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BrBRCVHe0034-71672003000300002

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National varietyBr
Year2003
SourceScielo

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AIDS em gestantes: possibilidade de reduzir a transmissão vertical PESQUISA/RESEARCH/INVESTIGACIÓN

AIDS em gestantes: possibilidade de reduzir a transmissão vertical

AIDS in pregnant women: possibility of reducing the vertical transmission

SIDA en el embarazo: posibilidad de reducir la transmisión vertical

Fernanda Scherer WiethåuperI; Petronila Libana CechinII; Sandra Gomes CorreiaIII IEnfermeira, Ex-Bolsista UNIBIC de IC IIMestre em Assistência de Enfermagem, Professora Pesquisadora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), E-mail: cechin@bios.unisinos.br IIIMestre em Educação, Professora Pesquisadora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)

1 Introdução Hoje, a AIDS (Acquired Immunity Deficiency Syndrome) é considerada uma pandemia. Segundo a Organização Mundial da Saúde(1), existem, no mundo, 23 milhões de pessoas infectadas pelo vírus HIV (Human Immunity Vírus), sendo que 40%, aproximadamente, são mulheres.

No Brasil, em 1985, a proporção de infectados que era de 24 homens: 1 mulher, em 1999/2000 passou a ser de 2 homens: 1 mulher. Agravantes, ainda, revelam que as mulheres têm se contaminado através das relações sexuais com os próprios maridos e significam 25% dos infectados, comparados com o ano de 1984, quando representavam apenas 1%(1).

Esse número crescente de mulheres infectadas no Brasil resulta num número também crescente de crianças nascendo com o vírus da AIDS. Desde a década de 80, a transmissão vertical, ou seja, a transmissão do HIV da mãe infectada para o filho por via transplacentária, no trabalho de parto, parto ou amamentação, tem predominado de forma marcante, sendo o primeiro caso notificado e confirmado de soropositividade por este tipo de exposição em 1985(2).

A transmissão vertical é a principal via de infecção pelo vírus HIV na população infantil. Dados revelam que esta transmissão tem sido responsável por 90% dos casos, como forma de exposição conhecida, em menores de 13 anos no Brasil(3).

A via perinatal, depois da sexual e sangüínea, é a terceira em freqüência comprovada pela infecção pelo HIV.

[...]A via transplacentária é a mais freqüente, mas também não é a única na transmissão matermo-fetal.[...] Os dados indicam que 20 a 25% dos recém-nascidos de mães infectadas irão se tornar aidéticos.

Cerca de 75% dos recém-nascidos soropositivos perdem esses anticorpos adquiridos passivamente em 15 meses(4:579-80)..

Em 1997, o País adota uma política de oferecimento universal do teste anti-HIV para gestantes no pré-natal. Com isso foi abandonada a proposta de oferecer testagem apenas para as mulheres com risco identificado para infecção pelo HIV.

Mas a realização do teste é facultativa, devendo ser solicitado consentimento verbal da gestante, além de disponibilizado aconselhamento pré e pós-teste(5).

O pré-natal, sob o ponto de vista clínico e obstétrico, é fundamental para evidenciarmos se a gestante é soropositiva, assintomática ou se clinicamente pode ser considerada aidética(4). Conforme alerta do Ministério da Saúde(6), é fundamental que a eficácia do tratamento anti-retroviral na mulher grávida seja monitorado com a realização de mensurações dos níveis de carga viral e contagem de células T-CD4+, como indicado para qualquer outro adulto, permitindo identificação precoce de possíveis falhas terapêuticas e adequação do esquema terapêutico.

Quanto à amamentação, a política do Ministério é recomendar a substituição do aleitamento materno pelo leite artificial ou leite humano pasteurizado disponível nos bancos de leite(5).

A Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis e AIDS (CN-DST/ AIDS) está desenvolvendo, desde novembro de 1999, ampla campanha junto aos ginecologistas e enfermeiras para que o exame anti-HIV passe a ser rotina nos cuidados do pré-natal e que o tratamento para as mães e os bebês seja feito o mais cedo possível. Assim, observa-se a vital importância do diagnóstico precoce para dar início ao tratamento adequado, a fim de amenizar a cadeia de proliferação do vírus no organismo dessas gestantes e evitar a transmissão via placentária para o feto(1).

