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BrBRCVHe0034-71672013000400013

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National varietyBr
Year2013
SourceScielo

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Modos de ser enfermeiro-professor-no-ensino-do-cuidadode-enfermagem: um olhar heideggeriano

INTRODUÇÃO O cuidado revela a própria existência, ou o modo de ser da enfermagem. É através do cuidado que a enfermagem legitima-se como profissão, e, nesse sentido, apresentam-se em seu cotidiano diferentes funções e responsabilidades.

Uma destas é ser educador, não para educação em saúde, mas também para a formação de novos profissionais.

O compromisso com a formação de novos profissionais engloba, além dos aspectos técnicos e científicos, a sensibilidade para ensinar o cuidado. Os enfermeiros- professores precisam estar preparados para encarar uma sociedade globalizada e com constantes avanços tecnológicos. O profissional enfermeiro está diante das transformações do mundo moderno, e deve pensar de forma crítica, possuir competências com compromissos éticos e de cidadania, autonomia, capacidade de resolver problemas, refletir e transformar a sua prática, porque apenas as habilidades técnicas não suprem mais as atuais necessidades do ser humano(1).

Assim, a formação de recursos humanos exige dos enfermeiros-professores múltiplas competência, constituindo-se um dos grandes desafios na educação em enfermagem, tanto para os órgãos de formação como na produção de saber(2).

Considerando que ensinar o cuidado representa um momento de encontro do ser- professor com o ser-aluno, onde ambos se colocam no contexto, com suas necessidades, informações, aspirações e vontades e estabelecem-se oportunidades de aprendizado para ambos.

Entretanto, o cuidado revela os modos de ser de cada enfermeiro. Estes se constroem ao longo do tempo, através de suas experiências cotidianas. Da mesma forma, os modos de ser enfermeiro-professor estão imbricados em seus cotidianos de ensino e suas experiências de vida, encontrando possibilidades de ensinar- aprender o cuidado.

Foi na possibilidade de saber quem somos e como somos que surgiu o interesse de estudar o modo de ser dos enfermeiros-professores no exercício de ensinar e aprender o cuidado de enfermagem, na perspectiva de um referencial que oferecesse suporte para a compreensão do ser em sua existencialidade.

Assim, o referencial fenomenológico de Martin Heidegger apresenta-se como apropriado, visto que busca o sentido do ser tanto no aspecto da singularidade, quanto do aspecto da universalidade. Ou seja, a fenomenologia hermenêutica procura atentar para duas características do discurso: o hermenêutico, referindo-se à interpretação; e o apofântico, que é o caráter revelador ou declarativo(3).

Os modos de ser indicam as possibilidades e as maneiras de projetar-se na busca do vir-a-ser no mundo. Ainda, para o autor, o homem é a expressão ontológica na facticidade do existir do ser(4). O ser constrói-se no tempo, e, por conta de existirmos no tempo, somos lançados a constantes mudanças. Ele indica, também, que as coisas se revelam na presença do ser-aí (Dasein), e a abertura para o mundo está na presença da própria condição de mundo. O ser-aí doa significados para a vida, velando e desvelando o sentido de sua a sua existência(4).

Os modos de ser para o cuidado mostram que a enfermagem precisa compreender e dar sentido às suas ações de forma autêntica. Os estudos que utilizam o referencial da fenomenologia abrem horizontes de possibilidades aos profissionais, dando sentido às suas vivências e atividades, tornando-se enfermeiros atentos e reflexivos sobre a realidade e o modo de ser de outros (5). Destarte, existir é cuidar do ser. É exercer o poder de ser-si-mesmo, em qualquer das situações experenciadas no cotidiano. O ser-no-mundo que é essencialmente cuidado - cuidado-de-si-mesmo e o cuidado-de-ser-com-outros, e por conta disso, o homem não pode ser compreendido fora das relações significativas que constituem o próprio mundo(6).

