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EuPTHUHu0871-91872013000100013

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National varietyEu
Year2013
SourceScielo

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Passado, presente e futuro da governação educativa na Região Autónoma da Madeira

1. Introdução Uma análise dos primeiros 35 anos de autonomia regional da Madeira, no campo da educação, pode considerar que as formas de participação, nesta área, assumiram fundamentalmente uma dimensão ao nível das atividades de proximidade admnistrativo-regional, onde também a intervenção das autarquias locais, com destaque para as Câmaras Municipais da Madeira e de Porto Santo, desempenhou alguma relevância. Fundamentalmente, constata-se que a intervenção, nos primeiros anos deste período, se relaciona com tudo aquilo que se refere aos transportes escolares, à ação social escolar e à construção e manutenção de escolas, para mencionar o mais relevante.

Porém, e nesta sequência, emergem, a partir de meados da década de 80 do século XX, na Madeira, consequência de alterações na composição governamental ao nível das matérias tuteladas pela área da educação, e de 1990, junto do Estado, alterações com alguns sinais de mudança, consequência do surgimento de algumas políticas educativas nacionais, tais como: as decorrentes da Lei-quadro da educação pré-escolar; o novo regime de autonomia, administração e gestão escolar; a possibilidade de criação dos conselhos locais de educação; e a elaboração das cartas educativas, replicadas, ou não, com as devidas adaptações regionais.

Na realidade, é por esta altura que o poder regional passa a intervir cada vez mais na ação educativa, ao liderar e planear políticas educativas mais ou menos explícitas, ao apoiar os estabelecimentos de ensino, ao investir em técnicos, equipamentos e infraestruturas. Deste modo, tenta-se sobretudo superar um conjunto variado de situações deficitárias que o sistema educativo, na Madeira, apresentava e que, aquando do processo de regionalização iniciado em 1976 (mas coincidindo, fundamentalmente, com a publicação do Decreto-Lei 364/79, de 4 de setembro1), era de molde a ter, por exemplo, uma taxa de analfabetismo de cerca de 40% da população adulta, um parque escolar desatualizado e, em termos infraestruturais, estabelecimentos escolares excessivamente concentrados nos concelhos do Funchal e limítrofes (cf. Secretaria Regional de Educação e Cultura [SREC], 1978).

Por outro lado, é também a partir desta altura que se assiste a um desenvolvimento na Região, assente essencialmente num ‘modo de pensar' que defende a necessidade de reintroduzir o humano na lógica desse desenvolvimento, e em que a ação política se deve tornar global, valorizando a componente formal e não formal e a formação ao longo da vida (Ferreira, 2005). É neste contexto que o sistema educativo regional aspira a conquistar um espaço próprio e onde desponta a problemática da centralização/ /descentralização, com a valorização do contexto regional a que politicamente corresponde uma ideia de democracia participativa, levando a um maior envolvimento dos indivíduos, num esforço comum com vista ao desenvolvimento global.

Evolutivamente, que os processos sociais são dinâmicos, foi-se assistindo, em paralelo, a um discurso da competitividade e da implementação da lógica de mercado, princípios que comandam a agenda política do Estado ao mesmo tempo que são usados, interna e externamente, como legitimadores para esta agenda. É que, conjuntamente, a reestruturação global, nacional e regional modificam a natureza e o âmbito da legitimação e o modo como este se constitui como um problema para o Estado (Robertson & Dale, 2001). De resto, esta ‘evolução' surge também associada à tendência para uma mudança de um Estado-educador para um Estado-regulador (Barroso & Viseu, 2003) e tem por pressuposto o discurso neoliberal de que com ‘menos' Estado mas maior regulação se obtém melhores resultados (‘melhor' Estado). Ora, este processo origina uma redefinição no papel e funções do Estado no plano social e económico, provocando constrangimentos e conflitos de poder no que respeita ao seu controlo político, com a redistribuição de poder entre o Estado e as periferias, pelo que, e como decorrência, se assiste, portanto, ao nível das administrações e também das escolas, à necessidade crescente de estas realidades aderirem à ideia de uma abertura social, que apela para relações com outras instâncias e para uma nova etapa que passa pelo (re)investimento educativo ou pedagogismo social (Charlot, 1997).

2. Regionalização político-administrativa em Portugal no pós-25 de abril Uma das características mais inovadoras da Constituição de 1976, aprovada a 2 de abril, por não ter paralelo na história jurídica e constitucional de Portugal, é o facto de ter instaurado uma democracia de cariz descentralizado, particularmente em termos de descentralização do território do país (Machado, 1982). Efetivamente, a Constituição de 1976 proclama entre os princípios fundamentais inovatórios o da autonomia, o das autarquias locais e o da descentralização democrática da Administração Pública e erige os Açores e a Madeira em Regiões dotadas de estatutos político-administrativos próprios. Não obstante, o Estado Português continua a ser unitário, apesar de ser também descentralizado. Como fundamento para esta realidade são de referir as características geográficas, económicas, sociais, culturais e históricas; como finalidades: a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico e social, a promoção e defesa dos interesses regionais, o reforço da unidade nacional e os laços de solidariedade entre todos os portugueses. Assim, e ao consagrar-se essa descentralização, estabelece-se como princípio, também ele constitucional, a Autonomia Regional(Miranda, 1997).

3. Autonomia Regional da Madeira Não será possível abordar a questão das políticas de descentralização da educação em Portugal, no pós-25 de abril, e também, por maioria de razão, na Madeira, desiderato que nos propusemos, sem antes fazer uma referência à problemática da autonomia. Entendemos que deverá ser neste campo restrito que se joga a concretização, a materialização dos diversos modelos teóricos propostos pelos investigadores. Assim, os princípios filosóficos subjacentes à conceção global do sistema educativo português, naquilo que na nossa área de investigação mais nos interessa analisar, têm oscilado entre duas correntes principais ' como refere Barroso (1998), uma mais normativista e outra mais construtivista. Estas conceções alicerçam-se, como seria óbvio, em quadros teóricos assentes em pressupostos ideológicos diferentes.

