Reflexões conceituais sobre humanização da saúde: concepção de enfermeiros de
Unidades de Terapia Intensiva
INTRODUÇÃO
A humanização da saúde é vista no contexto atual como um movimento integrador
das relações da saúde, buscando uma melhoria do atendimento e um ambiente
propício para o desenvolvimento do cuidado. Apesar da extensa produção
científica sobre o tema e o desenvolvimento de políticas públicas visando o
resgate de tal perspectiva, ainda permanece confuso o conceito relativo à
humanização da saúde e a determinação de sua aplicabilidade dentro da área.
No ano de 2003, foi criada pelo Ministério da Saúde (MS) a Política Nacional de
Humanização da Atenção e Gestão no Sistema Único de Saúde (PNH), também chamada
de HumanizaSUS partindo da ideia de reformulação das práticas assistenciais em
saúde no Brasil, que já vinham sendo discutidas desde 1999 com a criação e
implementação do Programa Nacional da Humanização da Assistência Hospitalar
(PNHAH), até então voltado somente para o circuito hospitalar(1). A política
expandiu essa perspectiva de humanização para todos os âmbitos da saúde, tendo
como princípios norteadores, dentre outros: "a valorização da dimensão
subjetiva e direito dos usuários, a sua autonomia e protagonismo, a construção
de redes cooperativas e solidárias de produção de saúde, o fortalecimento do
trabalho em equipe multiprofissional"(2).
Mais do que um conjunto de princípios idealistas para nortear as práticas em
saúde dentro do sistema assistencial do país, o termo Humanização pressupõe uma
conjuntura complexa de posturas e atividades que compreendem algumas
modificações no setor saúde, que persistem, ainda em dias atuais, com um modelo
de atenção biomédico, com frágeis relações entre usuários e equipe de saúde e a
precarização do acesso aos serviços(3).
Como uma proposta de mudança, a humanização visa à melhoria do atendimento em
saúde como um todo, na associação entre o lado subjetivo e objetivo do cuidado
ao ser humano em condições de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação,
através do reconhecimento da importância dos aspectos psicológico, emocional,
espiritual e social paralelamente a intervenção técnica e o cuidado
fisiológico, o que pressupõe uma estrutura assistencial de uma prática dita
holística. Afirma-se, igualmente, algumas concepções de humanização podendo o
termo ser entendido como uma escuta atenta, uma boa relação com o paciente,
reorganização logística dos processos de trabalho facilitando acesso, até a
melhoria dos ambientes de cuidados(4).
Por outro lado, seu conjunto de iniciativas abrangentes capazes de serem
enumeradas e reclamadas resulta em perspectivas multifocais de ações em saúde,
caracterizando uma proposta de difícil conceituação e um perfil polissêmico ao
próprio termo(5). Assim, todos estes horizontes aos quais à humanização se
expande acabam por fragmentar o seu conceito, tornando-o uma tarefa de difícil
compreensão de foco e abrangência. Segundo Deslandes, "como ainda não são
consensuais os contornos teóricos e mesmo operacionais do que se convencionou
designar humanização, sua abrangência e aplicabilidade não estão inteiramente
demarcadas"(6).
Para que haja a verdadeira aplicação de seus princípios norteadores, a
humanização da saúde requer uma delimitação bem estruturada de seu conceito,
logo, suas possibilidades de execução, fazendo com que esses parâmetros sejam
sempre revistos em prol da implementação das diretrizes de uma política a ser
vivenciada na realidade dos serviços de saúde. Este aspecto reafirma a
necessidade de discussões e reflexões que visem o esclarecimento conceitual da
humanização da saúde, na tentativa de efetivar a proposta no cotidiano da
prática assistencial.
Entretanto, talvez pela referida dificuldade em conceituar, logo, também
sistematizar a proposta da humanização, muitos ambientes de assistência em
saúde ainda carecem desse tipo de atenção diferenciada, mesmo dentro do
circuito hospitalar, obtendo a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) como um de
seus maiores exemplos. Por se configurar como um local de prestação de cuidados
à pacientes em estado crítico de saúde, a UTI normalmente constitui-se de
equipamentos de grande sofisticação tecnológica, recursos humanos altamente
especializados e capazes de atribuir assistência ininterrupta ao doente
internado(7). A própria dinâmica habitual deste setor pode provocar desconforto
ao usuário pelo excesso de estímulo de ruídos e iluminação da maquinaria, pela
falta de privacidade decorrente da necessidade de observação contínua, pelo
isolamento e afastamento da família/sociedade e a constante experiência de
morte presente na rotina das unidades(7).