A intervenção nesse processo deve assumir a forma de esclarecimento e extensão inovadora por parte dos profissionais de saúde. Sua intervenção junto às gestantes infectadas, nos aspectos da saúde, sociais, éticos e legais, é de suma importância, pois as mulheres em idade reprodutiva voltam-se para seu provedor de cuidados obstétricos(7). Por esta razão, justifica-se a implantação do anti-HIV como rotina para todas as gestantes contaminadas e a disponibilização do tratamento pré-natal padronizado pelo MS(4).

Porém, deve-se considerar que a solicitação do exame pelo profissional de saúde não é garantia de sua realização. Neste sentido, torna-se importante questionar: Quais os conhecimentos e condutas que têm influenciado a gestante na redução da transmissão vertical do HIV? De posse destes dados, torna-se mais fácil a intervenção educativa, visto que os programas deste cunho a serem implantados completam de maneira mais eficaz os vazios deixados pelas dúvidas que são preenchidos pelos mitos e crendices populares(8).

Assim, este estudo teve como objetivos: a. Identificar entre as gestantes o conhecimento sobre a transmissão vertical do vírus HIV durante a gestação; b. Verificar junto às gestantes o significado do resultado soropositivo que a identifica como infectada pelo vírus HIV; c. Averiguar junto às gestantes qual a compreensão que possuem em relação ao tratamento do recém-nascido soropositivo.

2 Metodologia A presente pesquisa é um estudo exploratório de natureza qualitativa para identificar entre as gestantes o conhecimento sobre a transmissão vertical do HIV, verificar o significado atribuído ao resultado soro-reagente do teste anti-HIV na condição de gestante e averiguar qual a compreensão que possuem em relação ao tratamento do recém-nascido caso isso ocorra.

Estudo realizado em quatro Unidades Sanitárias (US) no município de São Leopoldo/RS, sendo duas localizadas na periferia da cidade e as outras duas no centro. Essas US foram escolhidas por apresentarem grande fluxo de atendimento do programa Pré-Natal, oferecendo também local apropriado para as entrevistas, conforme evidenciado em estudo anterior acerca da estrutura das US(9).

Participaram do estudo 63 gestantes com idade entre 16 e 40 anos, sendo que 33,33% do total possuíam entre 16 e 20 anos, cujo grau de escolaridade variou do grau incompleto ao grau incompleto, todas inscritas no programa de Pré-Natal das US selecionadas. Quanto ao número de gestações, o grupo caracterizou-se com 31,75% de primigestas, sendo a maioria, seguindo com 19,05% as que se encontravam na segunda, terceira e quanta gestação. A escolha das gestantes ocorreu por ocasião da consulta no Pré-Natal, quando foram convidadas a participarem da pesquisa, informando-as quanto aos objetivos da mesma.

Às participantes, ao serem informadas dos objetivos da pesquisa, garantiu-se o respeito à autonomia, a livre participação, o anonimato e a confidencialidade das informações como também, o atendimento pré-natal, caso não quisessem prosseguir com a entrevista.

2.1 Coleta de dados Para esta etapa, foi utilizado um instrumento semi-estruturado aplicado através da entrevista. O método da entrevista visa valorizar a fala dos sujeitos, visto que este tipo de instrumento apresenta uma maior flexibilidade, permitindo maior liberdade ao pesquisador e ao sujeito, principalmente, por permitir a livre expressão das idéias(10). Antes de iniciar a entrevista, as grávidas que aceitaram o convite de participarem do estudo foram informadas de todos os procedimentos, sendo lhes explicado o termo de consentimento, o qual foi assinado por elas após as informações. As entrevistas foram gravadas com a autorização das gestantes, uma vez que esta forma de obter os dados facilita ao pesquisador a interlocução com as idéias manifestadas, permitindo o aprofundamento das questões emergentes no momento da pesquisa. Facilita, também, a percepção do pesquisador quanto à linguagem não-verbal do sujeito, parte importante que integra o processo da comunicação. As entrevistas foram transcritas na íntegra, respeitando a linguagem dos sujeitos.

