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EuPTHUHu0870-82312010000100010

EuPTHUHu0870-82312010000100010

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0870-8231
Year2010
Issue0001
Article number00010

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Perturbação mental e ideação suicida entre reclusos preventivos Perturbação mental e ideação suicida entre reclusos preventivos Nuno Alexandre Costa Moreira (*),Rui Abrunhosa Gonçalves (**) INTRODUÇÃO Os comportamentos autolesivospodem ser definidos como todo e qualquer acto através do qual um indivíduo causa uma lesão em si mesmo, independentemente do grau de intenção letal e conhecimento do verdadeiro motivo desse acto. Este termo permite-nos conglomerar uma ampla gama de comportamentos resultantes de autolesões, estejam eles relacionados com actos manipulativos, para-suicídios, tentativas de suicídio ou suicídios consumados (Moreira, 2008). Todavia, entre cada um destes comportamentos, existem diferenças significativas relativamente ao planeamento, motivação, letalidade, psicopatologia associada, reacção à descoberta e, sobretudo, no que respeita ao nível de intencionalidade suicida experienciada (Lohner & Konrad, 2006; Moreira, 2008). Como tal, a avaliação da ideação suicida poderá constituir um forte indicador de risco à efectivação destes comportamentos (Brown, Beck, Steer, & Grisham, 2000; Raynolds, 1988, 1991a), principalmente nos comportamentos autolesivos em que prevalece a intenção suicida (McAuliffe, 2002).

Embora não raras vezes seja possível observar-se sobreposição entre diferentes tipos de autolesão, nas autolesões com carácter manipulativo encontramos usualmente indivíduos com perturbação anti-social da personalidade e que apenas enveredam pela autolesão com intuito de obtenção de ganhos secundários. No para-suicídio encontramos geralmente indivíduos com perturbação borderline da personalidade, desregulados emocionalmente devido a um qualquer problema interpessoal e que utilizam o corte superficial da pele, não com intenção suicida, mas com intuito de pôr fim a um estado psíquico que muitas vezes se torna insuportável (Chapman, Gratz, & Brown, 2006; Hayes, Wilson, Gifford, Follette, & Strosahl, 1996; Moreira, 2008). Na tentativa de suicídio encontramos indivíduos desesperançados e que padecem de perturbações depressivas. Experienciam geralmente elevada intenção suicida, encontram-se cognitivamente constritos e não perspectivam outra saída que não a morte para um estado extremo de sofrimento mental (Moreira, 2008; Rudd, 2000).

No que se refere ao fenómeno suicidário em meio prisional, tem-se verificado que as taxas de comportamentos autolesivos são várias vezes mais elevadas nas prisões comparativamente ao observado entre a população geral (Daniel & Fleming, 2006; Haycock, 1986; Joukamaa, 1997; Kerkhof & Bernasco, 1990; Shaw, Baker, Hunt, Moloney, Appleby, 2004). A nível nacional, embora exista um acervo de literatura considerável sobre comportamentos autolesivos na população geral (e.g., Martins, 1990; Sampaio, 2006; Saraiva, 1999)1, os estudos sobre este fenómeno em meio prisional são escassos, reportando-se sobretudo à compilação das características socio-demográficas dos suicidas (e.g., Moreira, 1998) a estudo de casos (e.g., Pinho, Gonçalves, & Mota, 1997) e estudo das perturbações da personalidade dos indivíduos com história de auto-mutilação (Duque & Neves, 2004). Efectivamente, nas prisões apenas dispomos de dados relativos a um tipo de comportamento autolesivo, ao suicídio consumado, tendo Moreira (2008) apurado que entre 1998 e 2006 os suicídios foram responsáveis em média por 16,6% de todos os óbitos ocorridos em meio prisional português.

Quando o autor comparou as taxas de suicídio por 100.000 habitantes entre prisões e população geral entre 1999 e 2004 encontrou taxas de suicídio consumado extremamente elevadas nas prisões, variando entre um mínimo de 77,3% em 1999 e um máximo de 173,5% em 2001, com uma média de 124,7% entre 1999 e 2004, comparativamente à média de 8,8% na população em geral. Como tal, concluiu que entre 1999 e 2004, por cada suicídio na população em geral ocorreram 14 suicídios nas prisões portuguesas.

