Eficácia da memantina na doença de Alzheimer em seus estágios moderado a grave
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Introdução
A doença de Alzheimer (DA) é um transtorno neurodegenerativo progressivo,
manifestado por deterioração da memória, da cognição e das atividades da vida
diária, associado a uma variedade de sintomas psiquiátricos e a distúrbios
comportamentais. Essa doença afeta aproximadamente 15 milhões de pessoas no
mundo (Khachaturian, 1997), porém o número de pessoas acometidas aumenta
substancialmente com a idade da população (Henderson e Jorm, 2002). Tratamentos
farmacológicos são utilizados freqüentemente para as fases leve a moderada da
doença de Alzheimer, não havendo opções para os estágios mais avançados dessa
enfermidade. O glutamato é o principal neurotransmissor excitatório do cérebro
(Fonnum, 1984; Orrego e Villanueva, 1993).
Uma alta estimulação glutaminérgica pode resultar em prejuízo neuronal,
fenômeno que tem sido denominado excitotoxicidade. A memantina é a primeira de
uma nova classe de drogas para os estágios moderado a grave da DA. É uma droga
antagonista, não-competitiva, voltagem-dependente do receptor N-metil-D-
aspartato (NMDA), que bloqueia os efeitos patológicos dos níveis elevados de
glutamato (Danysz et al., 2000). O objetivo desta revisão de literatura é
avaliar a eficácia, a segurança e a tolerabilidade do uso da memantina em
pacientes portadores da doença de Alzheimer nos estágios moderado a grave.
Métodos
As bases de dados utilizadas para esta revisão de literatura foram MEDLINE,
Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), e
Education Resources Information Center (ERIC) para consultar artigos não-
publicados e trabalhos apresentados em conferências; o University Microfilms
International Dissertation Service para consultar dissertações e teses não-
publicadas; o Sistema de informação da Biblioteca da Organização Mundial da
Saúde (WHOLIS), bem como o National Technical Information Service (NTIS), que
resume estudos subvencionados por mais de 600 agências federais dos EUA.
As palavras de busca utilizadas foram memantinee Alzheimer's disease, sendo
incluídos apenas estudos feitos em humanos, com desenho duplo-cego, randomizado
e placebo-controlado. Os artigos deveriam ter pontuação superior a 4, de acordo
com os critérios de Jadad (Jadad et al., 1996). Essa pontuação compreende:
um ponto para estudo randomizado;
um ponto se a randomização foi feita adequadamente;
um ponto se o estudo é duplo-cego;
um ponto se o método duplo-cego foi descrito e é apropriado;
um ponto se são descritos os dropouts.
Foram excluídos os relatos de caso, os estudos abertos, as revisões de
literatura e as metanálises.
Resultados
Com as palavras de busca usadas foram encontrados no MEDLINE 55 artigos entre
os anos de 1999 e 2006. Feita a restrição para ensaios clínicos duplo-cegos,
randomizados e placebo-controlados, restaram seis artigos. Dois desses foram
excluídos, pois compreendiam o tratamento da demência vascular, a DA associada
a co-morbidades neurológicas e a associação da memantina com outras drogas.
Foram inseridos quatro artigos, com desenho duplo-cego, randomizado e placebo-
controlado e com pontuação superior a 4, de acordo com os critérios de Jadad
(Jadad et al.,1996). Os pacientes avaliados foram classificados como portadores
da doença de Alzheimer de moderada a grave, de acordo com as suas pontuações em
diversas escalas. A Tabela_1mostra uma síntese dos principais resultados dos
estudos selecionados.
Reisberg et al.(2003) (Jadad = 5) realizaram um estudo randomizado, duplo-cego
e controlado com placebo, num período de 28 semanas, em que foram envolvidos
252 pacientes portadores da DA de grau moderado a grave, diagnosticados de
acordo com o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders IV (DMS-IV).
Os pacientes tiveram o Mini-Mental State Examination (MMSE) com pontuação entre
3 e 14 e uma média de 7 a 9; Global Deterioration Scale (GDS) no estágio 5 ou
6; e Functional Assessment Staging (FAST) em estágio de 6a.
