Satisfação com saúde bucal de idosos brasileiros: um estudo de gênero com
modelo hierárquico
Key words:Salud Bucal; Anciano; Autoimagen
RESUMEN
Los objetivos de este estudio fueron identificar las diferencias de género, en
relación con factores asociados a la satisfacción con la salud bucal de
ancianos, con el fin de estimar la prevalencia de edentulismo por género y
edad. Se incluyó a 2.052 personas mayores de 60 años y más que residen en Sete
Lagoas, Minas Gerais, Brasil. La regresión de Poisson se utilizó para estimar
la prevalencia de edentulismo. La asociación entre la satisfacción bucal y las
variables independientes se realizó mediante el modelo de regresión ordinal
multidimensional jerárquico. La prevalencia de edentulismo en hombres y mujeres
era de un 63% y un 68,8%, respectivamente. La mayoría de los hombres de edad
avanzada (63%) y mujeres (57%) estaban satisfechos con su salud bucal. El
modelo ajustado final, para ambos sexos, fue desarrollado por variables
relacionadas con el ambiente externo, las conductas de salud y las condiciones
de salud bucal. Se concluye que la satisfacción con la salud bucal está
fuertemente influenciada por el estado de salud oral y las conductas de salud,
asimismo, los factores asociados son diferentes para cada género.
Introdução
O último levantamento epidemiológico realizado pelo Ministério da Saúde em 2010
indica um panorama ainda crítico para os idosos brasileiros, com elevada perda
dentária e edentulismo 1. Um estudo de revisão sistemática sobre a saúde bucal
desse grupo citado revelou uma prevalência de edentulismo média de 60,13% e
elevado uso de próteses nas diferentes populações e contextos abordados 2.
Diante desse quadro, o desenvolvimento de ações sociais de prevenção,
diagnóstico e intervenção é cada vez mais necessário 3. Apesar dos resultados
positivos da Política Nacional de Saúde Bucal – Brasil Sorridente – junto à
Estratégia Saúde da Família, o uso dos serviços odontológicos é muito baixo
entre idosos e pouco se sabe em que medida está relacionado à percepção da
necessidade de tratamento odontológico e à autopercepção da saúde bucal 4.
A obtenção de dados epidemiológicos por meio de índices e indicadores
quantitativos é importante, mas leva em conta apenas a visão do profissional 5.
Considerando-se que o comportamento dos indivíduos é condicionado por suas
percepções e pela importância dada a elas, a avaliação da autopercepção das
condições de saúde bucal representa um ganho substancial para o planejamento
dos serviços de saúde nessa área 6.
A utilização dos modelos sociológicos de interação entre variáveis subjetivas e
objetivas para o estudo de percepção e autoavaliação da saúde bucal da
população idosa vem ganhando repercussão internacional 7,8,9. Esses modelos
levam em consideração as características individuais, ambientais,
sociocomportamentais e culturais, as condições clínicas e também a experiência
subjetiva dos indivíduos sobre o seu bem-estar funcional, social e psicológico,
refletindo a natureza multidimensional da autoavaliação da saúde bucal
10,11,12.
Concomitantemente, estudos nacionais têm evidenciado que o envelhecimento é
diferente para homens e mulheres 13. Em relação à saúde bucal, a maioria dos
trabalhos aborda apenas o perfil epidemiológico bucal 14, com amostras não
comparáveis entre os gêneros 15,16, e foi realizada com idosos
institucionalizados 17.
Portanto, os objetivos do presente estudo foram identificar as diferenças de
gênero em relação aos fatores associados à satisfação com saúde bucal de idosos
e estimar a prevalência de edentulismo por gênero e faixa etária.
Métodos
Desenho do estudo e participantes
Este trabalho é parte de um estudo longitudinal realizado no Município de Sete
Lagoas, Minas Gerais, Brasil, com uma população residente de 214.152
habitantes, sendo que 10,16% têm a idade igual ou superior a 60 anos 18. O
município é dividido em 17 regiões administrativas (criadas para substituir os
limites dos 183 bairros existentes) 19, três áreas urbanas isoladas, um
distrito fora da sede e área rural.
O cálculo amostral foi realizado para comparação entre gêneros considerando-se
a prevalência de capacidade funcional para atividades instrumentais nos gêneros
masculino (86,6%) e feminino (72,9%) 20. O erro estimado foi de até cinco
pontos porcentuais, poder de teste de 80%, com intervalos de 95% de confiança
(IC95%), considerando um efeito de delineamento de dois. Foi utilizado um
adicional de 20% para perdas e recusas. Em seguida, a amostra de cada grupo
(homens e mulheres) foi estratificada por faixa etária em relação à população e
corrigida pela probabilidade do risco de morrer, resultando em 1.146 idosos.
Os critérios de exclusão adotados foram: indivíduos residentes em instituição
de longa permanência no período da coleta de dados, os portadores de
deficiências visual e/ou auditiva graves e não corrigidas, aqueles com
deficiência cognitiva que impede o entendimento e execução da entrevista e do
exame clínico, e os que se recusaram a assinar o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE).
A técnica de amostragem foi probabilística por conglomerados sob o critério de
partilha proporcional ao tamanho em dois estágios: setores censitários e
domicílios, que foram sorteados proporcionalmente ao número de domicílios
permanentes particulares ocupados por estrato (área urbana, zona rural,
distrito).
A coleta de dados foi realizada no domicílio e foram consideradas perdas de
entrevista/exame os casos em que o idoso não foi localizado após três
tentativas, incluindo o fim de semana. O projeto foi divulgado junto às
autoridades municipais, meios de comunicação e por folder próprio.
O exame epidemiológico foi feito sob iluminação natural, espelho bucal plano e
uma espátula de madeira. O índice CPOD (dentes permanentes cariados, perdidos e
restaurados) foi utilizado para estimar o edentulismo, segundo critérios
preconizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) 21, mas adaptados. O
número de dentes perdidos foi apurado e a variável foi dicotomizada em:
ausência de todos os dentes e presença de um ou mais dentes.
Foi realizada também uma avaliação clínica sobre uso e necessidade de próteses
superior e inferior. Para avaliar uma prótese em usos consideraram-se retenção,
estabilidade, e reciprocidade e estética. Os possíveis códigos indicavam o tipo
de prótese (parcial removível, parcial fixa, total) e a região (superior,
inferior). Neste trabalho, as variáveis foram agrupadas seguindo recomendações
da OMS, para medir o “agravamento” do edentulismo 21.
