Humanização e trabalho na enfermagem
PESQUISA
Humanização e trabalho na enfermagem*
Humanization and work in nursing
Humanización y trabajo en enfermería
Neusa ColletI; Célia Alves RozendoII
IEnfermeira. Doutora em Enfermagem pela EERP-USP. Docente da Universidade
Estadual do Oeste do Paraná
IIEnfermeira. Doutora em Enfermagem pela EERP-USP. Docente da Universidade
Federal de Alagoas
1 Introdução
A ABEn Nacional, no ano de 2002, propôs a discussão do tema "humanização e
trabalho: razão e sentido na enfermagem" durante as comemorações da Semana de
Enfermagem. Por acreditarmos ser este um tema bastante instigante e, face aos
problemas de uma prática de enfermagem cada vez mais tecnificada e
especializada, que submete o conhecimento a um infindável fracionamento,
salientamos a necessidade do resgate de algumas questões fundamentais ao
desenvolvimento do trabalho da enfermagem, dentre elas a humanização.
Vale salientar que as questões relacionadas à humanização, de uma forma ou de
outra, com diferentes abordagens e referenciais, sempre estiveram presentes no
trabalho da enfermagem.
Pensar na relação humanização/trabalho em enfermagem nos remete a duas
diferentes formas de abordar o assunto. Podemos estar nos referindo à
humanização do trabalho de enfermagem ou ao trabalho humanizado da enfermagem.
No primeiro caso, estaríamos nos referindo ao desenvolvimento de uma
assistência de enfermagem humanizada e, no segundo, a um processo de trabalho
que humanize as relações do trabalho de enfermagem. Nos dois casos estaríamos
falando da razão e do sentido que esses conceitos abarcam na profissão
enfermagem, pois a enfermagem é, essencialmente, cuidado, e cuidado prestado ao
ser humano, individualmente, na família ou na comunidade.
Portanto, ao falarmos em cuidado de enfermagem ao ser humano (seja voltado para
a assistência ou para as relações de trabalho) implica, essencialmente, em
cuidado humanizado. Contudo, é importante ressaltar que, muitas vezes, devido à
sobrecarga imposta pelo cotidiano do trabalho, a enfermagem presta uma
assistência mecanizada e tecnicista, não'reflexiva, esquece de humanizar o
cuidado justamente por entender que em si o cuidado deve ser humanizado. Da
mesma maneira, as relações de trabalho, em função de fatores internos e
externos à enfermagem, vêm se dando de modo pouco humanizado, interferindo
diretamente na própria assistência.
Como é possível ao trabalhador cuidar de maneira humanizada, se ele próprio não
habita em meio humanizado? Essa forma de conduzir as ações de enfermagem dá
origem a um dos grandes obstáculos hoje presentes no interior da profissão que
é a forma estereotipada e naturalizada com que a enfermagem, muitas vezes,
apreende seu objeto de trabalho e presta assistência. A naturalização de um ato
ou de um fato é altamente danosa para a libertação e para a transformação e a
concepção de "coisas e pessoas forjadas segundo sua natureza permite exercer
dominação sobre elas, sem que de fato os dominados tenham consciência de que
ela ocorra"(1:185).
A convergência entre humanização e trabalho na enfermagem não pode ser vista
como mais um modismo no interior da profissão como se agora esse fosse o
aspecto mais importante da assistência, de modo a não cairmos mais uma vez no
velho dilema da perda de referências da especificidade da profissão.
A enfermagem já caiu nessa armadilha: no início da profissão, o fio condutor
dos cursos de graduação em enfermagem foi essencialmente pautado em aspectos
tecnicistas. Posteriormente, com a inserção de referenciais especialmente da
psicologia e da psiquiatria, a enfermagem coloca as técnicas em segundo plano e
a essência da profissão passa a ser o apoio emocional e psicológico na
realização do cuidado de enfermagem como se fosse possível desvincular o físico
do psicológico.
Acreditamos que nós, profissionais da enfermagem, não conseguimos compreender e
dar a devida importância a ambos no processo assistencial aos usuários e, ao
invés de trazer esses conhecimentos como interdependentes e complementares para
a construção de uma assistência humanizada e integral, perdemos essa
perspectiva e com ela perdemos, também, a possibilidade de ampliar os
instrumentos de trabalho com vistas à qualidade da assistência e a tão
propalada assistência integral que permeia o discurso e, por que não dizer, a
prática dos enfermeiros no interior da profissão.
