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BrBRHUHu0002-05912014000200171

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National varietyBr
Year2014
SourceScielo

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Serra dos Pretos: Trajetórias de famílias egressas do cativeiro no pós-abolição (Sul de Minas, 1888-1950) Estudar o que se efetivou após o término da escravidão não é empreendimento fácil. Como observou Hebe Mattos e outros historiadores preocupados com o período, o que se desenvolveu, em diferentes partes da América, "além" da escravidão envolve uma série de complexas questões, difíceis de serem abordadas e, no caso do Brasil, ainda permanece como "território" pouco frequentado pelos historiadores.1 Analisar as experiências de liberdade de famílias egressas do cativeiro, no decorrer do século XX, com as contradições que elas encerram, as estratégias desenvolvidas para enfrentar os obstáculos que se apresentaram é o nosso objetivo neste texto. Focamos nosso estudo na comunidade da Serra dos Pretos, localizada no Município de Camanducaia, extremo sul de Minas, na primeira metade do século XX. Para a realização da investigação, valemo-nos de um corpo documental variado, cujo exame minucioso nos permitiu localizar um conjunto de dados, fragmentos de vidas e, assim, mapear percursos, trajetórias e examinar questões importantes referentes aos itinerários dos libertos e de seus descendentes no período do pós-abolição.

Comunidade da Serra dos Pretos Em 1877, Francisco Felipe da Maia, doente e pressentindo a morte, solicitou ao tabelião João Carneiro de Morais Ribas, na cidade de Jaguary (atual Camanducaia) que viesse até a sua casa, na fazenda dos Areias, para redigir seu testamento.2 Na presença do senhor Ribas, que compareceu em 16 de novembro do mesmo ano com mais cinco testemunhas, o fazendeiro pontuou quais eram suas últimas vontades, principalmente no que tocava à administração do patrimônio que possuía.

Os cativos, em número de 16, não foram esquecidos nas considerações testamentárias. Pelo contrário, o senhor fez apontamentos que seriam decisivos para suas vidas nos anos vindouros, a saber: Eu Francisco Felipe da Maia achando-me gravemente enfermo, porém em meu juízo perfeito faço este meu solene testamento de última vontade na forma seguinte [...]. Declaro que meus escravos [...] ficarão libertos por morte de minha mulher Dona Elisa Augusta da Maia [...].

Declaro mais, que deixo aos meus escravos uma parte de terras nesta fazenda [...] sem poderem vender, arrendar ou alhear por qualquer forma depois da morte de minha mulher e quando entrarem em gozo de sua liberdade. 3 Depois de muitos anos de labutas naquelas terras, a liberdade estava próxima e viria acompanhada de um legado em terras expressivo (então avaliados em cinco contos de reis).

Francisco Felipe da Maia veio a falecer oito anos depois da feitura de seu testamento, em 1885. No inventário,4 feito no mesmo ano, sua esposa, Dona Eliza Augusta da Maia, abrevia o tempo que os cativos deveriam cumprir de serviços na propriedade para quatro anos. Contudo, ela frisa que iria desistir do usufruto "daqueles que pelo bom comportamento forem digno disso".5 Talvez tenha agido assim pela pressão dos próprios cativos, que, por esse tempo, deviam saber das concessões a eles destinadas no testamento do falecido senhor e pela conjuntura, marcada por tensões, que apontava para o fim próximo da instituição.

Após o inventário, a maior parte dos escravos que integravam a posse de Francisco Felipe ainda continuou vivendo em cativeiro, e a liberdade veio de fato em 1888, com a Lei Áurea, embora, nessa época, grande parte deles tinha parentes que viviam em liberdade alguns anos.

No pós-abolição, os ex-escravos da família Maia puderam permanecer juntos vivendo nas terras que lhes foram doadas, que foi chamada de Serra dos Pretos.

Desse modo, os laços parentais e comunitários construídos durante muitos anos de cativeiro puderam ser reforçados após o fim da escravidão.