O questionário estruturado continha 50 perguntas semelhantes às da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios(PNAD) de 2011, incluindo questões sobre
estilo de vida e acesso e utilização de serviços de saúde bucal. Para as
variáveis relacionadas à saúde bucal utilizaram-se perguntas selecionadas do
SBBrasil 2010. O método teste/reteste foi empregado para verificar a
confiabilidade e o desempenho dos questionários e testes nesta amostra. A
fidedignidade foi avaliada pela correlação de Spearman para teste de associação
simples entre as variáveis do instrumento, e pela correlação partial rank de
Kendall para avaliar a interferência ou não de um fator externo comum a todos
os sujeitos. Obtiveram-se coeficientes de correlações superiores a 0,80 (p <
0,001).
O projeto piloto foi conduzido anteriormente à coleta de dados com 107 idosos
(10% da amostra total) em um município vizinho, sendo que as entrevistas foram
realizadas em duplicata para verificação das concordâncias inter e
intraexaminadores, utilizando-se o coeficiente kappa. Obteve-se 92% de
concordância interexaminadores e 98,5% para intraexaminadores, seguindo os
parâmetros adotados pela OMS 21.
A coleta de dados foi realizada entre os meses de janeiro e julho de 2012, por
uma equipe formada por três examinadores e três anotadores treinados e
calibrados. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade Federal de Minas Gerais (COEP-UFMG), CAAE-0413.0.203.000-11.
Satisfação com a saúde bucal
Para a variável dependente – satisfação com a saúde bucal (“Com relação aos
seus dentes/boca o(a) senhor(a) estava...”) – as respostas foram agregadas em
três categorias: “insatisfeito” (união de muito insatisfeito a insatisfeito),
“nem insatisfeito nem satisfeito” e “satisfeito” (união de muito satisfeito a
satisfeito), o que permitiu não perder o caráter ordinal entre as categorias da
variável.
Modelo teórico conceitual
O presente estudo utilizou o modelo comportamental em saúde 22 adaptado por
Martins et al. 23 para investigar os fatores associados ao grau de satisfação
bucal em idosos. As variáveis mais distais são as características demográficas.
O modelo comportamental expandido conceitua os comportamentos de saúde, as
características do ambiente externo e recursos socioeconômicos como variáveis
intermediárias, que por sua vez influenciam os resultados de saúde bucal
(avaliada, percebida, satisfação do indivíduo).
As variáveis independentes foram agrupadas em seis níveis hierárquicos
distintos entre distal, intermediário e proximal em direção ao desfecho (Figura
1). As variáveis distais, localizadas no primeiro nível de análise, foram
denominadas características individuais: faixa etária (60-64 anos, 65-69, 70-
74, 75-79 anos, 80 anos e mais); cor da pele autorrelatada (branca, preta,
amarela, parda, indígena. O ambiente externo foi avaliado pela localização do
domicílio (urbana, rural, distrito); se o idoso morava sozinho (sim, não);
tempo de moradia no domicílio (≤ 10 anos, 11-24, 25-37, 38 anos e mais);
condição de propriedade do domicilio (próprio, alugado, de parentes, outro);
tipo de construção (alvenaria, outro); abastecimento de água (rede geral
canalizada, poço ou nascente); presença de sanitário no domicílio (sim, não);
rede de esgoto domiciliar (rede geral canalizada, fossa); coleta de lixo
(serviço de limpeza público, outro); energia elétrica no domicilio (sim, não).
A disponibilidade de recursos foi medida por meio do nível de escolaridade
(analfabeto, 1o grau, 2o grau, graduado); renda mensal do idoso (≤ R$ 622,00,
R$ 622,00-820,00, > R$ 820,00); aposentado (sim, não); estado civil (casado,
solteiro, viúvo, separado); participação em grupo para terceira idade (sim,
não). O quarto nível reuniu as variáveis sobre os comportamentos de saúde: fuma
(sim, não); ingere bebidas alcoólicas (sim, não); possui algum problema para
dormir (sim, não); pratica atividade física (sim, não); teve perda de apetite
nos últimos seis meses (sim, não); possui algum problema para mastigar ou
deglutir os alimentos (sim, não); número de refeições diárias (uma, duas, três,
quatro ou mais); ingestão diária de líquido (uma, duas, três, quatro ou mais);
autoavaliação do peso (abaixo do peso, peso normal, acima do peso). As
variáveis sobre o uso de serviços odontológicos estavam no penúltimo nível de
análise: visita frequente ao dentista (sim, não); plano odontológico (sim,
não); tipo de serviços de saúde bucal (público, particular, plano/convênio,
outro); consulta ao dentista nos últimos seis meses (sim, não); motivo de
consulta ao dentista (dor, prevenção, tratamento, não consultou). Finalmente,
no nível proximal ficaram as condições de saúde bucal: edentulismo (sim, não);
autoavaliação da necessidade de usar/trocar prótese (sim, não); avaliação
clínica do uso e necessidade de prótese superior (não usa e não necessita, não
usa e necessita, usa e não necessita, usa e necessita); avaliação clínica do
uso e necessidade de prótese inferior (não usa e não necessita, não usa e
necessita, usa e não necessita, usa e necessita).
Figura 1 Modelo hierárquico para análise de dados adaptado por Martins et al.
23.
Análise dos dados
Inicialmente, realizou-se uma análise descritiva da amostra, estratificada por
gênero. A análise de regressão de Poisson foi utilizada para estimar a
prevalência de edentulismo por gênero e faixa etária. A satisfação bucal e a
necessidade subjetiva de prótese para cada grupo (homens, mulheres e total)
foram comparadas em relação ao edentulismo. Os resultados foram expressos como
odds ratio (OR) e IC95%.
Neste trabalho, optou-se por aplicar o modelo PLUM (polytomous universal model)
que incorpora a natureza ordinal da variável dependente na análise. Sendo
assim, foi realizada uma regressão logística com o modelo OR proporcional e
função Logit. Recomenda-se executar uma análise univariada para seleção dos
efeitos principais e incluir no modelo apenas as variáveis significativamente
associadas ao desfecho com um nível de significância prefixado. Em seguida, as
probabilidades entre as categorias da variável dependente são comparadas por
meio do cálculo da OR bruta e ajustada 24. Para identificar os fatores
associados à satisfação com saúde bucal, realizou-se uma análise univariada
para cada variável independente e, posteriormente, em cada bloco de associação.
Dentro de cada nível hierárquico, as variáveis com p < 0,20 foram testadas em
modelos múltiplos. Ao final, as variáveis com p < 0,05 permaneceram no modelo
final de cada nível e foram consideradas fatores de ajuste para os blocos
subsequentes. Para estimar as probabilidades do ponto de corte da variável
dependente, o modelo construído apresenta limiares (thresholds) para as
categorias inferiores (insatisfeito, nem insatisfeito nem satisfeito) em
relação à de maior ordem (satisfeito). Para além dessa utilização, o seu
interesse é reduzido 24.
