Filmes de óxidos anódicos de nióbio: efeito eletrocrômico e cinética da reação
de eletro-intercalação
onde tem-se que 3£x£5.
Utilizando-se as Leis de Fick, foram obtidas equações que permitiram realizar
um ajuste nos dados experimentais das medidas de cronoamperometria e de
absorbância, fornecendo um coeficiente médio de difusão e a constante de tempo
de reação para cada óxido.
Medidas ópticas e eletroquímicas foram realizadas para caracterizar a mudança
reversível de cor gerada na intercalação e a cor iridescente apresentada por
cada filme de óxido de nióbio, como resultado do cruzamento de ondas
eletromagnéticas.
PARTE EXPERIMENTAL
Na polarização potenciostática AC utilizada para o crescimento dos filmes6, a
anodização se dava pelo uso de um transformador de tensão elétrica ao qual se
conectava um eletrodo de platina, como catodo e o eletrodo de nióbio, como
anodo. Ambos eram imersos em solução aquosa 0,5M de H2SO4, contida em uma
célula eletroquímica. A aplicação de uma potencial (Ef) aos eletrodos, por
aproximadamente 30s, possibilitava a obtenção imediata de filmes de óxido de
nióbio com larga diversificação de cores iridescentes. Esses filmes se
mostraram uniformes em toda a sua superfície, com destaque para a homogeneidade
das cores neles presentes. A espessura L de cada filme, dependente da voltagem
no seu crescimento, foi calculada tendo como base resultados frequentemente
citados na literatura7-9, onde a razão de crescimento é igual a 2,3nm V-1.
As medidas voltamétricas, potenciostáticas e cronoamperométricas foram
realizadas em um sistema EG&G PAR 273 conectado a um computador 386 e
fazendo-se uso do software M270. Os espectros e as medidas de refletância, R,
em comprimento de onda constante, foram obtidas introduzindo-se a célula
eletroquímica em um sistema de espelhos no caminho do feixe de luz de um
espectrofotômetro de feixe duplo (U-3210 HITACHI). Os espectros normalizados
(DR) foram gerados a partir de espectros medidos de Nb/óxido/eletrólito (R) e
do referência Nb/eletrólito (Ro) e de acordo com a seguinte relação:
(2)
Os valores de absorbância foram calculados através da relação A=-log (DR).
O eletrodo de trabalho foi construído a partir de um cilindro de nióbio
metálico da Johnson Matthey Co., com 99,99% de pureza e área geométrica de 0,2
cm2. Embutiu-se o nióbio em um tubo de Teflon para evitar a distribuição não
homogênea de corrente e o contato elétrico foi feito por meio de uma haste de
latão. Antes da anodização, o nióbio era polido com lixa granulação 600, 1000
1500 e 2000, até a obtenção de uma superfície especular e em seguida lavado com
água Milli-Q. Como eletrodo de quase-referência utilizou-se um fio de prata
imerso na solução eletrolítica. O eletrólito utilizado foi uma solução 0,5 M de
de perclorato de lítio dissolvido em carbonato de propileno e como eletrodo
auxiliar, uma placa de platina. Todos os potenciais estão referidos ao eletrodo
de quase-referência utilizado.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Entre os filmes com diferente cor iridescente resultante da anodização do
nióbio, selecionou-se para este trabalho o de cor marron com L=23nm, crescido a
10V, o de cor azul com L=57,5nm, crescido a 25V e o de cor rosa com L=115nm,
crescido a 50V.
Refletância espectral
Nos experimentos de refletância espectral analisa-se as modificações ocorridas
nos filmes coloridos de óxido de Nb2O5 submetidos à aplicação de potenciais nos
quais reações de intercalação geram diferentes estados de coloração.
Os espectros foram obtidos mediante a aplicação de potenciais no intervalo de
coloração dos óxidos, de -0,6V a -3,0V, e também no processo inverso, de -3,0V
a -0,6V, onde ocorria a deintercalação causando o seu retorno à cor
iridescente. Cada medição era feita apenas após o estado estacionário ter sido
alcançado, ou seja, quando a refletância se mantinha constante, em função do
tempo, no comprimento de onda de l= 500nm. Obtinha-se, então, a carga total
envolvida no processo.
