Empenhamento organizacional nos trabalhadores temporários
Introdução
A natureza da relação de trabalho é há muito associada ao empenhamento do
trabalhador para com a empresa (Chambel & Castanheira, 2007). Porém, a
instabilidade do mercado de trabalho levou alguns autores a questionar se o
conceito de empenhamento organizacional continua a ser relevante (Hall &
Mirvis, 1995) e a afirmar que as transformações ocorridas dificultam o
desenvolvimento de níveis de empenhamento elevados nas organizações modernas
(Pratt & Rosa, 2003).
A teoria e pesquisa sobre empenhamento no trabalho estão sobretudo
desenvolvidas na área do empenhamento organizacional. O nosso país não tem
estado alheio a esta tendência, tendo surgido diversos estudos que focam o
empenhamento organizacional (Rego & Souto, 2004a; Rego & Souto, 2004b;
Rego, Leite, Carvalho, Freire, & Vieira, 2004; Rodriguez, Franco, &
Santos, 2006).
O modelo multidimensional de empenhamento organizacional de referência na
literatura é o modelo de três componentes (laço afectivo, normativo e
instrumental) apresentado por Meyer e Allen (1991). Os autores (1997) referem a
possibilidade de os trabalhadores não estarem tão empenhados nos renovados
arranjos organizacionais quanto estavam no passado. Sem prejuízo, reclamam que
o estudo do empenhamento não perde actualidade nem pertinência pois, apesar de
se observarem mudanças significativas na estrutura e configuração das
organizações, estas continuam a existir e a proliferar, tendo nas pessoas que
as constituem a sua principal razão de ser. As entidades empregadoras continuam
a preocupar-se com o empenhamento dos trabalhadores, ainda que os subcontratem
ou os recebam por cedência de empresas terceiras e, paralelamente, a maioria
dos indivíduos sente a necessidade de se empenhar em algo, até porque o
empenhamento em algum projecto, entidade ou pessoa é geralmente visto como uma
virtude (Ashman, 1999). Importante será reconhecer que o empenhamento que se
desenvolve nas condições de emprego contingente poderá ter características
diferentes, designadamente uma duração mais curta, ou estar focado num contrato
ou projecto, em vez de se dirigir para a organização como um todo.
Um dos mais relevantes sinais de flexibilização e contingência no mercado de
trabalho consiste no recurso ao trabalho temporário. Esta forma de trabalho
caracteriza-se pela existência de uma relação tripartida entre um trabalhador
temporário, uma Empresa de Trabalho Temporário (ETT) e um cliente
(Utilizador)2. Assenta em dois contratos autónomos no plano jurídico, mas
interdependentes do ponto de vista funcional. Embora os trabalhadores
temporários trabalhem para uma empresa cliente, eles são contratados e pagos
por uma ETT da qual são empregados, constituindo-se assim como um grupo de
empregados externos.
A procura de trabalho temporário tem vindo a aumentar, tornando imperativo que
os gestores de recursos humanos compreendam as necessidades destes
trabalhadores. Refira-se que este aumento de dimensão do mercado de trabalho
temporário não parece ser explicado de forma significativa pelas preferências
da oferta da força de trabalho (Brewster, Mayne, & Tregaskis, 1997). A
constatação de que o crescimento na utilização de trabalho temporário não foi
despoletado ou desejado pelos trabalhadores tem levantado preocupações sobre o
impacto do emprego temporário nos indivíduos. (De Cuyper et al., 2008). Porém,
pouco tem sido escrito sobre a forma como as organizações deverão gerir os seus
trabalhadores temporários (Feldman, Doerpinghaus, & Tunley, 1994). Para
além de revelar uma assinalável escassez de estudos longitudinais, a
investigação sobre a relação entre o trabalho temporário e o empenhamento
organizacional tem apresentado resultados inconsistentes, inconclusivos e até
contraditórios (De Cuyper et al., 2008).
Em qualquer relação de trabalho, as expectativas mútuas estão definidas
parcialmente pelo contrato de trabalho. No entanto, muitas obrigações e
expectativas críticas são parte de um acordo mais implícito entre as partes, o
contrato psicológico (Chambel & Castanheira, 2007). Os trabalhadores
temporários reconhecem de antemão que o relacionamento com o seu empregador e
com os seus colegas terminará, em princípio, num momento conhecido à data do
início do seu trabalho (Beard & Edwards, 1995). Esta constatação abre
espaço para a criação de um contrato psicológico marcadamente transaccional ou
economicista entre trabalhadores e entidades empregadoras, em contraste com o
emprego mais tradicional baseado nos aspectos relacionais ou sócio-emocionais
da relação laboral (McDonald & Makin, 2000; McLean & Kidder, 1994;
Rousseau, 1995).
Também no que diz respeito à insegurança no emprego, podem observar-se
especificidades decorrentes desta forma de trabalho. Estudos recentes
demonstraram que a insegurança no emprego reduz a satisfação no trabalho e
empenhamento organizacional entre trabalhadores permanentes, enquanto que pouco
acrescenta à explicação das respostas comportamentais dos trabalhadores
temporários (De Cuyper et al., 2008). Os autores avançam que é possível que a
empregabilidade represente uma alternativa à segurança no emprego para os
trabalhadores temporários: cenários de reduzidas taxas de emprego e défices de
qualificação individuais, ao invés de insegurança no trabalho podem, esses sim,
ser problemáticos para os trabalhadores temporários.