Considerando-se que a depressão e a ansiedade afetam a autoavaliação/percepção
de saúde na população idosa 25, foi realizado um ajuste no modelo final
levando-se em conta a presença de depressão medida pela Escala Geriátrica de
Depressão, versão curta com 15 itens (GDS-15) 26.
Todas as análises foram realizadas para homens e mulheres separadamente. Os
testes de homogeneidade dos declives e de multicolinearidade foram realizados
com ajuste de Pearson para analisar a validade do modelo construído. Para
verificar a possível interferência do número reduzido de algumas observações,
utilizou-se a análise dos resíduos para dados ordinais proposta por McCullagh
27. Todos esses testes evidenciaram que o modelo tinha todos os pressupostos
satisfeitos. O efeito do desenho amostral complexo foi considerado em todas as
análises realizadas, utilizando-se o software estatístico SPSS versão 18.0 (IBM
SPSS, IBM Corp., Armonk, Estados Unidos).
Resultados
Dentre os domicílios sorteados para obter a amostra, 27 idosos haviam mudado de
endereço, 38 não foram localizados e 35 faleceram no período da coleta de
dados, totalizando uma perda de 4,8%. Entre os idosos encontrados nos
domicílios houve 5,8% de recusa e 1,2% de perda por outros motivos. Dos idosos
entrevistados, 25 entrevistas foram realizadas com o cuidador devido a
dificuldades físicas e/ou mentais, não tendo sido, por este motivo, incluídas
nesta análise. Portanto, a amostra do presente estudo foi constituída por 2.052
indivíduos.
Em relação à satisfação com a saúde bucal, 25,9% dos idosos estavam
insatisfeitos, 14,7% nem insatisfeitos nem satisfeitos e 59,4% satisfeitos. No
grupo satisfeito com a saúde bucal (1.219 idosos), a maioria era do sexo
feminino (57,3%), tinha menos de 70 anos de idade (65,7%), edêntula (70,9%) e
achava que não era necessário trocar/usar prótese (72,8%) (Tabela_1).
Tabela 1 Descrição dos idosos por gênero em relação à satisfação com a saúde
bucal, segundo características individuais, ambiente externo, disponibilidade
de recursos, comportamentos de saúde, uso de serviços odontológicos e condições
de saúde bucal. Sete Lagoas, Minas Gerais, Brasil, 2012.
Variáveis/Categorias Masculino (N = 826) Feminino (N = 1.226)
Nem Nem
Insatisfeito insatisfeito Satisfeito Insatisfeito insatisfeito Satisfeito
(n = 184) nem (n = 520) (n = 347) nem (n = 699)
satisfeito satisfeito
(n = 122) (n = 180)
n % n % n % n % n % n %
Características individuais
Faixa etária (anos)
60-64 60 27,1 39 17,6 122 55,3 97 31,3 53 17,1 160 51,6
65-69 49 25,4 30 15,5 114 59,1 94 32,5 45 15,6 150 51,9
70-74 32 18,7 26 15,2 113 66,1 71 29,2 30 12,3 142 58,5
75-79 20 17,1 11 9,4 86 73,5 46 24,1 27 14,1 118 61,8
80 e mais 23 18,5 16 14,9 85 66,6 39 20,2 26 13,0 132 66,8
Cor da pele autorrelatada
Branca 51 17,1 40 13,4 207 69,5 110 26,1 55 13,1 255 60,8
Preta 36 29,0 14 11,3 74 59,7 55 32,5 28 16,6 86 50,9
Amarela 87 23,5 64 17,3 220 59,2 160 28,5 91 15,6 325 55,9
Parda 1 12,5 1 12,5 6 75,0 9 47,4 1 5,3 9 47,3
Indígena 6 33,3 2 11,1 10 55,6 3 13,0 4 17,4 16 69,6
Ambiente externo
Localização do domicílio
Urbana 174 24,0 95 13,1 455 62,9 316 29,0 154 14,1 619 56,9
Rural 7 8,9 26 32,9 46 58,2 18 16,8 22 20,6 67 62,6
Distrito 3 13,0 1 4,3 19 82,7 13 43,3 4 13,3 13 43,3
Mora sozinho
Sim 24 30,4 10 12,7 45 56,9 58 29,3 27 13,6 113 57,1
Não 158 21,2 112 15,0 475 63,8 287 28,0 152 14,8 586 57,2
Tempo moradia (anos)
≤ 10 62 28,7 33 15,3 123 56,0 85 27,9 49 16,1 171 56,0
11-24 50 23,1 30 13,9 136 63,0 93 30,9 48 15,9 160 53,2
25-37 43 21,9 27 13,8 126 64,3 99 31,8 50 15,9 164 52,2
38 e mais 29 14,6 32 16,2 137 69,2 70 22,4 35 11,2 207 66,3
Domicilio
Próprio 156 21,1 112 15,2 471 63,7 308 28,2 155 14,2 631 57,6
Alugado 13 39,4 3 9,1 17 51,5 25 37,3 10 14,9 32 47,8
De parentes 8 22,2 3 8,3 25 69,5 12 20,1 14 24,6 31 54,5
Outro 7 38,9 4 22,2 7 38,9 2 25,0 1 12,5 5 62,5
Construção do domicílio
Alvenaria (tijolo) 184 22,3 122 14,8 520 62,9 347 28,4 179 14,6 696 57,0
Outro 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 25,0 3 75,0
Abastecimento de água
Rede geral canalizada 180 22,3 116 14,4 510 63,3 344 28,4 177 14,7 683 56,9
Poço ou nascente 4 20,0 6 30,0 10 50,0 3 13,6 3 13,6 16 72,8
Sanitário no domicílio
Sim 183 22,4 122 14,9 513 62,7 347 28,4 180 14,7 695 56,9
Não 1 12,5 0 0,0 07 87,5 0 0,0 0 0,0 4 100,0
Esgoto
Rede geral canalizada 175 23,0 100 13,1 480 63,9 328 28,3 160 13,8 670 57,7
Fossa 9 13,8 22 33,8 34 52,4 19 27,9 20 29,4 29 42,6
Coleta de lixo
Serviço de limpeza 179 22,2 119 14,9 502 62,9 343 28,6 175 14,6 682 56,8
Outro 5 19,2 3 11,5 18 69,3 4 15,4 5 19,2 17 65,4
Energia elétrica
Sim 166 22,6 114 15,5 454 61,9 319 29,2 170 15,5 605 55,3