É claro que a prática e o discurso nem sempre estão em consonância, mas é
preciso fazer justiça à enfermagem, que reconhecidamente desenvolve uma prática
diferenciada dos demais trabalhadores da saúde, quando se trata da relação com
o usuário. No entanto, precisamos ter mais cautela e um olhar mais crítico em
torno dessas questões para que não venhamos a descaracterizar a profissão com
modismos e/ou com naturalizações que possam se tornar empecilhos à nossa
práxis.
No nosso ponto de vista, tanto a humanização da assistência de enfermagem
quanto a humanização das relações de trabalho de enfermagem surgem de uma
necessidade social e historicamente construída, não como mais um modismo da
profissão que tenta colocar essa temática em voga em si mesma, mas como um dos
aspectos do trabalho da enfermagem que contribui, significativamente, para a
construção de uma assistência de qualidade.
É direito de todo cidadão ter acesso ao atendimento público de qualidade, mas
para isso faz-se necessário a melhoria do sistema de saúde como um todo. Dois
aspectos nos parecem fundamentais para a construção da humanização no trabalho
da enfermagem. Um deles está vinculado à qualidade do relacionamento que se
estabelece entre os profissionais de saúde e os usuários no processo de
atendimento à saúde e o outro está vinculado às formas de gestão dos serviços
de saúde. Assim, os requisitos básicos colocados para o desenvolvimento de uma
assistência humanizada e de qualidade incluem o compromisso da liderança do
serviço, a qualidade da gestão, a competência e a criatividade da equipe.
Quanto à humanização da assistência de enfermagem, é fundamental agregarmos à
competência técnica e científica uma ética que considere e respeite a
singularidade das necessidades do usuário e do profissional, que aceite os
limites de cada um na situação que requer a produção de atos em saúde.
A racionalidade dos processos tanto de humanização da assistência quanto de
humanização das relações de trabalho da enfermagem vão ao encontro da
construção de uma "cultura organizacional pautada pelo respeito, pela
solidariedade, pelo desenvolvimento da autonomia e da cidadania dos agentes
envolvidos e dos usuários"(2:12).
Trata-se de produzir atos em saúde que levem em consideração o respeito ao
outro como um ser autônomo e digno, que busquem compreender os limites dos
sujeitos envolvidos nessa relação, as singularidades de cada um, bem como as
especificidades das necessidades apresentadas em cada momento em particular.
Humanizar em saúde é uma via de mão dupla, pois é um processo que se produz e
reproduz na relação usuário'profissional. Contudo, não é possível esperarmos da
equipe de saúde uma assistência humanizada aos usuários quando as condições de
trabalho são precárias, quando há falta de pessoal, sobrecarga de trabalho e
pressões no interior do mundo do trabalho que deixam as pessoas nos seus
limites físicos e psíquicos. Essas condições, também, foram historicamente
determinadas pela evolução do trabalho em saúde e produzem bloqueios no avanço
intelectual da enfermagem, assim como de outros profissionais. Agem como
camisas de força que engessam a criatividade dos profissionais. A ausência de
mecanismos que assegurem a reflexão cotidiana do processo de trabalho pode ser
indício da falta de qualidade em alguns serviços, assim como um desestímulo às
lutas por melhores condições de trabalho.
Se compreendemos que o processo de humanização se produz e reproduz nas
relações entre profissional e usuário e profissionais entre si e, que essas
relações são estabelecidas nos ambientes de trabalho, é importante levarmos em
consideração o contexto em que essas relações se dão. Para tanto, precisamos
saber quem são nossos usuários; quem são os profissionais que estão atendendo;
quais são as instituições que estão produzindo atos em saúde; qual a filosofia
da organização do trabalho dessas instituições; quais as instituições que
formam os profissionais que atuarão no setor saúde. Esses aspectos poderão nos
dar parâmetros para a reflexão acerca da atual forma de organização do trabalho
em saúde e a forma como a humanização deste trabalho vem sendo implementada no
cotidiano da produção das ações em saúde.