3 Discussão e análise dos dados A análise foi realizada com base nas etapas metodológicas proposta por Minayo (11), visto que esse método mantém-se atento à complexidade das situações que surgem durante o desenrolar da pesquisa, permitindo descrever o que se passa efetivamente no mundo da vida dos sujeitos, do ponto de vista daquele que vive as situações concretas..

A análise temática das informações obtidas nas entrevistas com as gestantes permitiu evidenciar quatro importantes categorias que emergiram ao longo da pesquisa e que, através de um encadeamento entre o aporte teórico e os questionamentos das pesquisadoras, tentando trazer à luz a compreensão do fenômeno em estudo, foram identificadas: como - o motivo para a realização do teste, o significado da realização do teste, conhecimento e vivências do cotidiano e perspectivas e cuidados com o recém-nascido. Ao longo desse processo, nosso objetivo era captar e entender melhor a dimensão da subjetividade dos sujeitos, possibilitando desvelar toda uma rede de aspectos que constituem o objeto deste estudo.

3.1 Motivos para realização do teste Realizar o teste anti-HIV nem sempre é uma opção simples, ele vem acompanhado de medo, preocupação, preconceito e desinformação. Toda esta preocupação está relacionada com seu resultado, pois este, por sua vez, poderá revelar a soropositividade. O resultado poderá trazer conflitos para um relacionamento até então bem constituído, mas sobretudo iniciar um longo sofrimento, acompanhado de culpa. Nunca realizei este exame, não sei [...] acho que para ver se tem o vírus da doença. medo [...] (Suj.2) Na nossa cultura, a gestante é vista como alguém que carrega em seu próprio ventre a vida, a esperança e o futuro. Assim, a gestação começa a ser vivida com muita insegurança em relação ao futuro desse bebê, marcado pelo estigma social, pela possibilidade de morrer ou de ficar abandonado, caso ela venha a falecer(12). Nesta situação acho que o bebê deve vir em primeiro lugar, eu vivi bastante mas ele está vindo ao mundo, tem que salvar ele imagina colocar uma criança doente no mundo como fica.(Suj.6) Na verdade, esse teste deve ser visto como um direito das mulheres gestantes durante o período pré-natal ou por ocasião do parto, uma vez que o próprio Ministério preconiza a necessidade de assistir à gestante durante os nove meses, tendo em vista a saúde da mãe e do bebê.

Em nossa pesquisa, realizada com gestantes que freqüentam o pré-natal, verificamos que a maioria havia realizado o teste na atual gestação. Eu fiz esse exame nesta gestação, acho muito bom porque na outra gravidez não me pediram. (Suj.12) Este fato se deve à Secretaria da Saúde do município de São Leopoldo, que implantou a realização do anti-HIV para gestantes, como rotina, a partir de março de 2000. Da mesma forma, existe também um esforço por parte dos profissionais da saúde, que atuam no pré-natal, em esclarecer e sensibilizar as gestantes para a importância desse teste em relação à saúde da mãe/bebê.

Das gestantes que até o presente momento não tinham realizado o exame, questionou-se sobre sua validade e predisposição em realizá-lo. A maioria posicionou-se a favor do exame, alegando quatro fatores a serem considerados : o uso de drogas que está muito difundido entre a população; o não uso do preservativo nas relações com pessoas desconhecidas; um momento apropriado para saber sobre a soropositividade, evitando assim a contaminação de outras pessoas e, por último, citam a oportunidade para tratar o bebê.

3.1.1 Quanto ao uso das drogas O Ministério da Saúde(1) mostra que indivíduos usuários de drogas nos últimos 12 meses, os adolescentes entre 16 e 19 anos participam com 16,3%, enquanto os jovens entre 20 e 24 anos aparecem com13,4%. Neste contingente, o sexo masculino aparece com um percentual maior que o feminino. Esta questão das drogas está no meio de todo mundo ninguém está mais livre [...] não sei [...] (Suj.5) 3.1.2 Uso do preservativo O uso do preservativo entre casais com uma relação mais estável é pouco citado, fato, que poderá ser responsável pelo aumento da AIDS entre mulheres casadas.