A questão do duplo empenhamento dos trabalhadores temporários, ou seja, o seu
compromisso simultâneo com a ETT e com a empresa Utilizadora tem sido abordada
por diversos autores. Alguns dos resultados dessas investigações parecem
apontar para níveis mais elevados de empenhamento com a empresa Utilizadora do
que com a ETT (Benson 1998; Van Breugel, Van Olffen, & Olie, 2005).
É esta particular relação entre os três agentes envolvidos que o torna uma
forma muito específica de trabalho, sendo também o ponto de partida para a
existência de uma tão grande variedade de interpretações acerca da forma como a
precariedade e o nível de contingência desta forma de trabalho podem afectar o
grau de inserção dos trabalhadores temporários na população activa, as suas
formas de manifestação comportamental nas organizações e as suas trajectórias
de emprego ao longo da vida activa.
Estrutura do estudo
Num primeiro momento, clarifica-se o conceito de empenhamento organizacional
analisando a sua natureza no contexto do modelo multidimensional de Meyer e
Allen (1991). São debatidas ainda propostas de variação da
multidimensionalidade e assinalada a importância da consideração de múltiplos
focos de empenhamento.
O cenário de flexibilização do mercado de trabalho e das relações entre
empregadores e empregados serve de mote à caracterização sumária do trabalho
temporário na União Europeia e em Portugal. São ainda apresentados contributos
teóricos produzidos a respeito desta forma de trabalho na conduta
organizacional.
Posteriormente, recorrendo à metodologia de inquérito por questionário, fita-se
a análise do empenhamento organizacional dos trabalhadores temporários face à
ETT e ao Utilizador; a sua inter-relação e o efeito da motivação (in)voluntária
em aderir ao trabalho temporário e da antiguidade no empenhamento
organizacional
Discutidos os resultados e apresentadas as conclusões, são sugeridas
implicações para a pesquisa neste domínio.
Empenhamento organizacional: o estado da arte
Historicamente, a retenção de trabalhadores tem sido um importante objectivo da
gestão de recursos humanos, pelo que o desenvolvimento de empenhamento é
presumivelmente do melhor interesse da organização. As organizações estão a
atravessar mudanças sem precedentes, fruto de alterações demográficas na força
de trabalho, inovações tecnológicas e competitividade global. A incerteza que
as organizações enfrentam torna difícil, se não impossível, garantir um emprego
para toda a vida ' algo que anteriormente estava implícito na relação entre
organizações e colaboradores e que ajudava a fomentar um maior empenhamento por
parte destes (Rousseau & Wade-Benzoni, 1995).
Considerado inicialmente como um constructo unidimensional de naturezas
discrepantes (Iles, Forster, & Tinline, 1996; Meyer & Allen, 1991),
reconhece-se hoje que o empenhamento organizacional pode assumir diferentes
formas (Allen & Meyer, 1990; Meyer, Becker, & Van den Berghe, 2004;
O'Reilly & Chatman, 1986; Rego et al., 2004).
O principal modelo multidimensional de empenhamento é o modelo de três
componentes apresentado por Meyer e Allen (1991). Mathieu e Zajac (1990),
autores de uma das mais reconhecidas meta-análises sobre o tópico apontam Meyer
e Allen como os seus mais importantes estudiosos. O seu modelo é
internacionalmente aceite, tendo sido validado em várias culturas. No seu
quadro teórico, o empenhamento possui três dimensões, qualquer uma delas
podendo manifestar-se ao nível organizacional ou outro (profissão, unidade)
nível (Meyer & Allen, 1997):
a) Affective Commitmentou Empenhamento Afectivo. Caracteriza-se pelo desejo
de permanecer na organização. Segundo Allen e Meyer (1990:3) Colaboradores com
um forte empenhamento afectivo permanecem na organização porque querem ( ).
Existe uma ligação, um envolvimento emocional com a organização, bem como uma
identificação com os seus valores;
b) Continuance Commitmentou Empenhamento Instrumental3. Traduz-se na
necessidade de ficar na organização. Para Allen e Meyer (1990:3) Colaboradores
com ( ) empenhamento instrumental permanecem porque precisam ( ). Baseia-se na
análise/percepção dos custos associados ao abandono da organização. Assim, o
trabalhador poderá estar apenas empenhado devido ao custo proibitivo associado
ao abandono da organização;
c) Obligation Commitment, depois (Meyer,Allen, & Smith, 1993:
539)redefinido Normative Commitment ou Empenhamento Normativo. Reflecte a
obrigação ou dever de permanecer na organização pelo que o trabalhador
considera errado abandonar a organização. Para os autores (1990:3)
Colaboradores com ( ) empenhamento normativo permanecem porque sentem que são
obrigados. Consiste na crença de que é uma obrigação moral permanecer na
organização.
