Política de formação inclusiva: percepção de gestores sobre processo de
mudanças em Instituições de Ensino Superior
INTRODUÇÃO
A sociedade, ao longo dos anos, considerou a pessoa com necessidades especiais
como um ser incapacitado, imutável, não se preocupando em criar serviços para
atender suas necessidades individuais. No entanto, quando profissionais
começaram um processo de sensibilização e propuseram medidas para o atendimento
às necessidades especiais, teve início à construção de conhecimentos e
alternativas de atuação na área de educação especial(1).
A trajetória do ensino superior no Brasil é encontrada em inúmeros estudos que
descrevem e analisam sua instalação tardia, os percalços de sua
institucionalização, seus projetos e reformas, suas facetas diante dos
diferentes momentos políticos, sociais e econômicos vividos no país, sua atual
conjuntura, seus conflitos e desafios(2).
A relação do estudante com Necessidades Especiais (NEE) e o ensino superior se
constitui um processo interativo em que se devem considerar conjuntamente as
suas características e as solicitações, recursos e possibilidades. Esta relação
encontra-se, no entanto, condicionada pelo reconhecimento dos direitos da
pessoa com NEE. Segundo a UNESCO, há três direitos "educacionais": à educação '
a Universidade faz parte do sistema educativo; à igualdade de oportunidades '
isto é, o direito de usufruir de oportunidades semelhantes às dos seus pares
sem condições de deficiência; à participação social ' consubstanciado no
direito de usufruir dos equipamentos e condições postos à disposição de toda a
comunidade(3-4).
Assim, se os serviços universitários propõem assegurar o direito à educação e à
igualdade de oportunidades terão que refletir sobre as condições de acesso
capazes de oferecer aos seus ingressantes. Porém, mesmo com a concretização, em
1931, do Estatuto das Universidades Brasileiras, considerado como um dos marcos
estruturais da universidade em nosso país, pouco se alterou do caráter
excludente e seletivo que vinha caracterizando o Ensino Superior. Ao contrário,
o estatuto corrobora para consolidar a hegemonia dos que se pretendiam
proprietários do saber, que eram também os proprietários das terras e de todas
as riquezas produzidas, e que se valiam do saber para justificar seu poder(5).
Isto demonstra que esse documento representou um instrumento precário e
insuficiente para diminuir o quadro de exclusão social e educacional no Brasil.
Tão pouco a reforma universitária instituída em 1968, de forma repreensiva e
centralizadora, concebeu a universidade pública como um lócusdemocratizador que
primasse pela inclusão educacional(2).
Neste sentido, a inclusão de estudantes com necessidades educacionais especiais
no ensino superior requer medidas que facilitem e auxiliem a concretização
desse processo, como: formação continuada de professores, produção e adequação
de recursos pedagógicos, assessoria psicopedagógica, adaptação de estruturas
curriculares, bem como a reflexão de todos os envolvidos no processo educativo.
Torna-se necessário a criação de comissões ou núcleos na própria instituição
responsáveis pelo desenvolvimento de ações que propiciem a inclusão. Para tal,
são requeridas discussões acerca das estruturas físicas e curriculares, a
programação dos cursos, das disciplinas que os compõem e dos princípios
norteadores das Instituições de Ensino Superior(6).
Em 1996, o Aviso Circular n° 277 MEC/GM sugeriu encaminhamentos para o processo
de ingresso de estudantes com necessidades especiais nas IES, sobretudo, pelo
concurso vestibular. Chama a atenção para as instituições desenvolverem ações
que possibilitem a flexibilização dos serviços educacionais, de infraestrutura,
de capacitação de recursos humanos, de modo que atendam uma permanência de
qualidade a esses discentes. Nova iniciativa oficial ocorre pela Portaria do
MEC n° 1.679/1999, que dispõe sobre os requisitos de acessibilidade a pessoas
com deficiências para instruir processos de autorização e de reconhecimento de
cursos e de credenciamento de instituições(2).
