Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

BrBRCVHe0004-28032004000400011

BrBRCVHe0004-28032004000400011

National varietyBr
Year2004
SourceScielo

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

Tumor sólido-cístico pseudopapilar do pâncreas (tumor de Frantz): estudo de quatro casos RELATO DE CASOS CASE REPORTSINTRODUÇÃO O tumor sólido pseudopapilar do pâncreas (TSPP), também conhecido como tumor de Frantz, embora raro, é uma neoplasia que tem sido cada vez mais descrita na literatura(8). É encontrado na maioria dos casos em adolescente do sexo feminino sendo considerado uma neoplasia com pequeno grau de malignidade, desde que passível de ressecção cirúrgica completa, o que é possível na maioria dos casos. O conhecimento dos aspectos epidemiológicos e clínicos desse tipo de tumor pode levar à suspeita do diagnóstico no pré-operatório, o que sem dúvida pode permitir abordagem cirúrgica mais radical que intencione a ressecção por completo de lesão.

Apresenta-se casuística uni-institucional, sendo discutidos aspectos clínicos, histopatológicos, imunoistoquímicos terapêuticos e de prognóstico.

PACIENTES E MÉTODOS No período de dezembro de 2000 a fevereiro de 2003, quatro pacientes tratados na Santa Casa de Misericórdia de Presidente Prudente, SP, foram incluídos neste estudo por serem portadores de TSPP.

Três pacientes eram adolescentes do sexo feminino com variação de idade entre 17 e 26 anos e um único paciente do sexo masculino com 42 anos.

Em três casos a apresentação clínica era inespecífica, com sintomas de desconforto abdominal e dispepsia. Em apenas um caso (sexo masculino) a queixa inicial foi de massa abdominal palpável. Em nenhum deles foi observada perda de peso. O exame físico, com exceção deste último caso, apresentava-se sem alterações. Exames laboratoriais, incluindo enzimas hepáticas e amilase, foram normais.

O primeiro exame solicitado a todos os pacientes foi a ultra-sonografia de abdome, que revelou, sem exceção, a presença de massa pancreática, sendo este seguido em metade dos pacientes de tomografia de abdome e ressonância nuclear magnética na outra metade. Em três pacientes o tumor estava localizado na cabeça do pâncreas e em apenas um no corpo e cauda pancreática (Figuras_1, 2, 3).

Em um caso (sexo masculino) o paciente havia recebido previamente o diagnóstico de pseudocisto pancreático, tendo sido submetido a drenagem endoscópica da lesão. Como complicação, apresentou dor abdominal e queda dos níveis de hematócrito, sendo operado de urgência para controle do sangramento. O paciente evoluiu com aumento progressivo da lesão, optando-se por sua ressecção 4 meses depois, quando se diagnosticou TSPP por exame anatomopatológico.

Nos pacientes do sexo feminino, apenas no caso 1 o diagnóstico pré-operatório foi compatível com cisto pancreático; nas demais se suspeitava de TSPP.

RESULTADOS O tratamento empregado encontra-se discriminado na Tabela_1. No caso 1, em virtude do tumor apresentar extensão extra-pancreática, foi possível sua enucleação. No caso 2 em que o tumor estava localizado em corpo e cauda pancreático e o paciente havia sido submetido previamente a drenagem endoscópica ( descrito anteriormente), foi identificada durante a cirurgia firme aderência do tumor ao rim esquerdo, sendo necessária a nefrectomia. No caso 4 houve lesão intra-operatória acidental da artéria mesentérica superior, sendo necessária a reconstrução com veia jugular externa. Esta paciente apresentou oclusão do enxerto sendo reoperada para implante de prótese de politetrafluoroetileno, evoluiu com quadro de sangramento digestivo alto e hepatite isquêmica, permanecendo por 29 dias na UTI, com alta após 35 dias de internação. Os demais casos evoluíram sem intercorrências. Não houve mortalidade na presente casuística.

O tamanho das lesões variou de 6,5 cm (caso 3) a 15 cm (caso 2). Ao exame macroscópico, o tumor se apresentava com aspecto cístico-papilar, com conteúdo hemorrágico em três casos e, em apenas um, era sólido-papilar (caso 4). Em todas as peças cirúrgicas havia margens livres de tumor. A microscopia mostrou no caso 1 invasão vascular e no caso 2 invasão angio-linfática. O estudo imunoistoquímico foi realizado em três casos e é apresentado na Tabela_2 .

O tempo médio de seguimento foi de 15 meses (1 a 27 meses), estando todos os pacientes vivos até a presente data, sem evidências de recurrência ou metástases.

DISCUSSÃO A primeira descrição do TSPP foi feita por Frantz em 1959, quando relatou como uma nova entidade quatro casos previamente definidos como neoplasias não- funcionantes de células de ilhotas pancreáticas(2, 16). Essa neoplasia tem sido descrita sob vários termos: "papillary cystic neoplasm", "solid and cystic acinar cell tumor", "papillary cystic neoplasm", "papillary cystic carcinoma", "solid and cystic tumor" e "low-grade papillary tumor". Apenas recentemente, em 1996, esse tumor foi denominado "solid-pseudopapillar tumor" pela Organização Mundial de Saúde(7, 10).

O tumor de Frantz é uma neoplasia rara do pâncreas, ocorrendo em aproximadamente 0,17%-2,7% dos tumores não-endócrinos do pâncreas(16). Até o momento, existem cerca de 452 casos relatados desse tumor na literatura inglesa (9). Recentemente, tem sido notado o aumento de sua incidência com mais de 2/ 3 dos casos totais descritos nos últimos 10 anos. A possível explicação é o maior conhecimento da doença e a maior uniformidade de conceituação nos últimos anos(10). No Brasil, a maior casuística em uma única instituição foi feito pelo Serviço de Cirurgia de Vias Biliares e Pâncreas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com 14 casos operados(1).