Embora as três componentes do empenhamento presumivelmente contribuam para a
permanência dos indivíduos na organização, uma vez que os motivos para
permanecer diferem (desejo, necessidade e obrigação), podem verificar-se
diferenças no comportamento dos trabalhadores (Meyer, Paunonen, Gellatly,
Goffin, & Jackson, 1989). A dimensão afectiva tem sido o alvo predilecto
daqueles que têm dedicado o seu trabalho ao estudo do empenhamento, quer em
termos teóricos, quer empíricos (Somers, 1993). Trabalhadores com um
empenhamento afectivo elevado estarão entusiasmados com a função que
desempenham e empenhados em contribuir para o sucesso da organização (Meyer et
al., 2004). Refira-se que para alguns autores, o autêntico empenhamento está
presente somente na componente afectiva (Mowday, Porter, & Steers, 1982).
As três componentes do empenhamento ligam o indivíduo à organização e tornam o
seu abandono menos provável, contudo as suas consequências atitudinais podem
ser bem diferentes (Meyer & Allen, 1991). Os indivíduos empenhados
afectivamente tendem a comportar-se no melhor interesse da organização, aqueles
cujo empenhamento é sobretudo normativo agem no mesmo sentido mas em menor grau
e os indivíduos empenhados instrumentalmente pendem a fazer apenas o necessário
para manter o emprego (Meyer et al., 2004).
Empenhamento organizacional: mais de três dimensões?
Não obstante os modelos multidimensionais de empenhamento terem granjeado
merecido espaço de destaque, o consenso sobre este constructo ainda está longe
de ser atingido, o que levou alguns autores a defender a realização de um maior
número de pesquisas sobre a sua dimensionalidade (Meyer & Allen, 1997).
Vários estudiosos postulam que as dimensões do modelo referido poderão não se
esgotar nas componentes afectiva, normativa e instrumental, devendo, por isso,
ser desmembradas. Esta discussão tem sido levada a cabo no âmbito do
empenhamento afectivo e, de forma mais marcada, do empenhamento instrumental. A
respeito deste, alguns investigadores sugerem a sua divisão em duas sub-
escalas: uma baseada nas percepções de falta de alternativas disponíveis e uma
segunda assente nos elevados sacrifícios pessoais associados ao abandono da
organização (Somers, 1993). A confirmação da pertinência desta bipartição do
empenhamento instrumental deve ser prosseguida, analisando-se os seus
antecedentes e consequentes (Allen & Meyer, 1996).
Os constructos de empenhamento afectivo e de empenhamento instrumental,
empiricamente distintos, parecem não estar significativamente relacionados
conforme demonstrado pelas correlações encontradas por Meyer, Stanley,
Herscovitch, e Topolnytsky (2002) e Rego, Souto, e Cunha (2007) de .05 e de
-.09 respectivamente. Todavia, subsistem dados contraditórios como os
apresentados por Rego e Souto (2004b) que obtiveram uma correlação de -.24 para
uma amostra portuguesa e de -.27 para uma brasileira. Já os componentes
afectivo e normativo do empenhamento, apesar de igualmente distintos, parecem
ter alguma relação: Meyer et al. (2002) encontraram uma correlação de .63 e
Rego et al. (2007) de .43.
Sem prejuízo das inconsistências latentes, o modelo tridimensional de Meyer e
Allen tem-se assumido globalmente como a proposta mais sustentada sobre
empenhamento organizacional, inclusive no contexto português (Rego & Souto,
2002).
Empenhamentos múltiplos
Igualmente importante na literatura de empenhamento organizacional foi o
advento da perspectiva dos empenhamentos múltiplos (Reichers, 1985, 1986; ver
também Ashforth & Mael, 1989; Randall, 1990). Para Reichers (1985), a
organização não deve ser vista como um entidade monolítica e indiferenciada que
suscita identificação e ligação por parte dos indivíduos. Ao contrário, deve
ser encarada como um coligação de vários constituintes que concorrem para que o
empenhamento organizacional só seja plenamente entendido como um conjunto de
empenhamentos múltiplos com várias entidades e grupos que formam a organização.
A pesquisa tem demonstrado que o comportamento organizacional é melhor
explicado tendo em conta os múltiplos empenhamentos dos trabalhadores (Becker
& Billings, 1993; Meyer etal., 1993). Hunt e Morgan (1994) concluem que
vários empenhamentosespecíficos contribuem para o empenhamento organizacional
global, particularmente o empenhamento com a gestão de topo e com o supervisor.
Não foram verificados quaisquer conflitos entre os diversos empenhamentos
específicos e o empenhamento global com a organização e constataram que o
empenhamento com o grupo de trabalho era independente do empenhamento
organizacional global. Talvez faça mais sentido falar de empenhamentos do que
de propriamente de empenhamento (Iles et al., 1996).
Reichers (1985) indicou um conjunto de focos de empenhamento que podem ser
importantes para muitos indivíduos, incluindo colegas, supervisores,
departamentos, subordinados, clientes e outros grupos ou indivíduos que compõe
a organização. Sugeriu igualmente que o empenhamento atitudinal de um indivíduo
no trabalho não pode ser adequadamente explicado apenas pelo empenhamento na
organização, uma vez que a própria natureza organizacional leva a que o
empenhamento dos colaboradores seja multidimensional.