Medidas de refletância espectral estão mostradas na figura_1 para o filme de
óxido crescido a 50V. No espectro inicial obtido sem aplicação de potencial,
com o circuito aberto, a causa da variação observada na refletância com o
comprimento de onda se deve basicamente à absorção característica da cor
original apresentada por cada filme de óxido. Dessa maneira, a medição feita
com o circuito aberto, c.a., possibilitou a caracterização da cor aparente dos
óxidos, que é o complemento da cor no espectro óptico correspondente ao
comprimento de onda onde a absorção é mais intensa10. Na figura_1 os espectros
mostram que para o óxido crescido a 50V maior absorção ocorre em
aproximadamente 490nm, região do azul turquesa (487-493nm), resultando na cor
rosa apresentada pelo óxido. Como espectros similares foram obtidos nos
processos de coloração/descoloração para todos os óxidos em estudos, esse
experimento revela também a reversibilidade da reação de eletrointercalação.
O emprego da Lei de Beer a dados experimentais gerados em medidas de
refletância espectral, possibilita a determinação do coeficiente de absorção
molar, e, e da eficiência eletrocrômica, h, parâmetros importantes utilizados
na comparação de distintos materiais eletrocrômicos. Em sua formulação
matemática expressa em (3),
<formula/> (3)
o coeficiente de absorção molar é dado em cm2mol-1, L corresponde ao
comprimento do percurso óptico em cm, ou seja, à espessura dos filmes e C é a
concentração da espécie absorvente em molcm-3.
Sabendo-se que a carga total q envolvida no processo eletrocrômico pode ser
dada por:
<formula/> (4)
onde n é o número de mols, z é o número de elétrons transferidos na reação
eletroquímica, F=96 500 Cmol-1 é a constante de Faraday e q é a densidade de
carga, o termo q(zF)-1 equivalente a LC, ambos em molcm-2, é introduzido na
equação de Beer (3), resultando na seguinte equação:
<formula/> (5)
onde o e(zF)-1 é a denominada eficiência eletrocrômica, h.
Nas medidas de refletância espectral, visando-se obter valores do coeficiente
de absorção molar, e, para os vários óxidos, fixou-se o comprimento de onda em
l=780nm el=500nm. Com os valores correspondentes da carga no intervalo de
potencial aplicado foram construídos gráficos de A vs q e através do
coeficiente angular das retas representativas do processo de oxidação e redução
de cada filme, determinou-se o e. Foi observado um desvio da linearidade
presente nos processos catódicos, devido à ocorrência da reação de decomposição
do carbonato de propileno. Por esse motivo, nos gráficos presentes na figura_2
só estão representados os processos anódicos, considerando-se l= 780 nm. Como o
fenômeno da iridescência confere a cada óxido uma cor original, ao considerar-
se dados de absorbância diretamente de dados de refletância, apenas são obtidos
valores de e aparentes. No entanto, embora não sejam coeficientes reais de
absorção molar, é correto o uso dessa aproximação na análise da cinética do
processo de eletrointercalação, como será visto mais adiante.
Considerando-se z=1, foram obtidos, em l=780nm, os seguintes valores de h e e:
para L=23nm: h=50 cm2C-1 e eAP=4,8 x106cm2mol-1; para L=57,5nm: h=18 cm2C-1 e
eAP=1,7 x106cm2mol-1 e, finalmente, para L=115nm: h=25 cm2C-1 e eAP=2,4
x106cm2mol-1. As diferenças observadas nos valores obtidos mostram que óxidos
de nióbio preparados eletroquímicamente crescem com distinta cor iridescente,
fato que lhes concede características físico-químicas e consequentemente h e e
próprios. Em geral os valores mostraram-se superiores aos apresentados por
filmes de óxidos de nióbio crescidos pela técnica de sputtering11, similares
aos obtidos para os filmes preparados pelo método sol-gel12 e inferiores aos
filmes crescidos por deposição química à vapor13. A diferença observada nos
valores deh e e deve-se as estruturas diferentes deles, fato que influe
drásticamente no transporte de carga e massa no filme.