Ainda no tocante às bases legais, recentemente foi revogada a Portaria nº
1.679/1999 e editada a Portaria nº 3.284/2003 MEC/GM, que dispõe sobre a
responsabilidade das universidades públicas, faculdades e centros de ensino em
assegurar condições básicas de acesso e permanência aos estudantes com NEE
físicas e sensoriais. Determina que na avaliação das condições de oferta de
cursos superiores ' para autorizá-los, reconhecê-los e renová-los ' sejam
incluídos requisitos de acessibilidade de pessoas com necessidades especiais
(2). Dentre esses requisitos, a referida Portaria determina que a
acessibilidade aos estudantes com necessidades físicas compreenderá, no mínimo:
eliminação de barreiras arquitetônicas para circulação do estudante, para
permitir acesso aos espaços de uso coletivo; reserva de vagas em
estacionamentos nas proximidades das unidades de serviço; construção de rampas
com corrimãos ou colocação de elevadores, para facilitar a circulação de
cadeira de rodas; adaptação de portas e banheiros com espaço suficiente para
permitir o acesso de cadeira de rodas; colocação de barras de apoio nas paredes
dos banheiros; instalação de lavabos, bebedouros e telefones públicos em altura
acessível aos usuários de cadeira de rodas.
Quanto às pessoas com necessidades educativas especiais auditivas ou visuais, a
Portaria nº 3.284/2003 esclarece que é compromisso formal das IES, no caso de
vir a ser solicitada e até que o estudante conclua o curso: manter sala de
apoio equipada com máquina de datilografia e impressora em Braille acoplada ao
computador, sistema de síntese de voz, gravador e fotocopiadora que amplie
textos, software de ampliação de tela e outros equipamentos para estudantes com
NEE visuais. Assim como, oferecer intérprete de língua de sinais,
especialmente, durante a realização de testes, flexibilizar a correção das
provas escritas, dentre outros itens para atender os alunos com NEE auditivas
(2).
Ainda sobre a Portaria nº 3.284/03 MEC/GM, seu artigo 2º trata da parceira
entre a Secretaria de Educação Superior e a Secretaria de Educação Especial,
que estabelece os requisitos de acessibilidade tomando-se como referência as
normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) relacionadas à
acessibilidade de pessoas com necessidades especiais, através da preocupação
com a edificação, o espaço, o mobiliário e o equipamento urbano. De acordo com
essa Portaria, os meios que facilitam a acessibilidade desses discentes
precisam ser incorporados por todas as Instituições de Ensino Superior,
públicas ou privadas, de forma que seja garantida a permanência do acadêmico no
curso de graduação(7).
Nota-se que existe preocupação por parte do governo em oferecer e garantir,
também no ensino superior, um atendimento educacional para as pessoas com
necessidades educacionais especiais. Entretanto, a implementação dessas normas
está em uma fase inicial, pois na prática, o processo de inclusão, embora em
alguns casos já esteja em andamento, ainda precisa ser efetivado.
Estudos realizados por diversos pesquisadores sobre o acesso e a permanência do
universitário com necessidades especiais nas IES do Brasil demonstram que as
iniciativas para proporcionar apoio psicopedagógico a esse grupo de estudantes
são isoladas e insuficientes para atender à demanda nas universidades(1).
A educação inclusiva é um desafio, é tarefa dos educadores, dos representantes
governamentais e de todos os cidadãos, mas para se efetivar uma política
inclusiva deve-se ir além da análise e aplicação de documentos legais(8).
Acredita-se que, no universo do ensino superior, a prática docente frente a
estudantes com necessidades educacionais especiais requer políticas públicas e
ações compartilhadas capazes de orientar o educador na formação de sujeitos,
valorizando a diversidade em todos os espaços e fazendo valer o verdadeiro
sentido da inclusão, como processo que reconhece e respeita diferentes
identidades e que aproveita essas diferenças para beneficiar a todos.
Diante dessas incompletudes, é preciso considerar que a universidade pública
hoje não pode ser tomada como a única responsável pela inclusão, mas como parte
integrante da implementação de políticas públicas que garantam apoio financeiro
às ações e iniciativas neste contexto.
Paralelamente a essa situação, tais instituições precisam estar cientes da
importância de expor às instâncias governamentais as limitações que enfrentam e
de apontar encaminhamentos que devem ser tomados para que haja a garantia de
acesso, ingresso e permanência desses estudantes, pois, contam com
profissionais das mais diversas áreas do conhecimento, que podem contribuir com
ensino, pesquisa e extensão na área das necessidades educacionais especiais
(4).
No âmbito administrativo é importante lembrar que se faz necessário aos
sistemas de ensino que constituam e façam funcionar um setor responsável pela
educação especial, dotado de pessoal, recursos materiais e financeiros que
viabilizem e deem sustentação ao processo de construção da educação inclusiva
(1).
