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EuPTHUHu1645-00862011000200001

EuPTHUHu1645-00862011000200001

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN1645-0086
Year2011
Issue0002
Article number00001

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Obesidade e Estilos de Vida Saudáveis: Questões Relevantes para a Intervenção

Ao longo das últimas décadas, a taxa de prevalência da obesidade em crianças e adolescentes tem sofrido um drástico aumento um pouco por todo o mundo (Lobstein, Baur, & Uauy, 2004), estando Portugal entre os países da Europa com as maiores taxas de prevalência de obesidade pediátrica (Moreira, 2007).

Até agora, muito se tem escrito sobre a intervenção na obesidade e muitos são os programas desenvolvidos para combater este problema, porém, continuam ainda hoje a ser escassos os resultados empíricos que apoiam essas intervenções e que comprovam a eficácia dos programas actuais, particularmente no que concerne à manutenção sustentada dos resultados terapêuticos a longo prazo (Fabricatore & Wadden, 2006). A definição do tratamento mais adequado e eficaz na manutenção dos resultados terapêuticos a longo prazo (i.e., para além da duração dos programas de intervenção) mantém-se assim, ainda hoje, uma fonte de incertezas para clínicos e investigadores.

Com o objectivo de reforçar e impulsionar a continuação dos estudos, nesta área, o presente trabalho pretende (a) apresentar os principais modelos teóricos que têm servido de base às investigações realizadas com crianças e adolescentes; (b) anunciar os factores identificados pela investigação como moderadores da relação entre a intervenção e os seus resultados (i.e., factores que podem facilitar ou dificultar o sucesso das intervenções); (c) dar a conhecer os diferentes tipos de tratamento existentes para a obesidade e a intervenção mais apropriada para crianças e adolescentes; (d) fazer uma análise crítica dos problemas dos actuais programas de intervenção; e (e) oferecer directrizes para a construção futura de novos programas mais eficazes.

A OBESIDADE NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA A obesidade é geralmente definida como uma condição em que a excessiva acumulação de gordura no corpo pode colocar em risco a saúde das pessoas. Neste sentido, a Organização Mundial de Saúde (OMS, 1998b) recomenda a distinção entre excesso de peso e obesidade, sugerindo que o excesso de peso seja definido por um Índice de Massa Corporal (IMC = peso em quilos [kg] / altura em metros quadrados [m2]) igual ou superior a 25 kg/ m2, e a obesidade seja definida por um IMC igual ou superior a 30 kg/ m2. Porém, quando se trata da obesidade pediátrica, o diagnóstico e a definição de obesidade tornam-se mais difíceis e controversos. Por deliberação da Direcção Geral de Saúde, em Portugal são actualmente utilizadas para o diagnóstico, em idade pediátrica, as tabelas de referência desenvolvidas pelo Center for Disease Control and Prevention/ National Center for Health Statistics (CDC/NDHS, 2000). Segundo o CDC/NDHS (2000) o excesso de peso, em idade pediátrica, é definido por um IMC igual ou superior ao percentil 85 e inferior ao percentil 95; por sua vez, a obesidade é definida por um IMC igual ou superior ao percentil 95.

Ao longo das últimas décadas, a obesidade tem-se destacado de entre os maiores problemas de saúde pública, tendo a sua prevalência vindo a aumentar drasticamente um pouco por todo o mundo, particularmente em crianças e adolescentes (Lobstein, et al., 2004). Portugal está entre os países da Europa com as maiores taxas de prevalência de obesidade infantil. As taxas de excesso de peso e de obesidade atingem prevalências acima de 30% nas crianças do arquipélago da Madeira e em algumas regiões do continente (Moreira, 2007). Em crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 5 anos, as taxas de excesso de peso atingem os 13.6% para o sexo masculino e os 20.4% para o sexo feminino; e as taxas de obesidade os 6.5% para o sexo masculino e os 6.9% para o sexo feminino (Rito, 2006). A revisão de Moreira (2007) dos estudos de prevalência em crianças com idades entre os 6 e os 10 anos permitiu concluir que a taxa de prevalência do excesso de peso para esta faixa etária varia entre os 14.7% e os 30.5% para o sexo masculino, e entre os 16.5% e os 29.1% para o sexo feminino; por sua vez, a taxa de prevalência da obesidade varia entre os 5.3% e os 13.2% para o sexo masculino, e entre os 6.4% e os 12.6% para o sexo feminino.

Resultados idênticos da prevalência nesta faixa etária (i.e., 6 - 10 anos) foram obtidos no estudo de Silva et al., (2008). No que concerne à população adolescente com idades entre os 13 e os 14 anos, a prevalência do excesso de peso é de 16.9% para o sexo masculino e de 16% para o sexo feminino; e a taxa de obesidade de 11.3% para o sexo masculino e de 9.2% para o sexo feminino (Ramos & Barros, 2005). Os dados disponíveis para a população adolescente portuguesa com idades compreendidas entre os 15 e os 18 anos permitem apontar para uma prevalência de excesso de peso de 21% e obesidade de 5% (Terres, Pinheiro, Horta, Pinheiro, & Horta, 2006).