De acordo com diversas pesquisas, o estabelecimento dessas comunidades não foi um fenômeno raro no século XIX.6 Especialmente nos anos finais da escravidão, foi considerável o número de libertos que, após obterem legados em terras ou mesmo adquirirem-nas por meio da compra, moveram grandes esforços para se organizarem a partir de um projeto de vida alicerçado em visões próprias que possuíam da liberdade. De forma geral, de acordo com recentes estudos, essas comunidades possuíam elementos comuns, que podem ser definidos como pilares básicos que marcaram a organização da vida cotidiana: o controle sobre o ritmo e o tempo de trabalho, a organização da produção econômica em base familiar, o acesso comum à terra e, primordialmente, o parentesco como eixo estruturador da vida comunitária.7 Em grande parte dos casos, como têm apontado alguns estudos, as doações feitas aos escravos partia de senhores que não tinham herdeiros diretos, e, em menor quantidade, daqueles cujo patrimônio estava obrigado à divisão entre os descendentes.8 Maria Helena Machado observa ainda que essas doações ou mesmo a ocupação de terras pelos libertos ocorreram, na maioria dos casos, em regiões em que a produção escravista não era mais viável pelo pouco dinamismo econômico, ou, geralmente, as terras tinham pouco valor comercial.9 No que se refere à família Maia, embora não faltassem herdeiros que pudessem receber as terras doadas aos escravos, o fato de Francisco Felipe não ter filhos contribuiu, certamente, para que a doação fosse efetivada. Em relação ao quadro econômico da localidade de Jaguary, em que se inseria a propriedade da família Maia, os dados censitários apontam, em termos gerais, que não havia na localidade condições para se manter uma dinâmica econômica de caráter escravista comercial. em 1872, é visível a inexpressividade dos escravos no conjunto populacional, sinalizando para a perda de funcionalidade do sistema escravista. Porém, quando nos atemos especificamente aos empreendimentos econômicos da família Maia, esse argumento parece pouco aplicável, que, no período abordado (final do século XIX, como em todo o século), os bens da família eram expressivos, mantendo-se uma intensa inserção no mercado, o que se percebe pelos rebanhos numerosos indicados no inventário de Francisco Felipe da Maia.10 Desse modo, a melhor forma de entender a doação é no contexto de uma política de domínio senhorial, que consistia em um sistema de incentivos que visava a obter o bom comportamento dos escravos e a produção de dependentes.11 Perseguir as trajetórias de vida dos ex-escravos da família Maia no pós- abolição esbarrou em vários problemas, o primeiro deles o de encontrar aquelas pessoas em meio a centenas de nomes nos registros paroquias e civis, todos semelhantes. No caso das mulheres, as dificuldades foram ainda maiores, pois era comum elas receberem como sobrenomes nomes de figuras religiosas, como Maria de Jesus, Maria das Dores, Maria da Conceição e outros. A impressão é de estarmos nos afogando em nomes, para usar a expressão de João Fragoso.12 Não é sem motivos que pesquisadores têm observado ser menos trabalhoso mapear trajetórias familiares de escravos do que de livres pobres, que não tinham um sobrenome de destaque a zelar, que os registros de escravos sempre vinham acompanhados do nome dos proprietários, o que facilitava localizá-los nos corpos documentais. A essa questão se soma a não anotação sistemática da cor, que aparece num pequeno número de registros civis e não é mencionada em nenhum assento batismal ou em outro documento eclesiástico do período.

O quadro é perturbador para o pesquisador que procura mapear e entender trajetórias de pessoas egressas do cativeiro no pós-abolição. Um fator que contribuiu decisivamente para que pudéssemos avançar na pesquisa foi o fato de os libertos assumirem o sobrenome da antiga família senhorial, o que começou, para alguns deles, mesmo antes do fim da escravidão, como verificado no batizado de Maria, em 1886: seus pais são referidos como Benedito da Maia e Olímpia da Maia, ambos escravos de Dona Eliza Augusta da Maia,13 esposa de Francisco Felipe da Maia.