Tendo em vista o contexto apresentado e o referencial teórico adotado, o objetivo deste estudo é Desvelar, à luz do pensamento de Martin Heidegger, os modos de ser dos enfermeiros-professores na experiência de ensinar-aprender o cuidado de enfermagem em uma instituição federal de ensino superior do sul do Brasil.

MÉTODOS Estudo qualitativo de abordagem fenomenológica, norteado à luz do referencial heideggeriano. Heidegger desenvolveu a fenomenologia, na qual a questão é a compreensão do ser. Destacou que a fenomenologia não é apenas descrever a experiência humana, mas compreender e interpretar, passando a distinguir a pesquisa fenomenológica segundo o que a pessoa experimenta em relação a um fenômeno e como interpreta essa experiência(7).

O estudo foi desenvolvido em uma instituição federal de ensino superior (IFES) do sul do Brasil. Com base nesse referencial, foram realizadas as entrevistas, mantendo-se a privacidade dos sujeitos, os mesmos foram selecionados a partir de um convite formal, em uma reunião geral de departamento da referida universidade, e, a partir daí, os professores que sinalizaram interesse em participar foram contatados para agendar local, dia e hora da entrevista.

Onze enfermeiros-professores constituíram os sujeitos significativos para o estudo, sendo o critério de inclusão foi que os enfermeiros-professores deveriam ser professores permanentes na IFES; os critérios de exclusão foram por: docente com menos de um ano de trabalho no departamento; professor de contratação temporária; ter participado da banca de qualificação do projeto de doutorado.

A técnica utilizada para captar os significados foi à entrevista fenomenológica, que tem um caráter de desvelar o fenômeno por meio da linguagem livre, mediante um questionamento norteador da pesquisa. Nesse tipo de entrevista o pesquisador lança mão de sua empatia e intersubjetividade, e deixa o sujeito entrevistado à vontade para conduzir seu pensamento e linguagem da maneira que achar apropriada. O processo de busca das informações baseado na fenomenologia entende que o diálogo fenomenológico é a ocasião da aproximação com a experiência humana, é um instante, em que precisamos ouvir o que a linguagem nos diz daquilo que emerge dos fenômenos, é um processo de apropriação(8).

A entrevista seguiu-se em dois momentos, no mesmo encontro. O primeiro caracterizava-se pela aproximação com o sujeito e o diálogo inicial abordava alguns pontos referentes à sua trajetória profissional na enfermagem. Essa estratégia foi utilizada para que o enfermeiro-professor pudesse voltar às coisas mesmas, ou seja, reviver a sua trajetória e as experiências vividas em seu mundo, e dessa forma antecipar indícios de sua existencialidade.

No segundo momento, era lançada a pergunta norteadora do estudo: "Quem é você, ser enfermeiro-professor que ensina-aprende o cuidado?", a qual estava registrada em uma tarjeta visível ao entrevistado e assim permanecia todo o tempo da entrevista. Neste momento, o enfermeiro-professor discorreria a partir de suas respostas anteriores, sobre a pergunta norteadora. Este momento tinha o intuito de desvelar o ser enfermeiro-professor.

A coleta dos dados aconteceu no segundo semestre de 2010, após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, com o Protocolo 996/2010. Sendo respeitados os aspectos éticos da pesquisa conforme o disposto na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde - Ministério da Saúde. Os sujeitos participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido, e tiveram seu anonimato mantido, sendo identificados pela letra D (Docente) seguida pelo respectivo número da entrevista. Vale ressaltar que apenas uma das pesquisadoras (doutoranda) teve acesso à identificação dos sujeitos, e também se subtraiu das falas toda e qualquer possibilidade de identificação.

Os depoimentos foram transcritos, organizados, e, a partir daí, decorreu-se a leitura exaustiva das informações. Codificaram-se os dados na intenção de agrupar os relatos que apresentavam similaridade, demonstrando o modo de ser dos enfermeiros-professores, subsidiando o tema e as unidades de significado.