Mercado de Trabalho
No âmbito de um mercado de trabalho global, a questão que se põe, é a de saber,
se a diminuição do número de trabalhadores permanentes no universo dos
trabalhadores por conta de outrem e o aumento de outras formas de emprego
representa uma reestruturação da mão-de-obra que se traduzirá na reprodução do
sistema económico e social (Vaz, 2000). Uma das externalidades mais visíveis
deste novo mercado consiste na precariedade do emprego.
Tradicionalmente, o mercado de trabalho era estruturado com base no trabalho
assalariado onde cada activo ocupava um emprego permanente e a tempo inteiro
desde o fim da escolaridade até à idade da reforma. As outras formas de
trabalho que entretanto apareceram e se desenvolveram, são consideradas como
trabalho não convencional ou ainda, precário ou atípico.
Nas organizações de hoje, uma parte considerável da força de trabalho é formada
por trabalhadores temporários dispostos a executar um trabalho com base num
contrato de duração limitada (De Gilder, 2003). Na terminologia de Rousseau
(1990) poder-se-á dizer que, provavelmente, o trabalhador temporário terá um
contrato psicológico transaccional, com a ênfase nos elementos económicos da
relação, enquanto o staff efectivo terá um contrato de cariz mais relacional,
assente no envolvimento e no empenhamento afectivo para com a organização.
O trabalho temporário
Em 2009, o número de trabalhadores temporários nos 27 países da União Europeia
rondava os 24 milhões. Destes, cerca de sete milhões estão empregados a tempo
parcial e os restantes a tempo inteiro. A maioria dos trabalhadores a tempo
parcial é do sexo feminino (67%) e normalmente bastante jovens (31% não
completou 25 anos de idade). No caso do trabalho a tempo inteiro verifica-se um
cenário idêntico no que respeita à distribuição etária, mas com uma percentagem
de 56% trabalhadores do sexo masculino (Eurostat, 2010). Durante 2009, 12% das
empresas nacionais recorreram ao trabalho temporário. No ano de 2008, existiam
em Portugal 265 ETT, representadas através de 427 agências e 750 funcionários
internos. Nos últimos 10 anos, os trabalhadores temporários têm representado
entre 0.7% a 0.9% da população activa portuguesa (International Confederation
of Private Employment Agencies [CIETT], 2011).
Se o trabalho temporário se caracterizou inicialmente pela cedência de mão-de-
obra para trabalhos administrativos, actualmente podemos encontrá-lo em todos
os sectores de actividade económica e em praticamente todas as categorias
profissionais, com a excepção das posições de topo. Esta forma de trabalho é
cada vez menos sinónima de perfis profissionais indiferenciados.
Devido ao rápido crescimento da taxa de desemprego, os trabalhadores
desempregados enfrentam cada vez mais dificuldades, seja na candidatura a novos
empregos, seja na adaptação a novas áreas de actividade. Perante este cenário,
muitos optam por se inscrever em empresas de trabalho temporário para ganhar
novas experiências laborais e por este tipo de trabalho lhes proporcionar maior
autonomia e liberdade (Marler, Woodard, & Milkovich, 2002). Sem prejuízo,
alguns estudos alertam que a maioria dos trabalhadores temporários não adere
voluntariamente a esta modalidade contratual: relatórios europeus estimam que
existam, num cenário optimista, cerca de 30% de trabalhadores temporários
voluntários (De Cuyper et al., 2008). Estes tendem a estar mais satisfeitos com
o seu trabalho (Ellingson, Gruys, & Sackett, 1998) e mais comprometidos com
a organização (von Hippel, Mangum, Greenberger, Heneman, & Skoglind, 1997)
quando comparados com aqueles que são forçados a aderir a esta forma de
trabalho.
De facto, os trabalhadores temporários não constituem uma entidade homogénea
nas suas preferências, atitudes e motivações. No seu estudo, Von Hippel et al.
(1997) tipificaram duas grandes motivações entre os trabalhadores temporários:
aqueles que procuram trabalho permanente, os temporariamente temporários(70%
dos inquiridos) e aqueles que não procuramemprego permanente, os
permanentemente temporários (30% dos inquiridos). Quando os indivíduos esperam
obter um emprego permanente tendem a estar mais empenhados com a empresa
Utilizadora, enquanto que relativamente à ETT não se regista qualquer alteração
sensível nos seus níveis de empenhamento. Por outro lado, quanto maior o peso
da falta de alternativas na opção pelo trabalho temporário, mais empenhados
estarão os trabalhadores com a ETT (von Hippel et al., 1997).
Apesar do carácter paradigmático que o trabalho temporário assume no quadro das
novas formas de trabalho emergentes, o nosso entendimento sobre as
particularidades da resultante relação triangular é ainda limitado.