Vários estudos (Daniel & Fleming, 2006; Haycock, 1986; Joukamaa, 1997; Kerkhof & Bernasco, 1990; Shaw, Baker, Hunt, Moloney, Appleby, 2004) têm tentado dar a conhecer as razões pelas quais nas prisões os suicídios, tentativas de suicídio e para-suicídios se encontram mais exacerbados. Numa revisão literária sobre a temática, Moreira (2008) identificou vários factores de risco associados a estes comportamentos nas prisões. De acordo com o autor, em primeiro lugar é necessário ter em atenção que as prisões presenteiam os recluídos com factores de risco qualitativamente diferentes daqueles encontrados entre a população geral. Normalmente, estas instituições são fonte de sofrimento, uma vez que afastam o indivíduo de seus amigos e familiares, obrigam-no a viver num meio violento, sobrelotado e repleto de novas normas, a enfrentar um processo legal desgastante, ao isolamento disciplinar e a lidar com inúmeros microstressores diários que potenciam o risco de comportamentos autolesivos. A fase da execução da pena em que o risco se mais exacerbado parece ser a da admissão do recluso na prisão e durante toda a prisão preventiva. Nesta fase, o recluso é confrontado com uma realidade completamente distinta que se traduz num acontecimento significativo de vida, numa "martelada," num stressor, que requer processos adaptativos até ao momento desconhecidos do seu reportório pessoal. Tal facto, associado à revolta, vergonha, culpa e medo experienciado após a admissão, produz tensão interior, sofrimento e tristeza, mais ainda, numa fase em que o indivíduo sente não ter suporte social e familiar. Quando estes stressores ultrapassam determinado limiar, o recluso pode contemplar o comportamento autolesivo como hipótese de fuga a um estado de sofrimento considerado pelo mesmo insuportável.

Moreira (2008) enfatiza ainda o facto de que somente alguns reclusos enveredam por comportamentos autolesivos perante estas fontes de stress, precisamente os mais predispostos, mais vulneráveis, ou seja, os que se encontram pouco "equipados" geneticamente, hereditariamente, ou em termos desenvolvimentais ou sócio-familiares para responder de forma adequada e adaptativa às contingências da perda da liberdade e vida em reclusão.

Normalmente indivíduos negligenciados em criança, com história de abuso psicológico, físico ou sexual, desesperançados, com historial de perturbação psiquiátrica, com antecedentes de comportamentos autolesivos, impulsivos, agressivos, que abusam ou dependem de substâncias, desempregados ou maritalmente abandonados. Ou seja, se por um lado as instituições prisionais potenciam stress elevado, por outro, albergam os indivíduos que em sociedade apresentavam inúmeras predisposições que acabam por se constituir em meio prisional como factores de risco acrescido para comportamentos autolesivos.

A presença de perturbação psiquiátrica tem sido apontada como um dos factores de risco que mais exacerbam os comportamentos autolesivos (Asnis, Friedman, Sanderson, Kaplan, Van Praag, & Harkavy-Friedman, 1993; Beautrais, 2002; Beautrais, Joyce, Mulder, Fergusson, Deavoll, & Nightingale, 1996; He, Felthous, Holzer, Nathan, & Veasey, 2001; Holmstrand, Niméus, & Tråskman-Bendz, 2006; Waern et al., 2002), embora seja importante notar que apesar da maior parte dos comportamentos autolesivos conhecerem o seu epílogo no decurso de perturbações psiquiátricas, nem todos os indivíduos com depressão, psicose ou outros quadros psiquiátricos acabam por enveredar por comportamentos autolesivos (Mann, 2003; Mann, Waternaux, Haas, & Malone, 1999). Além disso, verificou-se que a severidade objectiva, ou seja, o número de sintomas observados durante um quadro psiquiátrico não permite distinguir os pacientes que tentam o suicídio dos pacientes que não enveredam por tal conduta (Mann et al., 1999; Sher, Oquendo, & Mann, 2001). Em vez disso, será o impacto da doença ou dos acontecimentos de vida experienciados (e.g., problemas financeiros, profissionais e conflitos e perdas interpessoais) que variam amplamente de indivíduo para indivíduo e se correlacionam com o comportamento autolesivo (Sher et al., 2001), corroborando a hipótese de que tais comportamentos constituem fenómenos multidimensionais e que a capacidade de utilização de coping adaptativo durante o decurso da doença, reveste-se de grande importância (Moreira, 2008).

Embora acabe por ser um determinado stressor psicossocial agudo que precipita o comportamento autolesivo em indivíduos de si vulneráveis, nestes comportamentos a perturbação psiquiátrica encontra-se, de facto, normalmente exacerbada (Mann et al., 1999), constituindo-se como um dos factores de risco normalmente presentes em indivíduos que enveredam por tal conduta (Angst, Angst, & Stassen, 1999; Åsberg, Åberg-Wistedt, & Nordin, 1995; Goss, Peterson, Smith, Kalb, & Brodey, 2002; He, Felthous, Holzer, Nathan, & Veasey, 2001; Malone, Haas, Sweeney, & Mann, 1995; Moreira, 2008; Palmer & Connelly, 2005). Se tivermos em conta que nestas instituições a prevalência de perturbação psiquiátrica é extremamente elevada (Fazel & Danesh, 2002; Falissard et al.,2006; Singleton, Meltzer, Gatward, Coid, & Deasy, 1997) não será difícil relacionar tal facto com maior risco suicida ou taxas elevadas de comportamentos autolesivos nas prisões. Por exemplo, de acordo com o estudo de Goss e colaboradores (2002) referente a tentativas de suicídio em meio prisional, dos 124 reclusos que tentaram o suicídio pela primeira vez enquanto recluídos, 77% padecia de perturbação psiquiátrica. Num outro estudo, Meltzer, Jenkins, Singleton, Charlton, e Yar (2003), verificaram que, comparativamente a reclusos que não tenham tentado o suicídio os reclusos que tentam o suicídio têm quatro vezes mais probabilidade de terem recebido tratamento psiquiátrico no ano anterior à sua detenção. Em reclusas, essa probabilidade é três vezes maior.

