Estudo cinético por TG e DSC da decomposição térmica de alguns adutos de
haletos de cádmio
ARTIGO
ESTUDO CINÉTICO POR TG E DSC DA DECOMPOSIÇÃO TÉRMICA DE ALGUNS ADUTOS DE
HALETOS DE CÁDMIO
KINETICAL STUDY BY TGA AND DSC DATA OF THE THERMAL DECOMPOSITION OF SOME
CADMIUM HALIDE ADDUCTS.By DSC data, the kinetical parameters Ea , n and A were
calculated for the thermal decomposition of the adducts CdCl2.2dmf, CdCl2.dmf
and CdBr2.dmf (dmf= dimethylformamide) by using Rogers and Smith method. The
found values were : Ea = 85, 176 and 101 kJ mol-1 , n= 0.23, 0.25, and 0.17, A=
2.40x109, 1.89x1019 and 1.07x109 respectively. By TGA data, the kinetical
patameters for the thermal decomposition of the adduct CdCl2.1,5 dmeu
(dmeu=dimethylethyleneurea) were calculated by using five different methods.
Keywords : thermal decomposition; kinetical parameters; cadmium adducts.
INTRODUÇÃO
A dimetilformamida (dmf) é a mais simples das amidas N- substituidas e, devido
às suas características, é uma das amidas mais utilizadas como solvente em
processos industriais e no laboratório1. A dimetiletilenouréia (dmeu),
diferentemente da etilenouréia da qual é derivada, é liquída à temperatura
ambiente, chegando a ser utilizada como solvente em sínteses ou estudos
espectroscópicos2,3.
O estudo cinético da termodecomposição de sólidos pode ser efetuado utilizando-
se dados de TG, DTA ou DSC4. Comumente, este tipo de estudo é aplicado à
desidratação de sais, decomposição de polímeros, explosivos e compostos de
coordenação.
Neste trabalho analisa-se, do ponto de vista cinético, a decomposição térmica
dos adutos CdCl2. 2dmf, CdCl2.dmf e CdBr2.dmf5,6, através de dados de DSC,
utilizando-se o método de Rogers e Smith7 e, através de dados de
termogravimetria, estuda-se cineticamente a decomposição do aduto
CdCl2.1,5dmeu8 utilizando-se os métodos de Coats-Redfern9, Freeman10,
Horovitz11, Blazejowski12 e Zsakó13.
O principal objetivo do presente trabalho é correlacionar, de forma a mais
precisa possível, os parâmetros cinéticos calculados(Ea = energia de ativação,
n= ordem de reação e A= fator pré-exponencial) com as características
estruturais dos compostos estudados, tentando-se dar a estes termos um
significado físico adequado quando os aplicamos à termodecomposição de
compostos de coordenação. São propostas hipóteses que, pretendemos, sejam
objeto de estudo em trabalhos mais extensos e minuciosos a serem realizados
posteriormente.
PARTE EXPERIMENTAL
Síntese e Análise Elementar dos Compostos
O aduto CdCl2.2 dmf foi sintetizado pela dissolução de 1,8g de CdCl2 em 15 cm3
de dmf. A solução produzida foi colocada em banho de gelo e deixada em agitação
por uma hora, sendo o excesso de ligante removido posteriormente por evaporação
a vácuo, sendo que, durante a evaporação, o aduto forma aglomerados que
dificultam a secagem, que se completa apenas após 20 h.
O CdCl2.dmf foi obtido pela dissolução de 1,8 g de CdCl2 em 1,2-dicloroetano
sendo em seguida adicionados a esta solução 0,72 g de dmf, deixando-se a
mistura resultante em agitação por quatro horas. Durante o período de agitação,
houve a formação de precipitado que foi filtrado em placa porosa, lavado três
vezes com éter etílico e seco a vácuo.
O CdBr2.dmf foi preparado pela dissolução de 2,0g de CdBr2 em 15 cm3 de dmf
deixando-se a solução em agitação por duas horas. Em seguida, adicionou-se éter
etílico à solução, o que promoveu a precipitação do aduto, que foi então
filtrado em placa porosa e seco a vácuo.
O CdCl2. 1,5 dmeu foi obtido misturando-se 1,5g de CdCl2 a 15 cm3 de dmeu,
deixando-se a mistura em agitação por 24 h. O aduto formado foi lavado com éter
etílico e seco a vácuo.
Para todos os adutos, a determinação dos teores de metal foi efetuada por
titulação complexométrica com EDTA e a determinação de haletos, por titulação
potenciométrica com AgNO314.
Para os adutos com dmf, os teores de nitrogênio foram determinados pelo método
de Kjeldahl14. Para o aduto com dmeu, os teores de C, N e O foram determinados
em microanalisador do IQ da USP.