Eu sempre usava camisinha mas agora casei , então não preciso mais. (Suj.5) 3.1.3 Preocupação em não contaminar outras pessoas Entre o grupo pesquisado de gestantes que freqüentam o pré-natal, evidenciou-se uma preocupação em relação a outras pessoas que podem ser contaminadas por pessoas soropositivas que desconhecem a sua própria situação. Acho que todo mundo deveria fazer de vez em quando este exame porque esta doença leva à morte.(Suj.18)

3.1.4 Possibilidade de tratar o bebê A possibilidade de tratar o bebê foi referida por muitas gestantes durante a entrevista. Entendemos que o desejo de um homem e de uma mulher que esperam um filho é de que ele nasça com saúde perfeita(12). No momento em que a mulher é identificada como soropositiva, esta gestação é vivida como risco tanto para o feto quanto para a própria mãe. Se eu tiver positiva posso me tratar e tratar o bebê, posso proteger ele, claro que essa doença não tem cura. (Suj.6) 3.2 Significado da realização do teste A AIDS carrega consigo representações associadas à sua forma de transmissão.

Essas representações suscitam sentimentos de medo do desconhecido, da punição e da morte, estimulando o preconceito, gerando mitos e tabus. Esta simbologia a respeito da AIDS relaciona-se ao fato de os sentimentos se manifestarem das mais variadas formas. Um desses sentimentos é o medo irracional quanto à contaminação pelo HIV, associado a valores ligados à sexualidade, ao castigo e à morte(13).

Na fala dos sujeitos, o sentimento de medo foi traduzido muitas vezes como referência ao nervosismo presente tanto no momento da realização do teste quanto na busca de seu resultado, sendo, outras vezes, referido como tal, com todas as suas letras. Eu acho bom [realizar o exame], apesar do nervosismo que a gente fica na hora de pegar o resultado. (Suj.25) Fica claro que esta população possui informações adequadas quanto à transmissão sexual do HIV, pondo em questão os relacionamentos sexuais anteriores e reconhecendo nestes momentos do risco para a contaminação. Falando genericamente, "as doenças que mais causam terror são as consideradas não apenas letais, mas também desumanizadoras - no sentido literal do termo"(14: 46).

A liberdade íntima e sexual, antes relegada ao plano pessoal, torna-se motivo de discussão pública, visto que a AIDS põe em relação muito direta sexo, prazer e morte, tornando-se um problema social, econômico e sanitário(15). A fala dos sujeitos demonstra claramente que a população absorveu esse conhecimento, estando as suas falas marcantemente relacionadas com a morte. "A doença representa uma condenação"(14:56). Tu descobre que com AIDS, o que tu vai fazer? Esperar a morte. Com o tempo, tu vai. (Suj.12) Mais do que isso, a AIDS parece mexer num campo fundamental das relações humanas, em especial as amorosas, onde a fidelidade é muito valorizada. Parece sobressair-se um código culturalmente criado onde se atribui à mulher o papel de esposa fiel, enquanto a infidelidade do homem é algo esperado e socialmente aceito, incluindo-se como uma prova de virilidade(15).

A reação dos sujeitos diante da possibilidade de o exame ser reagente passa por reações como silêncio, surpresa, decepção, cabeças baixas. Verbalmente, as respostas foram as mais diversas. Manifestaram do pânico à certeza da impossibilidade deste resultado. Se a própria realização do exame é um momento de medo, esperar pelo seu resultado pode tornar-se apavorante.

Neste amplo leque, encontramos a preocupação dos sujeitos, caso soropositivos, com a discriminação, sendo que esta mostra-se nos vários grupos de convívio. É a mesma coisa que uma sentença de morte. Lógico que tu tem um tempo mas é discriminação de parente, família, aquela coisa que deixa a pessoa em pânico [...].(Suj.32) Assim, saber-se soropositivo é saber-se condenado. Se não a uma vida com restrições físicas, a uma vida com sérias restrições sociais que acabam por refletir no tratamento dessas pessoas. As motivações tornam-se escassas e a culpa cresce quando pensa-se não estar sozinha, visto que isso representa a contaminação do filho.