Ora, o processo de autonomia desenvolve-se, no nosso país, após a queda do regime, em abril de 1974, quando os seus reflexos incidem na política educativa nacional, essencialmente ao longo da segunda metade da década dos anos 80 do século passado. Assim sendo, surgem no Estado centralizado processos de desconcentração administrativa que, por vezes, são confundidos com medidas de carácter descentralizador. Neste sentido, verifica-se que Portugal acompanhou a tendência para aplicar algumas políticas educativas que emergem nas reformas da administração educacional nos anos 80 em alguns países europeus (Charlot, 1995). Por sua vez, o sistema educativo português é marcado por uma profunda necessidade de mudança, em que a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) é considerada o ponto central deste processo.

- Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei 46/86, de 14 de outubro) Promulgada a Constituição da República Portuguesa de 1976, competia à Assembleia da República legislar, tratando-se mesmo de matéria que, por força do Art.º 164º [alínea d): "Bases do Sistema de Ensino" ' hoje alínea i), resultado das revisões da Constituição de 1982, 1989, 1997 e 2004] da Constituição da República, constituía reserva absoluta da sua competência.

Decorrida uma década onde a emergência deste imperativo constitucional era por demais evidente, dada a ausência de um referencial, tal vem a ocorrer pela Lei 46/862, que aprova a Lei de Bases do Sistema Educativo de Portugal (LBSE) ' alterada pela Lei 115/97 (19 de setembro), que alterou os artigos 12º, 13º, 31º e 33º, e Lei 49/2005 (30 de agosto), que alterou os artigos 11º, 12º, 13º, 31º e 59º e aditou os artigos 13º-A, 13º-B e 13º-C e que veio republicar e renumerar todo este diploma legal. É também a partir desta Lei que emerge a ligação da escola à comunidade educativa, o novo paradigma de administração e gestão das escolas e a reforma curricular (Formosinho & Machado, 2000) e, deste modo, concretizam-se medidas tendentes a descentralizar decisões, que permitam favorecer a emergência de parceiros fortes e autónomos nas periferias (Canário, 1998).

De resto, a partir da década de 1980, em Portugal, adquire centralidade o início do processo de recomposição do papel do Estado, que vem acusar a crise do compromisso keynesiano, que sustentou as políticas públicas assentes num modelo de Estado intervencionista. No setor da Educação, este enquadramento veio a manifestar-se na crise daquele modelo burocrático e centralizador, de um "Estado educador", caracterizado por "políticas tradicionais baseadas no envolvimento directo do Estado na provisão do serviço público de educação, através de abundante produção normativa, centrada na provisão e controlo de recursos e procedimentos" (Afonso, 2003, p. 53).

Em Portugal, aliás, esta dimensão acaba associando-se também a uma desconcentração territorial nos finais da década 1980, com incidência na década de 1990, surgindo um modo de regulação institucional relativo ao setor do Ensino não Superior, que viria a ser designado em vários diplomas legais como de "política de reforço da autonomia das escolas" (Preâmbulo do Decreto-Lei 43/89, de 3 de fevereiro). Este modo é gerado no âmbito de uma reforma da administração e gestão das escolas e do sistema educativo e apontava para o reforço da escola enquanto espaço de decisão. Autores como Nóvoa (2005) fazem mesmo corresponder a estes anos das décadas de 80 e 90 do século passado o esforço de construção de uma pedagogia centrada na escola-organização, com uma importância acrescida de metodologias ligadas ao domínio organizacional (gestão, auditoria, avaliação) e de políticas de investigação mais próximas dos processos de mudança nas escolas (investigação-ação e investigação-formação).

Regressemos à Lei de Bases e ao enquadramento que diz respeito à distribuição de competências entre os diferentes níveis da administração ' no entender de Fernandes (1988), seguramente um dos ‘capítulos' mais inovadores, se não o mais inovador, da LBSE (p. 105), sendo, além disso, um dos temas centrais que são desenvolvidos ao longo do seu articulado. É que, enquanto antes (com realce para a reforma de 1973 conduzida por Veiga Simão, por lhe ter sido anterior e aquela que tinha no seu objetivo ser também claramente vanguardista) a democratização era entendida como o reforço na distribuição dos recursos educativos (mais escolas, mais professores, acesso mais alargado em termos de apoios socioeconómicos), mas omissa na alocação do poder entre os diferentes órgãos da Administração Escolar, na LBSE (a distribuição de recursos que vem, aliás, a ser substancialmente alargada) a democraticidade é agora entendida como uma distribuição do poder nas decisões educativas, através da descentralização dos órgãos.

A nível do que se menciona é, assim, sintomático o previsto no Art.º , 3, da LBSE, onde se afirma a existência, no sistema educativo, de uma pluralidade de centros de decisão independentes entre si e com poderes próprios (Fernandes, 1988). Ademais, e tendo presente a descentralização territorial enquanto princípio fundamental que a LBSE tende a invocar, o policentrismo das decisões é levado até aos limites compatíveis com a unidade da orientação de política global do sistema educativo. Neste sentido, a LBSE considera como níveis de descentralização os níveis estabelecidos na própria Constituição da República: Administração Central, Regional Autónoma, Regional e Local (Art.º 43° da LBSE).

Assim, e em termos da sua estrutura nesta dimensão, a LBSE define dois níveis de administração: o central e o regional (Art.º 44º), para além da administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino (Art.º 45º) ' mas este, porém, claramente subordinado aos anteriores e às suas respetivas funções. À Administração Central caberão funções de "concepção, planeamento e definição normativa", de "coordenação global e avaliação da execução das medidas da política educativa", de "inspecção e tutela", de "definição de critérios gerais de implantação da rede escolar" e de "garantia da qualidade", ou seja, as funções mais relevantes, mas também as mais típicas, de uma modalidade centralizada de administração da educação. À Administração Regional, através de cada um dos departamentos regionais de educação, a criar em cada Região, caberiam funções de integração, coordenação e acompanhamento da atividade educativa. A descentralização aparentemente instituída seria, assim, no sentido da Administração Central para a Administração Regional, de tal forma que Fernandes (1988) considera: "O nível administrativo regional é o principal beneficiário da descentralização consignada na LBSE, devendo considerar-se o 'nível normal de administração' da educação" (p. 111).