Assim, analisaram-se os dados à luz do referencial de Martin Heidegger, e em consonância com a literatura pertinente.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados foram organizados didaticamente, em duas unidades de significado: Modo de ser enfermeiro para o cuidado e Modo de ser professor para o ensino do cuidado. Os achados deste estudo apontam para algumas especificidades dos enfermeiros educadores, no desafio de ensinar-aprender o cuidado de enfermagem.

Neste momento optou-se por trazer as unidades de significado a partir dos depoimentos dos sujeitos.

A. Modo de ser Enfermeiro para o Cuidado Mesmo o cuidado sendo a essência da enfermagem, cada enfermeiro-professor o experencia conforme seus modos de ser no mundo. Eles demonstram em seus modos de ser a compreensão de seu próprio ser, a partir do ente com quem se relacionam e se comportam de modo essencial, sendo esta compreensão a partir do mundo circundante(4). Nesse sentido, os enfermeiros-professores revelam seus modos de ser na presença sob vários aspectos em conformidade com as experiências vivenciadas em seus mundos, determinando assim a sua existência para o cuidado.

Ao se apresentar no cotidiano acadêmico como ser-enfermeiro, expõe que se construiu no tempo, nos espaços e nas relações por ele estabelecidas, indicando em suas formas de ação seu corpo de conhecimento, imbricadas com as inúmeras formas de se mostrar no processo de construção de suas identidades. As possibilidades de cada ser e, neste o professor enfermeiro precisa estar pautado em conhecimento técnico e habilidades teóricas convincentes para realizar com sucesso em sua profissão, através de uma reflexão profunda dos elementos que caracterizam a identidade profissional e, neste sentido o conhecimento do processo de construção da identidade como um professor enfermeiro, cumprindo este novo papel.(9).

Nesta unidade de significado o enfermeiro-professor aponta para a perspectiva de ser-no-mundo como enfermeiro, pois sua compreensão existenciária reflete a concepção que cada ser tem de sua própria capacidade de escolher e decidir diante das possibilidades, no exercício de existir nas suas particularidades, situações, condições, e momentos da vivência. Nesse sentido, percebe-se nestas falas o sentido dado à sua compreensão: Olha... Eu me acho assim, quem sou eu como enfermeiro-professor, eu me realizo muito mais, não que eu não goste de ser professora, eu adoro ser professora! Mas eu me sinto mais realizada como enfermeira quando eu vou para assistência.

Quando eu estou com os alunos, eu me sinto mais enfermeira do que professora enfermeira, então eu me sinto assim. (D03) Bom... eu sempre, eu sempre me vejo como enfermeira, primeiro como enfermeira do que professora, e é engraçado que eu vejo outras pessoas dizerem que são professoras. Mas não eu. Digo que sou enfermeira, essa é a minha identidade pessoal. Eu sou enfermeira, e sou professora também. Mas é sempre a minha segunda maneira de como eu me percebo professora. (D11) Eu acho que de certa forma tu passa isso para o aluno, tesão com a profissão, orgulho, eu tenho orgulho de ser enfermeira! Onde eu vou, faço questão de ser enfermeira. Quando eu fui diretora que era um cargo para a universidade toda, e que não tinha a ver com a área da saúde, todo mundo perguntava: "Da onde veio a professora 'D06?'". Eu fazia questão de dizer, Eu sou enfermeira, venho do departamento de enfermagem. (D06) Eu digo que eu incorporo a enfermeira toda vez que coloco o no campo e a docente vem junto, mas primeiro eu incorporo a enfermeira. Porque eu passo o olho e consigo ver, apreender, o que está acontecendo, o que é que poderia ser feito. Isso é treino, são anos de treino para a questão da assistência. Então eu acho que este aspecto foi muito importante a minha experiência como enfermeira assistencial e gestora para a docência, e que ensina-aprende, porque eu sempre estou aprendendo. (D02) Parece ser o meu destino e você viu que coisa interessante eu queria ser professor, e muitas voltas eu fui ser enfermeiro, mas ainda privilegiou e venceu a questão da docência, então eu acho que cumpri o meu destino, e vou ficando aqui enquanto puder, e esse a questão do cuidado... eu fui professor e ao mesmo tempo um professor que cuida, e tenho feito isso e vou fazendo enquanto puder...[...] e uma contradição da enfermagem que de repente apareceu essa responsabilidade do cuidado com a vida, não com o ser humano, e com a vida no planeta. (D07) Observa-se nesses trechos que os sujeitos têm maior identidade profissional com sua formação de base, que é ser enfermeiro, e que a função de ser professor foi assumida por alguma circunstância em sua vida, mas que tem significado diferente. Nessa perspectiva, consolidam o seu ser como ser da presença, ou seja, é o homem em relação ao mundo, determinado pelo cotidiano, revelando seu modo de ser. E as mudanças que o ser sofre com o passar do tempo e suas experiências abrem novas possibilidades de convivência(4).