Chama a atenção o fato de que a maioria dos ex-escravos da família Maia, no pós-abolição, formalizaram suas relações conjugais. No período em que ainda viviam em cativeiro, havia um baixo índice de nupcialidade na posse, sendo somente uma escrava mencionada como casada, no conjunto de 16 escravos adultos, em 1885. Cruzando informações presentes no inventário (de 1885) e nos registros civis do período do pós-abolição, elaboramos o Quadro_1, onde apresentamos todos os libertos (arrolados como escravos em 1885) e seus consortes.

Quadro 1Relações conjugais: ex-escravos da família Maia e seus cônjuges  Maria Thereza de Jesus Gonçalo Alves da Maiaa Ignês Maria da Conceiç?oberto Alves da Maia Thereza Maria de Jesus Faustino Alves da Maia Rita Maria de Jesus Candido Alves da Maia Maria Maia Ricardo Alves da Maia Bertina Maria de Jesus Matias Maia Raimundo Dias Francisca de Paula Gerônimo Tibúrcio Theodora da Maia Catarina da Maia Júlio Francisco da Maia Olímpia da Maia Benedito da Maia Silvéria da Maia Adão Lopes da Silva Andressa Maiab Antônio Rosa da Maiab Paulinac Luciana da Maia Delfinac Lodovirac Fontes: Inventário post mortem de Francisco Felipe da Maia, 26/02/1885. FMC, caixa 842, 95. Registro civil de Nascimentos. Cartório de Registro Civil de Camanducaia (Doravante CRCC), livro 1 (1889-1891), 3 (1894-1899), 4(1891-1903), 5 (1903 -1906) e 12 (1918-1919). Registro civil de Óbitos. Cartório de Registro Civil de Camanducaia (Doravante CRCC), livro 1 (1889-1897), 2 (1897-1902) e 3 (1903-1911).

Notas: aOs nomes marcados em negrito se referem aos ex-escravos da família Maia; bViúvo(a); cNão encontrado registro no pós-abolição.

É patente a busca dos libertos por formalizar suas uniões, por garantir, diante da nova ordem, a regularidade de suas relações familiares. Segundo Eric Foner, durante a guerra civil nos Estados Unidos, pessoas que "acreditavam que a escravidão tinha destruído o senso de obrigação familiar se [surpreendiam] com a ânsia com que os ex-escravos legalizavam seus vínculos conjugais".14 Sônia Maria de Souza15 observou que, logo após a abolição, casamentos em série eram constantemente noticiados nos periódicos em Juiz de Fora. Ainda que, geralmente, em tom de ironia, ridicularizando o modo como eram realizadas as uniões, esses registros denotam claramente a busca dos libertos em amparar legalmente suas relações conjugais.

Em relação aos ex-escravos da família Maia, chama atenção o número considerável de casais em que somente um dos consortes tinha sido escravo desta família senhorial. Pode-se destacar ainda, que três dos libertos, identificados pela primeira vez como casados no pós-abolição, tinham cinquenta anos ou mais. Os dados sugerem que algumas destas uniões eram estabelecidas mais tempo no plano consensual, ou seja, sem a formalização perante a Igreja, e foram legalizadas após a emancipação. O fato de os cônjuges não serem, em sua maioria, ex-escravos do mesmo proprietário é um forte indício das dificuldades que eles tiveram, ainda no tempo da escravidão, de estabelecer vínculos conjugais com os companheiros de senzala, o que teria contribuído para que as uniões não tivessem sido legalizadas anteriormente.

Francisca, por exemplo, filha de Maria, neta de Lucas e Mariana, teve três filhos em cativeiro, todos referidos como filhos naturais, de pai incógnito. No pós-abolição, encontramos três registros de óbitos e um de batismo de filhos seus, em que se informa que o pai era Raimundo Dias. Tudo indica, que as proles nascidas ainda no tempo do cativeiro, também eram filhos de Raimundo, mas, como não tinham a união sacramentada, nos escapou o registro. Ainda que não tenhamos como comprovar, é possível que isso tenha ocorrido.