A obesidade está associada a inúmeros problemas de saúde e ao risco de doenças crónicas, incluindo problemas cardiovasculares, hipertensão, asma, problemas músculo-esqueléticos e diabetes tipo 2 (Lobstein, et al., 2004). A investigação neste domínio tem demonstrado que a obesidade em idade pediátrica surge ainda associada a problemas psicológicos e sociais diversos, nomeadamente, diminuição da auto-confiança (Wadden & Stunkard, 1985) e da auto-estima (Erermis, et al., 2004; Strauss, 2000), depressão (Anderson, Cohen, Naumova, Jacques, & Must, 2007; Erermis et al., 2004; Maddi, Khoshaba, Persico, Bleecker, & VanArsdall, 1997; Mustillo et al., 2003), ansiedade (Anderson et al., 2007), problemas de comportamento (Erermis et al., 2004; Mustillo et al., 2003), insatisfação com o corpo (Thompson et al., 2007), dificuldade em estabelecer relações sociais e isolamento social (Fonseca & de Matos, 2005).

A obesidade é considerada uma doença crónica influenciada por factores genéticos, metabólicos e fisiológicos, no entanto, é também determinada por factores ambientais, psicológicos, comportamentais, entre outros (Lobstein et al., 2004), que devem ser alvo dos esforços de prevenção e de intervenção.

REVISÃO DA LITERATURA E RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO A importância da adopção de comportamentos saudáveis está hoje plenamente divulgada, surgindo todos os dias notícias sobre a necessidade de praticar actividade física e alterar os comportamentos alimentares, como forma de melhorar a qualidade de vida. Porém, neste domínio, como aliás em muitos outros, a informação por muito pertinente que seja não é suficiente para provocar a mudança de hábitos e a adopção de novos comportamentos. Várias questões têm surgido, entre elas, a de saber que meios sócio-psicológicos podem ajudar as pessoas a adoptar novos comportamentos saudáveis e a manter as mudanças iniciadas de forma a possibilitar o alcance dos resultados desejados; ou, quando a disfunção existe, a de saber como estimular nas pessoas as competências para gerirem a aquisição de novos comportamentos que diminuam o risco de agravamento do seu estado de saúde e produzam os efeitos positivos necessários para uma maior autonomia e bem-estar (Maes e Karoly, 2005). Numa ou noutra situação, o que é notório é a existência de uma grande variabilidade na adopção de comportamentos de saúde. O que explica tal variabilidade? Eis uma das questões que, nas últimas décadas, suscitou o interesse dos psicólogos e os levou a produzir um vasto número de investigações empíricas e a construir modelos teóricos que possibilitassem a identificação dos determinantes subjacentes à concepção e à adopção de comportamentos de saúde. Apesar disto, grande parte dos programas de intervenção na obesidade parece não ter subjacente qualquer referencial teórico, ou no caso de o ter, este não ficar claro. O desenho de intervenções na ausência de um modelo teórico pode dificultar a determinação das razões do sucesso ou do insucesso dos esforços de intervenção. Desta forma, antes de construir qualquer programa de intervenção que fazer uma leitura dos modelos teóricos - desenvolvidos com o objectivo de permitir compreender e promover o sucesso da mudança dos comportamentos -, e procurar fundamento empírico nos estudos que têm apoiado e comprovado as orientações de cada modelo.

Como ponto de partida para a identificação das variáveis que qualquer programa de intervenção na obesidade deve contemplar para atingir os resultados desejados, o presente artigo destaca seguidamente os modelos que têm sido utilizados no domínio dos comportamentos de saúde e apresenta os resultados dos estudos empíricos que se basearam nesses modelos para explicar a mudança dos comportamentos alimentares e de actividade física.

Modelos teóricos como o modelo de crenças de saúde (Becker, 1979; Becker et al., 1977; Rosenstock, 1974), a teoria da motivação para a protecção (Rogers, 1975, 1983, 1985), a teoria da acção ponderada / teoria do comportamento planeado (Ajzen & Fishbein, 1980), são designados modelos motivacionais.

Muita da investigação que se tem dedicado ao estudo dos comportamentos alimentares e de actividade física tem sido conduzida na linha da teoria da acção ponderada e da teoria do comportamento planeado (Baranowski, Cullen, Nicklas, Thompson, & Baranowski, 2003). O estudo pioneiro de Schifter e Ajzen (1985), baseando-se no modelo do comportamento planeado, demonstrou que as atitudes, as normas subjectivas e o controlo percebido eram os fortes preditores das intenções de perda de peso; por sua vez, as intenções e o controlo percebido eram os preditores directos da perda de peso. Os autores do estudo descobriram ainda que a perda de peso aumentava com o desenvolvimento de planos de acção.

A generalidade dos modelos motivacionais assume que a intenção é o principal preditor da mudança. No entanto, apesar da utilidade destes modelos na compreensão dos determinantes dos comportamentos de saúde, actualmente sabe-se que as pessoas raramente agem em conformidade com as suas intenções e, por isso, a intenção explica apenas uma parte do comportamento (Armitage & Conner, 2000). Por conseguinte, os modelos motivacionais fornecem apenas um contributo parcial para a compreensão da mudança dos comportamentos.

A questão está em saber como tornar efectiva a realização da intenção. Os modelos baseados nas competências de auto-regulação têm estimulado um conjunto vasto de investigações relevantes para a compreensão da discrepância entre a intenção e a acção, e proposto a intervenção de processos psicológicos através dos quais os indivíduos podem influenciar a sua cognição, motivação e comportamento para produzir as acções que produzem as mudanças desejadas.