O processo de significação profissional é descrito pelos enfermeiros- professores por meio de suas vivências na prática assistencial. Eles consideram esses momentos como de aprendizagem e de construção de ser enfermeiro. Este mundo que foi sendo construído a partir de suas possibilidades traz para esses enfermeiros a base de suas experiências: Fui para o "X", hospital de referência em infecto. Na época a infecto era bem sedimentada, e na época tava começando a pneumologia, foi outro desafio como primeira enfermeira no estado, professora concursada, e fiquei... sempre conciliando hospital, secretaria de saúde, porque às vezes eu estava no hospital, mas sempre considero minha base o hospital "X". Trabalhei na direção de recursos humanos, trabalhei na escola de formação e saúde." (D05) Fiquei no Hospital "Y" de 90 a 95. fiquei cinco anos, foi que aprendi tudo de [...], e é aonde eu tenho o maior chão como prática assistencial, enfermeira da assistência. (D01) Esses sujeitos identificam-se como enfermeiros e com a possibilidade de cuidar em ambientes hospitalares, como alicerce de sua experiência profissional. Na prática que são apreendidas as vivências concretas que são carregadas para toda a vida. Nesses casos, esses enfermeiros-professores desenvolveram suas identidades pautadas nas experiências hospitalares, determinando suas formas de agir em conformidade com outros enfermeiros. A reordenação de olhares não quer dizer unidirecionar as ações de cuidado, mas sim conviver com pensamento reflexivos e encontrando, perscrutando tudo aquilo que possa contribuir para um cuidado de enfermagem compromissado com o bem, com a ética, com o respeito ao outro(10).

Da mesma forma, ao se identificarem como enfermeiros, relatam que em suas experiências puderam coexistir com outras pessoas, as quais serviram de modelos e contra-modelos. Onde o "existir é estar em relação com os outros no mundo e que o próprio ser é responsável pela sua existência, pelo seu modo de ser nas possibilidades" (11: 195). Nessas possibilidades de conviver com pessoas, as quais podem ser referência ou não para o futuro, revelaram seu modo de ser.

A existencialidade se mostra no cotidiano como possibilidade de estar-no-mundo, significa que o ente é lançado na temporalidade, submetido a todas as possibilidades e todas as limitações da condição de existir(4). Reconhecer-se como sujeito de sua jornada, ator ou escritor de sua história, faz com que o ser enfermeiro-professor amplie suas experiências e, neste caso, considera-se como experiência vivida e colocada novamente em seu campo de reflexão para ser interpretada. Neste movimento de compreensão e interpretação do Dasein, encontra elementos importantes em sua trajetória, que podem ser considerados como exemplos para sua formação.

A minha prática docente era a partir dos modelos que eu tive, dos meus professores, dos que eu gostava mais. Tentava fazer do mesmo modo, mas isso me incomodava muito. A universidade me fez ir buscando mais formação, para compreender um pouco mais, principalmente do processo ensino. (D09) Então, essa referência forte na minha vida profissional é de um enfermeiro e não de um docente. Tive excelentes docentes na graduação, outros nem tanto, mas uma coisa que eu trago na vida sempre é o seguinte: Existem para mim alguns modelos que eu gostaria e gosto de seguir e sempre são aquelas pessoas que eu considero. E o que eu acho que não são modelos, eu digo que são contramodelos e os trago comigo para saber o que eu não quero fazer na vida, que eu não quero seguir. (D02) Outro paradigma que é meu, enquanto docente, é que o mau exemplo também ensina.