Abordagem Metodológica
Utilizou-se como referência analítica o modelo tridimensional de Meyer e Allen
(1991), que comporta a dimensão afectiva, normativa e instrumental. Pretendeu-
se pesquisar a natureza do empenhamento organizacional que liga os
trabalhadores temporários à ETT e ao Utilizador bem como a relação entre estes
dois vínculos. A influência das motivações para o trabalho temporário e da
antiguidade no empenhamento organizacional dos trabalhadores foi também
examinada.
Amostra
Uma vez que o contacto com todos os indivíduos do público-alvo é inexequível,
optou-se por encetar contactos com ETT, com Utilizadores desta forma de
trabalho e directamente com trabalhadores temporários da zona norte do país de
forma a garantir uma taxa de resposta adequada aos propósitos da pesquisa.
Constituiu-se assim uma amostra por conveniência (Gil, 1999) a partir dos
trabalhadores temporários que se disponibilizaram voluntariamente para
participar no estudo.
Fazem parte da amostra final 102 indivíduos. A amostra é constituída por 54% de
respondentes do sexo masculino sendo que dois terços dos inquiridos têm menos
de 35 anos, o que parece ir de encontro à percepção de que o trabalhador
temporário continua a ser essencialmente jovem. Predominam as profissões menos
qualificadas ligadas à produção, à área logística e administrativa. Destes
trabalhadores, mais de 60% possuem um contrato de trabalho temporário a termo
com a ETT. Quanto à antiguidade na ETT, 70% tem um vínculo inferior a um ano e
17% dos respondentes trabalham na ETT há mais de dois anos. Na empresa
Utilizadora, os valores são semelhantes: 68% revelam uma antiguidade inferior a
um ano, ao passo que 23% mantém-se na empresa Utilizadora há mais de dois anos.
O trabalhador temporário da amostra caracteriza-se por um historial
relativamente curto nesta forma de trabalho. A falta de alternativas no mercado
de trabalho é a principal razão apontada pelos respondentes para enveredarem
pelo trabalho temporário (66%). Apenas 3.5% dos trabalhadores temporários
escolhem esta forma de relação laboral para adquirir mais experiência
profissional. Transparece a impressão que o ingresso no mercado de trabalho
temporário será frequentemente involuntário e poucas vezes resultará de uma
decisão intencional e premeditada.
Estudo Quantitativo
Face aos objectivos previamente estabelecidos, recorreu-se à metodologia de
inquérito por questionário (Quivy & Campenhoudt, 1992) para medir o
empenhamento organizacional. Utilizou-se um instrumento contendo 28 itens, 16
retirados do instrumento utilizado por Ferreira (2005) e 12 retirados do
instrumento empregado por Rego e Cunha (2003). Cada inquirido posicionou-se
duas vezes face aos 28 itens com vista à identificação dos níveis de
empenhamento organizacional com a ETT e com o Utilizador. Os itens concernentes
à ETT e à organização Utilizadora foram intencionalmente identificados e
colocados em páginas diferentes de forma a prevenir um efeito de espelho nas
respostas. Os indivíduos foram convidados a assinalar numa escala Likert de
cinco pontos o grau de concordância com cada item (1: discordo em absoluto; 2:
discordo em parte ; 3: não tenho opinião; 4: concordo em partee 5:concordo em
absoluto). No sentido de controlar apolarização das respostas, alguns itens
estão formulados na negativa. As proposições foram distribuídas aleatoriamente
pelo questionário. Dos 125 questionários distribuídos receberam-se 110, sendo
que oito questionários recolhidos não foram considerados válidos. A taxa de
resposta foi de 88%.
Através do questionário aplicado formularam-se as seguintes questões:
1. Quais as dimensões do empenhamento organizacional com a ETT e com o
Utilizador?
2. Qual a relação entre os dois vínculos acima mencionados?
3. Qual a influência da voluntariedade em enveredar pelo trabalho temporário
no empenhamento organizacional com a ETT e com o Utilizador?
4. Qual a relação do factor tempo (antiguidade na ETT, no Utilizador e
enquanto trabalhador temporário) no empenhamento organizacional com a ETT e com
o Utilizador?
Resultados
De forma a aferir o grau de ajuste dos dados à análise factorial realizou-se o
teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de Esfericidade de Bartlett. Este
procedimento foi executado quer para os itens relativos à ETT, quer para os
seus homólogos referentes à empresa Utilizadora.
Para cada grupo de itens (ETT e empresa Utilizadora) verificou-se uma boa
relação entre as variáveis confirmada pelo critério KMO de 0.77 (Pestana &
Gageiro, 2005) e pela significância do teste de esfericidade de Bartlett
1196.49 (p=.000) permitindo proceder à análise factorial em componentes
principais para os itens referentes à ETT. No que se refere aos itens
direccionados para a empresa Utilizadora foram igualmente realizados o teste de
KMO e o teste de esfericidade de Bartlett, permitindo verificar se a análise
factorial teria validade para as variáveis associadas. Para o primeiro obteve-
se um valor de 0.82 e no teste de esfericidade um nível de significância de
p=.000 para um valor de 1441.24.
