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BrBRCVHe0034-71672012000200025

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National varietyBr
Year2012
SourceScielo

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Plano de Cuidados Compartilhado: convergência da proposta educativa problematizadora com a teoria do cuidado cultural de enfermagem

INTRODUÇÃO A enfermeira, na condição precípua de educadora em saúde, exerce esta atividade profissional realizada com diferentes clientelas e contextos, o que exige conhecimento da realidade sócio-econômica, política e cultural na qual se situa o cliente, devendo resgatar esse sujeito como cidadão ativo, participante do seu processo de cuidado. Nessa diretiva, necessita posicionar-se de forma ética e embasada numa pedagogia que transcende à tradicional, embutida, ainda, na concepção e prática hegemônica de cuidado hierarquizante dos dias atuais.

Aproximando-se as situações de cuidado com as considerações pedagógicas de Freire0 ', tal evento educativo problematizador se torna possível por meio do diálogo transformador que comunica, possibilitando a transição de uma consciência "ingênua", caracterizada pela passividade, para uma consciência crítica e reflexiva, capaz de fazer com que o cliente se coloque em posição questionadora, participativa e ativa. Isto significa assumir a posição de sujeito e não objeto da ação profissional.

Assim agindo, pode optar por aderir ou não à mudança de hábitos, atitudes e modos de pensar a vida e a saúde. Os possíveis caminhos e as repercussões das escolhas são refletidos e traçados de forma conjunta na relação dialógica de cuidado, podendo o cliente ou escolher a mudança, que ocorre no sentido da verdadeira humanização do homem, ou ficar a favor da permanência, chegando ao ápice da antimudança.

Essa mudança de perspectiva na relação do cuidado entre a enfermeira e o cliente é capaz de promover uma autêntica comunicação entre pessoas que têm sentimentos, desejos, sonhos, dentre outros atributos humanos. Implica co- construção de saberes e a possibilidade de transformação da realidade, culminando dessa forma, numa interação mútua, verdadeira, horizontal e humanizada, voltada à libertação dos oprimidos por meio da ruptura da cultura do silêncio, revelando a importância da enfermeira nestes momentos. Esta ação política acontece em comunhão com os oprimidos na busca de sua libertação, resultando em desvelamento e, logo, inserção crítica na realidade(2).

Ao acessar os saberes e práticas de clientes acerca das demandas de cuidado de si, é possível se pensar em um cuidado compartilhado no qual se considere o universo de saberes técnico-científicos e populares. A prática do cuidado compartilhado está amparada nos pressupostos filosóficos do construcionismo social, ou seja, a construção do conhecimento dar-se-á a partir da experiência do sujeito num processo de significação. "Nesse sentido, ao pensarmos que o produto da ação de cuidar (o cuidado) pode ser compartilhado, temos , necessariamente, um processo dialógico permeando tal construção no encontro dos saberes - do senso comum e reificado - que, por sua vez, abarca o encontro de culturas de conhecimento e prática"(3).

Nessa perspectiva, a abordagem dialética freiriana entra em sinergia compondo o cenário de uma praxis radicalmente compromissada com as transformações sociais, abolindo eticamente a opressão e a injustiça. Isso porque essa proposta educativa dialógica e problematizadora, que assinala uma mudança de perspectiva na relação de cuidado de enfermagem, se reveste da compreensão do cliente como potencialmente ativo, inserido sócio-culturalmente em uma realidade que lhe é singular, cujas experiências se acumulam, se refazem e se modificam ao longo de sua trajetória existencial(4). Afinal, a prática do cuidado de si implica que o sujeito se constitua em face de si próprio não como um simples indivíduo imperfeito, ignorante e que tem necessidade de ser corrigido, formado e instruído, mas sim como indivíduo que sofre de certos males e que deve deles cuidar, seja por si mesmo, ou por alguém que para isso tem competência(5).