Subjacente à identificação destes processos está a ideia de que os indivíduos são agentes activos que tomam decisões, estabelecem objectivos e empreendem esforços para atingir esses objectivos. A auto-regulação refere-se, desta forma, aos processos que permitem ao indivíduo adaptar o seu comportamento às exigências do meio e mudar o seu comportamento para atingir metas e resultados desejados (Baumeister, 1999). Este é um processo sistemático que envolve esforço consciente para alterar pensamentos, sentimentos, desejos e comportamentos de forma a atingir as metas desejadas num contexto em constante mudança (Zeidner, Boekaerts, & Pintrich, 2000). Apesar das diferentes definições encontradas na literatura, a auto-regulação pode ser entendida como um sistema cognitivo-motivacional dinâmico que envolve o estabelecimento de metas, a aplicação estratégica e planeada dos recursos humanos e sociais para atingir essas metas, a auto-avaliação do progresso e a revisão dos objectivos e estratégias adoptadas. Este é um processo de gestão de respostas emocionais, elementos cruciais do sistema motivacional, concebidas em ligação com os processos cognitivos (De Ridder & De Wit, 2006).

Os modelos de auto-regulação, desenvolvidos para explicar e compreender os comportamentos de saúde, são igualmente utilizados em outras áreas comon a aprendizagem ou no domínio das organizações (Boekaerts, Pintrich & Zeidner, 2000). A área da saúde coloca, no entanto, um desafio adicional às teorias de auto-regulação devido à grande discrepância que tem sido encontrada entre o estabelecimento de metas de saúde e a falha no seu alcance, mesmo quando aquelas são consideradas importantes por parte dos indivíduos.

Os modelos de auto-regulação, ao incidirem o seu estudo nos processos de mudança activados pelo indivíduo (Baumeister, 2005) ' expressos na mobilização estratégica de pensamentos, sentimentos e comportamentos para alcançar um objectivo desejado ', destacam aspectos privilegiados para a compreensão da mudança dos comportamentos. A especificação dos processos cognitivos, metacognitivos, motivacionais, volitivos e comportamentais que podem intervir na mudança do comportamento em diferentes fases da sua execução, e o papel atribuído aos indivíduos na regulação estratégica daqueles processos com vista à concretização dos resultados desejados, veio estimular a abertura de novas linhas de investigação que visam identificar os factores facilitadores ou impeditivos da mudança do comportamento.

A maior parte dos modelos de auto-regulação considera a adopção de comportamentos saudáveis como produto de uma interacção dinâmica, temporal e recíproca de múltiplas estratégias cognitivas, motivacionais e comportamentais que vão interagir entre si e com o meio, durante os dois principais momentos da mudança: a formulação da intenção e a execução dos comportamentos. A diferenciação destes dois momentos no processo de auto-regulação possibilita a identificação dos factores que actuam na construção da intenção de agir e na execução e manutenção dos comportamentos seleccionados.

Apesar dos aspectos comuns, muitas são as diferenças existentes entre os diversos modelos que se concretizam na designação e saliência dos processos intervenientes na auto-regulação. O modelo cibernético (Carver, 2004; Carver & Scheier, 1998; Scheier & Carver, 2003) constituiu-se como uma das primeiras teorias de auto-regulação, segundo a qual os indivíduos identificam objectivos sistematicamente ao longo da sua vida, adoptam comportamentos para atingir esses objectivos (Scheier & Carver, 2003), monitorizam o progresso no alcance desses objectivos, e agem em conformidade para reduzir discrepância entre os resultados obtidos e os desejados (Carver, 2004). Através de processos dinâmicos de feedback e feedforward o resultado obtido (input) é avaliado a partir da comparação com o resultado desejado e, havendo discrepâncias, ocorre um processo para atingir o resultado desejado, formando-se um output que, por sua vez, é testado novamente para avaliar se o resultado desejado foi finalmente obtido (Carver & Scheier, 1998). Apesar deste modelo ter sido utilizado para explicar os processos de auto-regulação no contexto de algumas doenças crónicas (Carver, Scheier & Pozo, 1992; Carver et al., 1993; Scheier & Carver, 1992), nenhuma investigação foi realizada com base neste modelo na área da obesidade ou dos comportamentos de alimentação ou de actividade física.

Gollwitzer (1993) introduziu o conceito de realização da intenção, alertando para o papel facilitador dos planos de acção (que especificam onde, quando e como) na passagem da intenção para a acção. Os estudos empíricos que se têm fundamentado no constructo de realização de intenções de Gollwitzer (1993) têm- se mostrado encorajadores, sugerindo que os indivíduos que desenvolvem planos para a acção iniciam e mantêm mais facilmente comportamentos saudáveis (Sheeran & Orbell, 1999), como sejam a prática de exercício físico (Milne, Orbell & Sheeran, 2002), a prática de alimentação saudável (Verplanken & Faes, 1999), e o consumo de frutas e vegetais (Armitage, 2007; Kellar & Abraham, 2005).

Por sua vez, Schwarzer (1992) na abordagem do processo de acção para a saúde assume a existência de uma fase motivacional em que o indivíduo desenvolve a intenção e estabelece objectivos, e uma fase volitiva em que o indivíduo age para alcançar os objectivos de mudança. Segundo este modelo, na fase motivacional está presente a interacção de três variáveis importantes, sendo elas a percepção do risco, as expectativas de resultado e as expectativas de auto-eficácia. O resultado da interacção destas variáveis é a intenção de agir.