Pacientes com demência vascular, desordens neurológicas, co-morbidades
clinicamente significantes, depressão maior e/ou exames laboratoriais anormais
foram excluídos, além daqueles que recebiam medicações concomitantes, como
agentes anticonvulsivantes, antiparkinsonianos, hipnóticos, ansiolíticos,
neurolépticos ou colinomiméticos. Trata-se de um estudo com randomização
realizada por computador, através do Ran Code (versão 3.1), em que 126
pacientes receberam memantina numa dose de 20mg ao dia e 126 fizeram uso de
placebo por um período de 28 semanas.
Para avaliar a evolução dos pacientes foram utilizados os seguintes
instrumentos: Clinician's Interview-Based Impression of Change Plus Caregiver
Input (CIBIC-Plus), Alzheimer´s Disease Cooperative Study Activities of Daily
Living Inventory (ADCS-ADLsev), Severe Impairment Battery (SIB), FAST, MMSE e
GDS.
O CIBIC-Plus avalia sistematicamente o domínio da cognição, função e
comportamento do paciente. A elevação da pontuação indica piora do quadro. Os
pacientes que receberam placebo tiveram piora progressiva ao final de 28
semanas, comparados com os que receberam memantina. Todos os pacientes tinham
escore de 4 no CIBIC-Plus, contudo nos que receberam placebo os escores se
elevaram para aproximadamente 4,7 e nos que receberam memantina, para 4,4. A
diferença foi estatisticamente significativa (p< 0,03) ao final das 28 semanas;
entretanto, com a continuação da observação, a diferença não foi
estatisticamente significante (p< 0,06).
O ADCS-ADLsev, modificado para o estado grave, determina a habilidade do
paciente para a sua performancenas atividades da vida diária. O total de 54
pontos significa ótima performance,e pontos baixos indicam piora. Essa escala
foi pontuada, no início do estudo, em 27,4 no grupo placebo e 26,8 no grupo
memantina. Foi observado que, ao final das 28 semanas, houve menor deterioração
do grupo que recebeu memantina de aproximadamente -3, em comparação ao grupo
placebo, com aproximadamente -6, sendo essa diferença estatisticamente
significante (p< 0,003). Com a contínua observação essa diferença se reduziu,
porém permaneceu estatisticamente significativa (p< 0,02).
A avaliação feita pelo SIB observa a performancecognitiva da DA, incluindo
interação social, memória, linguagem, habilidade visual, atenção, praxia e
construção, com pontuação que varia de 0 (considerável deterioração) até 100.
Essa escala favoreceu o grupo que recebeu memantina, sendo que ao final das 28
semanas houve decréscimo na escala do grupo placebo de aproximadamente dez
pontos, comparado com decréscimo de aproximadamente cinco pontos no grupo
memantina (p< 0,002). A diferença permaneceu significante com a contínua
observação (p< 0,001). Pacientes tratados com memantina mostraram-se
significativamente menos deteriorados, quando comparados com o grupo placebo
(p< 0,007), ao final de 28 semanas. Os resultados de todas as escalas se
mantiveram significantes no end point, exceto o CIBIC-Plus.
Por fim, nas análises da população estudada ao final das 28 semanas, não foram
observadas diferenças significativas entre os grupos placebo e memantina nas
escalas MMSE, GDS ou Neuropsychiatric Inventory (NPI). Foram registradas 71
exclusões, sendo 42 pacientes no grupo placebo e 29 no grupo da memantina.
Agitação foi a razão mais prevalente da descontinuidade do estudo,
apresentando-se em 7% dos que receberam placebo e 5% dos que receberam
memantina. Efeitos adversos sérios foram reportados em 23 pacientes (18%) que
receberam placebo e 16 que receberam memantina (13%). Sete mortes ocorreram
durante o estudo, apenas duas no grupo memantina. Os efeitos adversos mais
sérios incluídos em todas as mortes não foram considerados relacionados com o
uso da medicação. A ocorrência de pelo menos um evento adverso relacionado com
o tratamento foi mais freqüente no grupo placebo (87%), quando comparado com o
grupo memantina (84%). Os efeitos colaterais mais freqüentes reportados foram
agitação, incontinência urinária, insônia e diarréia. Os dois últimos efeitos
foram mais freqüentes no grupo da memantina. Não houve diferença significativa
nos valores laboratoriais, nos eletrocardiogramas (ECG) e nos sinais vitais
durante o estudo entre os dois grupos.
