An Introduction to the Sociology of Religion: Classical and Contemporary
Perspective
Inger Furseth e Pål Repstad,An Introduction to the Sociology of Religion:
Classical and Contemporary Perspective,Aldershot, Ashgate, 2006, 241 páginas.
Inger Furseth e Pål Repstad, no seu livro An Introduction to the Sociology of
Religion, afastando-se de um padrão generalista, revelam o mérito de produzir
uma obra simultaneamente acessível e conceptualmente sólida. De facto, este
livro tem a virtualidade de atingir um público transversal, destinando-se tanto
a estudantes universitários que iniciam as suas pesquisas no campo religioso
como a investigadores com formação avançada e não necessariamente sociológica.
Longe de ser um trabalho de síntese sobre o estudo sociológico das religiões,
os autores procedem a um exercício reflexivo e crítico relativamente a autores
e teorias, apresentando ainda uma estrutura inovadora na apresentação do
manual, rompendo com os formatos mais comuns de livros da sociologia das
religiões com este carácter. Desde logo, na breve introdução acerca do que é a
sociologia, onde fica evidente a sua preocupação em destacar os grandes debates
internos dentro desta área do conhecimento as teorias orientadas para o actor
e as orientadas para a estrutura, bem como as perspectivas que valorizam seja o
conflito, seja o consenso , assumindo-os como eixo condutor na obra,
sublinhando que esses debates perpassam a sociologia das religiões e, por essa
razão, revisitando-os à medida que apresentam e reflectem sobre autores e
teorias.
Num segundo momento, Furseth e Repstad situam a sociologia das religiões na
sociologia, tendo reconhecido previamente (no prefácio) que, se há algum
propósito implícito na obra, esse é o de contribuir para que a sociologia das
religiões não se torne um campo isolado dentro da sociologia geral.
Ao apresentarem as várias perspectivas sociológicas sobre a religião, os
autores referem outras disciplinas que estudam a religião, enunciando
fronteiras e afinidades: a antropologia, a história das religiões, a teologia,
a história da igreja e os estudos religiosos em geral. Convém esclarecer que a
importância atribuída a estas últimas disciplinas resulta do facto de os
autores definirem claramente que o contexto social do seu livro é o
cristianismo. Enquanto aspecto distintivo dos campos disciplinares, Furseth e
Repstad procedem a uma explicitação da normatividade sociológica e de como esta
se aplica, de modo particular, à sociologia das religiões. O último capítulo,
"Sociologia, teologia e fé religiosa", ilustra bem isso: ao
estabelecerem a relação entre os diferentes campos, explicam como os aspectos
normativos do pensamento sociológico constituem simultaneamente virtualidades e
limitações.
Ainda no que respeita à interdisciplinaridade, e apesar de os autores
sublinharem a demarcação relativamente a qualquer tipo de abordagem
essencialista, questionamo-nos se, permanecendo fiel ao construtivismo, não
seria pertinente reflectir sobre os desafios que os desenvolvimentos mais
recentes na área das ciências biológicas lançam às ciências sociais e, de modo
muito particular, à sociologia das religiões. Estudos sobre o bem-estar e a
felicidade, por exemplo, são temas que muito especificamente solicitam
contributos à sociologia das religiões, tal como à psicologia, à economia e à
antropologia.
No capítulo 2, "A religião como fenómeno", os autores, além de
estabelecerem uma distinção entre as definições substantivas e funcionais,
expõem os problemas que se colocam neste campo. Embora a sociologia das
religiões seja cada vez menos ambiciosa na sua busca de uma definição universal
de religião principalmente no plano substantivo , dado que é cada vez mais
difícil encontrar um conjunto de conteúdos comuns a todas as religiões, esta
tarefa não deixa de ser indispensável. Pela nossa parte, recordamos que o
número crescente de sociólogos originários de sociedades de tradição não cristã
poderá ser entendido como um recurso fundamental para o enriquecimento dos
instrumentos conceptuais existentes.
Ao contrário da estratégia tradicional de se percorrer as perspectivas de cada
autor sobre a religião, Furseth e Repstad preocupam-se em apresentar o lugar da
religião no trabalho global de cada autor. Isso acontece no capítulo dedicado
aos autores clássicos figuram aqui Marx, Durkheim, Weber, Simmel, Freud, Mead
e Parsons , mas é particularmente evidente no capítulo seguinte, cujo título é
"A religião na sociologia contemporânea e na análise cultural". Esta
opção, que retoma a questão do actor e da estrutura, abre ainda canais de
comunicação com outros campos dentro da sociologia, sensibilizando o leitor
para o modo como autores centrais da teoria sociológica contemporânea abordam a
religião. Desta forma, Luhmann, Goffmann, Bourdieu, Giddens e mesmo Berger e
Luckmann figuram neste capítulo, menos pela sua especificidade dentro da
sociologia das religiões e mais pelo seu contributo para a teoria social. Os
autores justificam ainda a inclusão, neste mesmo capítulo, da análise cultural
com o argumento de que teóricos fundamentais, como "Habermas, Bauman e
Foucault, deram contributos significativos para a filosofia, a ética e a
crítica cultural" (p. 49). Em suma, enfatizam o que esses autores disseram
acerca da religião e como as suas perspectivas podem ser adoptadas no estudo da
mesma.
Ainda no plano de organização dos conteúdos, o modo como os autores situam a
secularização escapa aos procedimentos tradicionais. Ao invés de dedicarem um
capítulo (ou mais) à secularização, considerando-a um processo autónomo e
monopólio da sociologia das religiões, concebem-na como uma das grandes
narrativas, a par da modernidade, pós-modernidade e globalização. Essa
abordagem abre caminho para a apresentação, no capítulo seguinte, de um dos
temas mais importantes da sociologia das religiões na actualidade, que é o da
religião na esfera pública, discutindo aí religião oficial e Estado, religião
civil, nacionalismo religioso, religião pública e poder político.
É igualmente relevante o modo como outras questões nucleares da realidade
religiosa de hoje são criteriosamente autonomizadas em capítulos. Referimo-nos
à "religiosidade individual", a "organizações e movimentos
religiosos", à "religião, unidade social e conflito", à
"raça, etnicidade e religião" e à "religião e género".
Neste quadro, julgamos que também teria feito sentido incluir um capítulo
dedicado à relação entre a religião e a natureza ou o ambiente, uma vez que se
trata de um tema discutido no âmbito dos novos movimentos sociais (incluindo os
religiosos) e de um novo puritanismo secularizado.
Admitindo que a sociologia das religiões foi frequentemente remetida para as
margens de desenvolvimentos sociológicos importantes, Furseth e Repstad
procuram ressituá-la através de uma reflexão maturada acerca do seu futuro. O
livro traz, assim, o debate da sociologia contemporânea para o campo religioso
e a religião para o debate sociológico contemporâneo.
Helena Vilaça
Investigadora do Instituto de Sociologia
Faculdade de Letras da Universidade do Porto