No que diz respeito ao para-suicídio, Palmer e Connelly (2005) referem que reclusos com história de para-suicídio têm mais probabilidade de evidenciar um amplo espectro de características e sintomatologia depressiva. Estes reclusos, comparativamente a reclusos sem história prévia de para-suicídio, obtêm pontuações mais elevadas na Beck Hopelessness Scale, no Beck Depression Inventory-IIe no Beck Scale for Suicide Ideationaquando da admissão no estabelecimento prisional. Entre nós, Duque e Neves (2004) verificaram que os reclusos com comportamento de auto-mutilação têm maior tendência a apresentar perturbações da personalidade evitante, esquizotípica e borderline.

Relativamente a estudos com reclusos que acabaram por morrer por suicídio na prisão, também eles são reveladores de um historial de perturbação psiquiátrica e de abuso ou dependência de substâncias. Por exemplo, He e colaboradores (2001) verificaram que entre as perturbações psiquiátricas mais comuns em reclusos na situação de condenados vítimas de suicídio, se encontravam as perturbações do humor (44% antes da detenção e 64% durante o encarceramento) e perturbações psicóticas (28% antes da detenção e 44% durante o encarceramento).

Finalmente, numa revisão que envolveu 34 estudos (compreendendo 4780 casos de suicídio na prisão) Fazel, Cartwright, Norman-Nott, e Hawton (2008) encontraram que os factores de risco associados ao suicídio prisional eram a raça/etnia branca, ser do sexo masculino e casado, ser alojado em cela individual, ser preventivo e cumprir pena de prisão perpétua. nos factores de ordem clínica, salientava-se a ideação suicida recente, história de tentativas de suicídio, problemas de consumo de substâncias e ter um diagnóstico actual de perturbação psiquiátrica com a consequente prescrição de medicação psicotrópica.

Todos os estudos supramencionados, sejam eles relativos ao suicídio, tentativa de suicídio ou para-suicídio, são reveladores da importância da exacerbação da perturbação mental na efectivação destes comportamentos em meio prisional.

Infelizmente, exceptuando a investigação de Duque e Neves (2004) entre nós também escasseiam estudos sobre a prevalência ou características dos problemas de saúde mental dos reclusos portugueses, uma vez que as investigações que se conhecem têm ainda um carácter muito limitado (e.g., Marques, 2007; Ribeiro & Barros, 1995; Sousa, 2007) e estudos nacionais que cruzem os comportamentos suicidários com os problemas de saúde mental dos reclusos, são quase inexistentes.

Como tal, tendo em atenção que a associação entre comportamentos suicidários e perturbação psiquiátrica está particularmente documentada (Angst et al., 1999; Åsberg et al., 1995; Goss et al., 2002; He et al., 2001; Malone et al., 1995; Moreira, 2008; Palmer & Connelly, 2005) e que a ideação suicida parece ser o primeiro marcador de risco suicida (Raynolds, 1991a), este estudo tem como objectivo explorar a incidência de ideação suicida e de perturbação emocional em presos preventivos em dois momentos distintos da execução da pena, durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de cumprimento da pena. Além disso, utilizando o ponto de corte do QIS (Raynolds, 1988), que nos permite verificar se determinado indivíduo apresenta ideação suicida, dividiu-se a amostra em dois grupos, grupo com ideação suicida (CIS) e grupo sem ideação suicida (SIS), procurando-se desta forma verificar se existem diferenças significativas ou relação de dependência entre perturbação emocional e tipo de sintomatologia psicopatológica associada (i.e., somatização, depressão, hostilidade, ansiedade, ansiedade fóbica, psicoticismo, ideação paranóide, obsessão-compulsão e sensibilidade interpessoal) mediante o grau de ideação suicida reportada em ambos os grupos.

METODOLOGIA Participantes A amostra é constituída por 66 indivíduos do sexo masculino, maioritariamente jovens adultos com idades compreendidas entre os 23 e 40 anos (M=32.48; DP=9.56), solteiros ou a viver em união de facto, com habilitações escolares de nível básico e que no período antes da reclusão se encontravam desempregados, a trabalhar na construção civil ou em profissões que não exigiam elevada qualificação. Quanto ao tipo de crime cometido, a amostra é constituída maioritariamente por reclusos detidos pelo crime de roubo ou furto e tráfico de estupefacientes. No que se refere à reincidência2, a amostra fracciona-se praticamente em duas partes iguais. No Quadro 1 resumem-se os dados relativos às características sociodemográficas e criminais da amostra (Moreira, 2009, para consulta da análise inferencial entre estas variáveis e comportamentos autolesivos).