Não 18 19,1 9 9,6 67 71,3 28 21,2 10 7,6 94 71,2
Disponibilidade de recursos
Escolaridade
Analfabeto 53 22,1 32 13,3 155 64,6 92 27,1 51 15,0 196 57,9
1o grau 113 22,6 79 15,8 308 61,6 231 29,5 109 13,9 442 56,6
2o grau 13 20,6 10 15,9 40 63,5 18 26,9 13 19,4 36 53,7
Graduado 5 21,7 1 4,3 17 74,0 6 15,8 7 18,4 25 65,8
Renda mensal (R$)
≤ 622,00 115 23,5 75 15,3 300 61,2 243 27,7 137 15,6 497 56,4
622,00-820,00 21 28,0 14 18,7 40 53,3 31 30,1 14 13,6 58 56,3
> 820,00 49 18,1 37 13,7 185 68,2 73 29,7 29 11,8 144 58,9
Estado civil
Casado 119 19,4 95 15,6 401 65,0 130 27,7 66 14,1 273 58,2
Solteiro 14 22,2 12 19,0 34 58,8 42 30,0 31 22,1 67 47,9
Viúvo 34 36,6 12 12,9 47 50,5 148 28,5 67 12,9 304 58,6
Separado 17 28,8 4 6,8 38 64,4 25 26,3 16 16,8 54 57,0
Aposentado
Sim 148 21,2 104 14,6 456 64,2 222 27,1 126 15,4 471 57,5
Não 36 28,3 22 17,3 69 54,4 125 30,7 54 13,3 228 56,0
Grupo da terceira idade
Sim 6 14,6 6 14,6 29 70,8 38 32,8 20 17,2 58 50,0
Não 179 22,7 116 14,8 496 62,5 309 27,6 160 14,4 641 57,7
Comportamentos de saúde
Fuma
Sim 40 28,0 25 17,5 78 54,5 30 36,6 8 9,8 44 53,6
Não 144 21,1 97 14,8 442 64,1 317 27,7 172 15,0 655 57,3
Ingere bebidas alcoólicas
Sim 61 23,7 36 14,0 160 62,3 37 29,1 21 16,5 68 54,4
Não 123 21,6 86 15,1 360 63,3 310 28,2 159 14,5 631 57,3
Problema para dormir
Sim 67 26,0 42 16,3 149 57,7 179 34,3 82 15,7 261 50,0
Não 117 20,6 80 14,1 371 65,3 168 23,9 98 13,9 438 62,2
Prática de atividade física
Sim 42 19,4 33 15,3 141 65,3 97 29,5 45 13,7 187 56,8
Não 142 23,3 89 14,6 379 62,1 250 27,9 135 15,1 512 57,0
Perda de apetite
Sim 56 31,3 28 15,6 95 53,1 142 36,4 61 15,6 187 48,0
Não 128 19,8 94 14,5 425 65,7 205 24,5 119 14,2 512 61,3
Problema para mastigar ou
deglutir
Sim 28 37,8 18 24,3 28 37,9 94 50,8 21 11,4 70 37,8
Não 156 20,7 104 13,8 492 65,5 253 24,3 159 15,3 629 60,4
Refeições por dia
1 7 24,1 3 10,3 19 65,6 26 48,1 6 11,1 22 40,8
2 56 28,0 22 11,0 122 61,0 61 29,3 25 12,0 122 58,7
3 57 19,9 43 15,0 187 65,1 102 24,0 60 14,1 263 61,9
4 ou mais 64 20,8 53 17,2 191 62,0 156 29,2 89 16,7 289 54,1
Copos de líquido por dia
1 9 26,5 4 11,8 21 61,7 18 34,6 3 5,8 31 59,6
2 18 23,7 13 17,1 45 59,2 33 27,5 18 15,0 69 57,5
3 26 19,0 19 13,9 92 67,1 53 23,8 36 16,1 135 60,1
4 ou mais 131 22,6 86 14,9 362 62,5 242 29,3 123 14,9 462 55,8
Autoavaliação do peso
Abaixo do peso 20 24,1 16 19,3 47 56,6 40 32,2 24 19,4 60 48,4
No peso normal 117 20,2 81 14,0 381 65,8 175 24,2 101 14,0 447 61,8
Acima do peso 47 28,8 25 15,3 91 55,9 132 34,9 55 14,6 191 50,5
Uso de serviços odontológ s
Visita frequente ao dentista
Sim 24 16,8 22 15,4 97 67,8 75 30,2 33 13,3 140 56,5
Não 160 23,4 100 14,6 423 62,0 272 27,8 147 15,0 559 57,2
Plano odontológico
Sim 13 16,9 17 21,1 47 62,0 33 22,8 19 13,3 93 63,9
Não 171 22,8 105 14,4 473 62,0 316 29,0 161 14,9 606 56,1
Serviços de saúde bucal
Público 84 29,3 54 18,8 149 51,9 139 34,1 71 17,4 198 48,5
Particular 79 21,0 45 12,1 248 66,9 151 26,9 76 13,5 335 59,6
Plano/Convênio 5 10,6 12 25,5 30 63,9 21 23,9 15 17,0 52 59,1
Outro 17 14,0 11 9,3 93 76,7 36 21,4 18 10,7 114 67,9
Consulta dentista 6 meses
Sim 42 22,8 27 14,7 115 62,5 99 30,9 44 13,8 177 55,3
Não 142 22,1 95 14,8 408 63,1 248 27,4 136 15,0 522 57,6
Motivo da consulta ao dentista
Dor 35 42,7 14 17,1 33 40,2 44 38,3 16 13,5 55 48,2
Prevenção 15 20,3 6 8,1 53 71,6 23 22,1 17 16,3 64 61,6
Tratamento 84 18,7 58 12,9 307 68,4 202 27,7 96 13,2 430 59,1
Não consultou 50 22,6 44 19,5 127 57,9 78 28,0 51 18,3 150 53,7
Condições de saúde bucal
Edentulismo
Sim 100 19,2 70 13,5 350 67,3 211 25,0 119 14,1 513 60,9
Não 83 27,2 52 17,0 170 55,9 136 35,6 61 16,0 185 48,4
Necessidade subjetiva de usar
prótese
Sim 124 44,4 43 15,4 112 40,2 246 48,1 77 15,1 188 36,8
Não 60 11,0 79 14,4 408 74,6 101 14,1 103 14,4 511 71,5
Uso e necessidade de prótese
superior
Não usa e não necessita 10 13,0 12 15,6 55 71,4 23 25,8 17 19,1 49 55,1
Não usa e necessita 87 38,2 33 14,5 108 47,3 92 38,3 37 15,4 111 46,3
Usa e não necessita 35 10,9 45 14,1 240 75,0 79 15,7 62 12,4 361 71,9
Usa e necessita 50 25,1 32 16,1 117 58,8 153 39,0 64 16,3 175 44,7
Uso e necessidade de prótese
inferior
Não usa e não necessita 14 12,6 20 18,0 77 69,4 38 25,9 26 17,7 83 56,4
Não usa e necessita 104 34,0 47 15,4 155 50,6 147 38,1 63 16,3 176 45,6
Usa e não necessita 21 8,5 33 13,4 192 78,1 50 13,0 45 11,7 291 75,3
Usa e necessita 44 27,2 22 13,6 96 59,2 112 36,6 46 15,0 148 48,4
Na análise por gênero, observou-se que a maioria dos idosos dos sexos masculino
(63%) e feminino (57%) estava satisfeita com a saúde bucal. Em relação à faixa
etária, os idosos mais velhos estavam mais satisfeitos para ambos os gêneros
(Tabela_1).
