Condições e motivações para o trabalho de enfermeiros e médicos em serviços de
emergência de alta complexidade
INTRODUÇÃO
A centralidade do componente da ação humana em todo o processo do cuidado da
saúde tem como consequência a importância do trabalho dos profissionais na
qualidade da prestação de serviços. Sendo assim, as condições oferecidas para o
desenvolvimento do trabalho, a motivação dos profissionais de saúde e suas
inter-relações devem contribuir de forma significativa para a melhoria da
qualidade da atenção à saúde.
Através da análise dos componentes estrutura, processo e resultado é possível
avaliar a qualidade dos serviços de saúde(1). O processo refere-se às
atividades envolvendo profissionais de saúde e pacientes, com base em padrões
aceitos, e cuja análise pode ser orientada sob o ponto de vista técnico e/ou
administrativo. A qualidade é o produto de dois fatores, que são a ciência e
tecnologia da atenção à saúde e a sua aplicação na prática. A qualidade
alcançada será caracterizada através de alguns atributos: eficácia,
efetividade, eficiência, otimização, aceitabilidade, legitimação e equidade(1).
A discussão sobre a influência do trabalho do profissional de saúde na
qualidade do atendimento prestado ao usuário dos serviços de saúde não é
recente, e vem sendo bastante discutida nos últimos anos. Em estudo sobre o
burnout entre profissionais de urgências pediátricas (enfermeiros e médicos) do
Recife, verificou-se que os profissionais das urgências "entrelaçam" o
sentimento de responsabilidade pela vida dos pacientes com a desmotivação
gerada pelas insuficientes condições de trabalho e desvalorização profissional,
situação que repercute sobre a vida mental dos profissionais e,
consequentemente, sobre "as suas respostas diante das situações de trabalho"
(2).
Dentre os fatores que influem na motivação/satisfação dos profissionais, os
mais citados na literatura recente são: status perante a categoria, tempo de
trabalho na mesma alocação, remuneração, existência de formação continuada,
condições de trabalho, suporte especializado, condições sociais da comunidade,
(im)possibilidade de múltiplos vínculos, insuficiência de profissionais e
rotatividade dos profissionais médicos, realização profissional expressa pelo
vínculo, escuta e responsabilização, intensidade do ritmo de trabalho,
dificuldade de "diálogo" com os demais componentes da rede assistencial,
relação intraequipe, sobrecarga e complexidade do trabalho, possibilidade de
progressão no trabalho, autonomia, conflitos entre valores pessoais e laborais,
valorização pelos gestores(3).
Dos fatores citados um dos mais discutidos e pautados como relevante na
motivação do profissional é a questão das condições do ambiente físico do
trabalho. O investimento nas condições objetivas oferecidas para o desempenho
no trabalho (condições de higiene, segurança e equipamentos) é um caminho para
evitar a insatisfação com o trabalho(4). Além disso, o hospital de emergência é
um lugar onde os profissionais são submetidos à pressão do risco de morte do
paciente e da relação tensa com os usuários, pacientes e acompanhantes, que
chegam a agredir os profissionais quando confrontados com as dificuldades
estruturais e organizacionais no percurso do atendimento(5-6).
As condições insatisfatórias no trabalho afetam não apenas a autoestima como
também interferem diretamente na qualidade da assistência, devido à
desmotivação destes profissionais para o trabalho. A avaliação de enfermeiros
em uma emergência, identificou que a percepção das condições insatisfatórias de
trabalho, a que estão submetidos os profissionais, leva a desmotivação,
insegurança e baixo rendimento, o que impacta negativamente na qualidade da
assistência prestada(5).
A melhoria das condições de trabalho e as recompensas econômicas não geram,
isoladamente, maior envolvimento ou maior motivação, porém afastam barreiras
para o crescimento do desempenho(7). No caso dos profissionais de saúde, este
raciocínio se evidencia diante do conteúdo humanístico e social do trabalho,
implicando em outros mecanismos de valorização e motivação(6).
"A motivação no trabalho tem raízes na organização, no ambiente externo e no
próprio indivíduo"(8). Desta forma, uma pessoa motivada é produto da interação
de sua personalidade com essas condições, e "ao exibir um comportamento
motivacional o indivíduo utiliza-se de sua inteligência, emoções, instintos e
experiências vividas para alcançar os seus objetivos"(8), a partir das
condições objetivas que lhe são oferecidas.