Rive et al. (2004) (JADAD = 4) realizaram um estudo duplo-cego, randomizado e
placebo-controlado, com uma amostra inicial de 252 pacientes, obedecendo aos
critérios para definir o estágio da doença de Alzheimer, de acordo com a escala
do MMSE (MMSE > 10, moderadamente grave, e < 10, grave). O estudo realizou uma
triagem clínica para avaliar a eficácia e a tolerabilidade de 20mg de memantina
por dia, comparada com placebo, por um período de 28 semanas. A seleção dos
pacientes foi realizada pelo ADCS-ADLsev, sendo todos classificados de acordo
com as capacidades básicas (basic activities of daily living[BADL]) e
instrumental (instrumental activities of daily living[IADL]). As atividades
básicas são simples, como comer, vestir-se sozinho, transferir-se e utilizar o
banheiro de forma independente, enquanto as atividades instrumentais são mais
complexas, como utilizar o telefone, preparar comida e/ou lavar objetos. A
função cognitiva foi mensurada pelo MMSE e pelo SIB.
Para os sintomas comportamentais foi utilizado o NIP e para o grau da
severidade, o FAST e o GDS. O CIBIC-Plus foi usado para verificar o resultado
primário da eficácia da triagem clínica. O questionário The Resource
Utilization in Dementia (RUD) (Wimo et al., 1998) foi utilizado para mensurar o
tempo gasto (por mês) pelos cuidadores para assistir aos pacientes. Os 252
pacientes incluídos na triagem foram divididos em dois grupos. A classificação
dos dois grupos, computada por algoritmos, formulou os critérios de autonomia
para cada paciente. O número de grupos foi determinado pelo pseudo
Festatístico. O grupo 1 foi composto por 146 pacientes dependentes, pois
possuíam as menores pontuações, de acordo com as classificações supracitadas. O
grupo 2 foi composto por 106 pacientes com certa autonomia. O critério de
autonomia foi definido pela seguinte equação: IADL + 1,6 x BADL. Com resultado
> 32,4, o paciente é considerado autônomo e, caso contrário, é dependente. Não
houve diferença significativa entre autônomos e dependentes com relação a sexo
ou idade. A duração da doença foi maior para os pacientes dependentes (média de
5,8 anos ± 3,4) do que para os autônomos (média de 5,1 anos ± 3,9) (p= 0,033).
O início da doença antes dos 65 anos não mostrou diferença significante entre
pacientes autônomos e dependentes.
Uma diferença estatisticamente significante entre pacientes autônomos e
dependentes foi observada nas escalas MMSE, SIB, FAST, GDS e NPI, todas em
favor dos pacientes autônomos, indicando que esses têm menos distúrbios
cognitivos, funcionais e comportamentais (p< 0,001). O tempo dos cuidadores e
os custos são maiores nos pacientes dependentes (p< 0,001). Além disso, a
proporção da institucionalização é maior em pacientes dependentes (10,5%)
quando comparados com os autônomos (5,7%); contudo, a diferença não é
estatisticamente significante. Os pacientes autônomos tratados com memantina
tiveram, em seis meses, uma autonomia maior, quando comparados com os que
receberam placebo (razão de risco [OR] = 3,03; intervalo de confiança [IC]:
95%,1,38-6,66). Nos pacientes com doença moderamente grave e grave, os
dependentes, essa diferença foi menor, mas se manteve estatisticamente
significante no mesmo período de tempo (OR = 2,22; IC: 95%, 1,06-4,65).
Resultados similares foram identificados com a utilização do Treated Per
Protocol (TPP), com 78 pacientes no grupo placebo e 93 no grupo memantina, e
com o método Last Observation Carried Forward (LOCF), em que 247 pacientes
obtiveram uma última análise pelo ADCS-ADLsev. Em ambos os casos a memantina
foi benéfica na melhora da autonomia dos pacientes ao final das 28 semanas (p<
0,024 e p< 0,023), reduzindo assim os custos e diminuindo a responsabilidade do
cuidador. Os efeitos colaterais mais freqüentes foram agitação e insônia, com
predomínio no grupo placebo, porém não houve diferença estatisticamente
significante entre os grupos placebo e memantina.