Ora, remanesce, todavia, uma tomada de posição concreta sobre a efetiva dimensão que a Administração Regional (leia-se agora das Regiões Autónomas) deve assumir ' realidade que, como tentaremos evidenciar a seguir, acabou por se desenrolar fundamentalmente por impulsos e sob condução direta dos órgãos e dos agentes da própria Administração Educativa, ancorados em legislação regional e habilitados por um diploma nacional de transferência de competências (Decreto-Lei 364/79). Aliás, é sintomático o facto de a própria LBSE dispor que: "Enquanto não forem criadas as regiões administrativas, as competências e o âmbito geográfico dos departamentos regionais de educação referidos no n.º 2 do Art.º 44º serão definidos por decreto-lei, a publicar no prazo de um ano" (Art.º 62º, 4 ' com a republicação da LBSE [por força da Lei 49/2005, de 30 de agosto]: Art.º 65, 4). Nada mais se refere a este respeito, o que coloca claramente a convicção de que o legislador entende a dimensão da regionalização do país como pressuposto para atender a esta realidade, ‘esquecendo' que esta se encontrava institucionalizada no texto constitucional para a Madeira e os Açores.

O passo fundamental, na Madeira, em termos de construção regional, correspondeu à aprovação do Estatuto político-administrativo provisório, o Decreto-Lei 318-D/76, de 30 de abril, logo de seguida alterado pelo Decreto-Lei 427-F/ 76, de 1 de junho. Fundamentalmente, tratou-se de consagrar a autonomia político-administrativa evidenciada na Constituição, através de órgãos de governo próprio, no sentido em que estes prosseguissem a realização do interesse público na Madeira, sem prejuízo de se manter a integridade da soberania do Estado Português: Art.º 2.º - 1. A autonomia político-administrativa da Região Autónoma da Madeira não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição e do presente Estatuto. 2. A autonomia da Região da Madeira visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico- social e a promoção e defesa dos interesses regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses (Decreto-Lei 318-D/76).

O conteúdo da autonomia regional veio, consequentemente, a caracterizar-se pela existência de várias atribuições de natureza política, legislativa e administrativa, ou seja, apenas se encontram excluídas (atento o conjunto das funções do Estado) a função constituinte e a jurisdicional (Ferreira, 1980). A autonomia regional consiste, pois, não apenas na existência de um conjunto de poderes, mas, sobretudo, no exercício desses poderes e direitos por órgãos democraticamente legitimados pelos cidadãos das Regiões, ou seja, as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e os Governos Regionais. Pode mesmo concluir-se que os elementos característicos do Estado Regional estão presentes na Constituição, ainda que não se tendo optado por uma regionalização política integral do país, que entenderam os constituintes de 1976 ser este modelo aplicável apenas aos arquipélagos dos Açores e da Madeira, em função dos condicionalismos geográficos, económicos e sociais e das históricas aspirações autonomistas das populações insulares. E isto é a primeira vez, na história portuguesa, em que o Estado ' Poder Central ' confere faculdades substancialmente políticas a órgãos locais, com titulares eleitos pelas respetivas populações (Miranda, 1982).

O marco jurídico fundamental a dever ser assinalado em todo este processo de construção regional da área da educação é, sem dúvida, o mencionado Decreto- Lei 364/79, de 4 de setembro. Trata-se de um diploma do Governo da República, aprovado em Conselho de Ministros de 25 de julho, promulgado pelo Presidente da República a 8 de agosto e publicado no Diário da República a 4 de setembro. Com este normativo dá-se início por forma legislativa à transferência de competências nas áreas da Educação e da Investigação Científica do Estado para a Região Autónoma da Madeira: A concretização desta autonomia nos domínios da educação e investigação científica impõe que se efectue a transferência dos serviços periféricos do respectivo Ministério e claramente se definam as atribuições que nestas matérias pertençam à esfera da autonomia regional e aquelas que se reservam ao Governo da República (preâmbulo do Decreto-Lei 364/79).

Uma leitura atenta ao seu conteúdo deixa ressaltar que ficam praticamente separadas as funções legislativa e executiva e, destas, fica em exclusivo na tutela do Estado, através do Ministério da tutela, o impulso relativamente à primeira daquelas funções, não obstante poder caber às Regiões, no exclusivo limite da Constituição, o recurso também à via legislativa (cf. Miranda, 2005, p. 203). Uma análise detalhada e atenta ao conteúdo do Decreto-Lei 364/79 faz destacar, no entanto, a existência de uma falta de coerência nas matérias reguladas e até a forma como é realizada a abordagem sistemática destas ' desiderato, aliás, que acaba por se traduzir no modelo de construção do próprio Decreto. Isto afigura-se determinante na forma como são elencadas e abordadas as matérias, na sua inter e intrarrelação, o que dificulta a ação do intérprete. Tanto assim é que são usadas, neste Decreto-Lei, de forma pouco precisa, expressões que pretendem conduzir a uma mesma ‘conceptologia', de reservar para o Estado atribuições que se enquadrem na função legislativa ("A definição por via legislativa: ", Art.º , 1) e na medida em que lhe digam respeito (aquilo a que se refere no Art.º ), e que decorrem da garantia de aplicação dos princípios gerais do Sistema Nacional de Educação (hoje, pela Lei de Bases do Ensino: o Sistema Educativo), havendo mesmo a necessidade, reforçando esta intenção, de reiterar, a este propósito, todo um elenco de matérias que são inventariadas no diploma de forma expressa, no Art.º . A título de exemplo refira-se: regime [Art.º , 1. a)]; estatutos [Art.º , 1.

b) e f)]; princípios gerais [Art.º , 1. e)]; certas normas a observar a nível nacional [Art.º , 1. g)]; e definição de planos, programas e orientações [Art.º , 2. a), b) e 3.]. Noutro pólo, às competências dos órgãos de Governo próprio da Madeira ficam cometidas as atribuições de: garantir [Art.º , 1.

a)]; proporcionar [Art.º , 1. c) e d)]; apoiar [Art.ºs , 1. e), j) e 11º b)]; organizar [Art.º , 1. d)]; coordenar [Art.º , 1. e)], para dar também alguns exemplos que ilustram a intenção do legislador de utilizar expressões em natureza de tempo verbal, ação típica da função executiva: "superintender na organização administrativa e funcionamento", como a prevista no Art.º , 1.

f), confrontado com o Art.º , 1. a) a d) ' o que reforça o nosso entendimento relativamente ao facto de se estar perante o Poder Executivo cometido à Região, isto é, o poder de executar as medidas de âmbito nacional.