Todos esses fatores desencadeiam num ambiente estressante e favorecedor de
inseguranças aos usuários internados, que já se encontram vulneráveis pela sua
própria condição de adoecimento. Por esta condição particular, a equipe
multiprofissional da UTI deve apta a realizar o requerido cuidado humanizado,
capaz de contemplar todas as necessidades do usuário, para além do mero aspecto
teórico-técnico da assistência, ou seja, não só sua demanda fisiológica, mas
também psicoemocional, social e espiritual(8).
Reconhecendo a dificuldade em estabelecer a definição e a abrangência para o
termo Humanização e entendendo que este fator dificulta a efetivação da conduta
que se têm demandado dos serviços, desenvolveu-se este estudo com o objetivo de
realizar uma reflexão sobre o seu conceito partindo da concepção dos
enfermeiros atuantes em UTI.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo qualitativo, de caráter exploratório e descritivo,
realizado com onze profissionais de Enfermagem lotados em UTI Adulto de três
hospitais, situados no município de Recife-PE, no ano de 2010. O projeto de
pesquisa foi submetido à análise pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do
Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira, onde obteve
aprovação mediante protocolo de número 1673.
Foram incluídos na pesquisa somente os profissionais de Enfermagem, de nível
superior, que atuassem enquanto assistentes e gerentes em unidades de cuidados
intensivos em hospitais de ensino universitário públicos e filantrópicos desta
cidade. A determinação proposital das unidades participantes da pesquisa se deu
a partir da realização de uma tipificação das instituições entendidas como de
grande representação social em saúde e ensino universitário no município e que,
igualmente, concederam anuência de representante legal para participação neste
estudo. Foram excluídos, para tanto, os hospitais de caráter particular,
aqueles que não apresentaram atividades de ensino, bem como, os que não
demonstraram interesse em participar da pesquisa.
Após esta etapa, iniciou-se a execução da pesquisa por meio de coleta dos
dados. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE), conforme as diretrizes que regulamentam a realização de
pesquisas com seres humanos no Brasil, sendo devidamente esclarecidos sobre o
objetivo, o método de coleta dos dados e o desenvolvimento da pesquisa.
A coleta de dados se deu nas UTI, ambiente de trabalho dos participantes, por
meio de entrevistas semiestruturadas com gravação de voz em aparelho digital,
concomitante a anotações realizadas em diário de campo por meio de observação
direta, ambos registrados pelas próprias pesquisadoras. O instrumento de coleta
de dados constitui-se de um roteiro pré-formulado totalizando dezesseis
perguntas, podendo ter havido alguma variação conforme necessidade de maiores
esclarecimentos por parte das pesquisadoras. O roteiro seguiu-se com
questionamentos acerca do entendimento do profissional sobre humanização; o
desenvolvimento de práticas consideradas humanizadas em sua unidade de
trabalho; os aspectos entendidos como influências positivas e negativas de tal
conduta; sua relação particular com os pacientes e os familiares das unidades;
posturas profissionais durante intervenções; relação com a equipe
multidisciplinar, entre outros. A etapa de coleta de dados foi encerrada quando
se encontrou um nível de saturação onde o critério de confiabilidade das
informações recebidas pôde ser admitido, evitando a mera repetição de
afirmativas por parte dos entrevistados(9).
Posteriormente ocorreu a interpretação dos dados, conforme metodologia de
análise de conteúdo para pesquisa qualitativa(10). Inicialmente houve uma etapa
de transcrição das entrevistas e sua enumeração aleatória, de modo a preservar
a identidade dos participantes e desvios de análise das pesquisadoras. Cada
entrevista transcrita recebeu a enumeração e denominação de E1, E2, E3, em
diante, referente a cada enfermeiro em conformidade a ordem de sorteio das
entrevistas. Foi realizada uma pré-análise dos dados com leitura minuciosa
buscando a compreensão do material sintático e semântico do conteúdo coletado,
codificando-os em unidades de registro. Em seguida, houve a diferenciação dos
dados e posterior agrupamento de conteúdos similares na definição de categorias
de afirmativas que emergiram dos discursos. As categorias definidas foram:
Compreensão/entendimento da humanização; Condutas adotadas na lida diária pelos
profissionais; Relações interpessoais com paciente/familiares/equipe de saúde;
Fatores conjunturais que influenciam no desenvolvimento da humanização.