Winblad e Poritis (1999) (Jadad = 4) realizaram um estudo placebo-controlado,
duplo-cego e randomizado, com uma amostra inicial de 167 pacientes. Foram
selecionados pacientes de ambos os sexos, idades entre 60 e 80 anos, com
demência definida pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Diseases III
(DSM-III-R, 1987). Outros critérios de inclusão foram os estágios 5-7 do GDS e
MMSE < 10 pontos, com duração da demência superior a 12 meses. Os pacientes
excluídos do estudo possuíam algum tipo de enfermidade não controlada, como
doença terminal, insuficiência cardíaca progressiva, hipertensão grave, infarto
do miocárdio nos últimos três meses, arritmias cardíacas graves, diabetes
mellitus(DM) instável, doença hepática crônica, deterioração renal grave (nível
sérico de creatinina > 2mg%), deterioração da função tireoidiana, doença
psiquiátrica grave (esquizofrenia e depressão maior), epilepsia e/ou doença de
Parkinson, bem como os que estavam em uso de outras drogas como inibidores da
monoamina oxidase (IMAOs), neurolépticos, antidepressivos tricíclicos,
hipnóticos, nootrópicos ou agentes estimuladores da circulação cerebral.
A avaliação dos resultados foi feita em dois tempos. Os critérios de primeira
eficácia eram compostos pelo Clinical Global Impression of Change (CGI-C), que
avalia a mudança ea performancedo paciente com uma impressão clínica global,
realizada pela experiência do clínico, independente da avaliação feita pelo
cuidador, e pelo Behavioral Disturbances of Geriatric Patients (BGP), que
observa capacidade funcional e distúrbios comportamentais dos pacientes
geriátricos acompanhados pela equipe de enfermagem. O BGP é composto por quatro
subescalas com 35 itens, sendo que esse estudo utilizou a subescala de
dependência de cuidados. As variáveis da segunda eficácia foram classificadas
de acordo com o D-Scale, que tem dezesseis variáveis funcionais como critérios
mais importantes para caracterizar a independência, classificados desde uma
função normal até um cuidado dependente total.
Os resultados apresentados nesse estudo foram realizados com pacientes
portadores de DA, demência vascular e mista. Uma amostra de 79 pacientes
representava os portadores de DA que foram randomizados em grupos, sendo 41
pacientes em uso de 10mg de memantina ao dia e 38 em uso de placebo. Na
avaliação do CGI-C, após 12 semanas, 30 pacientes (73%) em uso de memantina
responderam com melhora e apenas 11 pacientes (27%) não responderam ao uso da
droga. O grupo placebo obteve resposta em 16 pacientes (42%), evidenciando
fortemente o envolvimento de fatores psicológicos, e 22 pacientes (58%) não
obtiveram resposta. A diferença entre os dois grupos foi estatisticamente
significante (p< 0,0005). Na avaliação do BGP, os pacientes que receberam
memantina tiveram diminuição da dependência (-3,5 ± 12,5) mais acentuada quando
comparados com os pacientes do grupo placebo (-1,6 ± 9,2) (p= 0,016).
O estudo evidenciou que, em relação à segurança e à tolerabilidade, 18
pacientes (22%) do grupo memantina e 18 pacientes (21%) do grupo placebo
tiveram efeitos adversos. Quatro pacientes (5%) do grupo memantina e cinco
pacientes (6%) do grupo placebo tiveram efeitos adversos sérios, que
consistiram em piora da insuficiência cardíaca, apnéia, distúrbio circulatório
cerebral, parada cardíaca, coma, hospitalização com dor abdominal, febre e
vômitos, entre outros. Em todos os casos dos efeitos adversos sérios não foi
observada relação com a medicação. A tolerância da medicação foi evidenciada
pelos parâmetros laboratoriais, mostrando que 71% dos pacientes do grupo
memantina e 69% do placebo toleraram muito bem o tratamento; 28% do grupo
memantina e 31% do placebo mostraram boa tolerabilidade; e apenas um paciente
do grupo memantina apresentou moderada tolerabilidade.
A freqüência de valores laboratoriais anormais foi distribuída, de forma
equivalente, em ambos os grupos. Dessa forma, esse estudo evidenciou que o
tratamento com a memantina, na dose de 10mg/dia, por um período superior a 12
semanas, melhora a capacidade funcional, a necessidade dos cuidados de
dependência e os sintomas comportamentais de demência grave, além de a droga
ser bem tolerada e segura.
