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BrBRCVHe0004-28032004000100002

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National varietyBr
Year2004
SourceScielo

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A taxa de resposta sustentada da hepatite C crônica ao tratamento com os diversos interferons-alfa e ribavirinas distribuídos pelo governo brasileiro é semelhante à da literatura mundial ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO Estima-se que existam no mundo todo 175 milhões de pessoas contaminadas pelo vírus da hepatite C (VHC)(17). No Brasil, segundo dados da Organização Mundial de Saúde, 2,5% a 4,9% da população encontram-se infectada(11). A hepatite C é considerada a principal causa de doença hepática bem como de transplante hepático nos Estados Unidos, podendo evoluir para cirrose (20% a 40% dos casos) e carcinoma hepatocelular (2,5% dos casos)(3, 16).

Pesquisas de tratamentos para a hepatite C aumentaram quando, em 1989, seu vírus foi isolado e identificado como o principal responsável pelas hepatites pós-transfusionais não-A não-B(2). Em 1997, um consenso americano(21) estabeleceu o uso do interferon-alfa isolado para tratamento da hepatite C crônica. A resposta sustentada, compreendida como a ausência de RNA viral após 6 meses de tratamento era em torno de 20%(13, 14, 20, 23). A taxa de resposta sustentada relaciona-se com a ausência do RNA viral por mais de 6 anos(18) em 92% dos casos e com a regressão da fibrose(25). Respondedores ao tratamento têm baixo risco de desenvolver complicações decorrentes da hepatite C crônica, enquanto os não-respondedores têm pior prognóstico(15). Em 1998, Consenso Europeu instituiu o uso de uma terapia combinada ' interferon-alfa associado à ribavirina ' sendo que a taxa de resposta sustentada elevou-se para 40%(13, 14, 19, 20, 24). Vários estudos determinaram que alguns fatores estão relacionados a melhor resposta ao tratamento com interferon-alfa e ribavirina: sexo feminino, idade inferior a 40 anos, fibrose leve ou ausência de fibrose, genótipos 2 ou 3 e carga viral menor que 3,5 milhões de cópias/mL(6, 25, 27).

Desde 1999, o Ministério da Saúde do Brasil distribui a combinação desses medicamentos através das Secretarias de Saúde estaduais. Em 21 de junho de 2000 foi publicado um protocolo nacional regulamentando o tratamento da hepatite C crônica no Brasil(1), garantindo à população o direito a este tratamento.

Ocorre que a compra dos medicamentos pelo Ministério da Saúde é feita através de licitações que privilegiam os produtos de menor preço. Assim sendo, os fornecedores podem ser laboratórios cujos produtos não tenham sua eficácia comprovada. Este viés também faz com que freqüentemente ocorra a troca do tipo de interferon-alfa utilizado por um mesmo paciente, durante seu tratamento, ou seja, do tipo 2A para 2B e/ou vice-versa. Questiona-se o quanto estes fatores poderiam contribuir para o insucesso do tratamento.

Desde 1999, o Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba, PR, trata pacientes portadores de hepatite C crônica com medicamentos fornecidos gratuitamente pelo Ministério da Saúde, através da Secretaria de Saúde estadual.

O objetivo principal deste estudo foi avaliar se a taxa de resposta sustentada em pacientes com hepatite C crônica, tratados no Hospital de Clínicas da UFPR com a associação interferon-alfa e ribavirina fornecidos pelo Ministério da Saúde, é comparável à da literatura internacional. O objetivo secundário é determinar fatores relacionados a melhor resposta ao tratamento.

CASUÍSTICA E MÉTODO Foram considerados elegíveis para o estudo 102 pacientes com hepatite C crônica em tratamento no ambulatório de Hepatologia do Hospital de Clínicas da UFPR, que iniciaram o tratamento a partir de agosto de 1999 e em agosto de 2002 tinham tempo suficiente para avaliação da não-resposta ou da resposta sustentada.

Critérios de inclusão: 1) positividade pré-tratamento em, pelo menos, dois testes anti-VHC (ELISA) de segunda ou terceira geração e a determinação qualitativa do RNA do VHC (VHC-RNA) através do método da reação em cadeia da polimerase (PCR); 2) elevação da alanina aminotransferase (ALT) de 1,5 x o limite superior de normalidade, por duas oportunidades, em 6 meses; 3) biopsia hepática nos últimos 12 meses, evidenciando atividade necroinflamatória de moderada a intensa e/ou fibrose. Foram dispensados da biopsia somente os casos que apresentavam algum distúrbio hereditário de coagulação.

Todos receberam interferon-alfa na dose de 3 milhões de UI via subcutânea, 3 vezes por semana e ribavirina 1 g via oral por dia, conforme as diretrizes do Ministério da Saúde(1): 6 meses de tratamento para os pacientes com genótipo 2 ou 3 e com dois ou mais itens de bom prognóstico (fibrose grau 0 ou 1, sexo feminino e idade inferior a 40 anos) e 12 meses para os demais. A medicação foi disponibilizada pela Secretaria de Estado da Saúde do Paraná. A procedência da medicação, segundo dados do Centro de Medicamentos do Paraná (CEMEPAR), da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, está discriminada nas Figuras_1 e 2.

