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BrBRCVHe0004-28032009000400003

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National varietyBr
Year2009
SourceScielo

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Associação entre lesões da mucosa gastroduodenal e Helicobacter Pylori em pacientes com doença hepática crônica ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Associação entre lesões da mucosa gastroduodenal e Helicobacter Pylori em pacientes com doença hepática crônica

Association between Helicobacter pylori infection and gastroduodenal lesions in patients with chronic liver disease

Rozangela Maria de Almeida Fernandes Wyszomirska; Laércio Tenório Ribeiro; Jackellyne Santos Monteiro; Bruno Pontes de Miranda Vidal; Roberta Maria Pereira Albuquerque de Melo; Cláudio Torres Miranda Departamento de Clínica Médica/Hospital Universitário Professor Alberto Antunes, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL Correspondência

INTRODUÇÃO As doenças hepáticas crônicas (DHC) apresentam elevada incidência e prevalência em todo o mundo, sendo observadas alterações da mucosa gastroduodenal, com risco elevado para o aparecimento de úlcera duodenal em cirróticos(8, 24, 26, 31). Dentre os mecanismos fisiopatológicos postulados, destacam-se as alterações séricas da gastrina(13, 29), com consequente aumento da secreção ácida, mudanças no fluxo sanguíneo(28) e diminuição da secreção de prostaglandina na mucosa gástrica(1), sendo ainda considerada a presença do Helicobacter pylori (H. pylori)(10, 18).

A infecção pelo H. pylori é altamente prevalente, principalmente em países em desenvolvimento(15), sendo responsável por lesões como erosões e úlceras gastroduodenais. Em pacientes com DHC sua prevalência é controversa(7, 9, 22, 32, 35, 36), bem como a existência de associações com lesões da mucosa gastroduodenal (LMGD)(5).

A gastropatia da hipertensão portal (GHP)(3, 30) está associada primordialmente à hipertensão portal, caracterizando-se endoscopicamente por áreas com aspecto em mosaico e pontos vermelhos no centro, predominantes no corpo e fundo gástricos(21). Além disso, pode estar associada a erosões e úlceras, que apresentam características endoscópicas semelhantes àquelas encontradas em pacientes sem hipertensão portal.

O conhecimento da prevalência da infecção pelo H. pylori em pacientes com DHC e o estudo da associação, ou não, com as lesões gastroduodenais, podem ser úteis na melhor caracterização da patogênese da GHP e na avaliação de possível efeito aditivo na produção de lesões gastroduodenais, quando estão presentes as duas condições. VERGARA et al.(34), em estudo de metanálise, incluindo sete estudos que avaliaram a prevalência da infecção pelo H. pylori e lesões endoscópicas associadas em cirróticos, concluíram que a infecção pelo microorganismo esteve presente em 60,7% dos indivíduos avaliados, com aumento do risco do aparecimento de úlcera péptica. Entretanto, BATMANABANE et al.(2) concluíram que a GHP não proporciona ambiente favorável à colonização pelo H. pylori, sugerindo não haver contribuição da bactéria na patogênese da GHP.

O objetivo deste estudo foi avaliar a presença de lesões da mucosa gastroduodenal e sua relação com H. pylori em pacientes com DHC.

MÉTODO Pacientes Realizou-se estudo transversal em que foram incluídos pacientes com DHC por diversas causas, com indicação para realização de endoscopia digestiva alta por suspeita de hipertensão portal e indivíduos com dispepsia funcional, como grupo controle, no Ambulatório de Hepatologia do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes da Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, no período de janeiro de 2005 a janeiro de 2006.

Os critérios de exclusão foram: pacientes com uso prévio (até 1 mês) ou atual de antibióticos, terapia prévia de erradicação do H. pylori, carcinoma hepatocelular ou outras neoplasias e episódio recente (máximo de 2 semanas) de hemorragia digestiva alta. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas e foi executado de acordo com a Declaração de Helsinki.

Diagnóstico da doença hepática crônica As doenças hepáticas foram identificadas como cirrose hepática secundária aos vírus das hepatites B e C, esquistossomose mansônica e doença mista, quando havia associação da etiologia viral com Schistosoma mansoni. O diagnóstico da cirrose hepática foi realizado através de exame físico, alterações de exames laboratoriais, achados de ultrassonografia e/ou biopsia hepática. A infecção pelo vírus C foi detectada pela presença de anticorpos anti-HCV de segunda geração e confirmada pelo HCV-RNA, enquanto que para a hepatite B foi considerada a presença do HBSAg. O Schistosoma mansoni foi identificado pela presença de ovos em amostra de fezes, através do método de Kato Katz, ou pesquisa de ovos na mucosa retal e a doença hepática esquistossomótica, forma hepatoesplênica, foi confirmada por achados de exame físico e de ultrassonografia.