Aliás, não como docente, mas na vida, que o mau exemplo também ensina.

Muitas vezes a pessoa critica o mau exemplo, então eu digo: O mau exemplo no mínimo ensina a gente a como não fazer, a como não querer ser, não é isso que eu quero para mim. Acho que tem que mostrar ambos os lados e que o mau exemplo deve ser visto e analisado do ponto de vista crítico.(D06) Nessas falas compreende-se que qualquer forma de manifestação é uma expressão ontológica do ser. Sendo a respeito das diferentes possibilidades de ação do ser-aí junto às coisas e aos outros, não apenas no sentido manifesto, mas também daquilo que possibilita toda manifestação do ser(4).

O ser da presença tem o seu sentido na temporalidade, ou na condição da historicidade. Esta indica a constituição do ser, própria da presença; explicitamente ou não, a presença é sempre o seu passado, e não apenas no sentido do passado. Neste momento, a presença é o caminho histórico construído a partir das experiências passadas. É o passado no modo de seu ser que significa que ela sempre acontece a partir de seu futuro. "Em cada modo de seu ser, também se compreende a presença, que de alguma forma nasceu e cresceu dentro de uma interpretação de si mesma, herdada da tradição"(4).

Os enfermeiros, ao se referirem às experiências vivenciadas com outros profissionais, identificam alguns exemplos os quais poderiam seguir ou não, e, por conta destes, direcionam suas práticas docentes na enfermagem. Dessa forma, revelam que bons ou maus exemplos exigem reflexões constantes das atitudes, reforçando que podem ensinar-aprender por meio destes, estimulando o exercício crítico reflexivo de enfermeiros-professores e acadêmicos em todas as situações possíveis. E eles entendem que, dessa maneira, podem ser modelo para os futuros profissionais.

É através do cuidado com o outro que o enfermeiro torna-se singular. É no exercício da compreensão do seu próprio ser, na reflexão sobre suas vivência e experiências no mundo, que o homem se transforma constantemente e constrói novos horizontes para sua trajetória de vida. É neste caminhar do movimento da vida que os enfermeiros-professores revelam seus modos de ser no ensino do cuidado de enfermagem.

B. Modo de ser Professor para o ensino do cuidado Os caminhos escolhidos pelos enfermeiros pautam-se em seus modos de ser na presença, essencialmente nas suas possibilidades, suas escolhas, no seu apropriar-se de si mesmo. O enfermeiro é um profissional que possui características próprias para o cuidado, e, ao assumir a atividade de docência, busca estratégias diferenciadas para ensinar. Chama-nos a atenção para aquilo que desejam mostrar para os alunos e que não está diretamente ligado aos conteúdos técnicos e científicos, mas sim aos modos de ser enfermeiro no dia a dia da enfermagem. Isso pode ser observado nos seguintes depoimentos: Tento passar para estes meninos a importância da presença do enfermeiro. Então, ultimamente eu tenho tentado trabalhar com os meninos, com os alunos, do posicionamento, da assertividade, estar sempre aprendendo coisas novas, buscar coisas novas para tentar melhorar a qualidade de vida, tanto deles mesmos como do paciente, do cliente. E a mensagem que eu sempre tento dar para eles é que eles estão ali porque o paciente existe, e não que eles são profissionais e o paciente tem que gravitar ao redor deles. (D01) Eu sempre tento mostrar para os alunos que beleza é esta profissão, o quanto a gente pode avançar, e quanto a gente tem condições de ocupar um espaço melhor.