Ocorreu fornecimento de tipos diferentes de interferon-alfa, 2A e 2B para um mesmo paciente.

A resposta ao tratamento foi classificada em: a) recaída, se determinação qualitativa do VHC-RNA negativa ao final do tratamento e positiva 6 meses após; b) não-resposta, se determinação qualitativa do VHC-RNA positiva ao final do tratamento; c) resposta sustentada, se determinação qualitativa do VHC-RNA negativa ao final do tratamento e após 6 meses.

Não se determinou a carga viral devido ao exame não estar disponível no período do estudo.

Todas as biopsias foram revisadas pelo mesmo patologista, tendo sido empregadas para confecção das lâminas as colorações de hematoxilina-eosina e Gomory. Os cortes foram avaliados quanto ao grau de alterações histopatológicas segundo a classificação de GAYOTTO et al.(9), que varia de 0 a 4 e tem correlação com a classificação METAVIR(12). Uma amostra aleatória de 10% do material foi encaminhada para controle interno e externo.

Para o teste anti-VHC utilizou-se a técnica ELISA de segunda geração (sensibilidade de 90% a 95%) ou terceira (sensibilidade de 95% a 98%)(3). Para realizar a determinação qualitativa do VHC-RNA, utilizou-se kit AMPLICOR® do laboratório ROCHE. Para genotipagem utilizou-se o método de hibridização reversa.

Delineou-se um estudo de coorte não-controlado. Definiu-se como desfecho principal a resposta sustentada ao tratamento, com relação à intenção e à conclusão do mesmo. Por intenção de tratamento, entende-se que fará parte da análise estatística todo paciente que iniciou o estudo. Conclusão de tratamento exclui os pacientes que não terminaram o tratamento proposto(5).

Para a análise estatística dos resultados utilizaram-se os testes paramétricos t de Student (através do software "Primer of Biostatistics")(10) e os não- paramétricos Qui-quadrado e Exato de Fisher (pelo software Epi Info)(4). O nível de significância (probabilidade de significância) adotado foi menor que 5% (P < 0,05).

O projeto deste trabalho foi analisado e aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de Clínicas da UFPR.

RESULTADOS Clínicos e demográficos Dos 102 pacientes elegíveis para este estudo, excluíram-se 15: 12 não tinham determinação qualitativa do VHC-RNA pré-tratamento e em 3 não havia dados disponíveis no prontuário médico. Foram, então, incluídos 87 pacientes, tendo- se encontrado os seguintes resultados (Tabela_3): a) idade média de 42,7 anos; b) predomínio significativo do sexo masculino (72,4%); c) entre os 67 (77%) pacientes avaliados quanto ao genótipo, encontrou-se número significativamente maior de casos com genótipo 1 (53,7%), contra 4,5% e 41,8% de pacientes com genótipos 2 e 3, respectivamente; d) quanto aos dados histológicos, observou-se ausência de fibrose em 6 (5,2%) e cirrose em apenas 11 (14,1%) dos 87 pacientes. Entre os que tinham fibrose, houve predomínio de casos com fibrose grau 1 (35,9%).

Vinte pacientes (23%) não realizaram genotipagem do VHC pré-tratamento, devido à indisponibilidade do exame no período em que foram incluídos.

Cinco pacientes não foram submetidos a biopsia hepática porque três eram hemofílicos e dois tinham doença de Von Willebrand.

Resposta viral sustentada Considerando-se intenção e conclusão de tratamento, a taxa de resposta viral sustentada foi de 32,1% (28 de 87 pacientes) e 35% (28 de 80 pacientes), respectivamente (Tabelas_3, 4).

Fatores independentes associados à resposta viral sustentada Correlacionando os fatores independentes de melhor resposta ao tratamento, ou seja, sexo feminino, idade inferior a 40 anos, genótipo diferente de 1 e grau de fibrose 0 ou 1, encontrou-se significância estatística apenas com relação ao genótipo dos pacientes. Entre os pacientes com resposta viral sustentada, houve predomínio significativo do genótipo 3 (65%), e entre os não-respondedores predomínio do genótipo 1 (68,3%; P = 0,0184) (Figura_3).

A diferença da distribuição dos demais fatores não foi significativa.

Estudo das perdas Sete (6%) pacientes interromperam o tratamento: três (42,8%) por sintomas gripais, um (14,3%) por neoplasia de esôfago diagnosticada durante o tratamento, e três (42,8%) por alterações hematológicas (Tabela_5).

DISCUSSÃO Resposta sustentada. Os interferons pertencem à superfamília das citocinas.

Modulam a atividade de muitos componentes do sistema imunológico, aumentando a capacidade do organismo de combater agentes infecciosos. Formam a primeira linha de defesa contra infecções virais. Classificam-se em alfa, beta e gama, de acordo com a seqüência de aminoácidos dessas proteínas. O interferon-alfa é produzido por monócitos e células B em resposta a vírus e estímulos antigênicos. O interferon recombinante é produzido por técnicas de DNA recombinante em Escherichia coli. Duas formas de interferon-alfa recombinante são comercialmente disponíveis e diferem por um único aminoácido na posição 23: lisina no interferon-alfa-2A e arginina no interferon-alfa-2B(28).