Cronoamperometria
Esse experimento realizou-se com o objetivo de investigar a cinética das
reações eletroquímicas e de mudança de cor e serviu como base para a elaboração
do modelo teórico proposto.
Nas figuras_3, 4 e 5 são mostrados cronoamperogramas com sinais simultâneos de
corrente e absorbância em l=780nm, para os filmes de 10V, 25V e 50V
respectivamente. Os sinais foram obtidos fixando-se o potencial inicial em -
0,6V e variando-se o potencial final Ea, de -1,0V a -3,0V, retornando-se em
seguida ao valor inicial de -0,6V. Observa-se que imediatamente após a
aplicação do potencial mais negativo do que o potencial inicial, a reação de
intercalação de Li+, simultânea à redução do óxido, gera a sua cor
eletrocrômica causando, desse modo, o aumento no sinal de absorbância. No
processo inverso, uma grande corrente anódica decorrente da aplicação do
potencial inicial de -0,6V, induz a descoloração do óxido. Caso tivesse sido
adotado um maior tempo de reação, o retorno do sinal de absorbância ao seu
valor inicial teria sido observado em todos os óxidos.
A cor iridescente dos óxidos em estudo é a responsável pelos distintos sinais
de absorbância por eles apresentados em decorrência da sua cor original
depender da espessura dos filmes. Desse modo, pelo fato de que eles possuem um
coeficiente de absorção molar que é aparente devido à influência do fenômeno de
interferência, estabelecer um vínculo entre a espessura e o comportamento da
absorbância dos óxidos não é possível.
Assim como nas medidas de refletância espectral, as medidas de
cronoamperometria mostram que a reação eletrocrômica presente nos óxidos é
reversível no intervalo de potencial em estudo. Fundamentalmente são as medidas
de absorbância que mostram com clareza a reversibilidade do processo, já que é
possível recuperar completamente a cor original do filme de óxido depois de um
ciclo de oxidação/redução.
Cinética da eletrointercalação
O modelo proposto para o estudo da cinética do processo de eletrointercalação
de íons Li+ nos óxidos de nióbio desenvolveu-se com base em um sistema
constituido por fases distintas: substrato condutor de elétrons, filme de óxido
de nióbio condutor misto e eletrólito condutor de íons14. Desse modo, duas
interfases o compõe: a interfase filme/eletrólito impermeável a elétrons e
permeável a íons e a interfase substrato/filme, impermeável a íons e permeável
a elétrons.
Considerando-se que o coeficiente de difusão das espécies Li+sol. no eletrólito
(DLi+sol@10-5cm2s-1)15 é 5 ordens de grandeza maior do que no interior do filme
de óxido (DLi+filme @ 10-10 cm2s-1)16, e portanto pode-se ignorar o transporte
de massa no eletrólito. Também supondo-se que a incorporação das espécies Li+
no filme é rápida devido ao forte campo elétrico presente na interfase filme/
eletrólito, campo elétrico que decorre do caráter semicondutor apresentado
pelos óxidos de nióbio e surge da geração de uma camada de acumulação de
elétrons, quando os óxidos são polarizados em potenciais mais negativos do que
o seu potencial de banda plana17. No interior do filme, a difusão e migração
dos elétrons até a interface óxido-eletrólito é mais rápida do que a difusão/
migração de Li+. Portanto, há a formação do par iônico (Li+ e-) na interface
óxido-eletrólito, originando um gradiente de concentração que possibilita a sua
difusão através do óxido. Baseando-se nas suposições acima, a finalização do
processo ocorre quando o par iônico encontra sítios Nb+2x e a reação de redução
origina a formação de sítios Nb(+2x-1) capazes de absorver luz na região
visível.
