Espécies e flutuação populacional de cigarrinhas em viveiro de citros, no
município de Mogi-Guaçu-SP
ESPÉCIES E FLUTUAÇÃO POPULACIONAL DE CIGARRINHAS EM VIVEIRO DE CITROS, NO
MUNICÍPIO DE MOGI-GUAÇU-SP
1
INTRODUÇÃO
No final dos anos 80, foi relatada, nas regiões Norte e Noroeste do Estado de
São Paulo, a Clorose Variegada dos Citros (CVC), que se tornou uma das mais
sérias e preocupantes doenças das plantas cítricas (Rossetti et al., 1990). A
CVC disseminou-se rapidamente pelas regiões produtoras de citros, sendo hoje
encontrada nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná,
Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás, Distrito Federal, Bahia, Sergipe e Pará
(Rossetti et al., 1997).
O agente causal da CVC é a bactéria limitada ao xilema, Xylella fastidiosa
(Chang et al., 1993; Lee et al., 1993; Hartung et al., 1994). Esta bactéria
provoca doenças em várias culturas, tais como videira, amendoeira, alfafa,
pessegueiro, pereira, cerejeira e outras, sendo transmitida por insetos vetores
(Carlos et al., 1997). O patógeno da CVC pode ser transmitido através de
borbulhas contaminadas (Jacomino et al., 1993) ou por insetos vetores das
famílias Cicadellidae, subfamília Cicadellinae, que se alimentam nos vasos do
xilema das plantas (Lopes, 1996; Gravena et al., 1997). Dentre as diversas
espécies de cigarrinhas que ocorrem em citros, comprovou-se que Dilobopterus
costalimai Young, Acrogonia sp., Oncometopia facialis (Signoret) (Roberto et
al., 1996; Lopes et al., 1996), Bucephalogonia xanthophis (Berg), Plesiommata
corniculata Young (Krügner et al., 1998), Acrogonia virescens (Metcalf),
Ferrariana trivittata(Signoret), Homalodisca ignorata Melichar, Macugonalia
leucomelas (Walker), Parathona gratiosa(Blanchard) e Sonesimia grossa
(Signoret) (Descobertos, 1999) são vetores de X. fastidiosa.
Uma das estratégias adotadas para o manejo da CVC é o controle químico dos
vetores, inclusive na formação da muda, quando esta se encontra nos viveiros.
Nessa condição, Garcia Júnior et al. (1997) realizaram levantamento das
cigarrinhas D. costalimai, Acrogonia terminalis Young e O. facialis,
constatando que seus níveis populacionais aumentaram a partir de dezembro,
início do verão, permanecendo altos nesta estação e no outono, e diminuindo na
primavera e inverno. Em viveiro localizado em Gavião Peixoto, região central do
Estado de São Paulo, Roberto et al. (2000) observaram que a espécie B.
xanthophis foi a mais abundante. Também foram capturadas as espécies M.
leucomelas, Dechacona missionumBerg,F. trivittata, Hortensia similis(Walker),
Acrogoniasp. e P. corniculata. As cigarrinhas ocorreram durante todo o período
de permanência das mudas no campo e foram capturadas tanto na periferia como no
centro do viveiro e na vegetação adjacente.
A ocorrência de cigarrinhas em viveiro de mudas cítricas faz com que aumente as
chances de contaminação das mudas pela bactéria X. fastidiosa. Identificar as
espécies, a dinâmica populacional e a abundância durante o processo de produção
de mudas é importante para o manejo de cicadelídeos em viveiro e para a
consolidação do processo de produção das mudas em ambiente protegido. Visando a
identificar as espécies de cicadelídeos de ocorrência em viveiro cítrico e sua
flutuação populacional, foi realizado o presente trabalho.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi realizado em viveiro a céu aberto, localizado no município de
Mogi-Guaçu - SP, com irrigação via aspersão. As avaliações iniciaram-se um mês
após o plantio dos cavalinhos, da variedade limão-'Cravo' (Citrus limonia
Osbeck) e estendeu-se até a retirada das mudas. O plantio do porta-enxerto foi
realizado em fevereiro de 1997, e a enxertia da variedade copa 'Pêra' (Citrus
sinensis [L.] Osbeck) foi realizada em julho de 1997, oriunda da borbulheira do
Centro de Citricultura Sylvio Moreira/IAC ' Cordeirópolis-SP. O arranquio das
mudas deu-se no mês de março de 1998.