Na fase volitiva, isto é, na concretização efectiva da intenção em comportamento, interagem estratégias auto-reguladoras, das quais se destacam a auto-eficácia de coping (i.e., crenças optimistas sobre a capacidade de lidar com os obstáculos e experiências de recaída) e o planeamento da acção e do coping (i.e., planos para a acção, controlo da acção e planos para lidar com as dificuldades) (Schwarzer, 1992). Nesta perspectiva, o planeamento envolve uma representação mental da situação futura para activar um determinado comportamento, como proposto igualmente por Gollwitzer. Os estudos empíricos fundamentados na abordagem do processo de acção para a saúde têm mostrado que a auto-eficácia é o melhor preditor da intenção e da mudança de uma grande variedade de comportamentos, nomeadamente os comportamentos associados à perda de peso e ao exercício físico (Schwarzer, 1992). Schwarzer e Renner (2000) mostraram o papel da percepção do risco, das expectativas de resultado e da auto-eficácia de acção como preditores da intenção, e o papel da intenção e da auto-eficácia de coping como mediadores da mudança dos comportamentos alimentares. O estudo de Schwarzer et. al, (2007) que teve como objectivo avaliar a utilidade do planeamento e da auto-eficácia como variáveis mediadoras pós-intencionais concluiu que o planeamento e a auto-eficácia funcionam como factores preditores dos comportamentos alimentares e de actividade física.

Igualmente, os resultados do estudo de Renner et al., (2008) confirmam o poder preditor da a bordagem do processo de acção para a saúde na auto-regulação dos comportamentos alimentares.

Por sua vez, Leventhal, Meyer e Nerenz (1980) e, mais tarde, Leventhal, Nerenz e Steele (1984) desenvolveram o modelo de auto-regulação de doença. Este modelo assume que, perante uma ameaça à saúde, o indivíduo elabora representações e reage emocionalmente à doença, estando motivado para resolver o problema de saúde e restabelecer o equilíbrio. Segundo o modelo de auto-regulação de senso comum (Leventhal, Brissette, & Leventhal, 2003) o comportamento é dirigido para um objectivo e orientado por um processo de retroalimentação, no qual os resultados do comportamento são avaliados tendo em conta o objectivo e, os resultados desta avaliação afectam os determinantes do comportamento. Desta forma, o comportamento é o produto de interacções dinâmicas de múltiplos factores, a diferentes níveis, e apresentando relações causais recíprocas. O comportamento caracteriza-se por um sentido intrínseco de atingir objectivos e reduzir ou eliminar obstáculos à concretização desses objectivos. O estudo de Wamsteker et al., (2005), baseando-se no modelo de auto-regulação de doença , estabeleceu como objectivo avaliar as crenças acerca das causas, consequências, dimensão temporal e controlo da obesidade como possíveis factores preditores da perda de peso. Este estudo concluiu que as baixas percepções de auto-eficácia e de controlo sobre a doença, e a crença de que a obesidade possui uma origem física estão associadas a uma menor perda de peso. Este estudo sugeriu ainda que o resultado das intervenções pode ser aumentado através da mudança de crenças, especialmente, daquelas relacionadas com a auto-eficácia, visto esta ter provado ser, neste estudo, o factor preditor mais significativo da perda de peso.

Adicionalmente, o estudo de Kitsantas (2000) veio demonstrar a importância da percepção de auto-eficácia e a utilidade de diversas estratégias de auto- regulação e auto-controlo, designadamente, o estabelecimento de objectivos, a auto-monitorização, a auto-avaliação, a mudança do contexto ambiental, a gestão do tempo, o apoio social e a procura de informação, para a perda de peso e a manutenção do peso saudável.

Em resumo, antes de se partir para o desenho de intervenções com vista à mudança de comportamentos de saúde é fundamental ter presente a importância dos processos de auto-regulação. A auto-regulação é um constructo multidimensional que integra duas componentes principais: uma componente afectiva-motivacional dinâmica e uma componente cognitiva-metacognitiva. A componente afectiva- motivacional dirige a formulação de objectivos considerados desejados ou adequados, e a escolha e adopção de estratégias motivacionais que têm por missão, entre outras, facilitar a gestão de emoções, a resistência face aos obstáculos e dificuldades, e a gestão do tempo e do esforço. A componente cognitiva-metacognitiva está presente na definição do objectivo a atingir em adequação com as crenças pessoais e com a representação da doença, na antecipação da acção futura, na elaboração de um plano de acção, nos juízos formulados sobre os progressos ou os fracassos ocorridos e na orientação da atenção para os objectivos desejados e os comportamentos adoptados.

FACTORES MODERADORES DOS EFEITOS DOS PROGRAMAS DE INTERVENÇÃO NA OBESIDADE Para o desenvolvimento de programas eficazes ao nível da intervenção torna-se necessário conhecer os factores que influenciam a direcção e a magnitude da relação entre a intervenção e os seus resultados.

De seguida são apresentados os diferentes factores, agrupados em categorias, que a literatura sugere estarem correlacionados de forma significativa com os resultados dos programas de intervenção na obesidade com crianças e adolescentes (Stice, Shaw, & Marti, 2006).

Características do Indivíduo Relativamente às características do indivíduo destacam-se como factores moderadores dos efeitos dos programas de intervenção a idade e o sexo.

Idade. O estudo meta-analítico de Stice et al., (2006) revelou que os programas de intervenção mais eficazes apresentam como principal alvo os adolescentes. Os autores sugerem que, por se encontrarem numa fase de desenvolvimento mais avançada, os adolescentes possuem uma maior capacidade de compreensão e aplicação dos materiais de intervenção e um maior controlo sobre a sua alimentação, comparativamente com as crianças.

Sexo. Segundo os resultados do estudo de Stice et al., (2006), os programas de intervenção na obesidade com indivíduos de sexo feminino apresentam resultados de maior sucesso comparativamente com os programas que intervêm com o sexo masculino ou ambos os sexos. A população adolescente de sexo feminino tende a mostrar-se mais receptiva às intervenções que têm como finalidade promover comportamentos alimentares saudáveis, possivelmente devido às pressões sócio- culturais para a conformidade com os ideais de beleza associados à magreza, manifestamente maiores para o sexo feminino, nas culturas ocidentais.