A análise das estratégias motivacionais de enfermeiras em um hospital de
urgência, utilizando a Teoria dos Dois Fatores, de Frederick Herzberg, que
propõe a relação do comportamento no trabalho com fatores higiênicos ou
extrínsecos e motivacionais ou intrínsecos, identificou que a maioria dos
profissionais de enfermagem associava a motivação apenas aos fatores
higiênicos, ligados às condições de trabalho: estrutura, salários, ambiente,
capacitação. Contraditoriamente, buscavam aplicar técnicas para motivar a
equipe, voltadas aos fatores motivacionais relacionados à liberdade de criação
e autonomia do trabalhador(9).
Outra abordagem da motivação para o trabalho é a Teoria dos Valores Individuais
Básicos que faz uma classificação dos valores de trabalho em dez tipos, a
saber:
...autodeterminação (independência de pensamento e ação),
universalismo ou filantropia (preocupação com o bem-estar de todos),
benevolência (interesse e preocupação com o bem-estar de pessoas
íntimas), auto-realização (meta de sucesso e de demonstração de
competência), hedonismo (prazer e gratificação pessoal), conformidade
(controle pessoal de acordo com as expectativas sociais), tradição
(respeito e aceitação dos ideais e costumes da sua sociedade),
estimulação (busca de excitação e mudança), segurança (estabilidade
da sociedade e de si mesmo) e poder (busca de status social,
prestígio e controle)(10-11).
Um dentre os instrumentos para avaliação das motivações para o trabalho, a
Escala de Valores Relativos ao Trabalho (EVT), baseada na Teoria de Valores de
Schwartz, possui índices de confiabilidade superiores a 0,80 (alfa de
Cronbach), com validação apresentada em estudo publicado em 2003. Este
instrumento propõe quatro fatores de motivação, contribuindo significativamente
para a compreensão das motivações para o trabalho e para o desenvolvimento de
pesquisas sobre os valores relativos ao trabalho, com a ressalva de que não
inclui aspectos relacionados às condições de trabalho e conforto, que
necessitam de instrumento adicional(12).
* Realização no trabalho - que se refere à busca de prazer e realização
pessoal e profissional, bem como de independência de pensamento e ação no
trabalho por meio da autonomia intelectual e da criatividade;
* Relações sociais - que se refere à busca de relações sociais positivas no
trabalho e de contribuição positiva para a sociedade por meio do
trabalho;
* Prestígio - que se refere à busca de autoridade, sucesso profissional e
poder de influência no trabalho; e
* Estabilidade - que se refere à busca de segurança e ordem na vida por
meio do trabalho, possibilitando suprir materialmente as necessidades
pessoais.
Os quatro fatores envolvem questões que se inserem nas escolhas de alternativas
de trabalho, de comportamentos no trabalho e avaliações do contexto de
trabalho, questões estas que influem na ação do trabalhador na assistência a
saúde.
Estudar a assistência à saúde prestada nas unidades de atendimento de
emergência é um grande desafio, que é ainda maior quando se propõe o estudo da
qualidade da assistência prestada. Neste enfrentamento, o presente trabalho
teve o objetivo de investigar as motivações para o trabalho e avaliar as
condições de trabalho oferecidas aos enfermeiros e médicos no atendimento aos
usuários em serviços de emergência.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo de corte transversal sobre as motivações e
condições oferecidas para o trabalho de enfermeiros e médicos dos três maiores
Hospitais Públicos de Urgência e Emergência do Recife, Pernambuco, todos sob
gestão estadual. No período da coleta, de outubro de 2006 a janeiro de 2007, os
Hospitais contabilizavam 97 enfermeiros e 469 médicos para o atendimento de
emergência e pronto-atendimento, realizando em média 2.800 atendimentos
semanais cada, num total de 8.400 nos três hospitais.
Para a definição da amostra, foram selecionados em cada hospital, através de
sorteio, um médico do pronto-atendimento diurno e noturno e um médico da
emergência diurna e noturna em cada um dos dias da semana, considerando as
características das emergências dos três hospitais em estudo e o interesse em
manter uma amostra aleatória com erro absoluto de até 5%, ou seja, 28 médicos
por hospital, num total de 84 médicos nos três hospitais, correspondendo a
17,9% do universo de profissionais.
No caso dos enfermeiros, os critérios foram os mesmos, porém, como a sua
atuação ocorre indistintamente no pronto-atendimento e emergência, foram
selecionados um enfermeiro dos turnos diurno e noturno em cada um dos dias da
semana nos três hospitais, ou seja, 14 por hospital, num total de 42
enfermeiros nos três hospitais (43,3% do total).
