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BrBRCVHe0034-71672010000400005

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National varietyBr
Year2010
SourceScielo

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Demandas do trabalho e controle: implicações em unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal

INTRODUÇÃO A relação entre o estresse ocupacional e a saúde mental do trabalhador vem sendo tema de várias pesquisas nos últimos anos, em nosso meio e em outros países, pois são preocupantes os índices de incapacitação temporária, absenteísmo, aposentadoria precoce e riscos à saúde associados à atividade laboral(1).

Diversos estudos desenvolveram modelos teóricos a fim de avaliar a prevalência de distúrbios emocionais e disfunções profissionais no ambiente ocupacional e, identificar os fenômenos que são comparáveis em múltiplos postos de trabalho e em grupos ocupacionais distintos(2-4).

Um dos modelos conceituais mais utilizados é o Modelo Demanda-Controle(2), que privilegia duas dimensões psicossociais no trabalho: o controle sobre o trabalho e a demanda advindo do trabalho. Karasek define que a tensão no trabalho (job strain) ocorre quando as demandas (exigências) do trabalho são altas e a margem de tomadas de decisões é baixa. Essa condição pode acarretar consequências nocivas à saúde física e psicológica.

O processo de trabalho nas UTIs demanda importantes atribuições, uma vez que a gravidade e complexidade dos pacientes impõem a necessidade de lidar com equipamentos sofisticados, realizar avaliações clínicas constantes e procedimentos complexos, com tomada de decisões imediatas.

O estresse pode ser especialmente importante em Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatal. Médicos e enfermeiros têm sido identificados como um grupo de extensiva atividade laboral, com demandas físicas e emocionais, ocasionada pelas implicações de suas atividades ocupacionais(5-19).

Na maioria das vezes, o médico lida com a complexa relação entre os diversos profissionais, combinando funções administrativas com a de ensino e assistência, enquanto o enfermeiro coordena os serviços auxiliares e de apoio à assistência. Assim, enquanto o médico fica mais sujeito a uma sobrecarga emocional(20), o enfermeiro parece sofrer mais com a sobrecarga física do trabalho(21-24).

Diante do exposto acima, o principal objetivo desse estudo é comparar a demanda e o controle sobre trabalho de médicos que trabalham em UTI Pediátrica e Neonatal, e, também, entre enfermeiros que trabalham nas mesmas unidades. O estudo também pretende avaliar se diferença entre o controle sobre o trabalho e a demanda psicológica na mesma categoria profissional, mas diferindo de acordo com a unidade de terapia intensiva.

MÉTODOS Realizou-se um estudo transversal, que incluiu médicos e enfermeiros, que trabalhavam em UTI Pediátrica (35) e Neonatal (22), na Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM). Foram avaliados ao todo 25 médicos e 10 enfermeiros da UTI Pediátrica e 12 médicos e 10 enfermeiros da UTI Neonatal, constituindo-se a amostra total de 57 profissionais, que aceitaram participar espontaneamente do estudo. O critério de inclusão consistia em ser médico ou enfermeiro contratado para trabalho na UTI e médico-residente cursando o estágio de UTI.

O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UNIFESP/EPM ( 1604/04) e todos os participantes assinaram o termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Utilizou-se o Job Content Questionnarie (JCQ) com 49 questões, elaborado por Robert Karasek (Universidade de Massachusetts, Lowell, 1979) e traduzido e adaptado no Brasil por Tânia M. Araújo Núcleo de Epidemiologia (Universidade de Feira de Santana, Bahia, Brasil, 2001).

As variáveis analisadas foram: controle sobre o trabalho (autoridade decisória e autoridade decisória no nível macro); demandas psicológicas do trabalho; esforço físico; carga isométrica física; demandas físicas do trabalho; insegurança no emprego; suporte social proveniente do supervisor; suporte social proveniente dos colegas de trabalho. A medida de resposta de cada item é avaliada em 4 níveis: 1 = discordo fortemente, 2 = discordo, 3 = concordo e 4 = concordo fortemente. O coeficiente de Alfa Cronbach geralmente aceito para mulher é 0,73 e para homem é 0,74(2).

As comparações entre unidades de trabalho (UTI Pediátrica e UTI Neonatal) e categoria profissional (Médicos e Enfermeiros) foram estudadas utilizando o teste Mann-Whitney U.

RESULTADOS Os médicos eram predominantemente do sexo feminino (76 %) com média etária de 34,70 ± 7,11 anos, e trabalhavam em UTI, em média 7,17 ± 6,89 anos. Os enfermeiros eram predominantemente do sexo feminino (95%), com média etária de 31,55 ± 6,37 anos, e trabalhavam na UTI, em média, 5,85 ± 4,40 anos.

Na análise do JCQ pode-se dizer que médicos da UTI Pediátrica comparados aos da UTI Neonatal apresentam valores médios superiores nas seguintes variáveis estudadas: controle sobre o trabalho autoridade decisória (35,68 ± 5,88) (p=0,19); esforço físico (6,32 ± 1,46), (p=0,22); carga isométrica física (5,00 ± 1,29), (p=0,62) e suporte social proveniente de colegas de trabalho (11,84 ± 0,98), (p=0,29). Nas demais variáveis: demanda psicológica do trabalho (43,58 ± 4,89), (p=0,92); insegurança no trabalho (6,25 ± 2,86), (p=0,43), médicos da UTI Neonatal apresentaram valores médios superiores, comparados aos da UTI Pediátrica, além de suporte social recebido do supervisor (14,83 ± 1,16), (p=0,01), com diferença estatisticamente significante (tabela 2).