4. Momentos da governação regional na Madeira na área da Educação Uma análise macro parece identificar, nestes mais de 35 anos de autonomia regional na Educação, duas visões distintas, ainda que complementares, no tempo da Educação e do seu papel na sociedade madeirense, a que vêm correspondendo duas visões também elas políticas e de tempo político.

Um primeiro momento corresponde ao período de criação das instituições regionais e ao assumir das competências, consequência do processo de regionalização da Educação que se iniciou em 1976 e vai seguramente até ao fim do III Governo Regional (1980-1984). Aqui, toda a orientação de política educativa está vocacionada para uma visão socializante e igualitária da Educação. As medidas tomadas privilegiam as relações com a Cultura e desenvolvem o Desporto, como vias de formação integral, que podem dar enquadramento à referida visão socializadora da Educação: " através da Educação, isto é, do desenvolvimento harmónico e integral das potencialidades individuais postas consciente e voluntariamente ao serviço da comunidade serão possíveis o progresso e bem-estar sociais" (Programa do I Governo Regional - 1976-1980, p. 67); "( ) o primado da nossa acção político-governativa é a preocupação com as classes mais desfavorecidas. O objectivo é a socialização, mas sem dogmas ( )" (Programa do III Governo Regional - 1980-1984, p. 5). É nesta época que se recorre a uma ‘figura' designada na altura como "Educação Permanente" (Cap. 10.7.1 do Programa do I Governo Regional - 1976-1980, p. 70).

Através desta prestam-se conhecimentos complementares, em função dos interesses dos indivíduos, com destaque para a escolarização da população, seja a nível da escolaridade obrigatória (alfabetização) ' assim designada no Cap. 10.7.2 do Programa do I Governo Regional - 1976-1980 (p. 70) ', seja a nível da obtenção de outros graus escolares. Este propósito viria, aliás, a seguir várias medidas de reforço às orientações definidas, quer pela mobilização de recursos internos ou admitindo a possibilidade de apoios externos, quer ainda através de programas articulados com a subárea da Cultura através da criação de bibliotecas escolares. Neste contexto de mobilização interna, são sintomáticos os esforços ao nível da criação de condições favoráveis ao funcionamento de novos cursos (Ano Propedêutico, inscrito no Decreto-Lei 364/79, Art.º , 2, e Decreto Regulamentar Regional 6/79M, Art.º 37º) ou a criação de cursos intensivos para complemento de habilitações, ou, ainda, uma campanha de alfabetização de adultos, admitindo-se a possibilidade de apoio da UNESCO (Programa do I Governo Regional, 1976-1980, p. 69) e o contacto com a experiência mexicana (SREC, 1978, pp. 20-29).

Um segundo momento, a que corresponderá uma nova visão, é aquele onde, volvida uma época de afirmação, se iniciam os tempos de consolidação das instituições.

É também um momento do consequente abandono da matriz nacional e do assumir em pleno daquilo que se poderá considerar uma identidade de cariz regional. Esta realidade, que se vai construindo, coincide com o advento dos anos seguintes a 1980, fundamentalmente tendo no seu arranque o IV Governo Regional (1984-1988).

Este assume, aliás, como seu propósito nesta área, materializado depois na sua ação e visão das políticas educativas, a transição para uma outra missão da Educação, ao privilegiar mesmo outras modalidades educativas e subáreas como: a Formação Profissional, a Educação Especial, a Infância, a Juventude e o Emprego. Este é o momento, também, onde assumem destaque as iniciativas de carácter legislativo ancoradas em opções de política educativa regional com forte afirmação numa matriz regional, como nos casos: da criação da Universidade da Madeira (Decreto-Lei 319-A/88, de 13 de setembro); do Modelo de autonomia, administração e gestão das escolas da Madeira (Decreto Legislativo Regional 4/2000/M, de 31 de janeiro, alterado pelo Decreto Legislativo Regional 21/2006/M, de 21 de junho); do Estatuto das creches e estabelecimentos de infância e pré-escolar da Madeira (Decreto Legislativo Regional 25/94/M, de 19 de setembro, revogado pelo Decreto Legislativo Regional 16/2006/M, de 2 de maio); e do Estatuto da carreira docente da Madeira (Decreto Legislativo Regional 6/2008/M, de 25 de fevereiro, alterado pelo Decreto Legislativo Regional 17/2010/M, de 18 de agosto).

Relativamente à Universidade da Madeira, deve considerar-se que desde muito cedo se inscreveu esta realidade nas opções dos Governos regionais e foi vista por estes como detendo um papel estratégico no sentido do desenvolvimento regional do arquipélago através da capacitação de quadros superiores, fundamentalmente educadores e professores dos Ensinos Básico e Secundário. De resto, em matéria de Ensino Superior, deve dizer-se que, nos anos subsequentes à regionalização, os decisores políticos tinham em mente esta opção, aquando do impulso para a criação, na Madeira, do Instituto Universitário da Madeira (criado pelo Decreto-Lei 664/76, de 4 de agosto) e, depois, da Escola Superior de Educação da Madeira (criada pelo Decreto-Lei 395/82, de 21 de setembro), efetivas géneses da Universidade da Madeira (que, de resto, os virá a absorver) e que, certamente, o poder governativo regional não quereria perder de vista, garantindo a sua real consagração, como foi feito, com a criação da Universidade pelo Decreto-Lei 319-A/88.