Os dados foram submetidos a uma análise factorial em componentes principais com
rotação oblíqua (direct Oblimin ) de forma a conhecer as dimensões de
empenhamento organizacional nos trabalhadores temporários. Em ambos os casos,
as correlações entre os componentes extraídos foram baixas, sendo a correlação
mais forte de r=-.34. Assim, optou-se pela razoabilidade de uma rotação
ortogonal Varimax.
ETT
A aplicação do método estatístico permitiu concluir a extracção de três
factores principais para a ligação com a ETT ' consideraram-se todos os itens
com saturações acima de ,500; nos casos em que os itens demonstraram possuir
uma saturação acima deste valor em mais do que um factor foram excluídos da
análise (Tabela_1).
Os itens formulados inicialmente na negativa viram a sua enunciação e inerente
codificação de dados alterada de forma a calcular os coeficientes de Alpha de
Cronbach (Pallant, 2001). Estes situaram-se acima de 0.70 (Nunnally, 1978) para
qualquer dos factores, o que permite afirmar que as três escalas possuem boa
consistência interna. Na Tabela_3 acrescentam-se as denominações atribuídas a
cada um dos factores extraídos e o apuramento de médias e desvios padrão para
cada uma das variáveis.
Contudo é de salientar que a estrutura factorial encontrada apresenta níveis de
correspondência díspares com as componentes afectiva, normativa e instrumental
previstas por Meyer e Allen (1991).
O factor 3 é aquele que apresenta maior conformidade com uma das dimensões do
modelo teórico de empenhamento organizacional preconizado pelos autores
canadianos, o empenhamento instrumental, e daí o rótulo que lhe foi atribuído.
Os itens que o constituem reflectem principalmente a percepção dos indivíduos
da inexistência de alternativas atractivas de emprego noutras organizações e de
forma ténue os elevados sacrifícios pessoais associados ao abandono da
organização.
Dimensões de empenhamento organizacional com a ETT
Os outros dois factores extraídos já não apresentam uma estrutura tão clara e
concordante com o modelo teórico em análise. O primeiro factor é aquele que
mais se afasta do preconizado pela literatura. Ainda que na sua constituição se
encontrem elementos sobretudo de cariz normativo e daí a denominação imputada,
coexistem componentes de natureza instrumental (sobretudo associados aos
elevados custos pessoais) e mesmo afectiva neste vínculo com a organização.
Estes elementos parecem apontar para a obrigação que o trabalhador temporário
sente em permanecer na ETT e sugerem que o próprio empenhamento normativo
poderá ser per se multidimensional. A este respeito, Nascimento et al. (2008)
salientam o papel flutuante desta componente, aventando a hipótese de que o
empenhamento normativo se associa, sob certas condições, à dimensão afectiva e,
sob outras, à instrumental. Neste caso, o vínculo normativo liga-se mais
acentuadamente com elementos de natureza instrumental. O factor 2 denominou-se
de Empenhamento Afectivo pois remete para o significado e sentido de pertença
nutridos pela ETT. Ainda assim incluiu um item de empenhamento normativo e
outro de cariz instrumental.
Empresa Utilizadora
Relativamente à ligação com a empresa Utilizadora, a análise factorial indicou
três factores principais (Tabela_4). Os factores apurados explicam 52.34 % da
variância encontrada. Os valores próprios e a variância explicada por cada um
dos factores podem ser consultados na Tabela_2.
Extraction Method: Principal Component Analysis. Rotation Method: Varimax with
Kaiser Normalization.
A medida de fidedignidade Alpha de Cronbach revelou que as três escalas
constituídas possuem valores de consistência interna acima do limiar de
aceitabilidade (Tabela_3). Os itens formulados inicialmente na negativa viram
atempadamente a sua enunciação e inerente codificação de dados alterada.
Os resultados da análise factorial parecem encontrar eco nos vários estudos
empíricos que têm questionado se o empenhamento organizacional afectivo e
normativo são na realidade independentes (Meyer et al., 2002; Rego et al.,
2007). Estes dois laços parecem ter alguma relação quando atentarmos na
estrutura do factor 1. Este factor, denominado de Empenhamento Normativo, para
além de retratar obrigações e deveres morais de lealdade para com a
organização, contém igualmente elementos de compromisso emocional e afectivo
que extravasam a definição proposta por Meyer e Allen (1990) para o laço
normativo. O factor 2, denominado de Empenhamento Afectivo, retrata a
internalização de valores e objectivos profissionais associada a um vínculo
activo, de trocas mútuas entre trabalhador e organização. O constructo de
empenhamento instrumental preconizado pelos autores está representado pelo
factor 3. É de notar que, a exemplo do verificado com a ETT, a falta de opções
de emprego disponíveis se constituiu de forma destacada como o principal traço
desta dimensão. O reconhecimento dos custos e sacrifícios associados com a
saída da organização encontra-se representado apenas por um dos itens.
ETT e empresa Utilizadora
No sentido de encontrar itens com um peso significativo distintivo para a
análise do empenhamento relativo à ETT e à empresa Utilizadora procedeu-se à
análise das suas comunalidades com os factores extraídos (Tabela_5).