QUADRO 1 Características sociodemográficas e criminais da amostra (N=66)

Instrumentos Questionário de Ideação Suicida (QIS) A ocorrência de pensamentos suicidas foi avaliada pelo Questionário de Ideação Suicida (QIS), versão portuguesa do Suicide Ideation Questionnairetraduzida e adaptada por Ferreira e Castela (1999). O QIS permite analisar a gravidade dos pensamentos suicidas em adolescentes e adultos, avaliando hierarquicamente os pensamentos relativos ao suicídio entre pouco e muito graves. O QIS é constituído por 30 itens, para os quais, são disponibilizadas sete alternativas de resposta que avaliam a frequência de ocorrência de ideação suicida. O formato de resposta oscila entre "Nunca pensei nisto" (0), até "Quase todos os dias" (6). Para propósitos de pontuação, os 30 itens são pontuados de 0 a 6, numa direcção patológica, sendo que a pontuação máxima de 180 indicia cognições suicidas ocorrendo quase todos os dias. De acordo com Raynolds (1988) uma pontuação ≥41 pode ser indicativo de significativa psicopatologia e de potencial risco de suicídio. Ao nível da consistência interna, os estudos psicométricos efectuados na versão portuguesa (Ferreira & Castela, 1999) revelam um coeficiente alfa de Cronbachde .96 e correlação teste-reteste com intervalo de um mês entre as duas aplicações de .76. O QIS apresenta ainda correlação positiva significativa com o Inventário de Depressão de Beck (.59, p<.001) e correlação negativa e significativa com a Escala de Auto-estima de Rosenberg (-.45, p<.001).

Inventário de Sintomas Psicopatológicos (BSI) A sintomatologia psicopatológica foi avaliada pelo Inventário de Sintomas Psicopatológicos, versão portuguesa do Brief Symptom Inventory(BSI; Derogatis, 1982) traduzida e adaptada por Canavarro (1999). É um inventário de auto resposta com 53 itens, onde o indivíduo deverá classificar o grau em que cada problema o afectou durante a última semana, numa escala tipo Likertque varia entre "Nunca" (0) a "Muitíssimas vezes" (4). O BSI avalia sintomas psicopatológicos em termos de nove dimensões de sintomatologia (somatização, obsessão-compulsão, sensibilidade interpessoal, depressão, ansiedade, hostilidade, ansiedade fóbica, ideação paranóide e psicoticismo) e três índices globais, que constituem avaliações sumárias de perturbação emocional, representando aspectos diferentes de psicopatologia (Índice Geral de Sintomas - IGS, Total de Sintomas Positivos - TSP e o Índice de Sintomas Positivos - ISP). De acordo com Canavarro um valor ≥a 1.7 no ISP é provável de ser encontrado em pessoas perturbadas emocionalmente. Os estudos psicométricos efectuados na versão Portuguesa (Canavarro, 1999) revelaram que a escala apresenta níveis adequados de consistência interna para as nove escalas, com valores de alfa de Cronbach que variam entre .72 para psicoticismo e .85 para depressão.

Procedimentos Esta investigação decorreu num estabelecimento prisional (EP) central para presos masculinos da Área Metropolitana do Porto entre Abril e Dezembro de 2008 e para a sua implementação foi obtida autorização por parte da Direcção Geral dos Serviços Prisionais.

Tínhamos como intuito incluir na nossa amostra todos os reclusos admitidos entre 7 de Abril e 7 de Junho de 2008 com medida de prisão preventiva. Durante a fase da investigação (7 de Abril e 7 de Junho de 2008) entraram 118 reclusos no estabelecimento prisional. O rácio entre a totalidade de reclusos admitidos durante este período de tempo e os participantes que acabaram por fazer parte da nossa amostra após seis meses de reclusão (N=66) pode ser explicado por: Durante a fase da investigação (7 de Abril e 7 de Junho de 2008) A participação no estudo implicava uma entrevista durante a primeira semana de reclusão. A impossibilidade de deslocação ao estabelecimento prisional sete dias por semana implicou desde logo algumas perdas, uma vez que 13 reclusos saíram em liberdade no mesmo dia ou nos dias seguintes à sua detenção antes que fosse possível convida-los a participar no estudo. Os reclusos foram seleccionados numa base voluntária. Neste sentido, 2 reclusos recusaram participar nesta investigação, alegadamente por não se sentirem capazes de responder às perguntas dos questionários. Um recluso de 67 anos de idade, apesar de ter aceite participar no estudo encontrava-se completamente alheado da realidade e não conseguiu completar os questionários. Um dos critérios implícitos à aplicabilidade dos instrumentos dizia respeito à inteligibilidade por parte dos reclusos da língua portuguesa. 2 dos reclusos tinham nacionalidade estrangeira e não falavam português, como tal, não foram incluídos nesta investigação.