No que concerne ao regime de autonomia, administração e gestão das escolas, deve dizer-se que este se encontra consubstanciado, na Madeira, num modelo próprio, em finais dos anos 90. Surge, também aqui, associado a uma vontade de afirmar, na Região, as competências da Madeira na área da Educação e, simultaneamente, implementar um Modelo regional, que, não escondendo a sua referência ao Modelo do Estado, fosse, no entanto, diferente e adequado à realidade insular. A este respeito, são esclarecedoras as palavras usadas pela Assembleia Legislativa da Madeira, aquando da sua audição pelo Tribunal Constitucional, face ao pedido de fiscalização que este Decreto viria a merecer: Porém a Assembleia Legislativa Regional da Região Autónoma da Madeira entendeu poder manifestar, conforme resulta da sua resposta, uma opção própria e autónoma de legislar, sempre no respeito pelos "grandes princípios que enformam o quadro normativo português na área do Sistema Educativo", fora do espartilho legal do Decreto-Lei 115-A/98, e tendo apenas como referência ' para além da Constituição e do Estatuto Político-administrativo ' a Lei 46/86 e o Decreto-Lei 364/79, que procedeu à transferência dos serviços periféricos ( ) (Acórdão 161/2003 - Processo 64/2000 do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República, I Série-A, 104, de 6 de maio de 2003, p.

2929).

Não obstante, deve dizer-se que este será, dos casos mencionados, aquele onde a dialética entre a legislação nacional e, sobretudo, as interpretações que esta mereceu face ao enquadramento normativo regional, mais se fez sentir, designadamente chegando a ter de se dirimir a contenda no Tribunal Constitucional. É que, por intervenção do, ao tempo, Ministro da República (hoje Representante da República, mercê da revisão constitucional entretanto operada, em 2004), o Decreto Legislativo Regional que aprovou o Modelo regionalde autonomia, administração e gestão foi sujeito a um pedido de fiscalização da sua constitucionalidade, tendo afinal este Tribunal decidido pela desconformidade de algumas das suas normas.

Mas, e na essência, se excetuarmos da versão inicial do Modelo (Decreto Legislativo Regional 4/2000/M) a forma de escolha da Direção das escolas (aqui assente em provas de mérito, constituindo, de resto, um efetivo recrutamento), a realidade dos Agrupamentos de Escolas, dos Contratos de Autonomia e o âmbito de aplicação do Modelo, tudo características fundamentais do Modelo do Estado, na Madeira não tiveram convictamente semelhante parametrização3 ' o que, associado a realidades como aquelas existentes nesta Região ao nível dos Quadros jurídicos de pessoal docente que existem por escola e por zona pedagógica (contrariamente ao continente, por Agrupamento), a permitir-se que, para o desempenho das funções de direção escolar releve não apenas a qualificação académica específica, como também, e em igualdade, o anterior desempenho destas funções por um mandato diretivo completo, confluem no sentido de também aqui existir, de facto, uma dimensão matricial regional própria, onde se associa ao enquadramento legislativo da área uma aplicação através de uma política governativa regional adequada, o que faz com que se tenha vindo a desenrolar desde o ano de 2000, na Madeira, um esquema organizacional das escolas assente num Modelo funcional próprio e distinto do restante espaço nacional.

Outra das matérias onde o sentido de afirmação governativa regional é paradigmático é o subsetor da infância. Trata-se de uma matéria acolhida no IV Governo (1984-1988) e para a qual a orgânica consequente (Decreto Regulamentar Regional 12/88/M, de 26 de abril) veio dar resposta, criando os serviços respetivos, colocados pela primeira vez sob a alçada da Secretaria Regional de Educação4. Aqui, o sinal é claramente inovador, no sentido em que integra na área educativa uma realidade própria da Segurança Social, fazendo- o conscientemente, na ótica em que, assim sendo, se permitirá responder às necessidades da população da Madeira e, com isto, se realiza um desígnio da Educação de responder ao desenvolvimento pleno e integral da pessoa humana.

Deve aditar-se que esta área se viria a manter na Secretaria Regional de Educação, na qual se integra desde essa altura, merecendo um enquadramento que passaria de mera resposta inicial a necessidade ' que, no momento, foi entendida ser, politicamente, melhor respondida pelo setor educativo, para revestir, depois, e até à atualidade, um tratamento continuado e sustentado, como atesta o facto de estar hoje regulado por um Estatuto próprio (Decreto Legislativo Regional 16/2006/M), que faz convergir os estabelecimentos caracterizados como Creches e, consequentemente, da primeira infância (dos 3 aos 35 meses) (Art.º do Decreto Legislativo Regional 16/2006/M), com os estabelecimentos da Educação Pré-escolar, numa resposta global e conjunta das duas áreas (primeira e segunda infâncias), oriundas de setores sociais diferentes ou, pelo menos, complementares5.

Uma das áreas assinaladas como relevantes, também na dimensão regional, que caracterizámos antes, é a da carreira docente. Aqui, segue-se um caminho próprio de afastamento da legislação nacional e prossegue-se uma clara intenção, ancorada na convicção de que "o Estatuto da Carreira Docente da Região Autónoma da Madeira surge como um marco importante e uma questão central, por um lado, do desenvolvimento e aprofundamento da autonomia e, por outro, da valorização da função de professor" (preâmbulo do Decreto Legislativo Regional 6/2008/M), não perdendo simultaneamente de vista uma lógica que garante a intercomunicabilidade de carreiras entre os docentes em todo o espaço nacional. Ademais, esta opção é, em parte, também, motivada porque o próprio Estatuto de carreira nacional (ao tempo, o Decreto Lei 15/2007, de 30 de setembro) se assume como circunscrito ao espaço continental e porque este introduz, naquilo que era uma ‘conquista' da profissão docente desde inícios dos anos de 1990 (com o Decreto Lei 139-A/90), a carreira única desenvolvida de forma horizontal em 10 escalões ' realidade considerada "património da profissão" que, assim, se descaracterizaria, ao passar a ficar sujeita a prova de ingresso na carreira, com duas categorias de professores (professor e professor titular), de acesso mediante provas públicas e com avaliação específica e sem bonificações no tempo de serviço, detendo as categorias conteúdos funcionais específicos e sujeitando mesmo o acesso à "categoria superior" (o preâmbulo do Decreto-Lei 15/2007 utiliza mesmo esta designação) a quotas. Em face do modelo continental descrito, a Madeira ensaiou um regime próprio, mediante a criação de um Estatuto de carreira docente regional (aprovado pelo Decreto Legislativo Regional 6/2008/M, de 25 de fevereiro, alterado pelos Decretos Legislativos Regionais nºs 17/2010/M e 20/2012/M, de 18 de agosto e 29 de agosto, respetivamente), que contemplou, fundamentalmente, a manutenção de uma carreira única horizontal, sem quotas, com 8 escalões, não sujeita a prova de ingresso e com bonificações no tempo de serviço docente pela obtenção, pelo docente, de qualificações académicas superiores.