O processo de eletrointercalação pôde, então, ser descrito pelas leis de Fick:
<formula/> (6)
onde D é o coeficiente de difusão (em cm2s-1), C é a concentração de
intercalante (em molcm-3), J é o fluxo (em molcm-2s-1) e x é a posição (em cm).
Supondo que na interface filme/eletrólito a concentração da espécie
intercalante C, é igual à concentração máxima de Nb(2x-1) e também que o
gradiente de concentração na interfase substrato/filme é zero, as condições de
contorno foram expressas da seguinte maneira:
<formula/> (7)
Pelo princípio da eletroneutralidade, a relação estabelecida entre fluxo e
densidade de corrente resulta em:
<formula/> (8)
Dadas as condições de contorno acima, a solução para as equações de Fick,
aplicadas em um meio plano e finito18, é dada por:
<formula/> (9)
Com o intuito de mostrar os perfis de concentração do par iônico no filme
(equação 9), considerando-se o óxido crescido em 10V, com L=23nm, e supondo-se
um coeficiente de difusão D= 10-13cm2s-1, para distintos tempos de polarização
t, a equação (9) fornece as curvas representadas na figura_6. Estas curvas
mostram que para tempos curtos não ocorre difusão do Li+ em grande extensão do
óxido. Tempos longos possibilitam uma maior penetração dos íons Li+, tornando a
concentração Co uniforme em toda a sua espessura.
Derivando-se a equação (9) em relação a x e substituindo-a na equação (8),
obtem-se:
<formula/> (10)
Integrando a expressão acima em função do tempo, a seguinte expressão de
densidade de carga é obtida:
<formula/> (11)
Substituindo-se (11) na equação (5) tem-se a expressão para a absorbância:
<formula/> (12)
Aplicando-se as equações (10) e (12) no ajuste dos dados experimentais, as
curvas de absorbância versustempo e corrente versus tempo foram reproduzidas e
estão mostradas para os óxidos em estudo na figura_7. O ajuste melhor no caso
das medidas de absorbância que no caso da corrente é devido fundamentalmente ao
fato da absorbância estar exclusivamente relacionada ao fenômeno eletrocrômico.
A corrente, fundamentalmente a tempos maiores onde ela é bastante pequena,
também está relacionada com reações paralelas. Por este fato é que os valores
experimentais são maiores que o melhor ajuste obtido. Dos seguintes parâmetros
ajustados: (zDF2Co/L2); (8CoLe/p2) e (D/L2), utilizou-se apenas o último na
determinação dos coeficientes de difusão D. Os distintos potenciais e
espessuras geraram um coeficiente de difusão médio, D=(7±4)x10-13 cm2s-1, que
está de acordo com o esperado para difusão em óxidos. O tempo característico de
reação, necessário para a total mudança de cor resultante da reação
eletrocrômica nos óxidos L2/D, demonstra proporcionalidade direta com a
espessura dos óxidos: 8s (L=23nm); 35s (L=57,5nm) e 190s (L=115nm).
CONCLUSÕES
A utilização da polarização potenciostática possibilitou a obtenção de filmes
de óxido de nióbio com cor iridescente homogênea e espessura característica do
potencial aplicado no seu crescimento. Esta cor foi confirmada no espectro
óptico obtido nas medidas de refletância espectral. A transformação da cor
iridescente à cor eletrocrômica, resultante do processo de intercalação do Li+,
e a sua descoloração na deintercalação pôde ser observada em todas as medidas
eletroquímicas realizadas neste trabalho e mostra a reversibilidade do
processo.
Em geral, o modelo proposto fornece uma descrição razoável e coerente com os
resultados experimentais. Dessa maneira pode-se afirmar que os resultados
obtidos mostram um mecanismo de mudança de cor associado à redução de íons Nb+5
a Nb+4 com simultânea injeção de cátions, tendo por finalidade compensar a
carga no interior do filme, como suposto inicialmente.