social não tem qualquer efeito.
Recuperando as hipóteses estabelecidas, verifica-se que os resultados são
compatíveis com todas, exceto H6, ou seja, apenas a motivação social não tem
efeito direto sobre a frequência de consumo, todas as outras variáveis
incluídas no modelo, quer as motivações, quer o conhecimento, quer as variáveis
exógenas, influenciam diretamente a frequência. Tendo em conta os objetivos do
presente trabalho, o resultado mais saliente é o fato das variáveis mediadoras
não conseguirem explicar toda a variância comum entre as exógenas e a variável
dependente, ou, dito de outro modo, o género do comprador e a ocasião a que se
destina a compra, influenciam a frequência de consumo declarada pelo comprador,
mesmo quando controlados (dum ponto de vista estatístico) os efeitos do
conhecimento subjetivo e das motivações para consumir. Se no caso do género
esta influência é pouco significativa, ela é bastante relevante quando o
comprador declara ter adquirido vinho para uma refeição normal. Não obstante,
os resultados merecem uma leitura mais complexa, no que respeita aos efeitos de
mediação (Figura_2).
O conhecimento subjetivo está associado à familiaridade com o vinho e é um
facilitador na tomada de decisão de consumo (Laroche et al., 2003), não
surpreendendo que exerça um efeito direto sobre a frequência de consumo. O
conhecimento subjetivo favorece ainda a estimulação intelectual e a
gratificação sensorial. Como estas motivações têm efeitos de sinal contrário
sobre a frequência, há dois efeitos indiretos contraditórios do conhecimento
sobre a frequência. O mesmo acontece com os efeitos indiretos do género e da
ocasião, já que são antecedentes do conhecimento. Esta complexidade de relações
pode resumir-se da seguinte forma: os homens e os compradores de vinho para
refeições normais têm maior conhecimento de vinhos e estão mais motivados a
consumir por estimulação intelectual, que tem efeito negativo na frequência,
mas também por gratificação sensorial, que tem efeito positivo na frequência.
5. Conclusões
O principal objetivo do presente trabalho foi avaliar de que forma os efeitos
mediadores do conhecimento subjetivo sobre vinhos e a motivação para consumir
podem contribuir para explicar as influências do género e da ocasião na
variação da frequência de consumo de vinho. Os resultados mais salientes
indicam que: i) os compradores de vinho para uma refeição normal consomem mais
frequentemente do que os que compram para outras ocasiões; ii) o conhecimento
subjetivo e a gratificação sensorial exercem um efeito positivo sobre a
frequência de consumo, enquanto a estimulação intelectual exerce um efeito
negativo; iii) estes dois fatores de motivação contribuem de forma antagónica
para os efeitos parciais de mediação da influência do género e da ocasião na
frequência de consumo.
Este estudo apresenta vários contributos para a compreensão do consumo de
vinhos. Em primeiro lugar, conseguiu-se operacionalizar com sucesso a
dimensionalidade das motivações positivas para o consumo, de acordo com a
teoria de Rossiter e Percy (1991). No entanto, os resultados mostram papéis
completamente distintos destas três dimensões no modelo de análise que aqui foi
avaliado. A gratificação sensorial é, na opinião dos inquiridos, a motivação
que mais importância tem para os levar a consumir, na linha de estudos
anteriores (Barrena & Sanchez, 2009; Duarte et al., 2010), tendo também um
efeito muito significativo na frequência de consumo. Pelo contrário, a
motivação social, seja por interação, seja por integração, é considerada pouco
importante e não tem qualquer efeito sobre a frequência, sendo também a menos
explicada pelo conhecimento subjetivo. Quanto à estimulação intelectual, tem
uma importância intermédia, tem um efeito moderado (negativo) sobre a
frequência e tem uma relação forte com o conhecimento subjetivo.
Em segundo lugar, este estudo reforça o papel do conhecimento subjetivo no
processo motivacional do consumo de vinho. Efetivamente, se os resultados forem
extrapoláveis para o universo de compradores de vinho, poder-se-á dizer que as
associações que têm sido referidas na literatura entre, por um lado, o género
(Thach, 2012) e, por outro, a ocasião (Berni et al., 2005) e as motivações, são
completamente mediadas pelo conhecimento subjetivo. Tal como esperado, o
conhecimento é maior entre os compradores do género masculino (Barber, 2008;
Barber & Almanza, 2006; Laroche et al.,2003) e entre quem compra para
refeições normais. Para além de exercer um efeito direto sobre a frequência de
consumo, o conhecimento percebido tem um efeito determinante nas motivações
para consumir, particularmente na estimulação intelectual, mas ainda muito
significativo nas outras duas.
Em terceiro lugar, os resultados deste estudo mostram que o efeito direto do
género sobre a frequência é bastante modesto, sugerindo que o maior
conhecimento de vinhos declarado pelos homens contribua, em parte, para a maior
frequência de consumo que tem sido referida na literatura (e.g. Duarte &
Ruivo, 1998).
Como é sabido, a experiência e familiaridade com a categoria de produto
reforçam a confiança na decisão de compra, facilitando o processo de avaliação
de alternativas (Laroche et al., 2003). Deste modo, os resultados aqui
apresentados sugerem que o marketing de vinhos, nomeadamente os que se
encontram à venda em hipermercados, reforce a confiança no conhecimento
subjetivo do comprador, procurando associá-la à gratificação sensorial
proporcionada pelo consumo. Este reforço das crenças no conhecimento e na
eficácia da decisão, através da recompensa sensorial, parece-nos ainda mais
pertinente se tivermos em conta que lidamos com um típico bem de experiência,
uma categoria onde atributos extrínsecos tendem a ter um papel bastante
relevante no processo de decisão.
Ao considerar apenas os compradores de vinho numa cadeia de hipermercados em
Grande Lisboa e Grande Porto, a amostra denota uma sobre-representação do
género masculino, do nível de formação superior e de consumidores diários de
vinho. Há também uma maioria muito significativa de compradores que adquiriram
vinhos para consumo no dia-a-dia, faltando um número suficiente de casos
relativos a outras ocasiões de consumo para estimar de forma mais rigorosa os
efeitos da ocasião, quer sobre a frequência de consumo, quer sobre as
motivações. As limitações de amostragem, inerentes à escassez de recursos
disponíveis para a realização deste trabalho, poderão ter alguma influência nos
resultados, nomeadamente na irrelevância da motivação social. Sugere-se que
este tipo de estudo seja alargado a uma amostra nacional em diversos canais de
distribuição, de modo a incluir segmentos que, eventualmente, dêem maior
importância às dimensões social ou intelectual da motivação; tenham outro tipo
de comportamento de compra, nomeadamente de maiores quantidades e preços mais
elevados; e adquiram vinho para ocasiões associadas a maior envolvimento.