A análise a exercer sobre este segundo momento deve conduzir, assim, no sentido de entender que a organização e sistematização das políticas educativas se encontra na conjugação das políticas do Ensino, da Formação Profissional e do Emprego, para corresponder a uma visão de pendor ' dir-se-ia ' mais pragmático e imediato, colocando a Educação ao serviço do interesse regional, e, embora se mantenha alguma função socializadora (paradigma do momento anterior!), uma outra função (a da capacitação profissional) ganha agora maior importância.

Acredita-se que a mudança social é feita a partir do Trabalho como fonte de rendimento e critério de vida, e por isso o Governo a perspetiva numa política integrada com a Juventude: "XVI - Política para a Juventude, 1. Princípio Orientador, Prossecução de uma política que tenha por principal objectivo a formação da Juventude e satisfação dos seus anseios, dando real expressão económica, cultural e social ao conceito de Política Global e Integrada de Juventude ( )" (Programa do V Governo Regional - 1988-1992, p. 78). Ou seja, a importância que é atribuída à Formação Profissional e à inclusão do Emprego inscrevem-se na estratégia política de articular várias valências para dinamizar mecanismos de coordenação intersetorial indispensáveis ao prosseguimento de uma política globalizante de Juventude.

Mas a reinterpretação do conceito de Educação merece, porém, um sentido evolutivo nos Governos Regionais seguintes, sendo que é no VIII Governo Regional (2000-2004), que coincide com o dealbar deste século XXI ' momento onde se ensaia uma nova abertura do conceito para áreas mais abrangentes de toda a mundivivência e da globalização social6, com a previsão das Novas Tecnologias e as Comunicações: "Temos de prosseguir, sempre em mudança. Atentos aos novos sinais que despontam na sociedade, bem como aos efeitos das novas tecnologias, cada vez mais rápidos. Prosseguir é alterar comportamentos e definir novos objectivos, num mundo que é diferente cada dia que passa" (Programa do VIII Governo Regional - 2000-2004, pp. 7-8) ', que haverá, parece- nos, um alargamento do conceito de Educação, tal como ‘descrito' antes, que o remete para uma dimensão estratégica de futuro, onde a sua ligação à Ciência e à Formação (traduzidas agora na Inovação) aparecem como determinantes em termos de qualificação da população da Madeira e de afirmação regional ' "Será a Inovação a mola para o novo ciclo de Desenvolvimento Sustentável da Região" (Programa do IX Governo Regional - 2004-2007, p. 6) ', sem perder, no entanto, toda a atualidade ao colocar-se, ainda, a modalidade educativa da Educação Especial, mediante uma dimensão inclusiva que transpõe o universo escolar e lhe um sinal de continuidade às realidades que atende (designadamente, aos adultos portadores de deficiência: a Reabilitação), mas também a modalidade da Formação Profissional, conferindo-lhe uma dimensão de Qualificação, em vez de Formação [substitui-se mesmo o vocábulo que designa a Direção Regional desta área, que passa a chamar-se Direção Regional de Qualificação Profissional em vez de Formação Profissional ' Decreto Regulamentar Regional 1/2000/M, de 17 de janeiro, Art.º , 1, alínea d)], havendo igualmente aqui um sinal de atualidade, que encara esta área como indo para além do sentido formativo stricto sensu e integrando uma dimensão de certificação profissional e de reconhecimento de competências, à luz das novas realidades europeias: A qualificação profissional, entendida num sentido lato de formação ao longo da vida, integrando a formação inicial e toda a valorização subsequente, a par da nova filosofia de qualificação nascida dos Centros de Novas Oportunidades, que reconhecem e valorizam, profissional e academicamente, as competências adquiridas pelos adultos activos, fruto da sua experiência de vida, constituem um dos objectivos fundamentais da estratégia do Governo Regional para este sector ( ) (Programa do X Governo Regional - 2007-2011, p. 113).

Acresce mesmo que este segundo momento de visão integrada da Educação, para além das funções mencionadas antes, transporta ainda uma perspetiva funcionalista da Educação como um corpus complexo, ao mesmo tempo unitário e compreensivo, onde é possível traduzir uma pluralidade de políticas que devem manter entre si estreita coesão e articulação, para atender, também ela, a uma complexa realidade sociológica da Madeira. Ora, esta visão, assim delineada, acaba rompendo com a ideia clássica das políticas educativas puras, centradas na Educação como área principal, uma vez que esta surge na sua formulação de ação e governação políticas, em igualdade de tratamento com outras modalidades ou subáreas como a Educação Especial, Qualificação Profissional, Emprego, Juventude, Novas Tecnologiase Comunicações.

Pode, assim, considerar-se, portanto, que os primeiros Governos Regionais definem o desenvolvimento e a socialização como eixos estruturantes da autonomia da Madeira ' "Na formação do governo (...) duas preocupações foram dominantes. Uma, a de encontrar garantias de eficiência dirigente e de coerência política, no sentido de ser concretizado o programa com que nos apresentamos no último congresso regional do PSD: Autonomia, desenvolvimento, socialização" (Programa do II Governo Regional - 1980-1984, p. 3) ', se bem que a socialização se constitua, também, em condição do desenvolvimento7, quer quando referida ao sistema económico de matriz social-democrata (fundadora dos Governos Regionais da Madeira desde 1976 até ao presente, atendendo a que o Partido Social Democrata da Madeira ganhou sempre as eleições realizadas na Região Autónoma da Madeira desde aquela data), quer quando invocada como processo de integração social das classes desfavorecidas e, consequentemente, como meio de promoção da dignidade e da justiça social. Poder-se-á afirmar mesmo que a definição das matérias educativas, na sua concretização e materialidade, se vai fazendo num processo de busca da fórmula adequada à realidade própria da Região Autónoma e às suas necessidades, fazendo com que cada Governo Regional encare determinado momento como devendo atender a determinadas especificidades e enfatizando, assim, na sua organização, determinadas modalidades8, aglutinando consequentemente algumas subáreas da governação e destacando outras9. Pode, pois, afirmar-se que todo este processo tem uma decorrência assente numa aprendizagem social por parte dos Governos Regionais, os quais, e em início de cada mandato, encaram a área da Educação em função daquilo que corresponderá ao sentido social e às necessidades educativas da Madeira. Mais, a perceção a extrair dos programas dos Governos Regionais confirma a interpretação que indiciámos antes, na medida em que revela uma evolução na formulação das políticas adquiridas, com a experiência governativa.