(D11) Acho que agora eu tenho conhecimento suficiente para estar passando para os alunos, ainda mais pelo fato de eu gostar do que faço. E eu sempre tento, assim, mostrar muito para os alunos essa importância de você gostar do que faz, de gostar da profissão de gostar do cuidado. (D03) Meu trabalho hoje é mostrar para os alunos, enquanto enfermeiro-professor, que você tem muitos espaços de cuidado, muitos espaços para o cuidado. E esses espaços têm que ser ocupados pelo enfermeiro, que não ocupa todos os espaços, e essa visão eu não tenho de agora. Como professora eu tento passar isso para os alunos. (D08) Eu não posso também ensinar a técnica, eu tenho que ir além da técnica, o aluno tem que aprender comportamento, a compaixão, a caridade, comportamento de cuidado bom, ética, e isso tem que estar nesta proposta de ensinar o cuidado e muitas vezes a gente não . A preocupação é com a técnica e não tem nenhuma ligação com a pessoa, e eu acho que esta é a contribuição que a gente como professora, a gente tem que dar. (D10) Observa-se que a intenção do ensino do cuidado dos enfermeiros-professores vai além das competências cognitivas ou atitudinais, ampliando as ações de ensino para a realidade da enfermagem.

Então, acreditam ser importante mostrar para os alunos, ações de cuidado do cotidiano da enfermagem e do mundo, que adquiriram por suas experiências de cuidado ao longo do tempo. Neste cotidiano é que o homem vive suas possibilidades, e nunca estamos acabados, mas sim abertos para futuro, no qual temos que nos conduzir. Somos aquilo que nos tornamos, neste mundo habitual de ser-com-os-outros é que nos envolvemos com aqueles de quem cuidamos(4). As características precípuas sobre o professor é que o mesmo seja mais capaz de aprendizado do que os aprendizes, o professor autêntico não ensina nada mais que aprender, o que significa que o processo educacional autêntico é aquele em que os alunos aprendem o próprio significado do aprendizado(4,12).

En efecto: enseñar es aun más difícil que aprender. Se sabe esto muy bien, mas pocas veces se lo tiene en cuenta.¿ Por qué es más difícil enseñar que aprender? No porque el maestro debe poseer un mayor caudal de conocimientos y tenerlos siempre a disposición. El enseñar es más difícil que aprender porque enseñar significa: dejar aprender. Más aún: el verdadero maestro no deja aprender nada más que 'el aprender'. [...] El maestro posee respecto de los aprendices como único privilegio el que tiene que aprender todavía mucho más que ellos, a saber: el dejar-aprender(12).

Os enfermeiros-professores reconhecem que suas competências vão além da transmissão de conhecimento, e percebem que ser docente é estar verdadeiramente comprometido com os futuros profissionais do cuidado. O professor deve ser considerado um mediador do processo de produção do conhecimento, isto é, um sujeito de informação e de transformação pela sua capacidade de desconstruir e construir os saberes, além de ter conhecimento do que vai ensinar, e, através da habilidade didático-pedagógica, articular e ampliar os conteúdos programáticos com o mundo real (13). Entretanto nesse contexto, os enfermeiros- professores demonstram especificidades que os caracterizam na sensibilidade para ensinar-aprender o cuidado, diante da diversidade de conteúdos que contempla a ciência e a arte da enfermagem. Desejam ensinar para seus alunos os desafios de ser enfermeiro, sem perderem de vista o entusiasmo para o cuidado.

O modo de ser do enfermeiro que assume a docência como forma de identidade profissional, demonstra que esta pode ser a contribuição aos futuros profissionais da enfermagem. Nesse movimento, os docentes constroem suas relações com os alunos não apenas baseadas em conteúdos ou disciplinas, mas transcendem o ensinar-aprender o cuidado de enfermagem quando mostram seu modo de ser, na promoção da autonomia do acadêmico, nas mais diversas situações.

Uma coisa que busco fazer é criar a independência no aluno, porque se tu colocas o aluno que nem um pintinho embaixo da asa, ele vai o tempo todo fazer as coisas se você está do lado. Eu trabalho, é claro, que esta liberdade é uma liberdade gradativa eu estou ali, ele sabe que eu sou uma referência, então esse desmame paulatino é importante, porque a gente tem que ajudar o aluno a ser enfermeiro, e na prática a gente não tem o professor. Então eu acho que essa liberdade, essa independência, também é ensinar, ou seja, tudo se ensina.