De igual modo, uma boa organização administrativa e didática que busque
contemplar a inclusão desses estudantes deve e pode ser buscada por toda e
qualquer IES. Contudo, o respeito às diferenças e à igualdade de oportunidades
para todos os indivíduos requer investimentos e ações governamentais nas
universidades públicas, pois caso não haja investimento na remoção de barreiras
arquitetônicas e educacionais, a efetivação de sua inclusão no ensino superior
tornar-se-á mais difícil(4).
No atual contexto educacional a permanência na graduação é mais uma barreira a
ser enfrentada pelo estudante com necessidades especiais e o gestor das IES
precisam ter sensibilidade e preocupação em adaptar o acesso a estrutura
curricular, assim como, preparar os professores e servidores/funcionários para
o atendimento desses indivíduos em sala de aula e demais setores/serviços da
instituição.
Portanto, esse estudo surgiu da necessidade de conhecer a reflexão por parte
dos gestores sobre a conformidade da grade curricular em suas IES às demandas
desses estudantes, inclusive, a adaptação das instituições para oferecer
estrutura, tanto física quanto pedagógica, compatível com as necessidades
destes para que possam ser acolhidos, terem suas expectativas atendidas e
sentirem-se efetivamente sujeitos partícipes do processo educacional(9). O
objetivo foi o de compreender a concepção dos gestores sobre a necessidade de
mudanças nas Instituições de Ensino Superior para se adequar à clientela com
necessidades especiais.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo exploratório e descritivo com abordagem qualitativa
realizado nas Instituições de Ensino Superior que ministram curso de Enfermagem
em João Pessoa-PB, Brasil. As IES envolvidas na pesquisa foram a Faculdade de
Enfermagem São Vicente de Paula, o Instituto de Educação Superior da Paraíba, a
Universidade Federal da Paraíba e o Instituto de Educação da Paraíba. As IES
foram nomeadas como IES 1; IES 2; IES 3 e IES 4 não correspondendo,
necessariamente, à ordem supracitada.
Os participantes do estudo foram quatro gestores de IES que aceitaram
participar da pesquisa. A escolha dos mesmos teve como critérios: apresentarem
vínculo com a instituição, estarem presentes no momento da coleta de dados;
aceitarem participar da pesquisa após leitura e concordância do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido.
A coleta de dados teve início com a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética
em Pesquisa, através do Parecer nº 0533. Aos participantes foram oferecidas as
orientações relacionadas ao estudo, quanto à finalidade da pesquisa e mediante
a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme estabelece a
Resolução Nº196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta pesquisa com
seres humanos(10).
Para obtenção dos dados foi realizada uma entrevista semiestruturada com os
gestores das IES, a fim de compreender a percepção a respeito das mudanças
institucionais para adequação aos indivíduos com necessidades especiais. Dessa
forma, as entrevistas foram agendadas e gravadas com a permissão do
entrevistado. Para interpretação dos dados utilizou-se o método da análise de
discurso na vertente Fiorin(11), segundo o qual os depoimentos ocupam uma
posição social que materializa, na linguagem, e, veicula, na sociedade, as
representações ideológicas dos sujeitos.Deste modo, as falas gravadas dos
gestores foram escutadas exaustivamente, transcritas com posterior análise do
conteúdo ideológico que estas representavam no contexto histórico e social
atual.
RESULTADOS
Nas entrevistas com os gestores das IES, quatro questões norteadoras foram
utilizadas com a finalidade de compreender a concepção desses administradores
no tratamento ofertado aos Portadores de Necessidades Especais (PNEs) nas
instituições de ensino que ministram o curso de enfermagem.
O primeiro questionamento foi: Nesta Instituição, existem políticas de inclusão
direcionadas às pessoas com necessidades especiais? Se existem, quais? Se não,
por quê? Nesta questão, destacaram-se os seguintes recortes dos depoimentos:
Nós reconhecemos a necessidade de adotar políticas;... Hoje nós já
temos algumas rampas, eu acho que construídas de forma inadequada,
não são de fácil acesso...; Nós também estamos tentando adequar os
banheiros aos PNE, para você vê nossa funcionária recém-chegada, a
cadeira dela não passa na porta do banheiro. (IES 1)
Para colocarmos o acesso para deficientes como sanitário, elevador.