Além de considerar as relações entre os sujeitos, profissionais e usuários,
humanizar exige considerar novas formas de gestão das instituições de saúde, o
que implica sensibilização dos dirigentes das instituições e dos idealizadores
das políticas de saúde com o tema proposto. É preciso um compromisso dos
dirigentes das instituições com a qualidade da assistência; investimentos para
a melhoria das condições de trabalho; financiamento suficiente do setor saúde
para resgatarmos a qualidade da assistência; planejamento, organização e
gerenciamento coletivos dos serviços de saúde; meios que permitam a reflexão
constante da prática assistencial; utilização de mecanismos de avaliação e
reorganização da assistência.
Observamos que, atualmente, existem fatores que impedem uma organização
coletiva do processo de trabalho e contribuem para a cristalização de uma
organização burocrático-verticalizada que não leva em conta a subjetividade dos
sujeitos envolvidos nesse processo. Esses fatores, de acordo com o Ministério
da Saúde, incluem tendência à verticalização excessiva; racionalidade gerencial
burocrática e formalista; funcionamento isolado dos diversos setores; jogo de
interesses e objetivos particulares; carência de comunicação e integração entre
profissionais(2).
Por outro lado, o processo de humanização precisa romper com formas
cristalizadas de organização dos processos de trabalho em saúde, traduzidos no
que segue:
- ao invés de verticalização, a horizontalização da organização por meio de
processos participativos, democráticos e solidários;
- construção de espaços democráticos nas relações de trabalho que facultem e
estimulem a livre expressão, o debate sobre a vida institucional, suas
dificuldades, angústias frente ao mundo do trabalho e objetivos a serem
alcançados;
- a participação dos sujeitos no processo de tomada de decisões, na definição
de estratégias e na construção de projetos coletivos acerca do seu trabalho;
- estabelecimento de formas de comunicação e integração que superem o mero
fluxo de informes operacionais que alimentam o sistema gerencial da
organização, pois essa comunicação instrumental não dá conta da humanização. A
comunicação que tem como essência a humanização é aquela que envolve os agentes
como sujeitos do seu processo, que possibilita uma interpretação das situações
vividas na assistência e no cotidiano do trabalho como um todo.
Assim, humanizar passa a ser responsabilidade de todos, individual e
coletivamente; jamais estará dada, sendo preciso reconstruí-la em todos os atos
em saúde, quer aqueles burocrático-administrativos (gestão), quer aqueles
relacionais. Humanizar no setor saúde é ir além da competência técnico-
científica-política dos profissionais, compreende o desenvolvimento da
competência nas relações interpessoais que precisam estar pautadas no respeito
ao ser humano, no respeito à vida, na solidariedade, na sensibilidade de
percepção das necessidades singulares dos sujeitos envolvidos.
A ação técnico-científica se realiza com a valorização da dimensão humana e
subjetiva dos sujeitos, se realiza na dependência de uma relação intersubjetiva
que repercute em todos que dela participam. A subjetividade é entendida como
produção de sentido, com potencialidade de criação e não meramente como algo
vago relacionado à introspecção individual. Subjetividade está relacionada a
processos contínuos de criação de singularidades.
No processo de produção capitalista há uma tentativa de gerar um tipo de
subjetividade: homogeneizadora das diferenças, que são produzidas via mídia.
Entender esse contexto é importante para que não homogeneizemos a assistência e
as relações entre as pessoas na enfermagem, mas busquemos, na
intersubjetividade, construir o processo de humanização.
Essa condição é necessária não só para atender às necessidades emergidas no
chamado mercado de trabalho, mas para resgatar o princípio básico do ser humano
que é o direito de ser tratado como tal, de ser atendido em suas
especificidades, suas singularidades, sua subjetividade. Embora existam
experiências isoladas de humanização, precisamos promover a ampliação de
experiências dessa natureza, trazê-las ao cotidiano do trabalho como um dos
aspectos tão importante quanto a competência técnica, a competência científica
e a competência política.
2 Desafios para o processo de humanização
Atualmente, no processo de produção dos atos em saúde, observamos a banalização
dos sofrimentos, dos sentimentos, das necessidades singulares, tanto dos
profissionais como dos usuários. Os contatos e relacionamentos entre ambos são
superficiais e os problemas decorrentes da forma de organização da assistência
interferem sobremaneira na relação que se estabelece entre profissionais de
enfermagem e usuários.