A prevalência de edentulismo nos gêneros masculino e feminino foi de 63% e
68,8%, respectivamente, sendo que houve diferença entre eles apenas na faixa
etária de 65-69 anos (RP = 1,13; p = 0,026). Evidenciou-se ainda um crescimento
dessa prevalência devido ao aumento da idade, sendo 85,5% entre as mulheres e
66,1% para os homens com 80 anos e mais de idade. De acordo com o modelo de
Poisson, não houve diferença de prevalência de edentulismo estatisticamente
significante entre as faixas etárias para o gênero masculino. No gênero
feminino, a prevalência de edentulismo nas faixas etárias 60-64 anos e 65-69 é
1,20 e 1,23 maior, respectivamente, quando em comparação com as idosas com 80
anos ou mais (Tabela_2).
Tabela 2 Análise do modelo de regressão de Poisson para a prevalência de
edentulismo em idosos segundo gênero e faixa etária. Sete Lagoas, Minas Gerais,
Brasil, 2012.
Variáveis Edentulismo RP IC95%
Sim Não Total InícioFinal Valor de p
n % n % n %
Masculino
Faixa etária (anos)
60-64 109 49,3 112 50,7 221 100,0 0,98 0,80 1,20 0,839
65-69 116 60,1 77 39,9 193 100,0 0,95 0,82 1,11 0,522
70-74 120 70,6 50 29,4 170 100,0 0,99 0,85 1,17 0,929
75-79 93 79,5 24 20,5 117 100,0 0,87 0,74 1,02 0,090
80 e mais 82 66,1 42 33,9 124 100,0 1,00
Feminino
Faixa etária (anos)
60-64 173 56,0 136 44,0 309 100,0 1,19 1,07 1,33 0,009
65-69 185 64,0 104 36,0 289 100,0 1,19 1,04 1,35 0,003
70-74 175 72,0 68 28,0 243 100,0 1,23 1,07 1,41 0,917
75-79 145 75,9 46 24,1 191 100,0 1,01 0,88 1,15 0,138
80 e mais 165 85,5 28 14,5 193 100,0 1,00
Total
Faixa etária (anos)
60-64 282 53,2 248 46,8 530 100,0 1,10 * 0,97 1,26 0,133
65-69 301 62,4 181 37,6 482 100,0 1,13 * 1,01 1,26 0,026
70-74 295 71,4 118 28,6 413 100,0 1,00 * 0,90 1,11 0,976
75-79 238 77,3 70 22,7 308 100,0 1,04 * 0,93 1,17 0,517
80 e mais 247 77,9 70 22,1 317 100,0 1,00
Na análise univariada, a satisfação com a saúde bucal estabeleceu uma relação
direta estatisticamente significante com a faixa etária dos idosos em ambos os
gêneros, sendo que quanto mais velho o idoso mais satisfeito ele estava com a
saúde bucal. Para o gênero masculino, a maioria das variáveis referentes ao
ambiente externo, disponibilidade de recursos e uso serviços odontológicos não
esteve associada à satisfação com a saúde bucal. Na análise por nível,
verifica-se que para ambos os gêneros todas as variáveis referentes às
condições de saúde bucal foram significantemente associadas ao desfecho
(resultados não apresentados).
As Tabelas 3 e 4 revelaram que o modelo, para ambos os gêneros, foi formado por
variáveis referentes a características individuais, ambiente externo,
comportamentos de saúde e condições de saúde bucal. Para o gênero feminino, a
variável sobre plano odontológico também permaneceu associada ao desfecho. A
chance de o idoso edêntulo estar satisfeito com a saúde bucal é de 60% (p =
0,003) para homens e 55% (p < 0,001) para mulheres quando comparados com os
idosos dentados. A autoavaliação de necessidade de prótese permaneceu
inversamente associada ao desfecho para homens (OR = 5,08; p = 0,001) e
mulheres (OR = 4,66; p < 0,001). Os idosos do gênero masculino que não usam e
necessitam de algum tipo de prótese tiveram 2,54 mais chances de estar menos
satisfeitos com a saúde bucal quando comparados àqueles que usam e necessitam
trocar as próteses (p < 0,001).
Os limiares que separam a categoria “insatisfeito” da “nem satisfeito nem
insatisfeito” foram 2,4 e 2,2 vezes maiores em relação à categoria “satisfeito”
para os gêneros masculino e feminino, respectivamente (Tabelas 3 e 4).
Após o ajuste pela variável depressão, a faixa etária e a presença de sanitário
no domicílio foram excluídas no modelo final para o gênero masculino (Tabela
3). Em relação ao gênero feminino, cor da pele autorrelatada, autoavaliação do
peso e número de refeições por dia não se mantiveram associadas ao desfecho no
modelo ajustado (Tabela_4).
Tabela 3 Modelo de regressão ordinal final para a satisfação com a saúde bucal
para o gênero masculino segundo características individuais, ambiente externo,
disponibilidade de recursos, comportamentos de saúde, uso de serviços
odontológicos e condições de saúde bucal. Sete Lagoas, Minas Gerais, Brasil,
2012.