3.3 Conhecimento e vivências do cotidiano A introdução do exame anti-HIV como rotina para as gestantes é algo recente, sendo que a sua solicitação vem sempre de forma inesperada para as gestantes.

Isso fica mais claro na demonstração de total desconhecimento acerca da natureza e propósitos do exame e do próprio HIV-AIDS manifestado por alguns sujeitos.

Este achado nos remete a pensar que não existem questões desgastadas. As dúvidas permanecem, mesmo quando julgamos haver informação. A questão é saber que informações chegam ou como elas chegam até essa população que procuramos atingir com as campanhas.

De qualquer maneira, a população parece introjetar as idéias de importância e progresso na realização do teste não pelo conhecimento dos fatos, mas justamente pelo desconhecimento. Parece ser traçada uma linha estreita entre a doença - no caso a AIDS - e o sofrimento causado, sendo este último a face conhecida do assunto em questão.

As mulheres que se mostraram melhor informadas acerca das possíveis conseqüências do soropositividade da mãe são aquelas que realizaram o exame (66,67% dos sujeitos) e, necessariamente, passaram pelo aconselhamento pré- teste. Demonstra-se, assim, a grande função educativa assumida por este momento, pois as dúvidas podem ser respondidas, motivando atitudes de saúde corretas.

Neste contexto, de se considerar que a AIDS, assim como todas as grandes epidemias que ocorreram até hoje, está sujeita a várias influências. Talvez a cultural possa ser apontada como aquela que vem elevando, nos últimos anos, o crescimento da doença entre as mulheres. Assim, em nosso meio cultural, os comportamentos estabelecidos para os diferentes gêneros determinam expectativas de submissão feminina e direito social da infidelidade masculina(16).

Assim, grande parte dos casais que têm uma relação afetiva estável não coloca em discussão questões como sexualidade e fidelidade, o que certamente dificulta uma possível abordagem de prevenção sobre a AIDS, como por exemplo, o uso de preservativo entre o casal, e também das eventuais relações sexuais extraconjugais.

Como mostra nossa pesquisa, a grande maioria das entrevistadas possuíam informações corretas sobre a forma de contágio da doença e a maneira pela qual poderiam preveni-la.

Fica evidente, em nossa investigação, que ter informação ou conhecimento sobre a AIDS não garante a prevenção da doença, pois esta implica mudança de comportamento. "O conhecimento é importante e, às vezes, essencial para a mudança de comportamento, embora raramente suficiente"(17:99).

O ponto crucial a ser destacado está na provável distância existente entre informação, conhecimento e mudança de comportamento.

Alterar o comportamento de mulheres que se colocam como protegidas contra as chances de contrair a doença por via sexual quando mantêm relação estável torna-se o grande complicador para a propagação da doença entre as mulheres e conseqüentemente seus filhos.

O silêncio muitas vezes manifestado em relação a sua sexualidade passa a ser ocupado pelos mitos que se "inserem nos espaços que o conhecimento deixa vazio" (8:48). As representações que os grupos humanos constróem, como no caso destas gestantes, servem para dar conta da imensidão de uma verdade que freqüentemente não quer ser conhecida.

Fica evidente, portanto, que elas tentam, em muitos momentos de suas falas, dar uma representação imaginária para poder, de certa forma, enfrentar a angústia do que poderia ser a realidade.

3.4 Perspectivas e cuidados com o recém-nascido O fato de a gestante carregar em seu ventre um outro ser, uma nova vida que poderá transformar-se em esperança, alegria ou desesperança, suscita sentimentos que geram profundas marcas na mulher grávida. Esta vivência trará inúmeros significados, pois a gestação representa a possibilidade de concretização de um profundo desejo de gerar um filho, de ser mãe, papel que a sociedade culturalmente lhe legou.

O significado da soropositividade ativa angústias primitivas que se ampliam quando a gestação se sob o signo da AIDS, remetendo o imaginário social à dor, à doença e sobretudo à morte(12). Diante dos reais riscos de gerar um filho que, em algum momento, pode adoecer e até morrer faz com que a mãe se mostre muitas vezes perplexa e confusa em relação à saúde do recém-nascido.