Na contramão de interações hierarquizantes e autoritárias, assume-se um compromisso na construção de relações horizontais através de práticas de cuidado que possibilitem a conscientização em saúde decorrente do ato reflexivo expresso no encadeamento ação-reflexão-ação, viabilizado pelo diálogo transformador. Nessa perspectiva, o sujeito atua como partícipe do cuidado, decide, opta e escolhe o melhor para si; condição que vai além de mero receptor de conhecimentos, gerando significativa autonomia nesse processo, de modo a reunir condições de implementar o cuidado nos seus espaços de vida comum.

Tendo em vista os posicionamentos abordados, este estudo objetiva refletir sobre o Plano de Cuidados Compartilhado -PCC - como uma proposta educativa- cuidativa, na convergência entre os teóricos Paulo Freire e Leininger, no que tange à pedagogia problematizadora e ao cuidado cultural de enfermagem. Essa proposta emerge a partir da finalização e dos resultados de uma pesquisa de Mestrado em Enfermagem, sendo apresentada em três momentos no decorrer desse artigo: Momento 1 "A Pedagogia Freiriana"; Momento 2 "Teoria do Cuidado Cultural de Enfermagem" e Momento 3 "Reflexões Sobre a Utilização do Plano de Cuidados Compartilhado -PCC - na Prática de Enfermagem".

A PEDAGOGIA FREIRIANA De acordo com Freire, "O homem deve ser o sujeito de sua própria educação. Não pode ser o objeto dela. Por isso, ninguém educa ninguém"(1). Decorrem deste pensamento indícios claros de que o homem não pode ser "coisificado" e oprimido na ação educativa. Como sujeito cognoscente, imerso no mundo e com o mundo, ele deve ser reconhecido e ouvido por meio de um processo de educação estabelecido numa relação horizontal e recíproca por meio do diálogo que comunica. A partir deste método participativo, dialogal e ativo, que permite a comunicação, ambos se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo.

O diálogo, portanto, é a essência da educação. É caracterizado como uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera criticidade. Nutre-se do amor, da humildade, da esperança, da e da confiança. Por isso, o diálogo comunica. Então, no momento em que os dois polos do diálogo se ligam, com amor, com esperança, humildade, e confiança, a construção de sujeitos críticos pela relação empática instalada entre ambos, procedendo, de fato, a comunicação, conforme representação esquemática a seguir:

Figura_1

É por meio da dialogicidade que os sujeitos alcançam a comunicação. O diálogo é mediatizado por uma interação horizontal e mútua, indo de encontro à educação depositária, na qual o opressor deposita, nos outros, o conhecimento de forma verticalizada, unidirecional por meio de um discurso monológico. A prática dialógica permite o compartilhamento de saberes e práticas entre os sujeitos envolvidos por meio das palavras. Neste momento é que se leva em consideração o saber do outro, valorizando sua cultura, suas crenças, seu contexto social, político e econômico.

A conscientização é um ato reflexivo, e, portanto, produto da prática dialógica. É nesse compartilhar de saberes e práticas que a revelação de uma ação praticada por um ou ambos do processo, culminando numa reflexão crítica acerca do ato para a construção de um novo saber, o compartilhado. É neste ínterim que a transitividade de consciência, da ingênua, revelada pela passividade, para uma consciência crítica e reflexiva, caracterizada por ser ativa e questionadora, outorgando autonomia ao sujeito cognoscente(7).

Neste processo de conscientização, a ruptura da cultura do silêncio, libertando os oprimidos frutos da educação tradicional. A partir disso, lançamos os caminhos para que os sujeitos possam agir novamente, desta vez, conscientes da situação ora posta. Esta nova ação pode ser modificada ou não pelo sujeito consciente, porque a partir dos caminhos lançados, ele opta pelo que é melhor para si, aderindo ou não a mudança de hábitos, vivenciando a autonomia alcançada. Se optar pela mudança, no sentido da verdadeira humanização do homem, transformará a realidade inicialmente apresentada.

Figura_2

É importante mencionar que essa mudança de comportamento geralmente não é imediata, e será percebida quando o sujeito der marcas da transformação de seu saber. um tempo variável entre a ação, a reflexão sobre esta ação e a geração de uma nova ação pela tomada de consciência(4).

