Psicologia da Saúde Sexual e Reprodutivaé a designação genérica de um extenso e
moderno campo de investigação e intervenção da Psicologia que toma como objecto
a saúde sexual e reprodutiva.
Se a Psicologia da Saúde é uma área de interesse e investigação bem delimitada,
e a sua contribuição para a saúde sexual e reprodutiva tem sido efectiva ao
longo da década de noventa, esta designação, que agrega conceitos próximos mas
distintos: o da saúde sexual e o de saúde reprodutiva, necessita de uma
explicitação complementar.
A Saúde Reprodutiva surge da adaptação do conceito generalista de saúde,
proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS), às questões mais particulares
da reprodução humana e, nesse sentido, pode ser vista como um estado de bem-
estar físico, psíquico e social, relativamente ao aparelho e à função
reprodutora (Miller & Bahamon, 1995).
Por seu turno, a Saúde Sexual pode ser definida como a integração dos aspectos
somáticos, emocionais, intelectuais e sociais do ser sexual, em direcção a um
valorização positiva da sexualidade (WHO, 1975).
A Saúde Sexual e Reprodutiva é pois um território de complementaridade
disciplinar, em que, naturalmente, a Psicologia se foi instalando, de forma a
responder aos desafios que uma concepção alargada da saúde permite legitimar
uma sexualidade despreocupada e prazenteira (Sargeant, 1993).
Numa primeira fase a Psicologia da Saúde Sexual e Reprodutiva interessou-se
pelas questões da educação sexual como estratégia promotora de saúde e
preventiva de doenças sexualmente transmissíveis, em particular do HIV, e de
gravidezes indesejadas (Nodin, 2004).
De facto, se a história da saúde sexual se pode contar até meados do século XX,
em torno, por um lado das preocupações sobre os comportamentos sexuais e das
patologias ou desvios que lhe estavam associados e, por outro lado, do
desenvolvimento de especialidades médicas e para-médicas centradas sobre o
aparelho sexual e o nascimento (ginecologia, urologia e obstetrícia), os anos
oitenta do século vinte inauguraram uma magna preocupação relacionada com o
aparecimento e expansão avassaladora do HIV como pandemia universal. A educação
sexual, já em vigor em muitos países como currículo escolar, ficou na ordem do
dia, como única possibilidade formativa e preventiva desta doença sem cura. De
caminho o destaque foi também para as gravidezes indesejadas, em particular na
adolescência, mas também em qualquer período da vida fértil em que a ausência
de informação e de uma atitude consciente de adesão ao planeamento familiar,
implicavam interrupções de gravidez ou filhos não desejados.
Se, entre nós estes temas continuam a ser prioritários, e a educação sexual
continua a ser um cavalo de batalha inconsequente, os números da infecção pelo
HIV continuam a crescer, a gravidez adolescente coloca-nos num desonroso
segundo lugar noranking europeu de países com mais jovens mães e as legislações
sobre a interrupção de gravidez facilitam abortos clandestinos, o evoluir das
sociedades e das mentalidades, e também dos recursos tecnológicos aplicados à
bio-medicina, trouxeram para a ribalta novas preocupações.
Este número deAnálise Psicológicadedicado àPsicologia da Saúde Sexual e
Reprodutivapretende, exactamente, mostrar alguns exemplos dos actuais
interesses de investigação e intervenção nesta área. Assim, os 12 artigos aqui
apresentados, uns teóricos outros decorrentes de resultados de investigação,
clarificam temas diversificados que vão desde a apresentação de um modelo de
adesão à contracepção, a representação que os técnicos de saúde têm perante o
fenómeno designado como de "barrigas de aluguer", o "estado
da arte" sobre o que se sabe das dadoras de ovócitos, as atitudes das
mulheres em relação à amamentação, as preocupações parentais dos indivíduos que
passaram a esta condição por recurso a fertilização in vitro, até questões
antigas, mas nem por isso menos pertinentes, como as que têm que ver com a
sexualidade, a infertilidade e o cancro, a imagem corporal das mulheres com
cancro de mama e as repercussões ao nível no relacionamento conjugal e sexual,
a satisfação sexual e percepção de saúde em mulheres com incontinência
urinária, a identidade sexual e os seus determinantes, a homofobia
internalizada e os seus instrumentos de medida, o impacto do exercício físico
na sexualidade dos mais velhos ou a relação entre função eréctil e qualidade de
vida em homens sem doença.
ISABEL PEREIRA LEAL