Diagnóstico endoscópico de lesões da mucosa gastroduodenal Para a realização de endoscopia digestiva alta os pacientes e controles foram submetidos a sedação com meperidina e midazolam, em doses que variaram de acordo com a tolerância, visando atingir nível de sedação consciente. O exame foi realizado pelo mesmo examinador, utilizando aparelho de videoendoscopia Olympus. Foram admitidas como LMGD a erosão, úlcera e gastropatia da hipertensão portal. O diagnóstico endoscópico de erosão caracterizou-se pela identificação de solução de continuidade tecidual, plana ou elevada. A úlcera foi identificada como lesão superficial da mucosa com base recoberta por fibrina e bordas distintas e a GHP através da presença de áreas da mucosa com aspecto em mosaico e pontos vermelhos no centro, predominantes no corpo e fundo gástricos(16). Em todos os pacientes foram realizadas biopsias, sendo retirados dois fragmentos do antro e do corpo. O material colhido foi imediatamente fixado em formalina a 10%.

Diagnóstico histopatológico Os fragmentos colhidos durante o exame endoscópico foram incluídos em parafina e corados pelos métodos da hematoxilina-eosina e Giemsa, sendo o primeiro para avaliação de infiltrado inflamatório e o segundo para pesquisa do H. pylori.

Todas as lâminas foram estudadas pelo mesmo patologista.

Análise estatística Os dados foram construídos e analisados no banco de dados Epi-Info Windows. As medidas de associação foram: estimativa do risco relativo - odds ratio (OR) e qui ao quadrado corrigido. O OR foi utilizado para pesquisar a intensidade das associações. O intervalo de confiança considerado foi de 95%.

RESULTADOS Foram incluídos no estudo 73 indivíduos, sendo 46 pacientes com DHC (39 do gênero masculino e 7 do feminino, média de idade de 45,6 ± 12,8 anos), e 27 indivíduos do grupo controle, sem doença hepática mas com dispepsia (19 do gênero masculino e 8 do feminino, média de idade de 45,2 ± 14,4).

As doenças hepáticas crônicas identificadas foram: cirrose hepática secundária à hepatite B e C em 30 (65,22%), esquistossomose mansônica em 7 (15,22%) e doença mista em 9 (19,56%) pacientes.

Trinta e oito (82,6%) dos 46 pacientes com DHC e 13 (48,1%) dos 27 controles apresentaram LMGD, sendo observada diferença estatisticamente significante (P<0,05). Os tipos de LMGD observados nos pacientes e controles encontram-se na Tabela_1.

Ao se avaliar a estimativa do risco de ocorrer lesões da mucosa gastroduodenal em pacientes com DHC, foi observado um coeficiente elevado (OR 5,12 IC 95%, 1,55-17,37), sendo essa associação estatisticamente significante (P = 0,002).

Dos 46 pacientes com DHC, 13 (28,2%) foram H. pylori positivo e dos 27 indivíduos do grupo controle, 17 (62,9%) foram positivos, sendo observada diferença estatisticamente significante (P = 0,008).

As características demográficas e tipos de lesões dos pacientes com DHC e dos controles, associados à presença do H. pylori estão demonstradas na Tabela_2.

Em relação ao grupo de doentes com DHC não foi observada diferença significante entre H. pylori positivo e negativo, em relação à frequência, idade, gênero e nem quanto ao tipo de lesões gastroduodenais, no entanto com grupo controle a presença de H. pylori foi fator significante para o aparecimento de erosões.

A Tabela_3 mostra que a associação entre lesão na mucosa gástrica e a DHC tende a ocorrer apenas na ausência do H. Pylori (P = 0,005; OR 13,0 IC 95%, 1,4- 327,9).

DISCUSSÃO Embora o papel da infecção pelo H. pylori na úlcera péptica(34), câncer gástrico(39), gastropatia congestiva(37) e encefalopatia hepática(38) tenham sido investigados em pacientes com cirrose hepática, os dados disponíveis ainda são escassos e contraditórios(40).