Não há vínculos nessa relação, o que dificulta, por parte da enfermagem, a
percepção das necessidades apresentadas pelos usuários. Nesse processo, ocorre
um desligamento do sofrimento do outro e o medo produz uma separação subjetiva
crescente entre os que estão cuidando (enfermagem) e os que deveriam ser
cuidados (usuários)(3). Ocorre um distanciamento da enfermagem em relação aos
usuários como mecanismo de fuga ao enfrentamento do problema. Fato semelhante
ocorre na relação entre os profissionais, para quem o trabalho também se
reveste de sofrimento e dor e uma forma de aplacá-los poderia ser o
desligamento do sofrimento e da dor do outro. Da mesma maneira que cuidar do
outro traduz a essência da enfermagem, ser cuidado e cuidar de si próprio
agrega sabor e saber a essa essência, fortalecendo-a.
Pode ser que os trabalhadores de enfermagem não tornem visíveis suas próprias
dificuldades com receio de que isso seja atribuído a sua incompetência em lidar
com questões relacionadas aos usuários ou ao próprio grupo. Não demonstram
sensibilidade ou capacidade de identificação com o outro. Diante dos usuários,
procuram evitar a manifestação de seus sentimentos, mesmo nos momentos em que
mostram maior sensibilidade de percepção e dizem tentar colocar-se no lugar do
usuário para entender sua situação.
Por outro lado, a equipe pode sentir-se despreparada para manter um
relacionamento mais próximo dos usuários. Faltam conhecimentos e preparo que
dêem suporte para trabalhar com a dor e o sofrimento do outro, para estabelecer
processos efetivos de comunicação. Em trabalhos realizados, anteriormente,
observamos que os principais distúrbios que afetam a comunicação podem estar
relacionados à mensagem propriamente dita, à forma de organização da
assistência, às condições de trabalho, à falta de elementos (conhecimento) que
subsidiem as ações de enfermagem(4,5).
Esses fatores favorecem a emergência do processo de banalização do sofrimento,
tanto dos profissionais quanto dos usuários. Segundo as autoras acima, apesar
de toda a angústia expressada pelos usuários em determinados momentos do
processo terapêutico, seu ou de um familiar ou amigo, em nenhum momento
identificou-se a enfermagem percebendo ou tomando alguma atitude para aliviar o
sofrimento psíquico dos usuários. Não estamos responsabilizando individualmente
os profissionais de enfermagem por esse tipo de atitude, pois além da falta de
preparo para enfrentar tal situação, em geral, as instituições não oferecem as
mínimas condições para que os profissionais possam construir diferentes formas
de atuação em seus locais de trabalho.
Nesses casos, tanto os profissionais quanto os usuários criam estratégias
defensivas para enfrentar a perversidade do cotidiano do trabalho. Os usuários
buscam forças internas, acionam mecanismos de defesa contra suas próprias
emoções que funcionam como anestésicos durante o período que necessitam do
atendimento em saúde. Já a enfermagem supõe-se imune contra a percepção do
sofrimento dos usuários para não correr o risco de ser tomada de angústia.
Ambos lutam contra a expressão pública de seus sofrimentos e sentimentos.
Afetivamente a enfermagem pode assumir uma postura de indisponibilidade e de
intolerância para com a emoção provocada pela percepção do sofrimento do outro.
Ao rejeitar ou negar o sofrimento do usuário, a enfermagem se protege.
A intolerância afetiva para com a própria emoção reacional acaba
levando o sujeito a abstrair-se do sofrimento alheio por uma atitude
de indiferença ' logo, de intolerância para com o que provoca o seu
sofrimento(3:46).
Nesse processo, aos usuários resta a letargia da insegurança, da dor
anestesiada pela ameaça de uma instabilidade que é ainda mais demolidora de
suas forças. As atitudes dos profissionais mais as incertezas convertem-se no
autêntico conteúdo de suas atitudes frente aos conflitos vivenciados no
cotidiano. Se essas afirmações estão corretas, pode-se deduzir que nem mesmo a
mera percepção do sofrimento poderá amenizar a situação, tornando-se
necessárias ações que busquem estabelecer relações de vínculo com o outro, pois
aquilo que para a enfermagem parece ser rotina no atendimento em saúde, para os
usuários talvez seja o pior momento enfrentado.