Durante a fase da investigação (7 de Outubro e 7 de Dezembro de 2008) A amostra referente à fase do estudo (i.e., sensivelmente seis meses após a admissão) contou apenas com a presença de 66 reclusos dos cem pertencentes à fase, uma vez que 34 reclusos da amostra inicial saíram em liberdade ou foram transferidos de estabelecimento prisional no período de seis meses que mediou entre as duas fases do estudo.

Todos os reclusos foram contactados pessoalmente pelo investigador e convidados a participar no estudo. Os participantes foram informados do propósito da investigação e pediu-se-lhes que assinassem um consentimento informado. Durante a fase da investigação (primeira semana de reclusão) procedeu-se à recolha de informação relativa às características sociodemográficas e criminais da amostra. Além disso, foram passados o QIS e o BSI, para avaliar, respectivamente, o risco suicida e a sintomatologia psicopatológica durante os primeiros sete dias de reclusão.

Após seis meses de cumprimento da pena foram novamente avaliados todos os reclusos que não saíram em liberdade, que não foram transferidos de estabelecimento prisional e que concordaram responder novamente aos questionários. Administraram-se novamente o QIS e o BSI, que permitiram observar exacerbação ou remissão do risco suicida e de sintomatologia psicopatológica após esse período de cumprimento de pena.

RESULTADOS O primeiro objectivo desta investigação passou pela avaliação das incedências de ideação suicida e de perturbação emocional e tipo de psicopatologia associada entre a população reclusa em análise em dois momentos distintos da execução da pena preventiva, durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de reclusão.

Recorrendo-se ao Teste t-studentpara amostras emparelhadas e considerando-se estatisticamente significativas as diferenças entre médias cujo p-valueseja inferior ou igual a .05, verificou-se que não existem diferenças estatisticamente significativas [t(65)=.350, p=.728] entre os níveis médios de ideação suicida observados durante a primeira semana de reclusão (M=22.20; SD=26.55) e após seis meses de cumprimento da pena (M=21.30; SD=28.16).

Contrariamente ao observado com os níveis ideação suicida, constatou-se que os níveis médios de perturbação emocional por participante são significativamente [t(65)=7.264, p=.000] superiores durante a primeira semana de reclusão (M=55.52; SD=23.74) comparativamente aos observados após seis meses de cumprimento da pena (M=36.98; SD=20.13) (v. Quadro 2).

QUADRO 2 Média e desvio padrão das pontuações do QIS e do BSI durante aprimeira semana de reclusão ( fase) e após seis meses de cumprimento da pena ( fase)

No Quadro 3 encontram-se as médias, desvios padrão e os resultados do Teste t- studentpara amostras emparelhadas para α≤.05 relativos ao tipo de sintomas psicopatológicos associados à perturbação emocional e índices globais de perturbação emocional avaliados pelo BSI durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de cumprimento da pena. Iniciando a análise pelo final do quadro, verifica-se desde logo que as pontuações dos índices globais de perturbação emocional diminuem significativamente com o decorrer da execução da pena. Entre as nove dimensões de psicopatologia do BSI, a ideação paranóide, a ansiedade, a hostilidade e a depressão foram as dimensões que se encontraram mais exacerbadas durante a fase da admissão na prisão. Após seis meses de reclusão, exceptuando a dimensão sensibilidade interpessoal, todas as outras se viram significativamente diminuídas, sendo que, entre estas quatro dimensões de psicopatologia, a ansiedade foi a dimensão que mais viu as suas pontuações diminuídas comparativamente ao observado durante a primeira semana de reclusão.

QUADRO 3 Média, desvio padrão e Teste t-student para amostras emparelhadas referente aos resultados da avaliação dos sintomas psicopatológicos durante a primeira semana de reclusão ( fase) e após seis meses de cumprimento da pena ( fase)

O segundo objectivo desta investigação passou num primeiro momento por analisar o grau de associação entre perturbação emocional, tipo de sintomatologia psicopatológica associada e ideação suicida. Num segundo momento, procurou-se verificar a relação de dependência e independência entre perturbação emocional e sintomatologia psicopatológica associada nos reclusos com e sem ideação suicida.

Neste sentido, procurou-se analisar a correlação entre as pontuações totais do QIS e do BSI. Da análise correlacional, verifica-se que durante a primeira semana de reclusão as pontuações totais de sintomatologia psicopatológica dos reclusos perturbados emocionalmente correlacionam-se positiva e significativamente com as de ideação suicida (Rsp=.542; p=.000). As dimensões psicopatológicas com maior associação positiva e estatisticamente significativas com as pontuações de ideação suicida durante a primeira semana de reclusão são a depressão, o psicoticismo, a hostilidade e a ansiedade (v.