(IES 2).
Existem: Quota de Contratação de portadores de necessidades
especiais; adaptações construtivas nos prédios para facilitar o
acesso e circulação; aquisição de elevadores para circulação
vertical; banheiros adaptados; estacionamentos reservados; Linguagem
Brasileira de Sinais - LIBRAS -incluídas nos currículos. (IES 3)
Sim, mudanças na matriz curricular, com inclusão da disciplina
Libras. Adequação dos espaços físicos como biblioteca, salas de aula,
banheiros, carteiras diferenciadas, rampas, elevadores, corrimões,
oficinas pedagógicas. (IES 4)
Constata-se nos depoimentos dos gestores das instituições participantes que há
preocupação com algumas modificações no sentido de atender as demandas dos
PNEs. Na IES 1, as políticas de inclusão apenas são postas em prática
coerentemente quando existem professores e estudantes na instituição com alguma
necessidade especial. Na IES 2, quando se refere a mudanças, são citadas
soluções na estrutura física, porém os PNEs não necessitam de melhorias das
condições apenas nesse aspecto. Nas duas outras instituições, as mudanças em
diversas amplitudes foram lembradas pelos gestores dessas empresas, revelando
conhecimento das necessidades nos seus diversos níveis de atendimento às
pessoas com necessidades especiais.
A segunda questão abordou: Como as mudanças estruturais têm ocorrido ou estão
sendo planejadas pela instituição para tal inclusão?
Rampas, adequação dos banheiros, os principais eu digo são essas;
acesso ao ônibus (...), então é uma preocupação também. (IES 1)
Já estão sendo executadas, como eu disse antes: nós temos elevador
para esse acesso, nós temos as rampas, os sanitários, tudo em ordem.
(IES 2)
A parte física dos prédios antigos é adaptada aos padrões atuais de
atendimento aos portadores de necessidades especiais e os novos já
são construídos para atender a essas necessidades. (IES 3
Fazendo reuniões de dirigentes, professores e funcionários,
adquirindo equipamentos e construindo áreas físicas, estacionamentos.
(IES 4)
As mudanças estruturais perfazem um papel de extrema importância no trato com
os PNEs nas diversas instituições. Nesta perspectiva, percebe-se a significação
desse fator no ideário dos gestores, pois todas as instituições apontadas no
estudo estão se adequando no aprimoramento dos espaços físicos para atendimento
de tais necessidades visando à adequação a legislação vigente e cumulativamente
abrangendo número ainda maior de indivíduos ao ensino superior. Mudanças esses
representadas pela construção e/ou reforma de áreas antes impróprias para o
livre acesso, ampliando a facilidade na circulação dos PNE.
O terceiro questionamento aos gestores foi: O corpo docente é pedagogicamente
preparado para atender as demandas de aprendizado dessa clientela? Se sim,
como? Se não, por quê?
Mas, eu acho que, no geral, os professores não são, assim,
capacitados, não foram orientados e talvez não atentem para essa
questão da necessidade especial. (IES 1)
O corpo docente é preparado. (IES 2)
Sim. O corpo docente é orientado a atender a portadores de
deficiências especiais, respeitando as suas limitações e adotando
práticas diferenciadas que os ajudem a ter um desempenho normal nas
atividades do curso. (IES 3)
Não, porém, estão sendo treinados a cada trimestre. (IES 4)
Outro componente de especial importância, porém de visualização mais discreta
no corpo da instituição, é a metodologia do ensino aplicada na formação
profissional, com o propósito de promover a transferência, manutenção e
absorção do conhecimento pelos estudantes desenvolvidos pelos professores
àqueles com necessidades especiais.
O que pode ser interpretado nos depoimentos é a diferenciação de opiniões por
parte dos gestores. O gestor da IES 1, justifica-se da ausência de orientação
pela instituição e ainda por não condizer com a realidade cotidiana da presença
de estudantes com necessidades especiais. Além disso, estes passam
desapercebidos pelos professores que não sentem, a priori, a necessidade de
aprimoramento pedagógico.
Em poucas palavras, o gestor da IES 2 relata que o seu corpo docente é
pedagogicamente preparado, porém não entra em detalhes. Na IES 3, o gestor
relata a orientação dedicada pela instituição a seus professores com a
finalidade de adotar práticas coniventes com a clientela . Enquanto que, o
gestor da IES 4, apesar de afirmar que seu corpo docente não estar preparado,
revela que realiza um treinamento trimestral na instituição dedicado aos
professores. Intui-se, assim, um certo grau de exigência desses gestores que
apesar de orientarem e treinarem seus funcionários quatro vezes ao ano, ainda
não atingiram as expectativas dos idealizadores de tal projeto.