Portanto, a mecanização do cuidado, a rotinização do contato pessoal, a
impessoalidade nas relações transformam-se em mecanismos de defesa e são
explicitados pela enfermagem como aspectos que têm influenciado nos modos de
prestar a assistência, têm impactado negativamente na efetivação de sua
prática, apesar de ser uma prática diferenciada dos demais profissionais, como
dissemos anteriormente. É importante reconhecer e valorizar o fato de ser uma
prática diferenciada da dos demais profissionais da área da saúde, mas
precisamos de mais do que isso: é importante termos claro que mais do que uma
prática diferenciada, necessitamos e queremos construir uma prática que faça a
diferença, uma prática verdadeiramente humana e humanizada.
Nesse sentido, emerge a necessidade de trabalhar com o sofrimento psíquico dos
trabalhadores de enfermagem, pois o desgaste psicológico aparece como um dos
obstáculos que interfere na qualidade de vida dessas pessoas bem como na
qualidade da assistência prestada. A falta de acompanhamento das necessidades
psicológicas da equipe é um aspecto que não tem sido levado em consideração
pelas instituições de serviços de saúde, cujos reflexos são evidenciados nos
modos de prestar assistência de enfermagem, nas dificuldades de convivência
entre enfermagem e usuários, e entre os membros da equipe de saúde, no
exercício da democracia e no respeito aos direitos dos usuários e dos
trabalhadores, ambos sujeitos.
A maneira como a enfermagem tem conduzido a leitura de suas condições de
trabalho não lhe permite perceber que seu ambiente de trabalho é antes de tudo
um produto social e daí decorre que seus modos de prestar assistência sejam
características de ações coletivas, definidas por sua inserção social
específica e não por indivíduos isolados. Portanto, no processo de trabalho, os
casos individuais não podem ser a base sobre a qual se constrói uma concepção
de assistência humanizada. O entendimento do caráter social desse processo
surge das condições ambientais onde vivemos, trabalhamos, as quais ocorrem sob
formas sociais específicas, a saber, em
determinados meios de produção e relações particulares entre os
homens, dos homens com os meios de produção e com o produto. Essas
condições ambientais são a síntese dessas formas sociais e não as
condições naturais a-históricas(6:104).
Cabe a nós, profissionais de enfermagem, estimularmos a reflexão permanente
acerca dos nossos modos de prestar assistência, dos modos de estabelecermos
relacionamento com os usuários dos serviços, assim como das reais condições de
trabalho no contexto social em que vivemos.
No nosso ponto de vista, os desafios do processo de humanização da assistência
e das relações de trabalho a serem enfrentados pela profissão implicam em
superação da relevância dada à competência técnico-científica em detrimento da
humanização; superação dos padrões rotineiros, arraigados, cristalizados de
produzir atos em saúde; superação dos modelos convencionais de gestão;
superação dos corporativismos das diferentes categorias profissionais em prol
da interdependência e complementaridade nas ações em saúde; construção da
utopia da humanização como um processo coletivo possível de ser alcançado e
implementado.
A enfermagem tem papel fundamental nesse processo, não porque é ela que
acompanha mais proximamente os usuários dos serviços de saúde, mas porque é a
enfermagem que tem discutido mais profundamente essa questão, é a enfermagem
que tem resgatado em sua prática profissional a humanização como aspecto
fundamental de seu trabalho, é a enfermagem que tem produzido conhecimento
acerca do tema, trazendo-o ao debate, é a enfermagem que tem questionado e
revisado suas próprias condutas, fazendo enfrentamentos importantes tendo como
fundamento a defesa da vida.
É a enfermagem que tem enfrentado outros profissionais e questionado
determinados posicionamentos e condutas que tornam as ações em saúde
mecanizadas, estanques, que atendem minimamente às necessidades biológicas do
ser humano, práticas que fragmentam e não favorecem a busca da integralidade da
assistência. Conforme já referimos anteriormente, entre as profissões do setor
saúde, é a enfermagem a que mais tem contribuído para a construção da
humanização da assistência, é a enfermagem que vê na humanização a razão e o
sentido do seu trabalho. E isso nos confere, tanto mais responsabilidade,
quanto desafios.