Variáveis Modelo bruto Modelo ajustado *
OR IC95% Valor de OR IC95% Valor de
p p
Limiares do modelo ordinal
Insatisfeito 9,80 1,09- < 0,001 7,31 1,89- 0,004
10,76 28,23
Nem insatisfeito nem satisfeit3,89 1,44- 0,003 3,05 0,79- 0,010
4,51 11,72
Características individuais
Faixa etária (anos)
60-64 1,87 1,13- 0,016 1,43 0,88-2,33 0,150
3,12
65-69 1,64 0,98- 0,061 1,30 0,79-2,14 0,302
2,76
70-74 1,33 0,78- 0,301 1,03 0,61-1,73 0,912
2,28
75-79 1,08 0,59- 0,808 1,24 0,69-2,22 0,471
1,97
80 e mais 1,00 . 1,00
Ambiente externo
Localização do domicílio
Urbana 4,99 1,22- 0,025 4,24 1,10- 0,036
20,41 16,31
Rural 2,76 0,76- 0,122 2,48 0,72-8,51 0,150
9,99
Distrito 1,00 1,00
Sanitário no domicílio
Sim 7,68 0,86- 0,067
68,13
Não 1,00
Esgoto
Rede geral canalizada 0,19 0,08- 0,001 0,28 0,12-0,68 0,005
0,51
Fossa 1,00 . 1,00
Comportamentos de saúde
Perda de apetite
Sim 1,94 1,33- 0,001 1,92 1,33-2,79 0,001
2,84
Não 1,00 . 1,00
Problema para mastigar ou
deglutir
Sim 2,13 1,28- 0,004 2,11 1,27-3,50 0,004
3,57
Não 1,00 . 1,00
Condições de saúde bucal
Edentulismo
Sim 0,60 0,42- 0,003 0,57 0,42-0,79 0,001
0,84
Não 1,00 1,00
Necessidade subjetiva de usar
prótese
Sim 5,08 3,58- < 0,001 5,36 3,93-7,32 < 0,001
7,21
Não 1,00
Uso e necessidade de prótese
superior
Não usa e não necessita 0,81 0,41- 0,542 0,78 0,41-1,48 0,444
1,60
Não usa e necessita 2,54 1,67- < 0,001 1,94 1,27-2,96 0,002
3,87
Usa e não necessita 0,93 0,60- 0,754 0,77 0,47-1,26 0,305
1,44
Usa e necessita 1,00 1,00
Tabela 4 Modelo de regressão ordinal final para a satisfação com a saúde bucal
para o gênero feminino segundo características individuais, ambiente externo,
disponibilidade de recursos, comportamentos de saúde, uso de serviços
odontológicos e condições de saúde bucal. Sete Lagoas, Minas Gerais, Brasil,
2012.
Variáveis Modelo bruto Modelo ajustado *
OR IC95% Valor de OR IC95% Valor de
p p
Limiares do modelo ordinal
Insatisfeito 3,81 1,19- 0,024 3,57 1,07- 0,039
12,16 11,95
Nem insatisfeito nem 1,70 0,54-5,42 0,367 1,61 0,48-5,37 0,438
satisfeito
Características individuais
Cor da pele auto relatada
Branca 1,67 0,61-4,54 0,318 1,28 0,64-2,56 0,493
Preta 2,06 0,74-5,78 0,168 1,69 0,83-3,46 0,151
Amarela 1,70 0,63-4,60 0,296 1,38 0,70-2,76 0,354
Parda 5,19 1,32- 0,018 1,91 0,69-5,31 0,216
20,32
Indígena 1,00 1,00
Ambiente externo
Tempo de moradia (anos)
≤ 10 1,34 0,95-1,90 0,097 1,39 1,07-1,82 0,015
11-24 1,79 1,27-2,52 0,001 1,49 1,14-1,95 0,003
25-37 1,66 1,19-2,34 0,003 1,54 1,18-2,02 0,002
38 e mais 1,00 1,00
Esgoto
Rede geral canalizada 0,53 0,32-0,88 0,014 0,58 0,40-0,83 0,004
Fossa 1,00 1,00
Comportamentos de saúde
Problema para mastigar ou
deglutir
Sim 2,02 1,46-2,82 < 0,001 2,20 1,68-2,89 < 0,001
Não 1,00 1,00
Refeições por dia
1 1,80 0,99-3,27 0,056 0,72 0,44-1,15 0,171
2 0,91 0,65-1,28 0,602 1,07 0,83-1,38 0,612
3 0,74 0,57-0,98 0,034 1,23 0,99-1,52 0,062
4 ou mais 1,00 1,00
Autoavaliação do peso
Abaixo do peso 1,17 0,76-1,81 0,479
No peso normal 0,77 0,59-1,00 0,051
Acima do peso 1,00
Uso de serviços odontológicos
Plano odontológico
Sim 0,55 0,38-0,81 0,003 1,40 1,03-1,91 0,031
Não 1,00 1,00
Condições de saúde bucal
Edentulismo
Sim 0,48 0,37-0,62 < 0,001 0,54 0,44-0,66 < 0,001
Não 1,00 1,00
Necessidade subjetiva de usar
prótese
Sim 4,66 3,64-5,98 < 0,001 4,79 3,95-5,80 < 0,001
Não 1,00 1,00
Discussão
Devido à sua importância para avaliar os aspectos subjetivos de saúde bucal, a
autoavaliação deste quesito é uma medida importante em estudos de base
populacional 28. No Brasil, a satisfação ganhou destaque no projeto SBBrasil
2010, sendo este o principal motivo para usarmos esta variável no presente
estudo 1.
Os resultados mais importantes deste trabalho referem à análise da associação
estatisticamente significante entre gênero e satisfação com a saúde bucal (p =
0,007), sendo que as mulheres estavam menos satisfeitas quando comparadas aos
homens. Esses resultados corroboram os dados da Pesquisa Mundial de Saúde 16.
Bulgarelli & Manço 29 relataram maior satisfação com a saúde bucal entre os
idosos mais velhos, mas sem associação significante com o gênero.
Por outro lado, a maioria dos idosos de ambos os gêneros estava satisfeita com
a própria saúde bucal, ainda que as condições clínicas observadas tenham
mostrado precariedade, com alta prevalência de perda dentária e necessidade de
tratamento odontológico restaurador e/ou reabilitador. Identificou-se um estudo
que avaliou a satisfação com saúde bucal na população idosa brasileira,
mostrando que 61,5% dos idosos estavam satisfeitos e/ou muito satisfeitos em
relação à própria saúde bucal 29.
Outros estudos têm mostrado boa autopercepção 3,5,6 e autoavaliação positiva da
saúde bucal em idosos 9,10 associadas a condições de saúde bucal precárias.
Esses resultados indicam que o idoso percebe sua saúde bucal de maneira
peculiar, refletindo atitude de resignação culturalmente difundida 12,
especialmente quando comparados aos adultos 11.
Na análise univariada, os idosos com menos de 70 anos estavam menos satisfeitos
com a saúde bucal quando comparados aos octogenários. Entretanto, essa
associação apenas foi mantida para os idosos com 60-64 anos do gênero masculino
no modelo não ajustado. Os resultados em relação à idade são controversos.
Alguns trabalhos relataram que os idosos têm uma avaliação melhor do que os
mais jovens 11, outros observaram uma relação inversa 25 e alguns não
encontraram nenhuma associação significativa 10,12. Para Bulgarelli & Manço
29, os mais idosos aceitam mais facilmente os problemas da cavidade bucal como
inevitáveis e, neste contexto antagônico, relatam maior satisfação com a saúde
bucal.