A última questão formulada aos gestores foi: Como avalia a atual situação do
ensino dessa instituição no preparo de profissionais com necessidades
especiais?
Eu acho que é ainda incipiente (...) não temos ainda trabalhado as
pessoas e nem as condutas para a visão das necessidades desse tipo de
pessoa, por isso eu digo, que há um despreparo, não há
conscientização, eu tenho visto que só quando ocorre necessidade é
que vislumbramos aquilo e tentamos solucionar. (IES 1)
No nosso ensino, a instituição já está bem preparada, nós temos hoje
o ensino integrado que é totalmente diferente, trabalhamos com a
qualidade propriamente dita. (IES 2)
No Curso de Enfermagem como nos demais desta IES, o ensino busca
atender necessidades específicas do estudante, de modo a que haja uma
equalização de competência e conteúdo entre eles e aqueles portadores
de necessidades especiais. (IES 3)
Precisa investir mais, inclusive ampliando o elenco de necessidades
temporárias e/ou permanentes. (IES 4)
A qualidade do ensino nas Instituições de Ensino Superior deve ser direcionada
no intuito de acolher sujeitos diferenciados por gênero, cultura, religião,
entre outras, porque é parte de sua filosofia essa união de sujeitos
individualizados de características peculiares e pensamentos únicos. E, para
tal, devem preparar-se para o acolhimento dessa diversidade.
O gestor da IES 1 revela incipiência no preparo da instituição para atender
pessoas com necessidades especiais, tendo em vista que, nem os recursos
humanos, nem os materiais foram adequados a essa finalidade. Já o gestor da IES
2, afirma que a instituição está preparada, porém a justificativa não satisfaz
a temática em questão, visto que o sistema integrado de ensino é apenas um
método de mudanças nas grades curriculares dos cursos, com o objetivo de
separar os conteúdos em módulos semelhantes, independente da clientela sem ou
com necessidades especiais. Na IES 3, o gestor relata a busca do atendimento
das necessidades específicas de cada estudantes e deste com os demais. O gestor
da IES 4 demonstra preocupação em ampliar suas dimensões no ensino-aprendizado
aos PNEs.
DISCUSSÃO
A partir dos depoimentos dos gestores compreende-se que os maiores avanços no
atendimento das necessidades dos PNEs têm ocorrido nas instituições privadas de
ensino, isso acontece em decorrência da natureza institucional. Esses avanços
têm possibilitado o atendimento de um mercado pouso visualizado nas
instituições públicas, em discordância com o que estabelece a Constituição
Federal do Brasil, no artigo 205: "Educação é um direito de todos e um dever do
estado"(12).
Há de se reconhecer que as políticas direcionadas para a busca da inclusão dos
PNEs em Instituições de Ensino Superior devam alvejar transformações que
vislubrem as possibilidades de mudanças não puramente estruturais ou
arquitetônica, com alterações nos locais de acesso, construção de rampas,
elevadores, corrimões, banheiros públicos e/ou outras adaptações capazes de
facilitar o trânsito desses indivíduos na espacialidade dos centros de ensino.
Por outro lado, há necessidade de alterações metodológicas no acolhimento,
ensino e avaliação da aprendizagem que somadas ao conjunto de políticas
institucionais possibilitem, também, a permanência, o bom desempenho e a
qualidade do ensino-aprendizado.
No aspecto relacionado ao planejamento das mudanças estruturais, pode-se
destacar o gestor da IES 4 que, além de relatar a adequação do espaço físico,
realiza o planejamento das modificações em conjunto com os demais atuantes no
processo de trabalho da instituição, ativando a participação de todos os
envolvidos nas estratégias de mudança buscando informações e ideias que
diferindo dos desejos e vivência dos gestores, contribuem satisfatoriamente
para uma visão ampliada das várias interfaces do cuidado com os PNEs.
É perceptível na organização, quando existe essa troca de informações e
pensamentos, o funcionário se sente participante ativo das ações da
instituição. Todos se beneficiam, pois autores e co-autores se desdobram num
ideário comum visando à notoriedade do serviço, assim como, a integração dos
profissionais nas tomada de decisões.