Este modelo educativo inovador, de transformação da realidade, baseada na crítica e reflexão, vem sendo adotado no campo da educação em saúde, particularmente da Enfermagem. Isto porque, o modelo tradicional que utiliza práticas verticalizadas de educação centradas na soberania do saber acadêmico- científico sobre os demais saberes não vem dando conta da complexidade inerente à saúde das pessoas, em que pese seus diferentes modos de viver e de cuidar de si.

O pensamento de Freire ainda é contemporâneo e inspira a teoria e a prática da educação, contribuindo e enriquecendo de forma significativa a prática educativa em Enfermagem, resultando em um cuidado diferenciado, pautado na problematização das situações advindas da realidade concreta dos sujeitos envolvidos em situação de cuidado. A pedagogia problematizadora subsidia os encontros entre enfermeira e clientes visando, pelo diálogo e compartilhamento de idéias e posições, acessar seus saberes e práticas sobre as demandas de cuidado de si, e, por um processo de crítica e reflexão, contribuir com a promoção de mudanças que se fizerem pertinentes e necessárias.

Ao abordar os saberes e práticas de clientes sobre as demandas de cuidado de si, numa perspectiva educativa, considerare sobremaneira o arcabouço cultural em que o cliente está envolvido por meio do compartilhamento de saberes e práticas de cuidado entre a enfermeira e o cliente, levando-se em conta as diferenças entre a cultura dos envolvidos no cuidado: a profissional, advinda do saber técnico-científico; e a pessoal, cunhado ao saber leigo dos clientes, revelando-se uma possível articulação das idéias freirianas com a Teoria Cultural do Cuidado de Enfermagem, do que tratamos a seguir.

TEORIA DO CUIDADO CULTURAL DE ENFERMAGEM A Teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural de Leininger objetiva "Identificar os meios para proporcionar um cuidado de enfermagem culturalmente congruente aos fatores que influenciam a saúde, o bem-estar, a doença e a morte das pessoas de culturas diversas e semelhantes"(8). Foi desenvolvida a partir da Antropologia; porém, reformulada para a Enfermagem Transcultural com perspectivas de cuidado humanizado(9-10).

A Universalidade do cuidado revela a natureza comum da humanidade e dos seres humanos, a Diversidade do cuidado revela a variabilidade e seleção das características originais dos seres humanos(11).

Leininger cunhou o termo enfermagem transcultural, que considera ser diferente da antropologia médica e disciplinas afins, por estar focada em culturas diferentes, no cuidado cultural, nos fenômenos da saúde e da enfermagem. Ela também cunhou o termo cuidado culturalmente congruente (nos idos de 1960) para embasar o principal objetivo de sua teoria(8).

Os conceitos de Cultura, Valor Cultural, Cuidado de Enfermagem Culturalmente Diverso, Etnocentrismo, Generalização, Estereótipo, Congruência Cultural, Etnoenfermagem e Enfermagem Transcultural fundamentam a Teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural(8).

Para a autora da teoria, cultura são "os valores, crenças, normas e modos de vida de um determinado grupo, aprendidos, compartilhados e transmitidos e que orientam seu pensamento, suas decisões e suas ações de maneira padronizada"(9).

A teoria se baseia na afirmativa de que "em todas as culturas o cuidado é uma necessidade humana essencial para o total desenvolvimento e manutenção da saúde e sobrevivência dos seres humanos"(12). As ações do cuidado cultural são congruentes com as crenças, valores e costumes do cliente, ajudando-o de modo significativo e pacífico no decorrer de sua trajetória existencial até a sua morte.

O cuidado cultural permite a construção de um plano de cuidados único e congruente ao contexto cultural do cliente, havendo, de certa forma, o alcance sobre a forma como o mesmo deseja participar do cuidado, qualificando-o. Este tipo de cuidado, em linhas gerais, mediatiza o cuidado integral em enfermagem.