Neste estudo as mulheres pardas tiveram uma menor satisfação com a saúde bucal
na análise por nível, mas não no modelo final ajustado. De acordo com Martins
et al. 10, a autoavaliação da saúde bucal é mais positiva entre os indivíduos
brancos, resultados que devem ser levados em consideração no planejamento das
ações em saúde.
Em relação às condições de moradia, os idosos do gênero masculino residentes na
área urbana estavam menos satisfeitos quando comparados àqueles que vivem no
distrito. Uma possível explicação para esses achados é que o meio social
interfere de forma diferenciada na maneira pela qual os indivíduos pensam,
sentem e agem a respeito de sua saúde 12. Martins et al. 23 encontraram
associação negativa entre residir no meio rural e autopercepção boa de saúde
bucal de idosos.
A falta de saneamento básico estava ligada a piores condições de saúde geral,
porém este é um dos poucos estudos que investigou a relação entre condições e
moradia e satisfação com saúde bucal.
O acesso à rede de esgoto se manteve associada à satisfação com saúde bucal de
maneira inversa para ambos os gêneros. Os idosos que não tinham rede canalizada
de esgoto têm 72% e 42% mais chances de relatarem menor satisfação com a saúde
bucal para os gêneros masculino e feminino, respectivamente. Uma possível
explicação para esses achados pode estar relacionada às diferenças
estatisticamente significantes entre localização do domicílio (urbana, rural,
distrito) e as condições de moradia (resultados não apresentados). O sanitário
da maioria dos domicílios na área rural do município estava ligado à fossa
(60,9%), em 50% estava localizado fora do domicílio e a fonte de água vem de
poço ou nascente. Levando-se em conta que outras variáveis sobre saneamento
coletadas no presente estudo (abastecimento de água, presença de sanitário e
energia elétrica no domicílio, coleta de lixo) não foram associadas ao
desfecho, não é possível garantir uma relação precisa entre rede de esgoto e
satisfação com a saúde bucal desses idosos.
No presente estudo, somente no modelo final ajustado para o gênero feminino o
tempo de moradia se manteve associado ao desfecho. Um trabalho realizado em
Campinas mostrou que o idoso que mora sozinho avalia sua saúde geral mais
positivamente em relação aos que moram acompanhados 30.
O perfil socioeconômico da grande maioria dos idosos brasileiros, em especial
na zona rural, é marcado por condições de moradia e saneamento sanitário
precárias, baixo nível de renda e de escolaridade, e atividade remunerada em
idades avançadas 31,32. Além disso, sabe-se que um maior nível de escolaridade
e renda favorece maior busca por informações de saúde e uma autoavaliação mais
positiva da saúde 16,28. Nesse contexto, esperava-se que as variáveis de
disponibilidade de recursos estivessem associadas ao desfecho no modelo final.
Apenas na análise univariada houve associação significantemente inversa entre
renda e satisfação com a saúde bucal para os homens.
Os aspectos mais importantes que compõem o conceito de percepção da saúde
perpassam a compreensão dos comportamentos de saúde e qualidade de vida
relacionada à saúde 12. Apesar disso, as variáveis que dizem respeito aos
comportamentos de saúde como tabagismo, alcoolismo, atividade física e sono,
não contribuíram para explicar a variabilidade do grau de satisfação bucal
entre os idosos do presente estudo. Na análise por nível, observou-se que os
homens fumantes tinham 1,6 mais chance (p = 0,014) de estarem menos satisfeitos
com a própria saúde bucal.
Os idosos que relataram problemas para mastigar os alimentos tiveram 2,11 e
2,02 mais chances de estar menos satisfeitos com a saúde bucal para os gêneros
masculino e feminino, respectivamente. No modelo ajustado masculino, a perda de
apetite nos últimos seis meses também se manteve associada à menor satisfação
com a saúde bucal. Para o gênero feminino, o maior número de refeições foi
fator preditor de maior satisfação com a saúde. Entretanto, quando a variável
depressão foi inserida no modelo, essa associação não foi estatisticamente
significante.
Segundo Lima et al. 33, os idosos se adaptam durante o processo de mastigação a
fim de manter sua dieta o mais próximo possível da realizada quando jovem. Por
outro lado, a perda dentária e o uso de próteses influenciam diretamente a
capacidade mastigatória, a percepção do sabor e a textura dos alimentos,
podendo resultar em menor ingestão de nutrientes, prejudicando o estado
nutricional do idoso 34.
Para o presente estudo as questões relacionadas à alimentação e à mastigação
foram importantes na avaliação da satisfação com a saúde bucal. Em um trabalho
realizado na Índia, cerca de 30% dos idosos acharam que não houve mudanças na
dieta por causa da perda dentária 35.
Outro achado interessante deste estudo refere-se à autoavaliação do peso
corporal entre os idosos. Para ambos os gêneros, os idosos com peso normal
avaliaram mais positivamente a sua saúde bucal em relação aos obesos.
Entretanto, essa associação não foi suficientemente forte para ser mantida no
modelo ajustado. A obesidade é um problema nutricional complexo que pode causar
graves prejuízos à qualidade de vida 3 e merece uma atenção melhor por parte do
profissional de saúde e da equipe interdisciplinar para se obter ações
coletivas eficientes.
O uso dos serviços odontológicos é um importante preditor para uma
autoavaliação positiva da saúde bucal 16,29. Neste estudo, as variáveis sobre
acesso e uso dos serviços odontológicos não estiveram associadas ao desfecho,
com exceção do plano odontológico para o gênero feminino.
No último nível da análise aparecem as condições de saúde bucal, tanto as
medidas objetivas (edentulismo, avaliação clínica do uso e necessidade de
prótese) e a autoavaliação da necessidade de prótese. No estudo de Atchison et
al. 28, quanto maior o número de dentes permanentes presentes mais
positivamente o idoso avalia a sua saúde bucal. Na presente pesquisa verificou-
se que a satisfação com a saúde bucal esteve significativa e negativamente
associada com o edentulismo, em todos os modelos da análise. No modelo
ajustado, os idosos edêntulos dos gêneros masculino e feminino tinham 57% e
56%, respectivamente, mais chances de estarem satisfeitos quando comparados aos
não edêntulos. Enquanto 47,7% dos idosos insatisfeitos não usavam nenhuma
prótese e tinham necessidade, 39,7% dos satisfeitos usavam prótese e não
necessitavam de substituição.
Em três estudos brasileiros 6,10,29 os idosos desdentados avaliaram
positivamente a saúde bucal, possivelmente por se verem livres de um ciclo de
péssimas condições bucais (dentes cariados, dor de dente). Alguns trabalhos
tentaram entender essa inversão de gradiente de associação de diversas
maneiras, sendo que a maioria dos autores relata que essa associação é fraca
9,10,12,15. Outra possível explicação seria assumir que diferentes contextos
podem influenciar a direção de associação entre percepção da saúde bucal e
condições objetivas de saúde. Entretanto, falta maior poder de comparabilidade
entre os estudos nacionais em relação ao grupo de pesquisadores que trabalha
esse tema há muitos anos.