Características da Intervenção No que concerne às características da intervenção, e apesar de alguns estudos conduzirem a resultados contraditórios, destacam-se como factores moderadores dos efeitos dos programas de intervenção na obesidade a duração, o envolvimento dos pais, o conteúdo informativo, a dieta e o exercício físico.

Duração. O estudo meta-analítico de Stice e Shaw (2004) concluiu que as intervenções de longa duração são mais eficazes comparativamente com as intervenções de curta duração. Contrariamente, a mais recente revisão meta- analítica de Stice et al., (2006) demonstrou que as intervenções na obesidade de curta duração são mais eficazes. Os autores referem que as intervenções longas tornam-se pouco apelativas para os jovens e resultam geralmente no aumento de desistências no decorrer dos programas.

Envolvimento dos pais. Alguns autores sugerem que os programas mais eficazes envolvem os pais nas suas intervenções (Berrocal, López, & Gavino, 1997). A revisão meta-analítica de Stice et al., (2006) concluiu, todavia, que o envolvimento dos pais pode não se correlacionar de forma significativa com os resultados dos programas de intervenção. Não obstante, é indiscutível o papel da família como modelo no desenvolvimento de hábitos de alimentação e de actividade física em crianças e adolescentes.

Conteúdo informativo. A investigação tem demonstrado que o conteúdo meramente informativo/educativo dos programas não se correlaciona de forma significativa com o sucesso dos programas de intervenção (Stice & Shaw, 2004; Stice et al., 2006). Deste modo, pode afirmar-se que a educação e o mero fornecimento de informação tornam-se insuficientes na promoção da mudança dos comportamentos. O recurso às estratégias comportamentais (em conjunto com os conteúdos educativos) pode desempenhar um papel fundamental na intervenção ao facilitar a aquisição de novos comportamentos.

Dieta. Os programas seguem geralmente a linha de intervenção tradicional, sugerindo um regime de dieta, com alusão à restrição alimentar como procedimento principal e, por vezes, único procedimento de intervenção (Stice et al., 2006). Importa considerar, contudo, os efeitos prejudiciais da dieta restritiva. A restrição alimentar, não é um conceito de doença, como também está geralmente associada a diversas reacções defensivas do organismo para contrabalançar as tentativas de perda de peso, incluindo o aumento da sensação de fome, o aumento da atracção e ingestão de alimentos hiper-calóricos, o aumento da fadiga diária e o consequente aumento de peso (Herman & Polivy, 2004; Ogden, 2004). Adicionalmente, diversos estudos têm comprovado os efeitos prejudiciais da restrição calórica no crescimento e desenvolvimento de crianças e adolescentes (Brook, Lloyd & Wolff, 1974; White, 1986). A acrescentar a isto, os resultados do estudo de Stice et al., (2006) permitiram concluir que a dieta restritiva pode não se correlacionar de forma significativa com os efeitos dos programas de intervenção. Em detrimento das dietas restritivas, diversos autores têm destacado a importância do desenvolvimento de comportamentos alimentares saudáveis, salientando este como um factor determinante na intervenção e prevenção da obesidade, bem como de outras perturbações alimentares como a anorexia nervosa ou a bulimia, muitas vezes associadas à obesidade e às dietas restritivas (Berrocal et, al., 1997).

Exercício físico. O estudo pioneiro de Epstein, Wing, Koeske, e Valoski (1985) mostrou que os programas que promovem a prática de actividade física não programada (e.g., subir escadas, andar a ) apresentam resultados mais significativos comparativamente com os programas que incentivam o exercício físico programado (i.e., desporto). Os autores afirmam que a prática de desporto é dificultada pelo excesso de adiposidade das crianças e adolescentes com obesidade; por sua vez, a prática de actividade física não programada facilita pequenas e variadas mudanças comportamentais que podem ser mais facilmente implementadas na rotina diária de crianças e jovens, comparativamente com o exercício físico programado. Isto resulta geralmente numa maior adesão e envolvimento dos jovens nos programas, permitindo combater um dos frequentes obstáculos à intervenção - o elevado número de abandonos por parte dos jovens quando confrontados com a prática rígida e exigente de exercício físico (Berrocal et al., 1997). Os resultados da meta-análise de Stice et al., (2006) comprovam que, de facto, o exercício físico programado não se correlaciona significativamente com os efeitos da intervenção dos programas.

Características do Desenho e Apresentação do Programa No que respeita às características do desenho e apresentação do programa, destacam-se como factores moderadores dos efeitos dos programas de intervenção a forma de selecção dos participantes e o formato do programa.

Selecção dos participantes. A investigação sugere que os programas aplicados a indivíduos que decidem activa e voluntariamente participar na intervenção apresentam efeitos mais significativos comparativamente com os programas aplicados a uma população pré-seleccionada (e.g., numa escola). Stice et al., (2006) sugerem que, por serem os próprios indivíduos a tomarem a decisão voluntária de participar no programa, estes geralmente apresentam uma maior motivação para se envolverem na intervenção e seguirem as suas recomendações.

Formato do programa. Os programas de formato interactivo apresentam geralmente uma maior eficácia comparativamente com os programas de formato didáctico (Stice & Shaw, 2004; Stice, et al., 2006). A literatura sugere que os programas com formato interactivo, por envolverem exercícios que permitem a aplicação das aprendizagens, possibilitam o aperfeiçoamento das competências e potenciam a alteração dos comportamentos.