Wimo et al. (2003) (Jadad = 4) realizaram um estudo multicêntrico, duplo-cego,
randomizado e placebo-controlado, por um período de 28 semanas, com triagem
clínica feita nos EUA. Os pacientes selecionados tinham idade mínima de 50 anos
com provável DA, de acordo com o DMS-IV e o critério do National Institute for
Communicative Disorders and Stroke ' Alzheimer's Disease and Related Disorders
Association (NINCDS/ADRDA) (McKhann et al.,1984). Os critérios elegíveis
incluíram as pontuações de 3-14 do MMSE, os estágios 5 ou 6 do GDS e o estágio
6a do FAST. As análises dos efeitos da medicação na função e na cognição do
paciente foram realizadas pelas escalas ADCS-ADLsev, FAST, SIB, e a relevância
clínica foi confirmada pelo CIBIC-Plus.
O estudo também evidenciou a utilização de recursos, que foram mensurados pelos
gastos com enfermagem em casa, no hospital ou em emergências, bem como com as
horas gastas pelo cuidador informal, usando o questionário RUD durante os
eventos ocorridos em um mês, e um seguimento dos eventos ocorridos em três
meses. O questionário foi completado nas semanas 12 e 28, ou quando os
pacientes terminavam o estudo prematuramente. Os eventos específicos do
questionário incluíam tempo empregado pelo cuidador para o paciente, mudança de
trabalho do cuidador, utilização de recursos para cuidados com a saúde tanto
por parte do paciente quanto por parte do cuidador, e posição residencial do
paciente, caracterizada no fato de morar na comunidade ou em instituição. Todas
as variáveis foram calculadas por um período de seis meses; entretanto o tempo
do cuidador foi calculado em sua totalidade por apenas dois meses.
A análise dos custos foi calculada com base nas despesas diretas com
medicamento, gastos não-medicamentosos e tempo do cuidador. Os 252 pacientes
foram randomizados, sendo que 126 receberam 10mg de memantina duas vezes ao
dia, totalizando 20mg/dia e 126 receberam placebo. Apenas 181 (97 no grupo
memantina e 84 no grupo placebo) completaram o período de 28 semanas de
tratamento. A não-continuidade foi mais alta no grupo placebo (42 pacientes,
33%) do que no memantina (29 pacientes, 23%). A razão mais freqüente para esse
evento foram alguns efeitos adversos, como a agitação, que também foi maior no
grupo placebo (7%) do que no memantina (5%).
Ao final das 28 semanas a superioridade da memantina em relação ao placebo foi
estatisticamente significante para os domínios global, funcional e cognitivo. O
CIBIC-Plus encontrou uma média de diferença de 0,36 pontos nos 181 pacientes
analisados (97 no grupo memantina e 84 no placebo), favorecendo os pacientes
que utilizavam memantina e revelando menor aumento na escala, quando em
comparação com o grupo placebo (p< 0,025). Na avaliação funcional realizada
pelo ADCS-ADLsev, a média de diferença entre os grupos, favorecendo a
memantina, foi de 3,37 pontos (p= 0,003) com a mesma amostra supracitada. O
total de pontos mensurado pelo SIB evidenciou consistente efeito da memantina
no desempenho cognitivo, com uma diferença de pontos de 5,7 (p= 0,002) em uma
amostra de 179 pacientes.
Nas escalas MMSE e NPI não houve diferença significativa entre os grupos ao
final das 28 semanas. As diferenças de importância clínica em relação aos
efeitos adversos não foram consideradas significativas entre os grupos. O tempo
dos cuidadores dos pacientes que receberam memantina foi significativamente
menor do que os cuidadores do grupo placebo, com uma diferença de 51,52 horas
por mês (p= 0,02). Análises adicionais evidenciadas pelo LOCF e pela intenção
de tratar (ITT) populacional avaliaram o tempo gasto pelo cuidador e
confirmaram resultado similar ao do TPP, sendo observada superioridade
estatisticamente significativa da memantina em relação ao placebo, com uma
diferença de 45,82 horas por mês (p= 0,01). O total de custos dos cuidadores e
fatores sociais foram estatisticamente mais baixos no grupo da memantina quando
comparado ao placebo. O estudo dos resultados dos custos sociais realizados
pelo TPP foi confirmado pelas análises feitas pelo LOCF e pela ITT,
evidenciando uma média de diferença mensal de $US 840,40 em favor da memantina,
sendo a diferença estatisticamente significante (p= 0,01).