Neste artigo descrevemos a primeira categoria definida, Compreensão/
entendimento da humanização, captada por meio da pergunta condutora da pesquisa
"O que você entende por humanização?", um dos questionamentos que mais revelou
ambiguidades nas respostas. Ao final seguiu-se uma etapa de inferência, onde os
dados foram interpretados e analisados levando-se em consideração o contexto
vivenciado pelos entrevistados seguido do cruzamento teórico com a literatura
selecionada sobre o tema(10).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A concepção dos enfermeiros de UTI sobre humanização apresentou algumas
variações em suas respostas, reforçando a já mencionada polissemia deste termo.
As definições foram pouco precisas e relataram desde aspectos referentes à
postura do profissional perante o usuário, as condutas que devem ser adotadas
na assistência em saúde concordantes às definições da PNH, até a insuficiência
na formação profissional para compreensão e desenvolvimento de tal perspectiva.
No intuito de favorecer o entendimento do conteúdo, agrupamos as respostas em
três subcategorias sendo elas: Humanização como empatia pelo paciente;
Humanização como cuidado holístico; e Humanização na formação do profissional.
Humanização como empatia pelo paciente
Pudemos constatar que os enfermeiros que trabalham em UTI possuem uma
compreensão aparentemente intuitiva sobre o conceito de humanização, partindo
de uma perspectiva de empatia pelo usuário. A empatia é um instrumento valioso
no processo de humanização, onde o indivíduo tenta se por no lugar do outro e
passa a agir de acordo com ideais e valores, qualificando o cuidado prestado
(11).
Quando perguntados "O que você entende por humanização?", muitos afirmaram um
conjunto de atitudes centradas no usuário da unidade de cuidados intensivos,
numa tentativa de reconhecê-lo enquanto ser humano semelhante. Os entrevistados
fizeram menção à sensibilidade através de uma assistência atenciosa em que
fosse necessário se colocar no lugar do outro, na busca de entender como o
paciente gostaria de ser tratado, ou mesmo de tratá-lo como a um familiar ou a
si mesmo.
O que eu entendo por humanização é você tentar tratar o paciente
quando ele chega na UTI da melhor forma possível, como se fosse seu
próprio parente. Né? Porque todos corremos o risco de um dia precisar
de um leito de UTI não é isso? Ninguém ia ficar satisfeito com mau-
trato. (E8)
Nas respostas dos entrevistados, percebe-se a relação que é estabelecida entre
o cuidado baseado numa capacidade de envolvimento com o usuário em questão e a
possibilidade de vislumbrar as suas necessidades fundamentadas numa compreensão
de bem-estar pessoal. Cabe, portanto, ao profissional reconhecer suas
limitações perante as convicções do outro, paciente e/ou familiar, na busca por
uma atuação de promoção de cuidados diferenciados visando prioritariamente o
conforto e satisfação deste sujeito em questão partindo de seus próprios
ideais.
Humanização como cuidado holístico
Foi afirmada também, uma preocupação com uma atuação integral do cuidado de
enfermagem na tentativa de atender ao usuário percebendo suas demandas físicas
atreladas ao sofrimento psicológico, social e espiritual existente na condição
de adoecimento, havendo referência à humanização como uma atitude de cuidado
holístico, na realização de ações para além do tratamento da patologia.
(...) é tudo que você pode usar como artifício para você atender o
paciente de forma holística. Você ter uma visão de todas as
necessidades dele para tentar atender e tratá-lo da melhor forma que
você possa, não só com a parte fisiológica, necessidades
fisiológicas, mas vendo tudo que está relacionado... À questão
emocional, a questão espiritual (...). (E9)
Percebemos nas respostas dos entrevistados um reconhecimento da necessidade de
modificação no modelo de intervenção para com o usuário do serviço, entendendo
a necessidade de uma atenção aos diversos aspectos da vida daquele paciente que
é antes de tudo um ser humano. Tais demandas integrais foram afirmadas como
necessidades persistentes, ainda que em situação de adoecimento e da
necessidade de cuidados intensivos pelo usuário.
Cabe ressaltar que, apesar da possível compreensão das entrevistadas sobre a
melhor forma de assistir integralmente ao usuário na UTI, foi afirmado que
muitas dessas ações são perdidas no cotidiano das unidades, onde se constata o
desenvolvimento de práticas mecanicistas baseadas no modelo biomédico. A
situação crítica do paciente e a demanda existente em termos de cuidados
técnicos, observação contínua e maquinaria necessária, foram afirmados como
obstáculos, onde a dificuldade de desenvolvimento do cuidado humanizado
residiria também na relação entre a execução das atividades técnicas rotineiras
em saúde juntamente às ações de caráter relacional e subjetivas, de forma que o
indivíduo que recebe os cuidados possa ser entendido como sujeito e não apenas
como usuário/paciente do sistema.