Pode-se inferir pelo depoimento dos gestores que apenas a IES 1 admite o
despreparo do seu corpo docente. Nessa instituição, em função de seu caráter de
gratuidade do ensino, a exigência no atendimento das normas são lentificadas,
fato a ser explicado pela falta de imposição e pressão social, inexistentes.
Além do mais, nesses serviços a hierarquia burocrática caminha vagarosamente
pela dependência da aprovação de um grande número de pessoas e recursos, por
vezes, em falta ou ainda mal utilizados.
Observa-se ainda, que os serviços educacionais, independente se público ou
privado, apesar dos respaldos legais que amparam os direitos dos portadores de
necessidades especiais, ainda não se mostram completamente estruturados para
acolher esses indivíduos. A integração constatada em documentos e discursos
políticos ainda não tem sido prioridade nos projetos direcionados para
educação. O gestor da IES 1, por entender não ser único responsável pelas
políticas, declara que há insuficiência em atender as necessidades dos PNEs. Já
o gestor da IES 2 busca justificativas pouco coerentes para justificar a
estrutura curricular adotada em relação à temática.
Por outro lado, os gestores da IES 3 e IES 4, na tentativa de manter seu
mercado plenamente funcionando com serviços prestados a todos que frequentam a
instituição, revelam-se preocupados com a manutenção e aprimoramento de ações
direcionadas aos PNEs, pois a atração dos indivíduos para essas instituições de
ensino, pelo investimento aplicado exige alta qualidade.
Apesar das lacunas existentes na atenção aos PNEs, não se permite deixar de
reconhecer que nas últimas décadas, avanços existiram, quando antes se buscava
a inserção desses indivíduos no ensino superior, hoje se anseia pela efetivação
do acesso e permanência. Algumas conquistas já foram alcançadas, mas torna-se
urgente uma ação articulada entre pessoas com necessidades educativas
especiais, IES, governo e sociedade para a construção de uma sociedade
igualitária e democrática.
A relevância social das necessidades especiais extrapola a esfera da saúde e
atinge a sociedade como um todo, visto que essas pessoas possuem as mesmas
necessidades de outras além das peculiares à sua condição(13). Cabe acrescentar
que a degradação da qualidade de vida desses sujeitos aumenta ainda mais quando
além da necessidade especial, a pobreza também se faz presente e está atrelada
a fatores como a (des)educação, o desemprego, a violência e as dificuldades de
acesso a serviços de saúde e de aprendizado(14).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a importância da temática da inclusão, ainda incipientemente
discutida, para não dizer quase escassa entre as publicações em saúde, este
estudo objetivou compreender a concepção dos gestores de IES em enfermagem da
cidade de João Pessoa-PB sobre a necessidade de mudanças a fim de adequarem-se
à clientela com necessidades especiais.
Para execução do mesmo, a disponibilização dos gestores em participarem da
pesquisa foi de fundamental importância, apesar da dificuldade de acesso a
alguns deles. Enriquecedor também foi o método de análise escolhido para
interpretação dos dados ' Vertente Fiorin ' pois possibilitou a integração
ideológica dos depoimentos dos sujeitos aos fatos históricos e sociais da
atualidade. Esta análise revelou que as IES demonstram preocupação em atender
as demandas das políticas de inclusão, tanto no que se refere à estrutura
física quanto pedagógica. Porém, algumas delas ainda assumem caráter de pouco
preparo e até afirmam tal posição no atendimento aos estudantes com
necessidades educativas especiais que ingressam em sua organização. Ocorre, nas
IES pesquisadas, um processo de mudanças construído de maneira lenta e gradual
requerendo atuação de gestores qualificados e comprometidos em executar cívil e
legalmente políticas de inclusão.
Nesta perspectiva, as contribuições oriundas dos resultados obtidos neste
estudo revelam haver um processo em franco andamento em direção a
redemocratização do ensino superior em enfermagem na Paraíba que abre as portas
da educação para pessoas com necessidades especiais, possibilitando, mesmo que
ainda de forma discreta, a qualificação profissional desses indivíduos.
Este estudo contribuiu, também, para ampliação do leque de possibilidades em
pesquisa na enfermagem, haja vista que publicações sobre essa temática
encontram-se prioritariamente na área da educação, em contrapartida, escassas
na área da saúde.