Em suma, os programas de intervenção na obesidade parecem ser mais eficazes quando têm como alvo a população adolescente e o sexo feminino; apresentam uma curta duração; promovem a educação e a aquisição de estratégias facilitadoras da mudança dos comportamentos; promovem comportamentos alimentares saudáveis em detrimento de dietas restritivas; estimulam a actividade física não programada em alternativa (ou complemento) ao desporto; a participação no programa é voluntária; e o programa apresenta um carácter interactivo.

INTERVIR NA OBESIDADE OU PROMOVER ESTILOS DE VIDA SAUDÁVEIS? Geralmente são consideradas três opções de tratamento nos casos de excesso de peso / obesidade: (a) alteração dos estilos de vida (i.e., programa alimentar, programa de actividade física e terapia comportamental); (b) farmacoterapia; e (c) cirurgia bariátrica.

A promoção de estilos de vida saudáveis é comummente considerada o primeiro passo no tratamento da obesidade e a intervenção mais adequada tendo em conta a relação custo - eficácia (Wing, 2002). Diversos estudos têm demonstrado a eficácia dos programas de promoção de estilos de vida saudáveis na manutenção do peso saudável a longo prazo e no tratamento de doenças comorbidas em adolescentes com obesidade. Estes mesmos estudos têm testemunhado igualmente os benefícios psicológicos da alteração dos estilos de vida (Wadden, Butryn, & Byrne, 2004; Wilfley et al., 2007).

A farmacoterapia e a cirurgia bariátrica não são actualmente recomendadas e nem consideradas formas seguras de tratamento da obesidade em crianças e adolescentes devido à fraca adesão destas populações aos regimes médicos ( Marston, 1970), às elevadas taxas de recaída (Lloyd, Wolff & Whelen, 1961) e aos seus efeitos secundários adversos no crescimento e desenvolvimento de crianças e adolescentes (Grollman, 1980; White, Cheek, & Haller, 1974).

A generalidade das revisões encontradas na literatura aponta para a prevenção da obesidade e a promoção de estilos de vida saudáveis como estratégias de intervenção mais realistas e benéficas para crianças e adolescentes (Lissau, Burniat, Poskitt, & Cole, 2002). Os esforços de promoção da saúde devem, entretanto, focar-se na população em geral, incidindo sobre todas as crianças e adolescentes, incluindo aqueles com peso saudável. Torna-se necessário o desenvolvimento de esforços de intervenção precoce no sentido de, não somente, prevenir a obesidade nestas populações, mas também e fundamentalmente, reduzir as taxas de prevalência da obesidade e das doenças comorbidas na população adulta a longo prazo.

PARA UMA INTERVENÇÃO EFICAZ: A INVESTIGAÇÃO FUTURA NECESSÁRIA As críticas que podem ser apontadas aos actuais programas de intervenção permitem informar o futuro desenvolvimento de novas intervenções. Seguidamente destacam-se alguns dos problemas encontrados nos programas de intervenção actuais, bem como directrizes para o futuro desenho de novos programas.

A Avaliação do Peso Na generalidade dos programas actuais é feita a avaliação regular do peso do adolescente para avaliar a perda de peso e, consequentemente, avaliar a eficácia do programa. No entanto, a ênfase colocada no peso do jovem pode desviar o foco desejável de qualquer programa do aumento da saúde pessoal para a preocupação com a perda de peso. Os programas devem reconhecer que a avaliação do peso e a sua comparação com as normas sociais pode potenciar o desenvolvimento de auto-percepções de anormalidade e ter um impacto negativo na auto-estima e no humor do adolescente. Desta forma, os programas devem considerar na avaliação dos resultados ambos, os benefícios físicos e psicológicos para a saúde do adolescente.

A Avaliação de Grupos de Indivíduos A maioria dos programas actuais avalia e compara o consumo de alimentos em grupos de indivíduos, desprezando as características individuais dos jovens (i.e., altura, composição corporal e nível de actividade física). Os programas futuros devem ter presente que a avaliação de grupos, não pode ocultar as diferenças individuais, mas também mostrar um padrão que é completamente diferente do padrão de comportamentos do adolescente em particular.

Utilização de Diferentes Técnicas e Valores de Referência Os actuais programas de intervenção utilizam geralmente diferentes técnicas na avaliação e diferentes valores de referência para a definição do excesso de peso e da obesidade. Isto torna difícil a comparação e a avaliação dos diferentes programas. Como forma de solucionar este problema, a investigação futura poderá beneficiar da adopção de padrões estandardizados de avaliação, bem como da utilização dos mesmos valores de referência para a definição das condições associadas ao peso.

A Mudança como Resultado do Desenvolvimento do Adolescente A generalidade dos programas actuais não tem em conta que as crianças e os adolescentes estão ainda em desenvolvimento, pelo que podem sofrer mudanças na composição corporal devido somente ao seu crescimento durante o período de intervenção, e não devido aos efeitos da intervenção do programa. Para controlar e avaliar os efeitos desta variável poderá ser necessário no futuro o desenvolvimento de estudos que incluam grupos de controlo.

A Avaliação dos Programas Na maioria dos programas actuais são contempladas somente duas avaliações do programa: antes e após a intervenção. No entanto, dadas as elevadas percentagens de recaídas encontradas nos programas torna-se indiscutível a necessidade de adoptar novas medidas e procedimentos de avaliação que contemplem a avaliação ao longo da intervenção e em sessões de follow-up.