A intenção é o reconhecimento singular dos respectivos saberes e práticas de cuidado, aplicados às demandas de cuidado de si, valorizando a totalidade da vida de cada um, tudo que o cerca, numa perspectiva holística da vida humana.

Leininger, em sua teoria, valoriza os aspectos culturais como forma de expressão dos sujeitos envolvidos no processo de cuidado, indo ao encontro das idéias de Freire, que também valoriza os aspectos culturais como forma de expressão dos sujeitos, todavia no processo educativo. Porém, que considerar as diferenças teórico-filosóficas entre os dois autores.

Enquanto Freire trabalha com a perspectiva da consciência crítico-reflexiva, pelo diálogo, Leininger trabalha com as categorias de adaptação e acomodação.

Na visão de Leininger, o cliente não propriamente transforma ou muda a sua concepção de saúde e doença pela crítica e reflexão, mas ajusta-se às condições que lhes são apresentadas.

Para Freire "a educação deve estimular a opção e afirmar o homem como homem.

Adaptar é acomodar, não transformar. O homem integra-se e não se acomoda.

Existe, contudo, uma adaptação ativa"(1). Além disso, enquanto para Leininger (9) o diálogo caracteriza-se como forma de atenuar os conflitos na relação do cuidado pela troca de informações, para Freire o diálogo não exclui o conflito, sob pena de ser um diálogo ingênuo. Isso porque Freire visualiza o diálogo como uma forma de os oprimidos superarem sua condição de oprimidos; afinal, vivemos numa sociedade de classes. Esclarece, ainda, que "esse diálogo supõe e se completa, ao mesmo tempo, na organização da classe, na luta comum contra o opressor, portanto no conflito"(1).

Não obstante as diferenças pontuais entre as concepções teóricas, ambas contribuem de maneira significativa com a construção do cuidado compartilhado, uma vez que tanto Freire quanto Leininger concebem a cultura como parte essencial, integrante do processo de educar e cuidar, respectivamente.

Considerando os aspectos culturais dos clientes envolvidos na relação de cuidado para a providência de um cuidado congruente a sua realidade, por meio do compartilhar de saberes e práticas, Leininger desenvolveu sua teoria baseada na convicção de que: as pessoas de diferentes culturas podem oferecer informações e orientar os profissionais sobre a forma como desejam receber os cuidados. A cultura determina os padrões e estilos de vida, e tem influência nas decisões das pessoas. Tal teoria ajuda a enfermeira a descobrir e documentar o mundo do cliente e utiliza seus pontos de vista, conhecimentos e práticas juntamente com o seu conhecimento profissional, como base para adotar ações e decisões profissionais coerentes com a cultura(13:27).

O cuidado cultural leva em consideração a totalidade da vida humana, havendo o respeito e a consideração do contexto cultural do sujeito. O conhecimento acerca desse cuidado cultural favorece as práticas de cuidado da enfermeira, tornando-as mais legítimas, à medida em que o reconhecimento do saber cultural do cliente, propondo cuidados de Enfermagem culturalmente congruentes (13). Assim, a apreciação e lapidação dos cuidados realizados pelos clientes, advindos do senso comum, compartilhados com o saber da enfermeira, representa a vivência em ato desse cuidado culturalmente congruente. Destaca-se a seguir o Plano de Cuidados Compartilhado - PCC.

REFLEXÕES SOBRE A UTILIZAÇÃO DO PLANO DE CUIDADOS COMPARTILHADO NA PRÁTICA DE ENFERMAGEM Em linhas gerais, o plano de cuidados compartilhado, construído em conjunto com cada cliente e em cada abordagem situacional de cuidado, procura enfatizar os cuidados considerados anacrônicos ao contexto do sujeito em questão, podendo trazer, em curto, médio ou longo prazo, prejuízos ao mesmo. Ainda pontua-se, no âmbito da relação de cuidado, a manutenção de práticas consideradas pertinentes pela enfermeira e cliente, a partir de uma análise lógica conjunta dos elementos fundamentais usados para o cuidado de si e suas possíveis repercussões na saúde do indivíduo em foco. Como a orientação dialogada tem o intuito de contemplar a individualidade de cada sujeito, suas necessidades e desejos, o plano não se centra em cuidados generalizados ou pré-pontuados, ou seja; à medida que a "conversa" flui, o plano de cuidados vai sendo co- construído na singularidade do cliente.