Recentemente, foram desenvolvidos novos interferons, chamados peguilados. Têm a característica de serem metabolizados mais lentamente, devido à adição de uma cadeia de polietileno glicol a suas moléculas. dois interferons peguilados: um de 40 Kda alfa-2A, outro de 12 Kda, alfa-2B(7). Estes interferons diferem quanto as suas propriedades físico-químicas, farmacocinéticas e farmacodinâmicas e, quando combinados à ribavirina, têm levado a taxas de cura acima de 50%(7, 8, 22). Cabe salientar que os resultados aqui descritos não são extrapoláveis aos interferons peguilados, haja vista as marcadas diferenças entre ambos e em relação aos interferons não-peguilados.

A ribavirina é um análogo de nucleotídio purínico, com efeito virostático contra largo espectro de vírus. Seus mecanismos de ação ainda são desconhecidos mas sugere-se que levem à inibição da RNA polimerase RNA-dependente e esgotamento do pool de guaninas(28).

Os resultados do tratamento da hepatite crônica pelo VHC melhoraram de forma marcante com a terapêutica combinada do interferon-alfa com ribavirina.

Metanálise recente de 48 estudos controlados, envolvendo 6.585 pacientes comparando o uso de interferon-alfa como monoterapia ou associado à ribavirina para tratamento da hepatite C crônica, demonstrou uma taxa geral de resposta sustentada de 37% em pacientes virgens de tratamento que receberam a associação dos dois medicamentos(14). Nessa metanálise, os pacientes foram tratados com interferon-alfa-2A (5 estudos), alfa-2B (25 estudos) ou não citavam o tipo de interferon utilizado (18 estudos). A procedência dos medicamentos, quando citada, era dos laboratórios Roche (alfa-2A) ou Schering-Plough (alfa-2B).

Outra revisão sistemática de 19 estudos randomizados envolvendo 3.765 pacientes, tratados com interferon-alfa e ribavirina pela primeira vez, encontrou 33% de resposta sustentada à terapia combinada(13).

Entre estes diversos estudos não foi citada a alternância de medicamentos de diferentes procedências ou de diferentes tipos de interferons. Pode-se questionar como um dos inconvenientes da alternância de medicamentos, a capacidade do interferon-alfa-2A de induzir a produção de maiores títulos de anticorpos neutralizantes, ou seja, anticorpos contra o próprio interferon, do que o interferon-alfa-2B(28), o que poderia hipoteticamente afetar a resposta aos interferons. No entanto, este ponto de vista é refutado por evidências contrárias à importância destes anticorpos na resposta ao tratamento(29).

As taxas de resposta sustentada observadas neste estudo (32,1%) foram muito aproximadas àquelas observadas pela literatura mundial (33% a 37%)(13, 14).

Assim sendo, ainda que o tratamento da hepatite crônica pelo VHC pelo sistema de saúde público brasileiro acarrete o uso de interferons-alfa e ribavirinas de diferentes procedências e que inclua a possibilidade do uso alternado de dois tipos de interferons, estas variáveis mostraram não afetar os resultados esperados.

Preditores. POYNARD et al.(25) demonstraram que os fatores independentes relacionados à melhor resposta ao tratamento eram sexo feminino, idade inferior a 40 anos, fibrose leve ou ausência de fibrose, genótipos 2 ou 3 e carga viral menor que 3,5 milhões de cópias/mL. Esses autores observaram resposta viral sustentada em 30% dos pacientes com genótipo 1 e de 64% naqueles com genótipos 2 e 3.

No presente estudo observou-se também correlação significativa (70%) entre os genótipos 2 e 3 com a resposta sustentada. Não se observou, porém, correlação com o sexo e idade, mas isto pode ter ocorrido devido ao predomínio significativo de pacientes masculinos e com idade superior a 40 anos na população selecionada para o estudo.

Metanálise publicada em 1999 envolvendo 344 pacientes demonstrou maiores taxas de resposta sustentada no grupo de pacientes que não tinha cirrose(26). Essa correlação com cirrose ou com outros graus de fibrose não foi encontrada nesta série. Não dados que justifiquem este achado na população estudada no presente estudo.

CONCLUSÕES A taxa de resposta sustentada encontrada neste estudo é compatível com a da literatura internacional, apesar das freqüentes variações individuais quanto aos tipos de interferons e a procedência dos mesmos.

Entre os preditores de eficácia mencionados na literatura internacional, apenas a presença dos genótipos 2 e 3 mostrou-se igualmente indicativa de boa resposta na presente série.

AGRADECIMENTO À Sra. Deise Pontarolli, do setor de Medicamentos Excepcionais da Central de Medicamentos da Secretaria de Saúde do Estado do Paraná, pelas informações prestadas sobre os medicamentos fornecidos no período deste estudo.


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