Fernández-Ballesteros (1995) sugere que a avaliação faz parte do processo de intervenção dos programas e propõe que a mesma seja integrada como uma das sete fases do ciclo de intervenção: (a) Identificação do problema e das necessidades; (b) Planeamento dos objectivos e das metas; (c) Pré-avaliação, cursos de acção e selecção do que se considera mais adequado; (d) Desenho e configuração do programa; (e) Execução do programa; (f) Avaliação/valoração; (g) Tomada de decisão sobre o programa.

Fernández-Ballesteros (1995) considera que as diferentes fases do ciclo de intervenção devem ser sujeitas a diferentes tipos de avaliação, dos quais são derivados juízos valorativos (ver Tabela 1) [para mais informação aconselha-se a consulta da obra original de Fernández-Ballesteros (1995)].

Tabela 1 Ciclo de Intervenção, Formas de Avaliação e Juízos Valorativos (Fernández- Ballesteros, 1995)

Quanto ao processo de avaliação/valoração propriamente dito, Fernández- Ballesteros (1995) propõe seis fases: (a) Planeamento da avaliação; (b) Selecção das operações a observar; (c) Selecção do desenho da avaliação; (d) Recolha de informação; (e) Análise de dados; (f) Informação sobre a avaliação [para mais informação aconselha-se a consulta da obra original de Fernández- Ballesteros (1995)].

A investigação futura deverá integrar ainda avaliações de follow-up a longo prazo (e.g., meses ou anos após a intervenção), replicações dos programas, avaliações dos custos, da sustentabilidade e da capacidade de generalização dos programas. Isto permitirá compreender a eficácia dos programas e estabelecer o tipo de intervenção mais eficaz.

DISCUSSÃO Nas últimas décadas, a taxa de prevalência da obesidade entre crianças e adolescentes aumentou drasticamente por todo o mundo, tornando indiscutível a urgência de medidas interventivas para travar este problema de saúde pública que é considerado uma epidemia global pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 2007).

O presente artigo teve como principais objectivos dar a conhecer os principais resultados da literatura e da investigação actual sobre a elaboração de programas de intervenção e fornecer directrizes para a futura construção de novos programas.

Os modelos teóricos possibilitam a compreensão dos comportamentos e dos processos que promovem a mudança e a adopção de novos comportamentos. Por esta razão, o presente artigo começa por informar sobre as principais linhas teóricas que devem servir de base aos esforços de intervenção. Por outro lado, não os conhecimentos teóricos devem apoiar os esforços de intervenção, como também os resultados da investigação empírica efectuada devem contribuir para uma intervenção integradora dos pontos mais salientes e comprovados de eficácia e eficiência. Assim, este artigo apresenta uma descrição dos resultados de investigação sobre a validade dos modelos teóricos e dos factores preditores e moderadores dos efeitos de intervenção. Porém, alguns resultados de investigação são ainda hoje escassos e não conclusivos. Desta forma, a investigação continua a ser necessária para apurar a validade dos modelos teóricos actuais e proporcionar o desenvolvimento de novas teorias mais integrativas e compreensivas. O apoio empírico para o desenvolvimento de uma teoria mais integrativa irá permitir no futuro informar os esforços de intervenção, dotando-os de uma maior eficácia. Todavia, para que tal se torne possível, tem de ser unanimemente reconhecida a necessidade de fundamentar teórica e empiricamente os esforços de intervenção e, para além disto, reconhecida a necessidade de se proceder à avaliação dos programas. Muitos são os programas de intervenção actualmente existentes que não apresentam qualquer fundamento teórico e/ou empírico (ou, se o apresentam, não o tornam claro e explícito) e que não contemplam a sua avaliação. Isto tem resultado no atraso da investigação e no descrédito por parte da população em geral nos esforços de intervenção.

A procura de respostas para promover a mudança efectiva dos comportamentos associados ao estilo vida e a sua manutenção a longo prazo mantém-se ainda hoje uma fonte de curiosidade e frustração para clínicos e investigadores. Na literatura, um insuficiente número de estudos é identificado como tendo a qualidade metodológica necessária para potenciar recomendações ou afirmar com confiança quais as estratégias de intervenção que podem trazer resultados de sucesso a longo prazo no trabalho com crianças e adolescentes.

Nos diversos programas efectuados, os adolescentes com excesso de peso ou obesidade conseguem iniciar esforços para o controlo dos seus comportamentos e, com ajuda profissional, são capazes de manter os seus esforços e a perda de peso durante os vários meses de intervenção, demonstrando resultados positivos em diversos domínios, nomeadamente, médico, psicológico e social. Porém, geralmente não conseguem manter os resultados terapêuticos a longo prazo, para além da duração dos programas (Lobstein et al., 2004). Desta forma, a investigação futura terá de continuar a responder a questões como: Em que medida os comportamentos e os processos psicológicos envolvidos na mudança inicial diferem daqueles envolvidos na manutenção da mudança a longo prazo? E, como promover e assegurar a manutenção dos resultados terapêuticos a longo prazo para além da duração dos programas de intervenção? A generalidade das intervenções actuais apresenta um carácter correctivo, encorajando os indivíduos a alimentar-se correctamente. Isto envolve frequentemente colocar crianças e adolescentes num regime de dieta restritiva.

Porém, nos casos de excesso de peso e ou obesidade, a dieta pode conduzir a diversos problemas físicos e psicológicos, nomeadamente, peso inconstante, perturbações alimentares (e.g., anorexia nervosa, bulimia), depressão, diminuição da auto-estima, entre outros. Isto, aliado ao facto de a dieta restritiva não demonstrar ser uma estratégia eficaz para o sucesso dos programas de intervenção (Stice et al., 2006), revela a importância da promoção de comportamentos alimentares saudáveis (em detrimento da dieta restritiva), como uma possível forma de assegurar a manutenção dos resultados terapêuticos a longo prazo. Importa recordar que a promoção de hábitos alimentares saudáveis é também um factor determinante na prevenção de perturbações alimentares como a anorexia nervosa e a bulimia, comummente associadas a dietas inadequadas e à restrição alimentar (Berrocal et al., 1997).