As participantes da pesquisa, ao serem questionadas sobre a situação do feto quando a mãe é soropositiva, deram respostas evasivas ou revelaram não saber o que pode acontecer. Este fato, certamente demonstra uma difícil realidade de ser aceita, de ser vivenciada e que precisa ser negada.

O fato de muitas gestantes se manterem em profundo silêncio mostrou-nos que ter um recém-nascido HIV+ seria um fato surpreendente em suas vidas, estando isto fora do controle pessoal, atingindo-as talvez em situação de total preparo e talvez totalmente despreparada para receber uma notícia como esta.

Uma parte significativa das entrevistadas em seus discursos passam a associar, incorporar o desconhecido com um conhecido cuidado: aquele que é dispensado a uma criança não portadora do HIV.

Outras acreditam que a criança, sendo tratada nos primeiros dias de vida, pode até evitar, se curar ou se recuperar da AIDS.

Neste sentido, reconhecem que a criança precisa ser acompanhada por um profissional da área da saúde, mas parecem desconhecer que a AIDS para a criança também é, ainda, uma doença incurável.

Um número bem pouco expressivo relatou que achavam que deveriam evitar dar de mamar, mas, assim, mesmo dentro de um pensamento um pouco vago, demonstrando pouca segurança em afirmar isto. Evitar ou suspender o ato da amamentação é algo que vem contrariamente a tudo que é divulgado e preconizado em relação a esta prática. Conduzir a percepção negativa dessa experiência, quando uma mulher é gestante e portadora do HIV, é uma lógica muito difícil de incorporar enquanto mulher e mãe.

Percebe-se também que não basta somente orientarmos, informarmos estas mulheres, sem levar em conta a sua capacidade de entendimento em relação a esta patologia. É preciso refletirmos sobre as questões subjetivas que permeiam as dificuldades em trabalhar com uma doença que tanto mobiliza as pessoas, principalmente mulheres que têm sob sua responsabilidade não apenas a sua vida, mas também aquelas que irão gerar.

5 Considerações finais Nossa pesquisa, realizada no município de São Leopoldo/R.S., identificou que a Secretaria da Saúde Municipal de São Leopoldo implantou em seus serviços de pré-natal, como rotina, a solicitação do exame anti-HIV para todas as gestantes.

Mas na população pesquisada, ainda pairam muitas dúvidas quanto ao real objetivo do teste anti-HIV. Para alguns sujeitos, ele tem o significado de tratamento para o feto; para outros, ele traz ansiedades, pois pode desvelar um passado de risco e, até mesmo, a soro-reagência.

Cientes de que esse exame expõe de forma contundente a própria sexualidade, algumas mulheres tornam-se receosas e até se recusam a realizá-lo. Por conta do desconhecimento da população em relação à conduta que é adotada pelos profissionais de saúde quanto ao resultado positivo, faz-se necessário que haja nestes serviços palestras para orientação e esclarecimento de dúvidas sobre todo o processo, a fim de minimizar a ansiedade, conforme preconiza o Ministério(1).

Observou-se, na amostra pesquisada, dificuldade em verbalizar as conseqüências para o feto da soropositividade da mãe. Talvez esta realidade seja muito difícil de ser assumida pela gestante, uma vez que traz à tona o sentimento de ela ser a responsável direta pela doença de seu filho e a possibilidade da morte, tanto do filho quanto dela.

O mesmo fato se verifica em relação aos cuidados com o recém-nascido. No imaginário dos sujeitos, lidar com uma criança fragilizada pelo vírus e com possibilidade de contrair infecções é algo além da sua capacidade.

Esses resultados trazem um alerta aos profissionais da saúde que lidam no pré- natal, visto que, além de enfocarem os aspectos epidemiológicos, clínicos e terapêuticos dessa síndrome, eles necessitam atender toda a parte emocional da gestante, desde a solicitação do teste até a entrega do resultado.

Assim, este estudo poderá despertar novas pesquisas devido à complexidade da temática e porque se vislumbram muitas possibilidades de investigação quanto à problemática da AIDS.


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