Quadro 4).

QUADRO 4 Correlação de Rho de Spearman entre as pontuações do QIS, Dimensões de Psicopatologia e ÍndicesGlobais do BSI durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de cumprimento da pena

Após seis meses de reclusão verifica-se aumento das correlações entre as pontuações totais de sintomatologia psicopatológica e ideação suicida (Rsp=.770; p=.000). No Quadro 4 observa-se que, comparativamente à avaliação efectuada na primeira semana de reclusão, após seis meses de reclusão praticamente todas as dimensões psicopatológicas e índices do BSI viram aumentadas as suas correlações com as pontuações de ideação suicida. As dimensões que mais se correlacionam com as pontuações totais de ideação suicida são a depressão, a ansiedade, o psicoticismo e a hostilidade.

Após análise de associação positiva e estatisticamente significativa entre ideação suicida e perturbação emocional, utilizou-se o ponto de corte do Questionário de Ideação Suicida (pontuação ≥41; Raynolds, 1988) e estratificou- se a amostra em dois grupos, grupo com ideação suicida (Grupo CIS) e grupo sem ideação suicida (Grupo SIS), sendo que, dos 66 reclusos que fizeram parte da investigação, 18 (27.3%) enquadram-se no Grupo CIS durante a fase da investigação e 14 (21%) durante a fase.

A observação dos Gráficos 1 e 2 permite-nos visualizar o tipo de sintomatologia psicopatológica experienciada pelos reclusos com e sem ideação suicida. Assim, no Gráfico 1 é possível observar que durante a primeira semana de reclusão o Grupo CIS apresenta pontuações de sintomatologia psicopatológica bem mais elevadas que o Grupo SIS em todas as dimensões psicopatológicas, particularmente ao nível da depressão, hostilidade, psicoticismo, ideação paranóide e sensibilidade interpessoal. O Gráfico 2 reflecte a variação da sintomatologia psicopatológica após seis meses de reclusão. Como é possível observar, em ambos os grupos verifica-se uma diminuição dos níveis de sintomatologia psicopatológica, contudo, enquanto no grupo CIS os níveis de sintomatologia psicopatológica apenas sofrem uma ligeira diminuição, no grupo SIS essa diminuição é abrupta.

No sentido de avaliar as diferenças nas pontuações médias de perturbação emocional (Índice de Sintomas Positivos) entre os grupos CIS e SIS durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de cumprimento da pena utilizou- se o Teste não-paramétrico Mann-Whitney. A análise foi efectuada para α=.05.

Durante a primeira semana de reclusão constata-se que as pontuações médias de perturbação emocional entre o grupo CIS e SIS são significativamente diferentes (U=194.50, W=1370.50, p=.001), com o Grupo CIS a apresentar níveis significativamente mais elevados de perturbação emocional (M=2.303; DP=.411) comparativamente ao Grupo SIS (M=1.974; DP=.274). Tal como durante a primeira semana de reclusão, após seis meses de cumprimento da pena o Grupo CIS apresenta níveis de perturbação emocional (M=1.213; DP=.370) significativamente superiores (U=119.50, W=1497.00, p=.000) comparativamente ao Grupo SIS (M=.568; DP=.243).

GRÁFICO 1 Avaliação dos sintomas psicopatológicos dos reclusos com ideação suicida (CIS) e sem ideação suicida (SIS) durante a primeira semana de reclusão ( fase)

GRÁFICO 2 Avaliação dos sintomas psicopatológicos dos reclusos com ideação suicida (CIS) e sem ideação suicida (SIS) após seis meses de cumprimento da pena ( fase)

Tendo por base o valor do ponto de corte do BSI (Índice de Sintomas Positivos ≥1.7) para a população portuguesa (Canavarro, 1999), na fase deste estudo é possível categorizar 59 (89.4%) dos 66 reclusos da amostra como perturbados emocionalmente, ou seja, demonstrando valores clinicamente significativos para sintomatologia psicopatológica durante a primeira semana de reclusão. Na fase verificouse uma diminuição considerável na percentagem de indivíduos com sintomatologia psicopatológica relativamente à analisada durante a primeira semana de reclusão. Apenas 31 (47%) reclusos cotaram para perturbação emocional, ou seja, verificou-se uma diminuição de 42.4% entre as duas fases da investigação ao nível da perturbação emocional.

Para se analisar se a incidência de ideação suicida é dependente da sintomatologia psicopatológica durante a primeira semana de reclusão e após seis meses de cumprimento da pena, recorreu-se ao teste de Fisher,considerando- se uma probabilidade de erro tipo I para α=.05. Verificou-se que a sintomatologia psicopatológica na primeira semana de reclusão não se encontra significativamente (Fisher=.176) associada com ideação suicida. Dos 18 reclusos com ideação suicida (CIS), todos (100%) se encontram perturbados emocionalmente enquanto dos 7 reclusos não perturbados emocionalmente nenhum pontuou para ideação suicida (v. Quadro 5).