A incidência e flutuação populacional de cigarrinhas foram avaliadas por
amostragens quinzenais. Utilizaram-se armadilhas adesivas amarelas Stiky Strip
(Olson Products Inc., Ohio, EUA), com dimensões de 7,6 x 12,7 cm. Foram
distribuídas, uniformemente, 48 armadilhas no viveiro, sendo 28 em toda a
periferia do talhão e 20 na área central. As armadilhas foram dispostas em
suporte de ferro na altura das plantas e, conforme essas cresciam, as
armadilhas também eram remanejadas para estarem na altura máxima das mudas.
Para conhecer a dinâmica populacional de cigarrinhas da mata para o viveiro,
foram colocadas 5 armadilhas adesivas amarelas na periferia do viveiro,
adjacente à mata, espaçadas a cada 5 metros, penduradas em cerca de arame, a um
altura de aproximadamente 1,5 m.
Contou-se o número de cigarrinhas presas à superfície da armadilha, nas duas
faces, separadas pela espécie. A freqüência de avaliação foi quinzenal;
contudo, a troca das armadilhas foi realizada mensalmente. As avaliações
iniciaram-se em março de 1997 e estenderam-se até março de 1998, totalizando 25
avaliações.
Para se determinar os períodos de maior atividade das espécies no viveiro,
foram calculados, a partir dos dados mensais de coleta, os valores médios de
cigarrinhas capturadas nas diferentes estações do ano: verão (dezembro, janeiro
e fevereiro), outono (março, abril e maio), inverno (junho, julho e agosto) e
primavera (setembro, outubro e novembro).
A partir dos dados de captura, efetuou-se também a comparação das espécies de
cigarrinhas através da porcentagem de ocorrência da espécie nas amostragens
mensais, ou seja, pela constância observada a cada ano de avaliação. Em função
dos resultados obtidos, as espécies foram distribuídas nas categorias
constante, acessória e acidental, de acordo com a classificação de Bodenheimer,
citado por Dajoz (1973) e Busoli (1979). A freqüência de cigarrinhas foi
estimada pela participação percentual do número de indivíduos dentro da
subfamília Cicadellinae.
Durante todo o período de avaliação, realizou-se o controle químico das
cigarrinhas em intervalo de aplicação de aproximadamente 7 a 10 dias. Foram
realizadas tanto aplicação com pulverizador tratorizado de arrasto como através
de pulverização aérea. Os produtos empregados foram escolhidos a critério do
Engenheiro Agrônomo responsável pelo viveiro e encontram-se listados na Tabela
1.
Devido à importância de cigarrinhas da subfamília Cicadellinae, que engloba a
maioria dos vetores de X. fastidiosa nas diversas culturas em que causa doença,
analisaram-se somente os dados de espécies desta subfamília de Cicadellidae, e
devido ao fato de as espécies da tribo Cicadellini serem consideradas vetores
mais eficientes que Proconiini, realizou-se a análise separadamente.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No período em que foi realizado o levantamento populacional, foram capturadas,
na área do viveiro, 14 espécies de cigarrinhas da família Cicadellidae,
subfamília Cicadellinae, sendo 10 espécies pertencentes à tribo Cicadellini e 4
espécies à tribo Proconiini (Tabela_2). Dentre as espécies comprovadamente
vetoras de X. fastidiosa (Roberto et al., 1996; Lopes et al., 1996; Krügner et
al., 1998; Descobertos, 1999), capturaram-se B. xanthophis, F. trivittata, M.
leucomelas, P. corniculata, Acrogonia sp. e O. facialis.
Considerando-se espécies da subfamília Cicadellinae, as mais freqüentes foram
B. xanthophise Acrogoniasp. (Tabela_2), sendo respectivamente as mais
freqüentes das tribos Cicadellini e Proconiini (Figura_1). A freqüência das
espécies B. xanthophis eAcrogonia sp., juntas, foi de 69,4%, enquanto a das
demais espécies vetoras de X. fastidiosa (D. costalimai,F. trivittata, M.
leucomelas, P. corniculata, S. grossa eO. facialis), juntas, foi de 19,3% e a
das outras espécies da família Cicadellidae foi de 11,3% (Tabela_2). Roberto et
al. (2000) constataram que B. xanthophisfoi a espécie mais comum durante todo o
processo de formação da muda em viveiro localizado em Gavião Peixoto-SP,
representando 92,3% do total de cigarrinhas capturadas.
