Percursos de mulheres, trabalho, família e participação associativa no grande
Porto
Oliveira, Márcia, Queirós, João, Novais, Carina, Cruz, Sofia, Monteiro, Bruno e
Marques, Regina (2011), Percursos de mulheres, trabalho, família e participação
associativa no grande Porto, Porto, Livpsic/Movimento Democrático de Mulheres,
136 páginas.
Sofia Bergano
Doutora em Ciências da Educação; Escola Superior de Educação do Instituto
Politécnico de Bragança
Percursos de Mulheres é uma obra que reúne um conjunto de textos que resulta do
desenvolvimento do projeto de investigação intitulado "Uma Vida de
Trabalhos? Trajetórias Profissionais e Participação das Mulheres",
coordenado por Márcia Oliveira e desenvolvido pelo Movimento Democrático de
Mulheres ' Núcleo do Porto. Este projeto de investigação decorreu entre 2008 e
2010 e incidiu sobre mulheres trabalhadoras dos concelhos do Porto, de Vila
Nova de Gaia, de Valongo, de Gondomar, de Matosinhos e da Maia.
Deste projeto de investigação destacamos dois eixos fundamentais em torno dos
quais a reflexão é desencadeada: o eixo do trabalho e o eixo da participação na
vida pública. Assim, esta obra é constituída por diferentes capítulos sobre
estas duas linhas matriciais de problematização.
O conjunto dos textos propostos permite a problematização em torno das questões
relacionadas com a presença das mulheres no mundo do trabalho e da participação
cívica com conciliação entre a vida profissional pessoal e familiar. Assim, e
ao longo dos diversos capítulos deste livro, estão presentes as mudanças
observadas na sociedade portuguesa, especialmente, na região do Grande Porto,
no que concerne ao papel da mulher na estrutura económica e, simultaneamente, a
constatação da persistência de desigualdade entre homens e mulheres nas esferas
pública e privada.
No primeiro capítulo, da autoria de João Queirós, ' Recomposição da estrutura
económica e trajetórias socioprofissionais de mulheres do Grande Porto um
retrato panorâmico (pp. 13-29) ' o autor apresenta as grandes tendências de
recomposição da estrutura económica do Grande Porto tendo como principal
enfoque as transformações verificadas nos modos de relação das mulheres com o
mundo do trabalho. Neste capítulo são conciliados dados oficiais das últimas
três décadas com informações recolhidas através do inquérito realizado a 701
mulheres, em idade ativa, realizado no âmbito do projeto "Uma Vida de
Trabalhos? Trajetórias Profissionais e Participação das Mulheres". Desta
articulação resulta a possibilidade de analisar as diferenças encontradas no
interior do conjunto das mulheres, no que às condições socioprofissionais diz
respeito e, simultaneamente, a possibilidade de proceder à análise daquilo que
são as transformações intergeracionais relativas a estas problemáticas.
O capítulo Trajetórias Profissionais de Mulheres; uma reflexão em torno da
mulher, do trabalho e da família (pp. 31-48), da autoria de Carla Novais, dá-
nos conta da instabilidade profissional das mulheres e da forma como as
exigências da vida familiar podem concorrer para a interrupção e/ou estagnação
das carreiras femininas. Relativamente a estes aspetos sublinhamos a
importância das questões levantadas no sentido de chamar a atenção para a
fragilidade laboral das mulheres e para o que este facto representa, em termos
de desvantagem das mulheres no que se refere à proteção social associada ao
trabalho.
No seguimento da problematização em torno da conciliação da vida profissional
com a vida familiar das mulheres, Sofia Cruz apresenta-nos o caso das mulheres
trabalhadoras nos hipermercados (pp. 49-58) e das dificuldades sentidas por
elas, na sequência da alteração do código do trabalho e das normas
regulamentares das grandes multinacionais que acabaram por constituir um fator
de desregulação dos tempos das vidas das mulheres, contribuindo para a
agudização dos problemas associados à conciliação do trabalho remunerado com as
tarefas familiares tradicionalmente atribuídas às mulheres.
No capítulo O medo. Insidioso elemento da experiência quotidiana de mulheres
trabalhadoras em "tempos de crise" (pp. 59-72), João Queirós retoma
a problemática da instabilidade económica que se apresenta, de uma forma mais
ou menos subtil, nos discursos das mulheres entrevistadas e que, de acordo com
o autor, é "o efeito de um caminho que se sente ser percorrido
individualmente" (p. 63). Esta citação ilustra de uma forma muito clara a
necessidade sentida da partilha e discussão das situações e circunstâncias de
vida das mulheres.
Bruno Monteiro, nos capítulos: As normas do gosto associativo. Modalidades de
participação associativa das mulheres assalariadas do Grande Porto (pp. 73-98),
Aquela que diz não e Notas de uma pesquisa sociológica sobre a abstenção (pp.
99-113) e Materiais para a história natural do sindicalismo (pp. 115-130). Um
trajeto feminino na militância sindical (1997-2000), debruça-se sobre a
participação das mulheres na esfera pública, propondo uma reflexão em torno da
participação das mulheres na vida cívica, designadamente da participação
associativa das mulheres assalariadas do Grande Porto; propõe também uma
reflexão acerca da abstenção das mulheres e fala ainda do trajeto feminino na
militância sindical. Neste conjunto de capítulos, sobre a participação das
mulheres, o autor problematiza as questões da cidadania e da permanência de
desigualdades entre mulheres e homens nestes domínios.
Este trabalho é de uma pertinência e atualidade inquestionáveis e dá-nos conta
de um conhecimento construído de forma contextual e participada, que resulta de
vários olhares sobre a desigualdade entre homens e mulheres. Simultaneamente,
remete-nos para a heterogeneidade que é possível observar no interior da
categoria das mulheres, no que respeita às suas situações laborais, familiares
e de participação cívica.