QUADRO 5 Relação entre ideação suicida e perturbação emocional durante a primeira semana de reclusão

Contrariamente ao observado na primeira semana de reclusão, após seis meses de cumprimento da pena, a ideação suicida encontra-se claramente dependente do facto do recluso se encontrar perturbado emocionalmente (Fisher=.02). Entre os 31 reclusos perturbados emocionalmente, 12 (38.7%) pertencem ao Grupo CIS.

Comparativamente, entre os 35 reclusos não perturbados emocionalmente, apenas 2 (7.4%) pertencem ao Grupo CIS (Quadro 6).

QUADRO 6 Relação entre ideação suicida e perturbação emocional após seis meses de cumprimento da pena

DISCUSSÃO Num primeiro momento, este estudo permitiu verificar que a conjuntura inerente à admissão do recluso na prisão obriga-o a experienciar determinadas adversidades que exacerbam os níveis de perturbação emocional, e que, com o tempo, esta condição tende a diminuir significativamente. O mesmo foi igualmente verificado num outro estudo efectuado entre nós com 38 mulheres reclusas e que mediu as diferenças das pontuações obtidas no BSI à data da sua entrada na prisão e após dois anos (em média) de cumprimento de pena (cf.

Sousa, 2007), bem como no estudo de Zamble e Porporino (1988). Estes dados vão ainda ao encontro de estudos que verificaram que a sobrecarga emocional própria da fase inicial da execução da pena se esbatida à medida que o recluso de adapta à instituição prisional e que, geralmente os reclusos retomam o seu normal funcionamento depois de reagirem adaptativamente ao impacto da detenção e à fase inicial de reclusão (Cooper, 1974; Elger, 2004; Gonçalves, 2008; Reitzel & Harju, 2000; Ribeiro & Barros, 1995; Zamble & Porporino, 1988). Por outro lado, verifica-se que os reclusos que experienciam ideação suicida continuam normalmente a experiencia-la após seis meses de reclusão.

Circunstância provavelmente relacionada com a incapacidade destes reclusos se adaptarem ao contexto prisional (Gonçalves, 2002), ou ainda, com o facto destes reclusos constituírem um grupo de elevada vulnerabilidade mesmo em liberdade, o que quererá dizer que importam para o sistema prisional características que os tornam mais predispostos a experienciar ideação suicida (Moreira, 2008).

Efectivamente, a divisão da amostra em dois grupos, permitiu constatar que os reclusos que experienciam maior ideação suicida são os que continuam perturbados emocionalmente após seis meses de reclusão e que os reclusos com níveis baixos de ideação suicida deixam de se encontrar perturbados e conseguem retomar o seu normal funcionamento, facto que, à semelhança de outros estudos, deixa transparecer que a perturbação psicológica não seja o único factor de risco a concorrer para a ideação suicida (Mann et al., 1999; Sher, Oquendo, & Mann, 2001). Dee facto, é possível verificar que no Grupo CIS a diminuição da perturbação emocional é diminuta, enquanto no Grupo SIS é extremamente elevada. Ou seja, o Grupo CIS apresenta níveis de perturbação emocional relativamente estáveis no tempo apresentando elevada sintomatologia depressiva, paranóide, hostil e psicótica. Tal como sugere Moreira (2008), são indivíduos que na sua maioria entram perturbados na prisão e assim continuam ao longo da execução da pena. Por outro lado, o Grupo SIS demonstra capacidade de resiliência, capacidade de utilização de copingadaptativo, retomando aos poucos o seu normal estado de funcionamento com o grau de perturbação emocional na sua generalidade e a depressão, a ansiedade, o psicoticismo e a hostilidade em particular a diminuírem consideravelmente. Tais dados vão ao encontro dos estudos que observaram maior grau de ideação suicida em quadros psiquiátricos (Goss et al., 2002; He et al., 2001; Meltzer et al., 2003; Palmer & Connelly, 2005), bem como do facto de as perturbações psiquiátricas constituírem um dos factores de risco para o suicídio mais importantes na população recluída (e.g., Fazel et al., 2008). Além disso, o tipo de sintomatologia psicopatológica observada no Grupo CIS tem sido frequentemente abordada na literatura como intimamente associada a comportamentos autolesivos, mais propriamente a sintomatologia depressiva (Biggam & Power, 1999; Bonner 2006; Cooper & Berwick, 2001; Dieserud, Roysamb, Ekeberg, & Craft, 2001; Hawton & Catalan, 1987; Wichmann, Serin, & Motiuk, 2000), ansiosa (Cooper & Berwick, 2001; Miller, 1994), psicótica (Hawton & Catalan, 1987) e hostil (Apter et al.,1991, 1995; Miller, 1994).