(D06) O aluno, ele entra na bolsa em um projeto, e ali ele tem que se desenvolver a partir daquele projeto. Ali ele começa a desenvolver habilidades técnicas, intelectuais e específicas, e também ali a oportunidade de aprender a conviver e aprender a ser pessoa. Assim ele aprende a conviver, ele se relaciona com alunos de outras áreas ou da mesma, mas sempre é também um trabalho interdisciplinar entre alunos, e eles vão aprendendo neste convívio. E a gente vai orientando, que todos têm o mesmo valor, todos podem aprender. O que você sabe, ensina para o outro, e é uma troca e é muito lindo ver essa convivência. (D08) E é uma perspectiva que também está com o acadêmico, eu tenho sempre uma preocupação muito grande com o acadêmico, que ele compreenda a importância daquilo que está fazendo e que tome a decisão de aprender, e que encontre os modos de aprendizagem que lhes são mais favoráveis eu não consigo trabalhar com os acadêmicos sem uma relação muito próxima, eu sempre sou muito "mãezona" (risos) e acho que isso é importante, esta relação de confiança com o aluno, essa coparticipação. Com as acadêmicas tenho uma relação muito boa de participação, de respostas, de afeto. Eu sou muito adepta de Freire nisso, acho que não existe saber sem sabor, e ninguém ensina sem amorosidade, ninguém ensina sem acreditar no ser humano. Acho que é um pouco isso, este ser. (D09) E na questão de tu estares ensinando, é bem como está ali, tu ensina e aprende o tempo inteiro, e isso é uma preocupação de poder, acho que tudo que vem de um lado como o outro, a gente aprende constantemente, ser assim... Uma escada que está o professor está em cima da escada, e o aluno em baixo, na verdade estão todos juntos no mesmo espaço, no olho no olho, fazendo discussões concordando e discordando e pudendo contribuir tanto para o crescimento de um lado como da gente mesmo, porque a gente como professor é... e tudo na vida da gente, a gente aprende às vezes muito mais do que acha que está ensinando.

(D04) Espera-se do educador uma nova postura que o remete ao paradigma emergente que propõe uma metodologia do aprender a aprender e, sugerindo, dessa forma, posturas diferenciadas as quais abandonam o modelo da escola tradicional, que prioriza a fragmentação do conhecimento e não favorece o desenvolvimento de um aluno questionador(14). Para fazer a diferença na Enfermagem não basta apenas formar novos profissionais, mas, sim, formar profissionais comprometidos com o exercício de reflexão, pois dessa maneira a Enfermagem pode chegar ao cuidado de excelência.

Este movimento de reflexão dos enfermeiros-professores com os alunos é o que Heidegger esclarece como ser autêntico, sendo aquele que se recusa a aceitar as coisas acriticamente, a agir como se tudo estivesse claro e compreendido, ou seja, "Todo questionar é um buscar. Toda busca retira do que se busca a sua direção prévia. Questionar é buscar cientemente o ente naquilo que ele é e como ele é."(4).

Outro aspecto encontrado nas identidades dos enfermeiros-professores foi que se denominam como pesquisadores, sendo esta atividade importante para o desenvolvimento tecno-científico da enfermagem. Entretanto, eles ressaltam que as pesquisas desenvolvidas devem voltar-se para o aperfeiçoamento da profissão e, consequentemente, para a valorização do cuidado. Vejamos nas falas abaixo as colocações feitas sobre este tema: Porque eu gosto, na enfermagem, principalmente do cuidado. Claro que pesquisa, adoro pesquisa, pesquisa voltada para o cuidado. Eu não faço nenhuma pesquisa que não esteja voltada para o cuidado, relacionada diretamente para o cuidado.