Para estudo da motivação, considerando os referenciais teóricos sobre avaliação
dos valores do trabalho, optou-se pela utilização da Escala de Valores
Relativos ao Trabalho (EVT)(12). A escala foi escolhida por apresentar fácil
aplicação e ser específica para avaliação de profissionais com formação escolar
acima do nível médio e superior. Para análise dos resultados da aplicação da
EVT, utilizou-se o padrão que avalia os fatores a partir da frequência dos
escores (1 a 5) em intervalos, médias e desvio padrão(7).
Com relação às condições estruturais de trabalho nos hospitais, foi solicitada
ao profissional a avaliação das dimensões relacionadas ao conforto,
equipamentos e insumos, quantidade de profissionais, meios de diagnose e
terapia, suporte do serviço de laboratório e gerenciamento/organização do
trabalho. Para tanto, foi elaborado um questionário específico, testado quanto
à clareza do texto e coerência das respostas, com a aplicação prévia no
Hospital da Restauração. O resultado deste teste foi utilizado para correções
do instrumento e não foi incorporado ao estudo.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro de Pesquisas Aggeu
Magalhães - CpqAM sob o número 61/06, e sua realização foi autorizada pelos
gestores estaduais.
RESULTADOS
Entre os profissionais entrevistados, observou-se uma predominância do sexo
feminino para os enfermeiros (92,9%) e masculino para os médicos (57,1%). Entre
os enfermeiros, 41,5% encontram-se na faixa-etária entre 35 e 44 anos; já entre
os médicos a maior proporção está na faixa-etária entre 25 e 34 anos,
representando 53,6% (Tabela_1).
Tabela 1 - Caracterização dos Enfermeiros e Médicos das emergências segundo
atributos pessoais. Recife, 2007.
*Um dos enfermeiros não respondeu esta questão
Quando se analisa, ainda na tabela_1, o tempo de formado dos enfermeiros e
médicos verifica-se que a maioria dos profissionais têm um tempo de formado
entre 5 e 14 anos, 45,2% entre enfermeiros e 56,0% entre médicos. Contudo,
ressalta-se que há uma considerável proporção de enfermeiros com tempo de
formado entre 15 e 24 anos (33,3%).
Os resultados referentes ao tempo de trabalho dos profissionais demonstram que
52,4% de enfermeiros e 66,7% dos médicos têm menos de 5 anos nas emergências, e
que enfermeiros possuem maior tempo de permanência (33,3%) em relação aos
médicos (19,0%).
A maioria dos profissionais possui pós-graduação em nível de Residência ou
Especialização, com maior percentual entre os médicos (95,2%). Quanto à escolha
do profissional em trabalhar na emergência, os resultados demonstraram que uma
ampla maioria (78% dos enfermeiros e 83% dos médicos) teve essa escolha como
opção pessoal (Tabela_1).
Ao analisar a motivação entre as profissões (Tabela_2), observa-se que a
Realização Profissional é o fator mais importante, com valor médio de 3,90 e
desvio padrão de 0,81, além da maior concentração de respostas com valor maior
que 4 (48,41% das respostas), entre todos os fatores. Seguem-se o fator
Relações Sociais (Média 3,76) e Estabilidade (3,62), com médias muito próximas,
com o fator Estabilidade apresentando maior dispersão nas respostas (desvio
padrão = 0,92). O fator Prestígio, com menor média (2,19), apresenta maior
concentração de respostas entre 1 e 2 (47,62%), e nenhuma resposta maior que 4.
Tabela 2 - Avaliação dos escores dos fatores motivacionais de acordo com os
profissionais enfermeiros e médicos a partir da aplicação da EVT. Recife, 2007.
[/img/revistas/reben/v66n2/02t02.jpg]
Em relação às condições de trabalho oferecidas pelas emergências, as opiniões
dos enfermeiros e médicos (Tabela_3) se direcionam majoritariamente às
respostas "Ruim" e "Regular", que representam em média 79,8% das respostas.
Tabela 3 - Avaliação das condições de trabalho segundo os enfermeiros e médicos
das emergências, Recife, 2007.