Por outro lado, o facto de o exercício físico não se correlacionar de forma significativa com os efeitos de intervenção (Stice et al., 2006) revela também a necessidade de os programas recorrerem a outras estratégias alternativas ou complementares, como o incentivo à redução dos comportamentos sedentários e à prática de actividades físicas integradas na rotina diária, no sentido de proporcionar um balanço positivo de energia e facilitar a manutenção dos comportamentos saudáveis a longo prazo.

A promoção de estilos de vida saudáveis pode não ser suficiente nos casos de obesidade mórbida, no entanto, de entre os diversos tipos de intervenção (i.e., programas de promoção de estilos de vida saudáveis, famacoterapia e cirurgia bariátrica), ela é considerada a intervenção mais adequada tendo em conta os riscos para a saúde pediátrica e a relação custo - eficácia. Os programas de promoção de estilo de vida saudáveis possibilitam a intervenção nos casos em que a obesidade está instalada, mas permitem adicionalmente a prevenção em crianças e adolescentes saudáveis ou em risco de desenvolverem excesso de peso ou obesidade. A promoção de estilos de vida saudáveis é actualmente considerada fundamental para a prevenção da obesidade em crianças e jovens, mas também para a prevenção a longo prazo da obesidade na idade adulta.

O desenvolvimento de intervenções com grupos específicos tendo em conta o sexo, a cultura e o nível sócio-económico é uma área onde será necessária investigação futura. Recorde-se que a população adolescente de sexo feminino tende a mostrar-se mais receptiva às intervenções que têm como finalidade promover comportamentos alimentares saudáveis (Stice et al., 2006). Estes resultados apontam para a necessidade de serem desenvolvidas intervenções alternativas e específicas para a população adolescente de sexo masculino. Será a promoção do exercício físico e do desporto, em detrimento da promoção de comportamentos alimentares saudáveis, uma melhor estratégia para a intervenção com a população adolescente de sexo masculino? Existem culturas que demonstram elevadas taxas de prevalência de excesso de peso e obesidade quando comparadas com outras. Porém, muitas vezes nestas culturas não se reconhece a necessidade de intervenção, em parte porque que o excesso de peso e a obesidade estão associados a uma menor insatisfação corporal e estigmatização social (Duncan, Anton, Newton, & Perri, 2003).

Como poderiam ser então desenhados e apresentados programas para travar a obesidade nestas populações, de forma a motivar a mudança dos comportamentos? As crianças e os adolescentes de nível sócio-económico baixo deparam-se provavelmente com um maior número de obstáculos no acesso ao tratamento, o que dificulta a sua participação nos programas de intervenção (Hill & Peters, 1998). Como desenhar intervenções eficazes de baixo custo que possam chegar a estas crianças e estes adolescentes? O facto de a maioria dos adolescentes estar mais orientada para os benefícios imediatos de um estilo de vida em detrimento dos seus potenciais custos futuros pode tornar a intervenção junto desta população um verdadeiro desafio. De facto, os benefícios do comportamento de saúde apenas serão experienciados no futuro, enquanto os benefícios do consumo excessivo de alimentos e do comportamento sedentário ocorrem no presente. Para fazer frente a este desafio, os futuros programas poderão focar os aspectos relacionados com a saúde que são mais imediatos e relevantes para os adolescentes, como as associações entre o comportamento alimentar e o êxito no exercício físico, a boa aparência, ou condição física; desenvolver esforços para tornar as escolhas alimentares saudáveis mais acessíveis e atraentes; e ajudar os jovens a desenvolverem competências específicas (e.g., como comer um pequeno-almoço saudável quando o jovem está com pressa para ir para a escola).

Apesar de todas as directrizes que este artigo sugere como possíveis formas de intervenção futura, é irrealista esperar que a intervenção com crianças e adolescentes seja suficiente para fazer frente à interacção dos múltiplos factores que têm contribuído para as crescentes taxas de prevalência da obesidade pediátrica, nomeadamente os factores genéticos, ambientais, sociais, culturais, entre outros. Desta forma, as famílias, as escolas, os grupos comunitários e as políticas governamentais para a saúde devem, todos eles, dar um contributo para a criação de um ambiente favorável à mudança de estilos de vida. Embora os programas de promoção de estilos de vida saudáveis sejam necessários e talvez o único meio de inverter as taxas de prevalência da obesidade a curto prazo, serão necessárias políticas interventivas para assegurar a resolução eficaz deste problema de saúde pública a longo prazo. A obesidade deve ser uma prioridade para a investigação científica, mas também para o sistema nacional de saúde e para as acções políticas futuras.

Em suma, são ainda escassos os estudos sobre a intervenção na obesidade e muitas são as questões que se mantêm sem resposta. Com o objectivo de reforçar e impulsionar a continuação dos estudos nesta área, o presente artigo expôs as principais linhas teóricas que poderão servir de base aos futuros esforços de intervenção, apresentou os principais resultados da investigação actual, informou sobre os tipos de intervenção mais apropriados para crianças e adolescentes, ofereceu directrizes para a futura construção de novos programas mais eficazes e levantou algumas questões de investigação que se mantêm por responder e urgem em obter resposta...


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