(D03) Na pesquisa eu estou tão motivada. Porque na pesquisa tem um monte de coisas que eu não sei, fica mais claro que eu estou aprendendo. Na pesquisa o foco é sempre o cuidado, e de pesquisador também, pesquisando para o cuidado, para melhorar o cuidado. (D011) Eles se referem à importância da pesquisa na enfermagem, e que esta precisa voltar-se para o cuidado, pois é a essência da profissão, e que, destarte, podem contribuir para maior visibilidade do trabalho da enfermagem em todos os espaços de cuidado. O conhecimento precisa ir além de disciplinas específicas e conexas, sendo que os interesses e os objetivos da prática de ensinar, de assistir e de pesquisar precisam abarcar suporte para a realidade de pensar e ser no mundo e na realidade da ciência(15).

A formação, nesse aspecto, sentido existencial ao cuidar. Então, o pensar em modos de cuidar em enfermagem requer a compreensão do sentido e do significado desse cuidado, sua dimensão político-social e sua implicação sobre a vida dos cidadãos(16).

Por outro lado, é também através da pesquisa que se aprimora o cuidado e se desvela o sentido de ser enfermeiro, dando ênfase às atividades que contribuem para o corpus de conhecimento da profissão.

Diante das faces que o ser enfermeiro-professor adota em sua trajetória profissional e pessoal, podemos perceber a complexidade, em que, além de cuidar, assume a responsabilidade de ensinar o cuidado. Com essas atitudes que levam a comportamentos de cuidado de enfermagem, baseados no conhecimento técnico-científico, no despertar para sensibilidade e na constante crítica de seus fazeres. Estes são alguns dos desafios do enfermeiro-professor que vivencia a complexa atividade de ensinar futuros profissionais o cuidado de enfermagem, e que precisam estar munido de competências que vão além do preparo de uma aula, ou das paredes da sala de aulas, visto que constantemente se em situações variadas em seu cotidiano de trabalho(17).

CONSIDERAÇÕES FINAIS Através da atividade de docência, os professores de enfermagem participantes do estudo mantêm a essência da profissão, que é o cuidado, e nesse sentido se compreendem como uma pessoa em um tempo e um espaço em movimento de interpretação constante do seu cotidiano de ensino, no modo de ser enfermeiro para o cuidado e no modo de ser professor para o ensino do cuidado.

O ser-enfermeiro-professor-no-ensino-do-cuidado-de-enfermagem toma como base suas experiências profissionais e a coexistência com os outros para ensinar as fortalezas e as dificuldades de ser enfermeiro. Em seus mundos, entendem que são seres inacabados, que sempre buscam aprimorar o seu conhecimento no intuito de ensinar melhor. Sentem-se desafiados e procuram então, se aprimorar constantemente, pois reconhecem os avanços dos saberes da enfermagem. Estão sempre abertos a novas possibilidades, e criam seus próprios sentidos para a vida.

Os enfermeiros sujeitos desta pesquisa que estão na docência ensinando o cuidado de enfermagem apresentam características específicas, dentre elas, a empatia e a intersubjetividade. A capacidade de ensinar pode estabelecer na relação aluno-professor as possibilidades de ser-no-mundo, segundo a autenticidade de cada um desses sujeitos. Nesse contexto, abrem-se muitos caminhos, e direcionam-se seus modos de ser, para contribuírem na formação de profissionais críticos e reflexivos comprometidos não com a questão profissional, mas também com o mundo em que vivem suas experiências de cuidado.

Para exercerem esta competência de ensinar enfermagem, os enfermeiros- professores precisam se reconhecem como tal, e têm a consciência de que ser professor de enfermagem não é apenas transmitir conhecimento, mas, sim, envolver-se com este universo no qual o cuidar é aprender e ensinar e, também cuidar é ensinar a aprender, na constante reflexão do seu saber e fazer em enfermagem, bem como dos seus modos de ser enfermeiro.

Espera-se, então, que os achados desta pesquisa possam ser uma contribuição para os enfermeiros-professores na busca do vir a ser, em seus cotidianos de ensino, pautados na experiência de cuidar e voltados para a formação de novos profissionais enfermeiros.


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