As espécies B. xanthophis eAcrogoniasp.foram de ocorrência constante no
viveiro, S. grossa foi de ocorrência acessória e as demais espécies de
ocorrência acidental, inclusive as espécies D. costalimai e O. facialis,mais
comuns em pomares em produção (Paiva et al., 1998; Roberto & Yamamoto,
1998). Roberto (1998) constatou que, em laranjeira em produção, as espécies
Acrogoniasp., D. costalimai e O. facialis, nos anos de 1995 e 1996, foram de
ocorrência constante em pomares das regiões Norte, Noroeste e Centro do Estado
de São Paulo; entretanto, na região Sul, as espécies Acrogoniasp. e D.
costalimai foram de ocorrência acessória e O. facialis de ocorrência acidental.
Neste mesmo trabalho, o autor constatou, nos anos de 1997 e 1998, que todas as
três espécies foram constantes nos pomares das 4 regiões estudadas.
Na periferia da mata capturaram-se 3 espécies da tribo Cicadellini (B.
xanthophis, D. costalimai e P. corniculata) e 2 da tribo Proconiini
(Acrogoniasp. e O. facialis) (Tabela_2). Todas as espécies capturadas na
periferia da mata foram de ocorrência acidental. A freqüência foi de 38,8;
27,8; 16,7; 11,1 e 5,6 %, respectivamente, para D. costalimai, Acrogonia sp.,
O. facialis, B. xanthophis e P. corniculata. A espécie D. costalimaifoi
capturada em maior número na periferia da mata que no viveiro, enquanto
Acrogonia sp. e B. xanthophisforam capturadas em maior número no viveiro.
As espécies da subfamília Cicadellinae foram capturadas no viveiro, durante
todo o período de coleta, com exceção da primeira quinzena de setembro (Figura
2). Ocorreram três picos populacionais, um na primeira quinzena de maio, um
outro na primeira quinzena de junho e um terceiro na primeira quinzena de
dezembro. Na periferia da mata, ocorreram também três picos populacionais, o
primeiro em abril/maio, o segundo em outubro e o terceiro na primeira quinzena
de dezembro (Figura_2). No período de junho a outubro, não foram capturados
espécimens na periferia da mata.
Comparando-se espécies das tribos Cicadellini e Proconiini, constatou-se que
houve predomínio de espécies da primeira tribo (Tabela_2). As espécies da tribo
Proconiini predominaram nos primeiros meses de coleta dos dados, da segunda
quinzena de abril até o final de maio, e nas demais datas houve predomínio de
espécies da tribo Cicadellini.
Em relação às estações do ano, constatou-se que houve um crescimento
populacional de cigarrinhas até meados do outono e, posteriormente, uma queda
populacional (Figura_3). No inverno, a população foi decrescente, atingindo ao
final deste, níveis populacionais muito baixos, enquanto, na primavera, ao
contrário, a população foi crescente. No verão, a população de cigarrinhas
manteve-se constante, sem tendência de crescimento ou decréscimo.
A baixa população no verão, ao contrário do que foi observado por Garcia Júnior
et al. (1997), provavelmente, seja decorrente do estágio das mudas. Nesta
estação, as mudas encontravam-se na fase final de produção e, provavelmente,
pouco atrativa para as cigarrinhas devido à pouca vegetação e maior porte das
mudas.
Apesar do controle químico sistemático realizado no viveiro, mesmo com
pulverizações aéreas, constatou-se a presença de cigarrinhas em praticamente
todo o processo de formação da muda. Roberto et al. (2000) constataram a
presença de cigarrinhas durante todo o processo de formação da muda em viveiro
localizado em Gavião Peixoto-SP. A ocorrência de cigarrinhas em viveiro pode
levar à contaminação das mudas pela bactéria X. fastidiosa, causadora da CVC.
Entretanto, a contaminação estará relacionada à infectividade das cigarrinhas
vetoras da bactéria.
CONCLUSÕES
1. Em viveiro cítrico há predomínio da espécie B. xanthophis.
2. Durante todo o processo de formação de mudas, ocorre presença de cigarrinhas
no viveiro, com predomínio de espécies da tribo Cicadellini.
3. A população de cigarrinhas é crescente até meados do outono e,
posteriormente, decrescente.
4. No inverno, a população é decrescente e, na primavera, crescente.
5. No verão, a população de cigarrinhas não apresenta um padrão de crescimento
ou decréscimo.