A prevalência de úlcera péptica em pacientes com cirrose hepática vem sendo identificada entre 6% a 33%(14, 27), sendo também os pacientes com maior associação com a gastropatia da hipertensão portal(27). Neste estudo, observou- se que 80,31% dos pacientes com DHC apresentaram LMGD à endoscopia digestiva alta, sendo que 16 (42,1%) apresentavam GHP, 7 (18,4%) associação de lesões e 5 (10,5%) úlcera péptica.

A prevalência de H. pylori em pacientes com cirrose apresenta grande variação, entre 26% e 89%(17, 19). Ao se avaliar os efeitos da erradicação de H. pylori em doentes com cirrose hepática, LO et al.(14) observaram prevalência da bactéria de 52% e QUEIROZ et al.(25) avaliando pacientes portadores de vírus C encontraram prevalência de H. pylori de 70,2% em cirróticos e 47,5% em pacientes não-cirróticos. No presente estudo, encontrou-se prevalência de H.

pylori de 28,2% em pacientes com DHC por diversas causas e de 62,7% no grupo controle, de indivíduos dispépticos. Em estudo de metanálise, GISBERT et. al.

(9) observaram resultados semelhantes, com prevalência do H. pylori em pacientes com hepatopatia crônica e lesão de mucosa gastroduodenal, igual ou até menor, quando comparado aos pacientes com lesão de mucosa gastroduodenal e sem doença hepática crônica. Fator que poderia contribuir com os resultados discordantes entre os estudos seria a utilização de métodos diferentes para a identificação do H. pylori, inclusive a sorologia(22, 23), que em pacientes cirróticos pode superestimar a prevalência da bactéria, tendo sido demonstrada baixa sensibilidade e especificidade nesse grupo de pacientes(40).

Outro aspecto importante no presente estudo é que não foi observada diferença significante entre os grupos H. pylori negativo e H. pylori positivo, em relação à média de idade, gênero, presença ou ausência de lesões da mucosa gastroduodenal, independente do tipo de lesão. Esses resultados foram semelhantes aos encontrados por LO et al.(14). No entanto, CHEN et al.(4) encontraram uma expressão do antígeno de H. pylori na mucosa de pacientes com DHC em 69% dos pacientes, sendo que a extensão e a intensidade de inflamação crônica do antro foram observadas em 95,5% dos pacientes com DHC, recomendando o tratamento precoce da bactéria nesse grupo específico de doentes.

Os resultados desta casuística demonstraram uma associação entre LMGD e DHC, com risco de 5,1 vezes para o aparecimento das lesões, mas a análise estratificada mostrou que essa associação é mais intensa quando o H. pylori esteve ausente. Esse resultado sugere que o H. pylori pode não ser fator de risco fundamental para o aparecimento de LMGD em pacientes com DHC, devendo, no entanto, ter papel secundário, que necessita ser definido. QUEIROZ et al.(25) demonstraram em seu estudo que a infecção por H. pylori e a idade foram fatores associados com cirrose hepática em portadores de vírus C, sugerindo que pacientes com cirrose hepática secundária à infecção pelo vírus C podem ser mais susceptíveis à infecção pelo H. pylori, que em pacientes sem cirrose hepática. Os pacientes com DHC, independente da causa, podem ter alterações na resposta imune(6, 11, 20), aumentando a susceptibilidade de adquirir infecções.

Além disso, são pacientes submetidos a endoscopia digestiva alta com mais frequência que a população geral(26, 29), fator esse que aumenta o risco de adquirir infecção por H. pylori(12, 33). Por fim, a hipertensão portal que se instala em pacientes com DHC não pode ser negligenciada, tendo sido demonstrado que pacientes com cirrose e história de sangramento digestivo têm mortalidade maior que os pacientes sem cirrose. CHEN et al.(4) observaram que a incidência de úlcera péptica aumenta em 44%, quando a cirrose hepática associa- se com a presença de varizes de esôfago.

CONCLUSÕES Os resultados demonstram interação significante entre a associação de LMGD em pacientes com DHC, independente da causa desta última e da presença do H.

pylori. Esses resultados estimulam a realização de futuros estudos para melhor clarear o papel do H. pylori na patogênese da doença hepática e o estabelecimento das possíveis relações com a hipertensão portal, resposta imune e outros.


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