(...) se tem um ambiente muito hostil, o paciente fica muito só, a
parte de equipamentos é uma coisa muito assustadora (...) eu confesso
que o cuidado humanizado também é meio complicado por conta do dia a
dia, da natureza do trabalho, os pacientes que a gente está
acostumado a receber são pacientes críticos. (...) Mas com relação ao
profissional, eu acho que se cada um fizer um pouquinho, dá pra fazer
um cuidado humanizado (...). (E4)
Entendemos que apesar da concordância quanto à proposta de humanização em saúde
pelos profissionais entrevistados, isso não implicaria no convertimento
facilmente aplicável dessas diretrizes com regularidade em sua prática diária.
(...) É possível. Só que a maioria das vezes a gente deixa passar despercebido.
Já pelo fato de a gente estar acostumado com aquele setor, com o que está
acontecendo e muitas vezes passa despercebido esse tipo de coisa. (...) essa
questão de respeito que não há (...) as palavras a serem usadas, a forma de ser
tratado, às vezes os profissionais chegam estressados de algum canto, de outro
plantão, aí o paciente tem alguma queixa, aí não dá muita importância à queixa,
então trata ele mal, com grosseria (...) o barulho de máquinas, incomoda muito,
gritos que ele não entende o que é (...) e a pessoa fica mais angustiada
também. (E11)
As atitudes entendidas como humanizadas tendem a serem sufocadas no cotidiano
dos serviços devido à sobrecarga de trabalho, a natureza contínua e crítica da
atenção designada em UTI e até mesmo despreparo para a realização de tais
condutas, entre outros(12). A efetivação dos princípios da humanização que não
é, muitas vezes, sistematizada dentro da rotina das unidades, resultaria
principalmente do esforço independente de cada profissional em conduzir a
assistência guiada pelo seu bom senso no entendido dessa proposta e sua
disposição individual em efetivá-la.
Humanização na formação do profissional
Outro aspecto que surgiu nas respostas dos enfermeiros quando questionados
sobre o entendimento de humanização é concernente à formação dos profissionais
da área para atuação mediante as diretrizes da política HumanizaSUS,
configurando uma fragilidade na relação entre a teoria e a prática.
(...) poderiam ter alguns treinamentos para capacitar melhor os
profissionais, porque muitas vezes você quer fazer, mas não sabe
exatamente como. E aí, você tendo uma capacitação, você fazendo
algumas oficinas para desenvolver esse lado... Às vezes na graduação
você não é trabalhado para ter um atendimento humanizado. Você é
trabalhado para ter um atendimento mais mecânico. (E9)
Apesar das possíveis intenções do profissional de enfermagem em realizar uma
assistência humanizada, permanece ainda o fator de despreparo em termos
educativos formais para a sua execução de modo que contemple os diversos
aspectos biopsicossociais e relacionais que se demanda. Entendemos que muitas
das ações entendidas como desumanizadas que são evidenciadas com frequência nos
diversos âmbitos da atenção em saúde, podem ocorrer por insegurança do
profissional em modificar as rotinas de cuidados já estabelecidas em seus meios
de atuação, bem como, na incapacidade de sistematizar ações de humanização
devidamente aplicáveis aos diversos cenários assistenciais. Nesse contexto,
persiste a certeza de que a formação do profissional deve abarcar os conteúdos
teóricos, técnicos, políticos e éticos, referentes ao desenvolvimento do
cuidado em enfermagem(13).
(...) a ideia que se tem em saúde de humanização é você tratar o
paciente respeitando a individualidade dele, respeitando os limites e
crenças dele, que é aquela noção que você tem de teoria na faculdade
e que na prática depende mais de cada pessoa. Se você é uma pessoa
que não respeita o próximo, não tem como você colocar humanização
numa pessoa dessa. (E3)
Desde a definição das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN)(14) dos cursos de
saúde no ano de 2001, tem havido por parte das Instituições de Ensino Superior
(IES) em saúde uma maior abertura para a aceitação de conteúdos relativos aos
conteúdos que abarquem os aspectos de formação integral, ensino crítico-
reflexivo e ético na construção de novos desenhos curriculares dos cursos de
saúde(13). Entretanto, ainda coexistem falhas em termos de formação moral do
profissional da área de forma que o desenvolvimento de sua compreensão e sua
competência para atuação em conformidade aos pressupostos da humanização da
saúde em que afirmam.
O desenvolvimento de uma consciência reflexiva nos profissionais é condição
básica estruturante para que estes sejam, posteriormente, capazes de executar o
cuidado ético e humano quando no momento de sua atuação assistencial.