A origem do tumor de Frantz é, sem dúvida, grande motivo de controvérsia. A despeito do seu grande uso, o método imunoistoquímico tem se revelado de auxílio apenas marginal no esclarecimento dessa controvérsia. Resultados inconsistentes têm sido encontrados para marcadores epiteliais, neuroendócrinos, de enzimas pancreáticas, de hormônios de células de ilhotas e para outros antígenos(15). A despeito da falta de diferenciação específica para determinada linhagem celular, o TSPP apresenta uma imunofenotipagem característica. A vimentina é consistentemente expressa, assim como marcadores para alfa-1 anti-tripsina, alfa-11 anti-quimiotripsina e enolase neuro- específica(10, 15). Esses achados confirmam a opinião da maioria dos autores que concorda com a teoria da célula precursora do tumor ser oriunda de uma célula epitelial primitiva(12, 16). Os resultados dos exames de imunoistoquímica realizados nos pacientes desta casuística foram uniformemente compatíveis com a presença desses marcadores, com exceção do alfa-11 anti- quimiotripsina, que não foi testado.

A teoria da origem do tumor a partir de células embrionárias é defendida por KOSMAHL et al.(8). Esses autores, estudando 59 tumores e aplicando grande número de marcadores em análises imunoistoquímicas, observaram forte reatividade para vimentina, alfa-1 anti-tripsina, enolase neuroespecífica e para receptores do progesterona. Em virtude dos achados não terem sido compatíveis com nenhuma linhagem celular específica do pâncreas e também pela presença do receptor hormonal nas amostras avaliadas, os autores sugeriram que algumas células embrionárias pudessem permanecer no pâncreas durante a embriogênese, diferenciando-se posteriormente no TSPP. A predileção pelo sexo feminino encontrado nesses tumores suporte a essa teoria. LAM et al.(9), no entanto, avaliando oito pacientes não encontraram em nenhum caso positividade imunoistoquímica para nenhum receptor hormonal. REBHANDL et al.(14), em revisão da literatura sobre o assunto, encontraram o receptor da progesterona em apenas 27 casos, sugerindo que os hormônios sexuais tenham papel no crescimento e não na patogênese desse tumor. No presente estudo em apenas um paciente em que foi testado o receptor de progesterona não houve positividade.

A maioria dos casos diagnosticados têm sido encontrada em mulheres jovens, especialmente em adolescentes, o que é compatível com 75% da presente casuística. Os achados clínicos são vagos e podem incluir dor abdominal leve e saciedade precoce(10). No momento do diagnóstico, os tumores, comumente, apresentam grandes dimensões. A despeito disso é rara a invasão de estruturas vasculares ou biliares, o que torna a ressecção possível na maioria dos pacientes. Na maioria das séries o tumor acomete, preferencialmente, o corpo e cauda pancreática(10, 13, 14). No presente estudo o inverso foi observado, com 75% dos casos ocorrendo na cabeça pancreática. Tal achado pode ser justificado pelo pequeno número de pacientes estudados.

A ressecção cirúrgica é o melhor tratamento para o TSPP, sendo na maioria das vezes, o único tratamento suficiente. O tipo de ressecção depende da topografia do tumor e deve objetivar a preservação das estruturas adjacentes.

Duodenopancreatectomias com preservação do piloro e pancreatectomias corpocaudais com preservação do baço devem ser tentadas(1). Em casos selecionados, a enucleação também é alternativa viável, o que foi realizada em um dos casos na presente série, sem morbidade e com margens cirúrgicas livres.

As taxas de ressecabilidades são altas em virtude do tumor, ao crescer, deslocar as estruturas adjacentes ao invés de invadi-las(16). A maioria dos estudos concorda que ressecções alargadas ou linfadenectomias não estão indicadas(14). As metástases devem ser ressecadas, mesmo quando associadas à recidiva tumoral, o que é mais comum na população mais idosa(5, 11).

A experiência com o tratamento adjuvante é limitada aos bons resultados obtidos com a ressecção do tumor. Alguns esquemas de quimioterapia têm sido propostos, porém sem números suficientes para conclusões definitivas. A radioterapia foi relatada com sucesso em apenas um caso com invasão do hilo hepático(3).

Em virtude da longa história natural da doença e da relativa raridade, tem sido difícil estabelecer critérios histopatológicos preditivos de agressividade do tumor(6). NISHIHARA et al.(12), analisando 22 pacientes portadores de TF identificaram, em 3 casos com potencial maior de malignidade em virtude de metástases para gânglios, peritônio e órgãos distantes, a presença de invasão venosa, atipia nuclear e áreas de necrobiose, sugerindo que tais achados pudessem predizer doença mais avançada. A despeito disso, sobrevida em longo prazo de 7'10 anos tem sido relatada em pacientes com ressecção completa da lesão e também naqueles com doença residual, o que tem justificado se considerar o TSPP como uma neoplasia de bom prognóstico. No entanto, em aproximadamente 15% dos casos metástases são descritas(4, 5, 6, 17), e até o momento cinco casos de morte por doença à distância foram relatados(10, 16). Em virtude de dois pacientes desta casuística apresentarem, à microscopia, invasão venosa, encontram-se sob rigoroso seguimento anual no sentido de detecção precoce de metástases à distância. Por enquanto, não sinais de recidiva em nenhum dos casos operados, o que, apesar do pequeno tempo de seguimento, certamente atesta o caráter menos agressivo dessas lesões quando comparadas ao adenocarcinoma pancreático.


Download text