Concluir-se-á, então, que o conceito de Educação, na Madeira é, também ele, um pouco à semelhança da autonomia regional, um conceito dinâmico e evolutivo ' "A Autonomia tem de ser encarada como um processo em permanente evolução. Ela deve possibilitar que, cada vez mais, os problemas de uma comunidade sejam resolvidos pelos respectivos órgãos de governo próprio" (SREC, 1978, p. 34) ', quer quanto à perspetiva de orientação e definição das políticas, quer no que se refere à própria organização política do Departamento do Governo Regional da Madeira com a área de tutela da Educação (Secretaria Regional de Educação). De resto, as reestruturações que a Secretaria Regional de Educação atravessou refletem a evolução do pensamento político dos Governos Regionais sobre a missão da Educação na Madeira. É por isto que se poderá concluir que a evolução morfológica relativa à composição e articulação de diferentes áreas de intervenção da Secretaria Regional foi realizada num contínuo processo de aprendizagem social, por etapas de experiência acumulada na administração e gestão do sistema educativo regional ' se calhar, melhor seria chamar-se subsistema regional de educação, como defendido em Alves (2011, 2012) ', gradualmente percorrido e a cada momento visando atingir um modelo de intervenção política adequado às necessidades específicas do desenvolvimento e da modernização do setor educativo na Madeira. De resto, esta articulação de valências tão diferenciadas sob a mesma tutela, embora possa suscitar dificuldades de execução, é, no entender dos Governos Regionais que as promoveram, desejável, pela dimensão do universo regional: O alargamento permanente da eficácia das medidas que, nas áreas do Ensino, da Educação Especial, da Formação Profissional, do Emprego, do Desporto e noutras, têm por destinatários os jovens, bem como a implantação de mecanismos que garantam a articulação e coerência das políticas sectoriais (Programa do V Governo Regional - 1988-1992, p. 82).

Mais: estas mudanças têm surgido, no contexto da Região Autónoma da Madeira, como fruto de uma aprendizagem socialfeita pelos agentes políticos, que, a cada momento e no contexto da resposta que tem de ser encontrada, organizam as estruturas governativas para, de forma imediata e pragmática, encontrar as melhores soluções, desenvolvendo aquilo que configurará uma política de ação tipicamente decisional, gradualista e personalizada, feita por ‘impulsos' ao nível das políticas dos Governos Regionais e dos responsáveis pela área da Educação, que, partindo do quadro da política educativa nacional, tem buscado sempre traçar uma estratégia própria de resposta aos desafios colocados pela sociedade. Esta descrição poderá ser uma forma típica de exercer a política, como a descreveu Dror (1993). Isto é, aplicar as políticas nacionais educativas, mas traçando, na sua implementação, uma estratégia para trilhar um percurso próprio.

Acresce que este caminho percorrido acompanha a autonomia regional que se vai construindo, também ela, em moldes semelhantes aos descritos, conduzindo à definição de um perfil próprio na execução das políticas de natureza educativa na Região Autónoma da Madeira. Este crescimento, e depois desenvolvimento, resulta fundamentalmente de duas ideias-chave: primeiro, uma lógica de crescimento para acompanhar aquilo que o sistema modelar do Estado concebe para a Educação e, depois, uma ‘filosofia' de inovação e desenvolvimento, para adaptar aquele sistema modelar à realidade social e às especificidades regionais. De facto, embora se assista a uma continuidade das regras nacionais, registam-se ruturas a nível das práticas e na forma de as colocar no terreno, o que acaba por conduzir a uma administração autónoma que resulta, por um lado, no corte relativamente à cadeia hierárquica do Estado (consequência da autonomia política e administrativa que a Região da Madeira goza) e, por outro, mais construtivamente falando, criando as condições necessárias a conceber e implementar as soluções mais adequadas às necessidades, às expectativas e aos recursos regionais da população madeirense. Simultaneamente, associa-se a estes desideratos estruturais também o perfil de liderança dos processos e da forma próxima de atender aos anseios das populações, ao conhecimento do meio e da sociedade madeirense, além de uma prática de diálogo permanente, que levam a que as soluções sejam apresentadas numa partilha e num envolvimento entre quem governa e quem é governado.

5. Horizontes futuros para a governação educativa na Madeira Anteriormente expusemos a nossa visão de que a evolução da Educação, na Madeira, no período após a regionalização, se foi conseguindo por patamares.

Cada um destes passos corresponde a um tempo político próprio e às respostas que, nesse mesmo momento, urge atender, sempre dentro de uma forte ligação às necessidades sociais do momento, e também, diga-se, a uma experiência governativa que se vai acumulando naquelas respostas, que dita, também ela, condições que melhor aconselham à interpretação dos interesses regionais, numa relação estreita e intensa ' consequência, como se referiu, da longevidade resultante da maioria de suporte partidário que vem assegurando a estabilidade dos Governos Regionais desde o início da regionalização. Ainda, as evolutivas mudanças e formas de vir enquadrando, no setor da Educação, as subáreas que anteriormente se identificaram, acabam sendo resultado, também, de processos de reorientação e reformulação das políticas educativas para acompanhar o desenvolvimento do projeto, mais vasto, da sociedade madeirense que os Governos Regionais, em cada momento, pretendem renovar e desenvolver, sempre numa perspetiva de abordagem da Educação lato sensu e no plano regional.