[/img/revistas/reben/v66n2/02t03.jpg]
A pior avaliação refere-se ao CONFORTO como condição de trabalho, avaliado por
69,8% dos profissionais como ruim, seguido da manutenção de equipamentos
(67,7%). Embora as piores avaliações se concentrem nos agregados CONFORTO e
EQUIPAMENTOS E INSUMOS, também é importante citar o alto percentual de
respostas "Ruim" em relação ao número de atendimentos por turno.
O agregado melhor avaliado foi o de MEIOS DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICOS, com
29,0% de resposta "Bom", marcadamente em função do "Suporte do Banco de Sangue"
(45,2%). Em seguida, aparece o quantitativo de profissionais, com 26,1% de
"Bom", sendo que a maior avaliação positiva se refere à quantidade de médicos
(33,2% Bom).
DISCUSSÃO
O perfil dos enfermeiros nas unidades pesquisadas revela predominância do sexo
feminino e faixa-etária entre 35 e 44 anos. Além disso, a grande maioria dos
profissionais possui pós-graduação em nível de Residência ou Especialização,
tem um tempo de formado entre 5 e 14 anos e tem menos de 5 anos de trabalho na
emergência.
Os médicos apresentam um perfil com algumas diferenças: a maioria é do sexo
masculino e são mais jovens, encontram-se na faixa-etária entre 25 e 34 anos.
Também apresentam um tempo de formado entre 5 e 14 anos, possuem pós-graduação
em nível de Residência ou Especialização e é maior a proporção de médicos com
menos de 5 anos de trabalho na emergência, em relação aos enfermeiros.
Deste perfil dos profissionais pode-se apreender que se caracterizam pela
juventude e especialização, porém com formação recente e pouco tempo de
trabalho nas emergências, o que deve ser responsável por uma menor experiência
dos profissionais. Além disto, evidencia a existência de uma grande
rotatividade de profissionais nas emergências, em particular dos médicos,
problema presente em todos os níveis de atenção, já evidenciado na Atenção
Básica(3).
Outra característica, tanto dos enfermeiros como dos médicos, foi a opção
pessoal de trabalhar nas emergências, importante para uma maior motivação e
compromisso com o atendimento à população(5). Porém, estas unidades têm uma
remuneração diferenciada em relação aos profissionais diaristas e em relação a
outros hospitais, com o pagamento de gratificação por trabalho em regime de
plantão, logo, o estímulo financeiro talvez seja responsável por uma maior
opção em trabalhar nestas emergências.
A identificação da Estabilidade como segundo mais importante fator motivacional
entre enfermeiros e médicos sugere ser a estabilidade no emprego uma estratégia
motivadora para garantir a permanência dos profissionais nas emergências.
A Realização Profissional foi o fator motivacional de maior importância para os
profissionais. Como este fator se refere à busca de prazer e realização pessoal
e profissional, bem como de independência de pensamento e ação no trabalho por
meio da autonomia intelectual e da criatividade, pode-se concluir que são
pessoas bastante motivadas no desempenho das suas funções. A importância do
"trabalho em si" na motivação humana e suas implicações no resultado do
trabalho também foi identificada como a categoria mais citada em outras
pesquisas realizadas que confirmam a assertiva de que os fatores relacionados
ao próprio trabalho, às tarefas e deveres relacionados ao cargo, recompensam o
indivíduo(13-14).
A boa valorização dos fatores Relações Sociais e Estabilidade revela que os
profissionais consideram que têm uma contribuição positiva para sociedade
através do seu trabalho, e que o seu trabalho na emergência também é importante
como meio de suprir materialmente suas necessidades pessoais. Em estudo
utilizando-se do mesmo instrumento metodológico (EVT), identificou-se que a
realização profissional e a estabilidade foram valores laborais transmitidos
dos pais para os filhos e que estes fatores motivacionais ressaltam a
importância do sucesso profissional baseado no êxito do trabalho e da
independência e satisfação de necessidades materiais(15).
O fator Prestígio obteve a menor relevância como fator motivacional para o
trabalho, resultado semelhante ao estudo de motivação da equipe de enfermagem
em uma unidade de terapia intensiva, no qual 46% dos profissionais não se
sentiram reconhecidos na unidade(16). Este fator se refere à busca de
autoridade, sucesso profissional e poder de influência no trabalho, e seria
necessário um estudo complementar para sugerir os motivos de sua baixa
valorização. Pode-se inferir, contudo, que os profissionais percebem seu
trabalho como pouco reconhecido e não identificam nele o caminho do
reconhecimento profissional.