Por fim, é legítimo referirem-se algumas limitações nesta investigação. Desde logo, o aspecto metodológico referente à utilização do Questionário de Ideação Suicida, que apenas se encontra aferido para a população jovem adulta portuguesa (e.g., Ferreira & Castela, 1999). Ora, como a média de idades do presente estudo se cifra nos 33 anos, a validade das comparações deve ser ponderada, embora a versão para adultos, o Adult Suicidal Ideation Questionnaire(ASIQ; Raynolds, 1991b) consista exactamente no mesmo questionário ao qual foram retirados cinco itens. Como tal, teremos que esperar por uma adaptação portuguesa da versão para adultos para ultrapassar este obstáculo.

No que concerne à generalização dos resultados à restante população reclusa, não nos esqueçamos que os estabelecimentos prisionais demonstram alguma heterogeneidade quanto à população reclusa e aos stressores associados a cada tipo de estabelecimento prisional. O presente estudo foi levado a cabo num estabelecimento central para presos preventivos masculinos, do norte do país.

Como tal, os dados deste estudo devem ser cuidadosamente generalizados aos presos preventivos em cadeias regionais, que são estabelecimentos prisionais com poucos reclusos e onde os stressores poderão ter efeitos menos nefastos.

Por outro lado, a população de presos preventivos de outras áreas do país, contam nos seus efectivos com elevada população prisional estrangeira, mais propriamente indivíduos de etnia negra provenientes dos PALOPs, o que pressupõe também uma apreciação cuidada. Finalmente, a generalização dos resultados a presos condenados deve ser cuidada, devendo-se ter em conta que estes estabelecimentos prisionais não encerram os mesmos tipos de stressores que uma prisão para presos preventivos (e.g., Johnson & Toch, 1982).

Alguns dos problemas referidos poderão ser ultrapassados noutras investigações que contemplem amostras maiores e mais diversificadas, sendo que os dados obtidos por Sousa (2007) demonstram que o universo da reclusão feminina deverá ser igualmente tido em conta dadas as suas particularidades. Além disso, tendo em conta que a população reclusa não apresenta um risco uniforme, será fundamental ter em conta diferentes tipos de estabelecimentos prisionais bem como a prevalência do abuso de substâncias e de perturbações da personalidade do tipo anti-social, psicopático ou borderline, que todos estes elementos surgem associados à tipologia dos percursos adaptativos dos reclusos (e.g., Gonçalves, 2008). Portanto, em futuros estudos seria interessante desenvolverem-se desenhos prospectivos com prazos de investigação alargados que permitam a identificação das características da personalidade dos reclusos em risco suicida. De qualquer forma, entendemos que o presente estudo contribuiu para o aumento do conhecimento empírico sobre o fenómeno suicidário em meio prisional português, reforçando a necessidade de, cada vez mais, se proceder a avaliações precoces para despiste dos reclusos mais problemáticos (e.g., Moreira, 2009).

CONCLUSÃO O estudo apresentado, tendo um carácter exploratório, logra obter contudo alguns dados interessantes e que abrem caminho a futuras investigações. Assim, de um lado verifica-se que a entrada para a prisão constitui um momento de "choque" para muitos indivíduos e que, pelo facto de muitos deles evidenciarem vulnerabilidades psicológicas significativas, a ideação suicida aparece como uma "estratégia adaptativa" - ainda que paradoxal - ao cumprimento da pena, que permanece ao longo do tempo de reclusão. Por outro lado, e tendo em conta que uma parte significativa da amostra deixa de evidenciar sintomatologia psicopatológica após seis meses de execução da pena, é lícito pensar que não tais reclusos poderão ser portadores de factores protectivos que aumentem a sua resiliência, como também se pode alvitrar que a prisão enquanto instituição normativa e prestadora de cuidados, pode ter contribuído para uma maior estruturação apaziguando, aos poucos, o seu sofrimento psicológico. Em todo o caso, a ideação suicida surge fortemente associada à perturbação mental, mas dada a "evolução" da amostra ao longo do cumprimento da pena, podemos considerar que haviam dois grupos à partida. Um em que as duas condições apareciam associadas e que portanto serão "pré-existentes" à reclusão, e um outro em que as duas condições parecem se ter encontrado na prisão - pelo menos nos momentos iniciais do cumprimento da pena - um "terreno fértil" para interagirem. Assim, é possível que possamos reeditar aqui, mais uma vez, a diferenciação entre uma explicação disposicional para o primeiro caso e situacional para o segundo. Por isso, e a exemplo do estudo clássico de Zamble e Porporino (1988), que reforça a necessidade de se proceder a investigações de carácter longitudinal para melhor cernir os processos adaptativos dos reclusos, também aqui nos parece que avaliar os reclusos em três momentos distintos (durante a entrada na prisão, até à condenação e depois da condenação), poderá fornecer uma resposta mais adequada para as diferenças de resultados que obtivemos.


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