Consideraram-se apenas diferenças de comunalidades acima de .10 nesta análise.
As diferenças de maior magnitude registam-se ao nível das obrigações e deveres
morais de lealdade para com a organização traduzidasnos itens Sinto que, se
recebesse uma oferta de melhor emprego, não seriacorrecto deixar a minha
organizaçãoeSinto-me em dívida para com a minha organização. A comunalidade
destes itens é acentuadamente maior nocaso dos factores de empenhamento
extraídos para a empresa Utilizadora do que no caso da ETT.
A análise correlacional (Coeficiente de Correlação de Pearson) das associações
entre os factores extraídos para cada um dos focos de empenhamento (ETT e
empresa Utilizadora) não demonstrou relações significativas entre as dimensões
de empenhamento para um mesmo foco. No entanto, foi possível identificar
correlações entre dimensões de empenhamento face à ETT com dimensões de
empenhamento face à empresa Utilizadora. O empenhamento afectivo com a ETT está
correlacionado com o empenhamento afectivo da empresa Utilizadora (r=.45; p
<0.01); o empenhamento normativo para ambos os focos está correlacionado
(r=.37; p <0.01) e o empenhamento instrumental apresenta uma correlação
significativa ao nível de 0.01 de r=.53. Nestes três casos, as correlações
apresentam valores moderados no critério de Pestana e Gageiro (2005).
No que concerne às correlações entre as dimensões identificadas de empenhamento
organizacional e variáveis demográficas verificou-se um número reduzido de
associações e de magnitude pouco relevante. Pretendeu-se ainda aferir a
existência de diferenças significativas nas várias dimensões de empenhamento em
função das motivações dos inquiridos para integrar o mercado de trabalho
temporário e das características demográficas, mediante testes one-way ANOVA e
testes t de Student para amostras independentes. Nestes últimos, constatou-se a
existência de diferenças estatisticamente significativas entre as médias do
sexo masculino e feminino na dimensão empenhamento afectivo face à ETT e face à
empresa Utilizadora: t(70)=-2.57, p=.012 e t(68)=-2.62, p=.011. As demais
diferenças de médias significativas circunscreveram-se à opção Adquirir maior
experiência profissional na dimensão empenhamento afectivo com a empresa
Utilizadora (t(68)=-2.32, p=.023) e pela Flexibilidade de horários no
empenhamento instrumental com a ETT (t(70)=-2.31, p=.024).
A análise da variância não registou diferenças estatisticamente significativas
no empenhamento organizacional para qualquer dos focos quando examinada a
antiguidade dos trabalhadores temporários na empresa Utilizadora, tendo-se
verificado o oposto quanto à antiguidade na ETT e na condição de trabalhador
temporário. O valor médio de empenhamento afectivo com a empresa Utilizadora é
significativamente menor nos indivíduos que são trabalhadores temporários há
mais de um ano e menos de dois do que nos que exercem este tipo de trabalho há
menos de um ano (F(3, 62)=3.6, p=.01). Observou-se a mesma tendência quando se
analisou a antiguidade do trabalhador na ETT (F(3, 63)=3.3, p=.02).
Não se verificaram diferenças de médias significativas entre os indivíduos que
optaram voluntariamente pelo trabalho temporário e aqueles que não o fizeram no
referente às dimensões de empenhamento com a ETT e com a empresa Utilizadora.
Finalmente e de modo a comparar os valores médios de cada dimensão de
empenhamento com a ETT com os valores do vínculo homólogo com a empresa
Utilizadora recorreu-se a um teste t de Student para duas amostras
emparelhadas. A análise dos resultados não revelou diferenças de médias
estatisticamente significativas.
Discussão
As análises factoriais confirmaram que o empenhamento organizacional deve ser
observado como um fenómeno tridimensional de vinculação, comportando uma
dimensão afectiva, normativa e instrumental para com a ETT e a empresa
Utilizadora.
Relativamente à medição do empenhamento organizacional, vários trabalhos
(Ferreira, 2005; Meyer & Allen, 1997; Rego, Cunha, & Souto, 2005) são
coincidentes no destaque do empenhamento afectivo, seguindo-se o empenhamento
normativo e instrumental. A ligação dos trabalhadores temporários com a ETT não
é condizente com esta ordenação. Neste caso, o vínculo instrumental apresenta o
score mais elevado com um valor médio idêntico ao do empenhamento afectivo,
sendo o laço normativo a componente menos forte da ligação entre os inquiridos
e a ETT. Os valores obtidos para a ligação com a ETT parecem estar em linha com
posições que postulam a natureza de não-empenhamento, de não compromisso do
trabalhador temporário. Em linha com os resultados de Benson (1998) e Van
Breugel etal.(2005), o vínculo com a empresa Utilizadora destaca-se pelos
seusscoresmais elevados em qualquer das dimensões de empenhamento quando
comparados com os da ETT. O empenhamento afectivo apresenta o valor mais
elevado, seguido do instrumental e do laço normativo. Neste contexto, importa
atentar nos sinais fornecidos pelas pesquisas que demonstraram que as
correlações do empenhamento instrumental com comportamentos desejáveis como a
cidadania organizacional, assiduidade e desempenho, são fracas e por vezes
mesmo negativas (Meyer et al., 1989). Aceitando-se que as organizações têm
interesse em promover os laços afectivos e normativos dos seus colaboradores e
em atenuar o vigor do laço instrumental (Meyer & Smith, 2000) e que as
consequências de altos níveis de empenhamento instrumental podem ser negativas
parece necessário e útil repensar e reconstruir práticas de gestão de recursos
humanos dos trabalhadores temporários.