A motivação para o trabalho dos profissionais de saúde também foi evidenciada
em um estudo que constatou que estes profissionais eram mais motivados que os
bancários, fato que estaria associado a expectativas mais elevadas dos
profissionais de saúde(7).
No desdobramento deste estudo em uma tese de doutoramento, identificou-se
algumas diferenças entre o perfil motivacional de médicos e enfermeiros,
apontando para a melhor avaliação dos enfermeiros em relação às condições
oferecidas em comparação com os médicos, com maior destaque nas questões do
conforto, limpeza, repouso, qualidade da refeição e quantidade de materiais
para o desenvolvimento das atividades. A melhor avaliação dos enfermeiros "pode
estar associada ao perfil destes profissionais, que apresentaram uma maior
vinculação à unidade, como foi visto anteriormente, e consequentemente um maior
conhecimento das rotinas hospitalares e inserção na gerência das emergências"
(8).
Quanto às condições de trabalho, foi evidenciada uma avaliação crítica dos
enfermeiros e médicos nos três hospitais. Analisando-se as questões melhor
avaliadas (suporte do banco de sangue, quantidade de médicos e enfermeiros,
carga horária de trabalho, qualidade das refeições e quantidade de materiais) e
as questões pior avaliadas (conforto como condição de trabalho, manutenção dos
equipamentos e disponibilidade dos equipamentos de trabalho, organização do
ambiente e número de atendimentos por turno), percebe-se que há uma maior
insatisfação com questões estruturais e gerenciais dos hospitais. A
insatisfação com o número de atendimentos por turno aparenta ser incoerente com
a melhor avaliação da quantidade de profissionais e carga horária de trabalho.
A alta demanda de pacientes é grande fonte de insatisfação, cujo enfrentamento
se daria, não pela ampliação do quantitativo de profissionais, mas com o
reordenamento da demanda(5).
A má avaliação das condições de trabalho coaduna com os resultados de estudos,
em que a sobrecarga de trabalho, o estresse e a inter-relação entre ambos são
apontados como relacionados às más condições de trabalho, e podem predispor os
profissionais à desmotivação ou mesmo à Síndrome de Burnout(2, 17-18).
Além disto, a pior avaliação encontrada na infraestrutura e organização reflete
diretamente na qualidade da prestação do serviço. As condições de trabalho são
o principal preditor da força motivacional. Investimentos para melhorar essas
condições são, sem dúvida, o primeiro passo para recuperar a motivação daqueles
que estão perdendo o ânimo(19). Ainda em relação à infraestrutura e organização
do serviço, já foi verificado que o desprazer está relacionado à organização e
às condições de trabalho(18).
O gerenciamento e organização do trabalho como categoria mal avaliada pelos
profissionais, corrobora com esse maior envolvimento e conhecimento por parte
dos enfermeiros nessas rotinas, resultado já encontrado por outros estudos
(5,8).
A boa motivação dos profissionais de saúde apreendida neste estudo evidencia
elementos que ajudam na compreensão do processo de trabalho e na sua interação
com as organizações de saúde. O primeiro elemento é a compreensão de que a
realização profissional é a principal motivação para o trabalho, a conseqüência
dessa maior motivação deveria ser uma maior dedicação ao trabalho e, por
conseguinte, um melhor atendimento à população. O segundo é o grau de
importância que confere às relações com seus colegas de trabalho, assim como, o
quanto é importante o seu trabalho para sociedade, embora não perceba o
reconhecimento ao seu trabalho. O terceiro é a importância da remuneração como
motivo para trabalhar na emergência, ou seja, o salário é uma boa motivação
para o trabalho.
A compreensão deste perfil motivacional dos trabalhadores possibilita o
desenvolvimento de estratégias de motivação da organização que consideram os
valores e metas dos trabalhadores(20). Nesse intuito, é importante frisar a
escassez de relatos e estudos, envolvendo médicos, considerando um maior número
de trabalhos envolvendo enfermeiros.
Por outro lado, a percepção pelos profissionais de inadequadas condições de
trabalho também se expressa pela baixa percepção do fator motivacional
prestígio, ou seja, a não oferta de boas condições de trabalho seria reflexo do
não reconhecimento devido do trabalho desenvolvido pelos profissionais de saúde
(14,17). Assim, demonstra-se o sentimento de baixo protagonismo que acompanha
estes profissionais dentro das unidades, podendo implicar por vezes em
percepção de pequena força social dos profissionais na determinação de melhores
condições de trabalho, e consequentemente, pouco engajamento em sua
transformação.