Discussão
Os achados sugerem que os pacientes com DA de estágios moderado a grave podem
experimentar benefícios com o tratamento antiglutaminérgico, diminuindo a
progressão da deterioração característica da doença, principalmente no que diz
respeito à atividade da vida diária. A utilização da memantina, na dose de 20mg
por dia, pode reduzir tempo e custo dos gastos por parte dos cuidadores e, ao
mesmo tempo, melhorar os domínios global, funcional e comportamental dos
pacientes portadores de DA. A eficácia, a segurança e a tolerabilidade do uso
da memantina em pacientes portadores de DA nos estágios de moderado a grave
foram demonstradas na avaliação dos quatro estudos selecionados. Todos os
artigos analisados evidenciaram benefícios do uso da memantina nas doses de
10mg ou 20mg ao dia, quando comparada com o placebo, apresentando melhora da
capacidade funcional, das atividades da vida diária e dos distúrbios
comportamentais, com diferenças estatisticamente significativas. A melhora da
cognição, entretanto, não foi superior à do placebo em dois estudos (Reisberg
et al., 2003; Wimo et al., 2003).
A memantina aumenta a autonomia do paciente portador de DA, principalmente na
habilidade de levantar-se, mover-se de forma independente, tomar banho ou ir ao
banheiro, vestir-se, orientar-se no espaço, realizar atividades em grupos e
interessar-se por hobbies(Winblad e Poritis, 1999). Portanto as pressões e o
estresse sofridos pelo cuidador diminuirão, bem como o tempo gasto com o
paciente e o risco de depressão, aumentando então a sua qualidade de vida. A
análise dos estudos não demonstrou relevância quanto aos efeitos colaterais; ao
contrário, os efeitos adversos foram até maiores no grupo placebo do que no da
memantina, sugerindo que os prováveis efeitos colaterais não eram decorrentes
da droga, mas sim da própria gravidade da doença.
A relação custo/benefício favorece o uso da memantina, pois além de reduzir os
custos totais com o paciente portador de DA, melhora a capacidade funcional e
os distúrbios do comportamento (Wimo et al., 2003). Assim, o gasto obtido para
a manutenção medicamentosa é compensado por redução dos custos adicionais,
melhora do paciente e aumento da qualidade de vida do paciente e do cuidador.
Todos os estudos avaliaram memantina versusplacebo num período de 28 semanas.
Entretanto, Reisberg et al.avaliaram a eficácia da memantina em longo prazo,
realizando uma extensão de 24 meses do estudo duplo-cego, randomizado e
placebo-controlado (Reisberg et al.,2006). Os pacientes, que antes recebiam
placebo, passaram a receber memantina 20mg/dia e apresentaram um benefício
estatisticamente significante, revelando menor grau de declínios funcional,
global e cognitivo, quando em comparação com o placebo durante estudo duplo-
cego (p< 0,05). Na fase de extensão os efeitos adversos dos pacientes tratados
com memantina tiveram perfil similar ao dos pacientes do estudo duplo-cego. A
extensão da terapia com memantina por mais 24 semanas também se mostrou
benéfica para pacientes portadores de DA nos estágios moderado a severo.
Uma metanálise publicada no Cochrane Database of Systematic Reviews (McShane et
al., 2006) incluindo estudos não-publicados sugere que a memantina mostrou-se
benéfica para pacientes com DA nos estágios moderado a grave, quando avaliada
por SIB, ADCS-ADLsev, NPI e CIBIC-Plus. Houve progresso na melhora clínica,
cognitiva e funcional, com resultados estatisticamente significantes em relação
ao placebo. Pacientes que receberam memantina desenvolveram discretamente me-
nos agitação, quando em comparação com placebo (p< 0,04) na doença leve. A
agitação foi um pouco maior nos pacientes com doença moderada a grave, porém
permaneceu menor do que nos que receberam placebo (p< 0,005). Parece, portanto,
que esse efeito é conseqüência da própria doença.
Sabe-se que a doença de Alzheimer é progressiva e que as medicações
antidemenciais têm uma função apenas paliativa. Até o presente momento a
memantina foi testada e se mostrou superior ao placebo por um período de 28
semanas, mas seu uso prolongado carece de evidências científicas em estudos
controlados.