A análise correlacional assevera que quem está afectivamente empenhado num dos
alvos tende a estar também afectivamente empenhado na outra organização-alvo.
Não obstante se reconhecer que os vários cenários contratuais originam a
criação de contratos psicológicos específicos que explicam diferenças na
intensidade e predominância relativa das dimensões do empenhamento, é de
realçar que a natureza e a forma com que cada indivíduo se liga com uma
organização, qualquer que ela seja, são mais importantes do que o foco desse
empenhamento. Os dados indiciam que o empenhamento organizacional não deve ser
encarado como uma realidade de soma nula, uma vez que um mesmo indivíduo pode
ter múltiplos empenhamentos simultaneamente e que estes não se anulam
necessariamente, antes pelo contrário, parecem estar positivamente associados.
De facto, os contratos de trabalho temporários não têm inevitavelmente efeitos
negativos sobre a relação empregado-organização (Chambel & Castanheira,
2007), visto que os trabalhadores temporários não experienciam necessariamente
dissonância cognitiva por estarem empenhados com múltiplos alvos, desde que
estes tenham objectivos comuns.
Por outro lado, os dados da amostra sugerem que o ingresso no mercado de
trabalho temporário será frequentemente involuntário e poucas vezes resultará
de uma decisão intencional e premeditada, sendo antes resultado da percepção de
falta de alternativas no mercado de trabalho. Esta motivação extrínseca,
apontada pelos respondentes como a principal razão para a entrada no mercado de
trabalho temporário poderá estar na origem dos elevados valores de empenhamento
instrumental registados. Em todo o caso, os resultados obtidos não são
suficientemente esclarecedores quanto ao papel que a voluntariedade pode ter na
explicação da relação de empenhamento do empregado com a ETT e com a empresa
Utilizadora.
Conclusão
Um traço distintivo do vínculo psicológico destes trabalhadores é o seu forte
carácter instrumental evidente sobretudo na relação com a ETT e de forma mais
atenuada com a organização Utilizadora.
Comparativamente com o modelo mais considerado de empenhamento organizacional,
a proposta de Meyer e Allen (1991), o laço dos trabalhadores temporários
apresenta nuances mormente na importância relativa que cada dimensão de
empenhamento (afectiva, normativa e instrumental) assume. O arranjo contratual
tripartido do trabalho temporário é essencialmente divisional nas
responsabilidades e atribuições, sejam elas jurídicas, laborais ou formativas.
A gestão funcional e psicológica da pertença simultânea a dois contextos
organizacionais, ainda que em esferas de relacionamento distintas, revela-se de
difícil apropriação. Esta dificuldade poderá desempenhar um papel decisivo na
construção de atitudes e comportamentos organizacionais afectando
consideravelmente a ligação entre o indivíduo e as organizações. Paralelamente,
a obrigatoriedade de reciprocidade nas relações mútuas entre os trabalhadores e
as organizações é pouco explícita ou diminuta. Torna-se complicado ao
trabalhador temporário desenvolver, em contexto laboral, relações de confiança
duradouras, de ligação interpessoal e de laços significativos com outros
trabalhadores da organização.
Implicações
O trabalho temporário invoca metodologias renovadas e específicas de gestão da
motivação dos trabalhadores, diversas das empregues com os trabalhadores com
vínculos permanentes. Existem condições particulares no trabalho temporário que
se podem revelar problemáticas para as organizações, como sejam o historial
relativamente curto nesta forma de trabalho da maioria dos trabalhadores ou o
ingresso involuntário no trabalho temporário devido exclusivamente à falta de
alternativas. Por outro lado, enquanto que a maioria dos trabalhadores prefere
contratos internos mais estáveis, alerta-se que existe um pequeno grupo de
trabalhadores que se encaram como temporários permanentes. Este facto não é de
desprezar quer para a ETT, quer para a própria empresa Utilizadora: uma
avaliação das razões e motivações que conduzem os indivíduos ao trabalho
temporário e as suas perspectivas temporais é um processo a não descurar de
forma a conseguir um emparelhamento mais eficaz entre as necessidades da
empresa e dos trabalhadores temporários. Em termos práticos, poder-se-á afinar
quer o conteúdo do trabalho a executar, quer a própria duração do contrato.
Cabe às organizações que contratam e acolhem estes trabalhadores garantir a
formação adequada para as exigências das funções a desempenhar, fomentar a
autonomia no desenvolvimento das tarefas, acautelar percepções de iniquidade
(distributiva, procedimental e interaccional) e propiciar o devido suporte
organizacional de forma a promover níveis de empenhamento benéficos para a
organização como um todo.