A avaliação da necessidade de prótese é um assunto controverso, pois os
julgamentos do profissional e do idoso são, muitas vezes, completamente
divergentes. Os idosos que necessitavam usar/trocar prótese estavam menos
satisfeitos com a própria saúde bucal. Apesar disso, a maioria dos idosos desta
investigação que não usava nenhum tipo de prótese e necessitava não percebeu a
necessidade de usá-la. Ariga et al. 35 mostraram que dos 70,3% dos idosos que
tinham necessidade de usar prótese apenas 14,4% perceberam a necessidade de
substituir dentes perdidos. Percebe-se que os idosos têm percepções diferentes
relacionadas à condição de saúde bucal e à necessidade de tratamento
odontológico 4.
Por último, destaca-se que a avaliação clínica do uso e necessidade de prótese
em idosos é diferente entre as arcadas superior e inferior, especialmente em
relação ao uso de prótese total 36. Neste estudo, somente um pequeno porcentual
dos idosos não necessitava nem usava qualquer tipo de prótese inferior (12,6%)
ou superior (8,1%).
Considerando-se o impacto da saúde bucal na saúde geral e no bem-estar do
idoso, outro objetivo da presente investigação foi avaliar a prevalência de
edentulismo em relação ao gênero e faixa etária. A perda dentária não pode ser
mais considerada uma consequência normal do envelhecimento. Trata-se de um
processo cumulativo de exposição à cárie, doença periodontal, periapical ou
trauma, que acarreta problemas na mastigação, satisfação com a aparência dos
dentes, autopercepção de saúde ruim e necessidade de reabilitação protética
5,15.
A prevalência de edentulismo deste estudo foi elevada (66,4%), sendo maior
ainda entre as mulheres (p = 0,004), resultado semelhante a outras
investigações 14,23. De acordo com a literatura, com o aumento da idade tem-se
a redução do número de dentes, aumento do índice CPO e do percentual de dentes
perdidos por cárie 37. Neste estudo, a razão de prevalência de edentulismo foi
estatisticamente maior apenas para as idosas mais jovens, revelando muito mais
uma particularidade do gênero feminino do que diferenças reais entre as cinco
faixas etárias do envelhecimento. Esses resultados refletem a situação nacional
5, mas devem ser interpretados com cautela, uma vez que a maioria dos idosos
deste e de diversos estudos é de mulheres. O tamanho, as estratificações e
correções da amostra minimizam esses efeitos, possibilitando as comparações
realizadas neste trabalho.
Em relação à utilização do modelo multidimensional por meio da regressão
logística ordinal pode-se afirmar que foi possível identificar os fatores
determinantes para satisfação com a saúde bucal, seguindo os níveis
hierárquicos teóricos de determinação de maneira independente.
Para a variável dependente que apresenta três categorias de respostas, o modelo
apresenta dois limiares (thresholds). É interessante observar que o ponto de
corte entre a categoria do meio (nem insatisfeito nem satisfeito) e a superior
(satisfeito) para o modelo feminino não foi significante (p = 0,367), mesmo
após o ajuste do modelo (p = 0,438). Possivelmente isso indica que as idosas
desses dois grupos podem ter percepções semelhantes de respostas em relação às
variáveis independentes do modelo, mas não há uma base teórica concreta para
garantir esta interpretação.
A taxa de resposta do presente trabalho pode ser considerada alta (98,8%),
sendo este um dos poucos estudos domiciliares com idosos que obteve amostra
probabilística suficiente para realizar aferições e comparações por gênero. De
modo geral, o perfil epidemiológico da saúde bucal de idosos no Brasil tem sido
avaliado por meio de pesquisas com amostras não probabilísticas, tais como
usuários de centros de saúde e centros de convivência 2, idosos
institucionalizados 17 e usando resultados referentes aos inquéritos
epidemiológicos do Ministério da Saúde 11. Entretanto, faz-se necessário
especificar que os resultados encontrados são válidos e representativos para a
população do município que vive em comunidade, sem déficits cognitivos e/ou
físicos importantes.
Finalmente, é importante discutir algumas limitações do trabalho. Este estudo,
em que a maioria dos idosos era composta por edêntulos, pode ter tido
influência nos resultados encontrados quando comparado à satisfação com a saúde
bucal em outra faixa etária. Esses resultados fazem parte da linha base do
projeto sobre envelhecimento ativo. Por isso, ainda não é possível determinar
se existe uma relação temporal entre a satisfação com a saúde bucal e as demais
variáveis analisadas. Além disso, a incorporação de outras variáveis e o
geoprocessamento dos dados poderão ajudar a ampliar a discussão levantada neste
trabalho.
Destaca-se ainda que a medida da satisfação com a saúde bucal é influenciada
diretamente pela memória do entrevistado, pelas suas características físicas e
psicológicas, e também pelos aspectos contextuais e culturais de cada grupo
populacional. Portanto, quantificar o que é subjetivo é sempre limitado, pois
envolve valores e sentimentos que podem mudar ao longo da vida e até mesmo em
um curto espaço de tempo 10.
Em suma, o processo que relaciona a autopercepção às variáveis objetivas e
subjetivas de saúde é dinâmico. Sendo assim, as ações integradas de promoção da
saúde e do bem-estar que abordam, simultaneamente, os principais fatores
determinantes da autopercepção da saúde poderão contribuir significativamente
para a qualidade de vida dos idosos 8,23.
Conclusão
Conclui-se que a satisfação com a saúde bucal dos idosos deste estudo é
diferente entre os gêneros e influenciada fortemente pelas condições de saúde
bucal e comportamentos de saúde.
Para o gênero feminino, a prevalência de edentulismo foi maior nas faixas
etárias inferiores a 70 anos. Entre os homens, não observou- se diferenças
significantes entre as prevalências por faixa etária. Quando comparou-se homens
e mulheres, verificamos uma razão de prevalência maior na faixa etária entre 65
e 69 anos.
As discussões de gênero no envelhecimento apresentadas neste estudo precisam
ser aprofundadas em relação às condições e percepção da saúde bucal, pois
existem particularidades de cada grupo que podem passar despercebidas nas
análises rotineiras.
Agradecimentos
A. C. V. Campos recebeu auxílio para a realização da pesquisa mediante bolsa
concedida pelo CNPq, na modalidade doutorado no país (no141307/2011-0) e o
projeto foi financiado pelo CNPq (no14/2011, protocolo 1829669704655455).