Como enfatizado anteriormente, essa reflexão emerge dos resultados considerados positivos de uma dissertação de mestrado em enfermagem, suscitando um caminho acerca de como, efetivamente, pode-se praticar uma abordagem de educação em saúde democrática, em que gera frutos pertinentes que colaboram na restauração da saúde e bem-estar do cliente.

A justificativa detalhada de cada cuidado sobre a sua pertinência, ou não, é papel fundamental da enfermeira no manejo da confecção do plano de cuidados compartilhado, colaborando para o entendimento do uso, ou não, de determinadas práticas. Ao final da implementação do processo educativo dialógico, à medida que o plano de cuidados vai sendo construído, os problemas observados vão sendo, novamente, pontuados e seguidos das orientações dialogadas. O conhecimento do cliente e da enfermeira acerca do cuidado vai sendo questionado e revisitado.

O compartilhamento das informações entre enfermeira-cliente, pautado pela pedagogia problematizadora, é pertinente, na medida em que facilita a aprendizagem dos clientes. O cliente passa a refletir e a atentar para os cuidados que lhes são essenciais. Durante a troca de saberes, a enfermeira indaga sobre os detalhes do cuidado estabelecido em seu espaço de vida cotidiana, ou seja, no domicílio; e é justamente que se revelam as possibilidades de mudança de hábitos frente às dificuldades e problemas encontrados. Isto porque, consciente de sua condição e das demandas de cuidado necessárias, o cliente reúne melhores possibilidades de cuidar de si no domicílio.

A prática dialógica traz para o contexto do cuidado a condição de crítica e de reflexão do cliente que, por sua vez, permite a tomada de consciência sobre o problema e a possibilidade de agir sobre ele de modo a transformá-lo. Uma vez consciente, o cliente se torna mais ativo e partícipe do cuidado; sente-se mais seguro para exercer sua autonomia neste processo, o que o habilita a avaliar os cuidados prestados no domicílio.

O estímulo ao conhecimento do novo deve ser feito pela enfermeira, considerando, no entanto, a pertinência de cada caso e sua realidade. O aumento na qualidade de vida pelo alcance da autonomia planejada se torna real, e assim, facilita os diversos cuidados executados, principalmente no contexto domiciliar pelos clientes. Tais cuidados compartilhados são desafios para a enfermagem, pois demandam uma série de atributos que dependem não da postura profissional da enfermeira, como também da dinâmica de atendimento da instituição assistencial, a relação com a equipe interdisciplinar e sobretudo com o entendimento dessa nova perspectiva política e amorosa, que supera a pedagogia tradicional enraizada não na culturalidade dos clientes, como também no exercício dos profissionais de saúde e seus gestores.

DESAFIOS PARA A ENFERMAGEM O compartihamento das informações proporciona a revisitação de saberes e práticas não pelos clientes, como também pela enfermeira. A crítica-reflexão viabilizada pelo diálogo transformador e reconstrutor permite o aprimoramento ou construção de novos saberes que não fazem parte do universo cultural primeiro.

No entanto, no contexto atual, a atividade educativa estabelecida pelo profissional de saúde ainda é feita, em grande parte, de forma hierarquizada e autoritária, na qual não se permite a troca e não a valorização do sujeito como participante ativo do processo de cuidado, não tendo voz. Essa forma de educar-cuidar, a despeito dos méritos por vezes alcançados, não avança no sentido de valorizar o cliente como sujeito ativo, inserido em um contexto que lhe é próprio, em que seus saberes e suas práticas têm valor e são respeitados.