Todavia, para esta realidade converge, atualmente, a circunstância de o Estado, enquanto espaço de decisão, começar a ser relativizado por dois fenómenos distintos que reforçam dois espaços de decisão concorrentes, bem como a presença de novos atores. Um espaço supranacional, através do fenómeno geral da globalização de que a União Europeia é a máxima expressão, com a construção de um espaço europeu da Educação (Nóvoa, 2005), e um espaço criado pelas dinâmicas de descentralização e de valorização do regional (Fernandes, 2005), ao que acrescentaríamos o local, fundamentalmente a partir do final da década de 90 do século XX, e sobretudo com a publicação da Lei 159/99, de 14 de setembro10.

Ora, esta formulação, assim crescentemente apresentada, tem vindo, inquestionavelmente, a colocar ‘sob tensão' a Administração Regional e, em decorrência, naturalmente, a Administração Educativa. Os seus efeitos assinalam-se agora naquilo que nos parece corresponder à ‘abertura' de um novo ciclo, donde começa a avultar mais a lógica gestionária do que uma lógica política de (re)destribuição de poderes (Lima, 1995, p. 65). É aqui que se começa a assistir à emergência dos discursos que apelam aos modelos de inspiração e de gestão privadas, particularmente, de cariz empresarial ("importação de lógicas de mercado para os sistemas escolares", segundo Barroso & Viseu, 2003) em detrimento do político. O seu leitmotiv é a luta contra a burocracia, a ineficácia e a ineficiência11.

Melhor caracterizada esta tentativa de mudança de paradigma, podemos considerar que ela tem conduzido à ideia de centralizar (melhor será talvez dizer recentralizar) as decisões políticas e estratégicas e apenas desconcentrar as estruturas operacionais e de coordenação. A ideia de privatização, seja no sentido de um desinvestimento progressivo, seja através de estratégias de concessão, ou mesmo privatização, tout court, tende, assim, a ser apresentada como coincidente com a própria ideia de reforma da Administração Pública, isto é, com a apropriação, por esta, dos modelos de funcionamento típicos do setor empresarial12. Em abono do ‘cenário' que se descreveu, pode constatar-se que este começa a emergir e tem uma ancoragem nas correntes de pensamento que, desde finais dos anos 80 do século passado, começam a impor-se e que, seguramente, as novas organizações internacionais têm vindo a propor como a sua visão para as políticas a seguir pelos diferentes Estados. Assinalem-se aqui as instituições financeiras como o FMI e o Banco Mundial, que acabam fazendo eco daquilo que tem sido a visão dos EUA, mas também das Nações Unidas (que assinalam mesmo aquelas que se consideram como as oito características que devem coexistir para se estar perante uma "Boa Governança" ' vide UNESCAP, 2010) e, mais recentemente, a União Europeia (Nóvoa, 2005). Esta dimensão em crescendo de influência da União Europeia acabará mesmo por nos obrigar a constatar a existência de uma perspetiva que contribui para a ideia de uma erosão gradual da soberania estatal numa série de domínios e de políticas, nomeadamente no campo da Educação e, por consequência, na Administração Educativa. Dir-se-ia mesmo, com Fátima Antunes (2005b), que nas três últimas décadas se procedeu "à lenta gestação do processo de europeização que agora ensaia a maturidade" (p. 130). É que a União Europeia, como se sabe, constitui um sistema político complexo, organizado em níveis distintos, sendo regulada por um sólido aparelho jurídico-legal e outras formas de poder, tanto formais como informais, em que intervêm múltiplos atores13.

Ao pretender compreender as mudanças observadas na regulação da administração dos sistemas educativos nos últimos anos e aquilo que venha a ser a evolução também em termos regionais na Madeira, dever-se-á concluir, pois, não estar perante um contexto único, mas, antes, perante uma sobreposição de contextos em mutação que se inter-relacionam e influenciam e em presença de novos conceitos e diferentes linhas de orientação que, em conjunto, enquadram e influenciam a definição das políticas educativas. Por outro lado, importará considerar esta problemática também no contexto da Teoria Organizacional e da Sociologia das Organizações, para além de uma reflexão pertinente no campo da Ciência Política, onde se analise a evolução das políticas públicas e o caso específico da Administração Educacional. Neste sentido, a evolução da autonomia da Madeira na área da Administração Educativa e, consequentemente, da governação nesta área, dependerá, assim, e se calhar em grande parte, da mobilização e do posicionamento que venham a tomar todos os parceiros educativos com as quais esta tem de ‘conviver'.

A nosso ver, a Administração Educacional Regional terá tudo a ganhar, portanto, com o desenvolvimento de uma regulação autónoma educativa que se traduza no aprofundamento de medidas de política educativa próprias, que se distingam, na sua formulação ou aplicação, das medidas do Estado, sendo resultado do processo de adequação das políticas nacionais à especificidade regional. Este processo faz-se na construção de um projeto educativo regional próprio, que conduza à permanente afirmação de um efetivo subsistema regional educativo, construído à luz do interesse regional e da regulação autónoma educativa, e pode, e se calhar deve, decorrer, assim, na Madeira, de um projeto orientado por valores e interesses específicos da Região, concretizado numa praxis legislativa, de administração e de gestão regionais, de acordo com uma nova visão de desenvolvimento regional. É que os sistemas educativos confrontam-se, hoje, com uma complexidade de problemas com origem no processo de evolução das políticas e na transformação ou manutenção do comportamento das administrações que as suportam, no carácter mutável que caracteriza as sociedades contemporâneas nos aspetos sociais, financeiros, económicos, políticos e culturais e na dificuldade de conceber soluções em contextos de incerteza permanente.

Na essência, pugna-se, portanto, por uma visão regional que promova uma política educativa autonómica própria, que, mais determinada do que a decretar uma reforma, construa os alicerces para uma permanente construção organizacional em contínua articulação entre as diferentes Administrações Educativas, Central, Regional e Local, bem como com as restantes entidades, máxime escolas, não descurando, nestas, os parceiros que as integram e, sobretudo, os atores que diariamente as fazem funcionar.


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