Entretanto, para atingir este ideal esperado urge ainda que se repense as
práticas em termos da valorização de novos saberes, bem como quanto à aquisição
de uma postura mais dialógica também entre as equipes e com usuários e a
revisão de posturas políticas e ideológicas entre os gestores(15).
Da mesma forma, a formação profissional deve também conduzir-se em termos
morais, onde possam ser discutidos dilemas presentes no cotidiano das equipes,
para que a humanização possa ser vivenciada de forma genuína e não somente
repassada enquanto teoria e afirmações idealizadas. Este é um fator necessário
para apropriação de uma postura profissional em que sejam respeitados os
valores do paciente e de seus familiares, consideradas a demandas
biopsicossociais de cada indivíduo e o desenvolvimento justo das condutas em
saúde condizentes à dignidade intrínseca a cada ser humano. Portanto, a
formação para atuação humanística pressupõe a reflexão tanto de conteúdos
objetivos em termos de revisões na conduta gestora, aperfeiçoamento e qualidade
de atendimento, até os aspectos mais subjetivos da assistência como o
autoconhecimento dos sujeitos envolvidos no processo, a empatia e a melhoria
das relações interpessoais com o usuário, familiares, gestores e intraequipe
(16).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entendemos que a problemática conceitual da humanização provoca limitações na
tentativa de modificação do cenário assistencial em saúde, uma vez que ela
perpassa desde aspectos técnicos, relacionais, éticos e até mesmo, questões de
ordem estrutural dos ambientes e assistência. Com a interpretação dos dados
coletados, podemos perceber que os enfermeiros envolvidos no cuidado dentro do
ambiente da UTI possuem algum conhecimento sobre o tema, que foram afirmados de
forma não sistematizada, mas ainda assim, em concordância aos direcionamentos
que a política de humanização preconiza. Apesar disso, foi igualmente
mencionada à existência de falhas na concretização dessa assistência nas
unidades e o despreparo para sua implementação.
A empatia foi afirmada como prerrogativa essencial para a vivência da
humanização, sendo esta a condição para o entendimento das necessidades do
paciente, que apesar da situação de adoecimento, é antes de tudo, um ser humano
e semelhante. Entendemos que geralmente os profissionais atuem de forma
intuitiva na busca por um melhor atendimento aos usuários, utilizando da sua
própria compreensão de bem-estar como principal norteador para ações de
cuidado.
Afirmou-se a importância da realização de uma atenção integral ao paciente
intervindo nos aspectos de caráter fisiológico associado à manutenção de boas
condições psicológicas, espirituais e sociais. Apesar de a conduta holística
ter sido mencionada nas falas dos entrevistados, e facilmente diferenciada
enquanto fatores biopsicossociais de importância na garantia de melhoria de
saúde, estas não foram necessariamente afirmadas na realidade dos serviços. A
nosso ver, este é um cenário que ainda carece de maiores aprofundamentos, pois
o mero fato de poder replicar o discurso sobre as perspectivas da humanização
da saúde, não implica diretamente no seu real entendimento pelo profissional,
ou na sua disposição para atuação mediante estas demandas, nem mesmo na
competência para implementação de tais condutas em seu cotidiano de serviço.
Os profissionais reconheceram seu despreparo em termos de educação formal para
atuar na assistência conforme a proposta da humanização, e legitimaram a
necessidade de haver melhorias na formação do profissional de enfermagem
relativas ao tema em questão. Ao contrário, foi afirmada a formação em
enfermagem com vistas ao desenvolvimento de condutas prioritariamente
mecanicistas. Diante dessa realidade, constata-se a importância da orientação
para humanização em saúde ideologicamente e sistematicamente desde a graduação,
de forma que valorize, acima de tudo, um processo de desenvolvimento de
competências ético-morais que orientem suas futuras práticas. Entendemos
também, a importância do constante estímulo aos profissionais já atuantes,
pelas suas instituições de trabalho através de educação permanente e discussões
concernentes ao tema visando o esclarecimento e sistematização dessas ações,
além da promoção de debates e trocas de experiências entre todos integrantes
das equipes de saúde.
Acreditamos ter atingido aqui os objetivos deste estudo, mas reconhecemos a
necessidade de aprofundamentos sobre a temática, pois o conceito de humanização
requer ainda maiores análises conceituais que promovam aproximações sobre sua
definição, na tentativa de estabelecer as delimitações teóricas que culminem no
favorecimento e desenvolvimento efetivo de suas práticas.