Mesmo com a evolução da ciência, do mundo em que vivemos, algumas atividades/ atitudes profissionais ainda continuam enraizadas e permanecem inalteradas ou pouco alteradas ao longo do tempo. Assumir uma nova postura frente à nova realidade reveste-se de condição ética perante a sociedade em transformação, tendo em vista as repercussões da implementação da pedagogia freiriana em pesquisas publicadas e consagradas, especialmente, no âmbito da enfermagem.

É preciso, contudo, investir em estudos e na prática profissional que visem à superação do modelo monológico, que não vem dando conta dos aspectos alusivos à saúde e à singularidade do cliente. O processo dialógico não somente trabalha no intento de dar voz aos sujeitos, como também, dar significado a esta voz, imprimindo-lhe sentido. É preciso, deste modo, pensar a educação em saúde em consonância com as modificações cotidianas do mundo em que vivemos, sendo o cliente sujeito ativo integrante desse processo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Na contemporaneidade, o Plano de Cuidados Compartilhado surge como resposta à superação de uma pedagogia tradicional de educação em saúde bancária que não vem dando conta dos interesses individuais dos clientes, suas necessidades e desejos no que compete à sua identidade como ser único/insubstituível que responde de forma característica às práticas de cuidado de si.

O Plano de Cuidados Compartilhado é fundamentado pelos princípios teóricos de Paulo Freire e Leininger, no que tange à pedagogia problematizadora e ao cuidado cultural de enfermagem. Ambos concebem a cultura como parte essencial, integrante do processo de educar e cuidar, respectivamente.

No compartilhamento das informações, enfermeira e cliente refletem juntos e analisam criticamente a pertinência, ou não, de determinada prática, e quando consideradas inadequadas ao contexto do cliente, ambos se mobilizam para a mudança. Faz-se necessária a articulação dos cuidados profissional e popular com o cenário onde ele será efetivamente realizado. Para tanto, a participação ativa do cliente é imprescindível na atividade desenvolvida, pois favorece o processo de conscientização sobre as formas que ele pode se cuidar, abrindo caminhos para favorecer sua saúde e bem-estar.

Sobre a valorização dos cuidados profissional e popular durante o processo educativo-cuidativo, vale dizer que, além dos aspectos físicos, a enfermeira deve atribuir sentido àqueles subjetivos, como a atenção necessária ao cliente: seus valores, suas crenças, seus modos de viver, -de cuidar de si e o conjunto de saberes e práticas presentes em suas ações de cuidado. Valorizar a complementariedade desses aspectos significa pensar o cuidado de forma compartilhada, permeada pela prática dialógica e sensível da enfermeira.

A aprendizagem conjunta acerca dos elementos considerados essenciais ao cuidado permite o desvelamento de uma realidade peculiar e a inserção de possibilidades para a transformação, por opção do sujeito, da realidade concreta revelada. Sua condição de crítica e de reflexão é aguçada, exercendo com maior segurança e autonomia as demandas cotidianas do cuidado de si, avaliando, modificando hábitos e transformando a realidade.

A autonomia planejada se torna real, fazendo com que os clientes não mais exerçam práticas fragmentadas, decorrentes da pedagogia tradicional. O cliente autônomo alcança, contudo, a plenitude das ações. Quando chega à autonomia desejada, se insere em um universo que lhe é peculiar; está no mundo e com o mundo e com isso pode ser mais. Mesmo com as modificações sofridas no mundo, consegue, ao mesmo tempo, inserir crítica e reflexão acerca do cuidado pensado, avaliando e modificando hábitos, constantemente.

Contudo, devemos refletir sobre o quê e como orientamos, sendo necessária a impressão de crítica e reflexão em cada situação de cuidado e em cada atividade educativa, pois a orientação dialogada possibilita o compartilhamento de saberes e práticas que perpassam os sistemas, popular e profissional, garantindo a efetividade do nosso cuidado. Desta forma, alcançamos as necessidades e desejos do cliente, nosso maior mobilizador da implementação de práticas de cuidar eficazes.


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