Aparelhagem
As curvas DSC a partir das quais os parâmetros cinéticos foram calculados para
os compostos com dmf, foram obtidas em um DSC da Perkin -Elmer, com uma taxa de
aquecimento de 4,2 x 10-2 K s-1. A curva TG para o CdCl2. 1,5 dmeu foi obtida
num TGA-7 da Perkin-Elmer em atmosfera de N2 à 0,16 K s-1_.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
1) CdCl2. 2dmf, CdCl2.dmf e CdBr2.dmf
Analisando-se as curvas termograviméticas obtidas5,6, verifica-se que para os
três compostos, a decomposição térmica inicia-se pela saída dos ligantes,
ocorrendo em seguida a sublimação do haleto. Para o CdCl2.2dmf, a perda dos
ligantes acontece em duas etapas, uma para cada ligante :
CdCl2. 2 dmf (s) = CdCl2.dmf *(s) + dmf (g)
CdCl2.dmf *(s) = CdCl2 (s) + dmf (g)
Os parâmetros cinéticos calculados são apresentados na tabela_1:
Provavelmente, a etapa determinante na decomposição térmica desses compostos,
seja a ruptura da ligação metal-ligante. Sendo assim, é de se esperar que
exista algum tipo de relação numérica entre Ea e D(M-O) (entalpia de ligação
metal-oxigênio). As entalpias de ligação metal-oxigênio para CdCl2. 2dmf,
CdCl2.dmf e CdBr2.dmf são de 135, 208 e 187 kJ mol-1 respectivamente4,5,
mostrando que Ea e D(M-O) aumentam paralelamente.
O fato de n e A serem diferentes para CdCl2.dmf e CdCl2.dmf*, indica que o modo
de preparação do composto certamente é também fator determinante em sua
cinética de decomposição, provavelmente devido a diferenças de natureza
estrutural, seja a nível molecular ou em termos de forma e compactação dos
grãos formados. Vale a pena perceber que, assim como n e A, a temperatura do
início da degradação térmica ti também é maior para o CdCl2.dmf*.
Comparando-se os valores de A para o CdCl2.dmf e o CdBr2.dmf, constata-se uma
diferença muito significativa, que não pode ser explicada simplesmente em
função de possíveis diferenças estruturais, uma vez que os difratogramas de
raios X (método do pó) sugerem serem estes compostos isomorfos5. A explicação
pode talvez ser encontrada nas diferentes vias de síntese utilizadas para os
dois compostos5,6, o que pode ter determinado diferenças nos tamanhos e
formatos dos grãos produzidos, alterando assim sua área superficial, o que
certamente influencia a cinética de decomposição. Assim, os valores de A, ao
menos para a cinética de termodecomposição de compostos de coordenação, parecem
se relacionar com o que se poderia chamar de macroestrutura dos compostos, ou
seja, as características morfológicas dos grãos formados.
2) CdCl2.1,5 dmeu
Pelo fato da curva DSC obtida não ser bem definida, optou-se por efetuar o
cálculo dos parâmetros cinéticos para este composto, utilizando-se os dados de
termogravimetria8.
O composto degrada-se térmicamente em duas etapas:
1ª) CdCl2.1,5 dmeu (s) = CdCl2. dmeu (s) + 1/2 dmeu (g)
2ª) CdCl2.dmeu (s) = CdCl2 (s) + dmeu (g)
Os cálculos foram efetuados utilizando-se programas em linguagem Basic,
desenvolvidos por H. S. Júnior (Tabela_2).
Percebe-se que, de um modo geral, os valores de Ea , n e A obtidos através dos
cinco métodos utilizados, concordam entre si, dentro de um limite tolerável.
Os valores obtidos para a segunda etapa da degradação térmica, assemelham-se
aos encontrados para os compostos com dmf que apresentam mesma estequiometria
que o intermediário CdCl2. dmeu (que não chegou a ser sintetizado), indicando
que a geometria dos compostos constitui-se em fator determinante para a
cinética de decomposição. O fato dos valores de Ea, n e A serem bastante
maiores para a primeira etapa que para a segunda, parece confirmar esta
hipótese.
Em face dos elevados valores de A, deve-se esperar que a primeira etapa de
decomposição seja mais rápida que a segunda, o que pode ser realmente
constatado analisando-se a curva TG.
Novamente, elevados valores de A, parecem relacionar-se à morfologia dos grãos
do composto, ficando implícito que, quanto mais finamente divididos forem os
grãos (quanto maior a área superficial), maiores serão os valores de A.
Uma vez que a dmeu é um ligante monodentado, e não bi ou polidentado, a
existência de uma estequiometria fracionária pode ser explicada como
consequência da polimerização do composto. Uma vez que os valores de n são de
duas a três vezes maiores para a primeira etapa, a existência de um elevado
valor para n, parece associar-se de alguma forma à presença de uma geometria
irregular para o composto, e não apenas à presença de um número maior de
ligantes (veja-se por exemplo o valor de n para o CdCl2. 2dmf).
Uma vez que os valores de Ea são muito elevados para a primeira etapa, em
relação a uma entalpia de ligação metal-oxigênio relativamente baixa (154,9 kJ
mol-1)8 para este composto, diferentemente dos compostos com dmf, grande parte
do valor de Ea parece estar comprometido com outros processos além da ruptura
da ligação metal-ligante, como difusão do produto gasoso formado através do
composto sólido remanescente, dessorção do produto gasoso formado da superfície
do composto sólido remanescente, e rearranjos de natureza estrutural, quer da
micro ou da macro estrutura do composto sólido.