Em relação à análise realizada com os enfermeiros que compõe a UTI Pediátrica, obtiveram-se valores médios superiores nas seguintes variáveis, comparados com os da UTI Neonatal: controle sobre o trabalho autoridade decisória (33,20 ± 4,64), (p=0,83); esforço físico (7,40 ± 1,40), (p = 0,09); e suporte provenientes dos colegas (11,50 ± 0,71), (p=0,11), sem diferença estatisticamente significante. Enfermeiros da UTI Neonatal apresentaram valor com significância estatística na variável insegurança no trabalho (5,80 ± 2,44), (p=0,05). Nas demais variáveis: demanda psicológica do trabalho (35,70 ± 7,47), (p=0,93); carga isométrica física (4,90 ± 0,99), (p=0,26) e suporte social proveniente do supervisor (11,10 ± 5,72), (p=0,68), nenhuma diferença estatística foi encontrada, quando comparados com enfermeiros da UTI Pediátrica (tabela 2).

Quando comparadas categorias profissionais nas diferentes unidades de trabalho pode-se dizer que médicos e enfermeiros da UTI Pediátrica diferem nas seguintes variáveis, com diferenças estatísticas significantes: controle sobre o trabalho autoridade decisória (p=0,02); demanda psicológica do trabalho (p=0,03); esforço físico (p=0,02) e suporte proveniente do supervisor (p=0,04) (Tabela 2).

Tabela_1

Em relação a médicos e enfermeiros que compõe a UTI Neonatal, diferenças estatísticas significantes foram encontradas nas variáveis: controle sobre o trabalho autoridade decisória (p=0,02); esforço físico (p=0,05) e suporte proveniente do supervisor (p=0,02).

DISCUSSÃO A utilização do instrumento JCQ, para avaliar o estresse ocupacional de enfermeiros, tem sido recurso metodológico em alguns estudos(25-27).

Nestes estudos, pode-se verificar que um dos pressupostos adotado por Karasek (2,28), que a tensão psicológica sofrida no trabalho, ou seja, quando a as demandas são altas e o trabalhador tem baixa autonomia, como conseqüência gerando tensão no ambiente organizacional, é observada, assim como na presente pesquisa.

Em nosso estudo encontramos valores estatísticos significantes na variável suporte social proveniente do supervisor, presentes em médicos da UTI Neonatal.

A possibilidade de apoio social diminui a tensão psicológica, que pode depender do grau de interação social e emocional e da confiança que se estabelece entre os membros da equipe e o supervisor(2,28).

Em contrapartida observou-se que enfermeiros da UTI Neonatal apresentam valores estatísticos significantes na variável insegurança no trabalho. Este fato é descrito por Karasek(2,28), como alta exigência e baixo controle, somado a um baixo apoio social, com maiores riscos para o desenvolvimento de patologias físicas e mentais.

Quando comparamos médicos e enfermeiros da UTI Pediátrica, observamos diferenças estatísticas significativas em relação às variáveis: controle sobre o trabalho, demanda psicológica do trabalho, esforço físico e suporte social proveniente do supervisor. Estas diferenças retratam um ambiente organizacional que apresenta grande tensão, ou seja, a autonomia dos profissionais para tomar decisões (controle sobre o trabalho) e a alta demanda, produz desmotivação e dificuldade no aprendizado em novas tarefas, além de reduzida habilidade para gerenciar situações organizações(2,28). Da mesma forma, podemos afirmar em relação às comparações entre médicos e enfermeiros da UTI Neonatal, onde apresentam diferenças significativas nas variáveis: controle sobre o trabalho, esforço físico e suporte social provenientes do supervisor.

No estudo de Rijk(25), apesar de enfermeiros de UTI, apresentarem alto controle sobre o trabalho, tendia a uma maior exaustão emocional, em virtude da demanda advinda do mesmo; o que corrobora nossa pesquisa.

Apesar de não avaliarmos as diferenças entre gêneros, LaMontagne(29) e Muhonen (30), demonstraram que o controle sobre o trabalho e demandas advindas do mesmo, são vivenciadas de forma diferente por homens e mulheres. No primeiro estudo a prevalência de tensão no trabalho é maior em mulheres, e as altas demandas têm um efeito direto sobre a saúde da mulher, enquanto que no sexo masculino, influência as relações sociais, fato observado no segundo estudo.

A maioria da população por nós avaliada faz parte do universo feminino, e nossos resultados apresentam ambientes organizacionais marcados pelo estresse e altas demandas, apontando baixa autonomia no trabalho vivenciada pela maioria dos sujeitos analisados.

Vale ressaltar que estudos de corte transversal caracteristicamente apresentam dois tipos de limitações: incluem aqueles indivíduos que "sobreviveram" à doença e, por coletarem simultaneamente dados de exposição e da doença, têm dificuldade para estabelecer uma relação de causalidade entre ambos. Desta forma, não podemos deixar de considerar as possibilidades de havermos perdido informações daqueles que: (1) não devolveram os questionários; ou (2) por alguma razão, estavam ausentes do trabalho na época da coleta de dados.

O tipo de amostragem de conveniência utilizado pode ter comprometido a representatividade.

CONCLUSÕES Apesar do número limitado de participantes, o estudo tem importantes implicações para futuras pesquisas com o instrumento JCQ em UTIs, na tentativa de verificar fatores ocupacionais, bem como comparar dados sócio-demográficos com o controle e demanda no trabalho, além de apoio social advindo do trabalho, visando instrumentar profissionais de áreas afins, quanto à detecção e redução de fatores de riscos ocupacionais, bem como direcionar o trabalhador para redução de formas inadequadas de lidar com as exigências advindas do trabalho.


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