No Quadro_2, reunimos todos os arranjos familiares dos quais conseguimos registros até início da década de 1920, ou nos foram apontados pelos depoimentos orais. Evidentemente, existiram vários outros núcleos familiares, e os que foram descritos certamente contavam com mais integrantes. Contudo, comparando-se com o Quadro_1, vemos que os documentos encontrados dizem respeito à maioria dos ex-escravos (partindo-se dos nomes arrolados no inventário em 1885). Assim, temos um quadro cheio de lacunas, mas que nos uma noção dos arranjos familiares.

Quadro 2  Grupos familiares (ex-escravos da família Maia e seus filhos)  Nome dos pais Nome dos filhos Data de nascimento Ricardo Alvez da Maia Mariana Julia 1888 e Maria Maia Francisca Maia - Sebastião Maia (conhecido como Sebastião - Ricardo) Augusta Alvez da Maia 1898 Adão da Maia Brasiliba da Maia 1889 e Silvéria da Maiaa Gonçalo Alves da Maia Maria do Carmo Maia 1889 e Maria Thereza de Jesus Benetida Maia 1892 Mariana Maia 1896 Lucas Maia 1896 Júlio da Maia 1897 Martiminiana Maia 1902 Cândido Alvez da Maia José 1980 e Rita Maria Jesus João da Maia 1896 Gerônimo Tibúrcio Maria das Dores 1889 e Theodora Maroa de Jesusb José Tiburcio 1889 José Gerônimo 1890 Benedito da Maia Maria Olímpia das Dores 1890 e Olímpia Maria das Doresc Joaquim 1907 Luciana Augusta da Maia Carolina da Maia 1888 Faustino Alves da Maia Antônia 1890 e Thereza Maria de Jesus José 1894 Josefina da Maia João dos Santos 1904 Pedro 1906 José 1908 Amado 1919 Júlio Francisco da Maia Antônio 1890 e Catharina da Maiad Sebastião 1904 Paulina 1907 Júlio Francisco da Maia Julia 1922 e Maria Theodora da Maia (segundo casamento de Júlio Francisco da Maia) Raimundo Dias José Raimundo 1894 e Francisca de Paula Maiae Carolina Paula 1897 Felipa de Paula 1897 Cecília Maia Maria de Jesus 1900 Rita Alves da Maia Nazaré Alves da Maia Benedito Alves da Maia Sebastiana Inocência Alves da Maia João Delfino João Delfino José Delfino Joaquim Delfino Crideo Delfino Amado Delfino Margarida Delfino Benedita Delfino Ana Delfino Mathias Antônio de Souza Thereza Maria de Jesus 1919 e Bertina Maria de Jesus Matias Maia Filho João Matias Joaquim Matias Maia José Matias Maia Domingas Maria de Jesus Benedita Maia Amadeu Matias Maia Filho Antônio Matias Filho Benedito Mariano Benedito Mariano e Maria Inácia Mariana de Jesus Angelina de Jesus Fontes: Inventário post mortem de Francisco Felipe da Maia, 26/02/1885. FMC, caixa 842, 95. Registro civil de Nascimentos. CRCC, livros 1 (1889-1891) 3 (1894-1899), 4(1891-1903), 5 (1903 -1906) e 12 (1918-1919). Registro Civil de óbitos. CRCC, livros 1 (1889-1897), 2 (1897-1902) e 3 (1903-1911). Entrevista com Senhor José Mina, realizada no dia 02 de Abril de 2011, no bairro do Ribeirão Fundo, próximo a Serra dos Pretos, Município de Itapeva-MG. Entrevista realizada com o senhor Belmiro Lopes da Silva, no dia 09 de outubro de 2010, na cidade de Cambuí-MG.

Notas: aNo quadro está indicado somente a filha que este casal teve em liberdade, antes porém, ainda no tempo da escravidão, eles tiveram nove filhos; bTheodora teve uma filha em 1885; c O casal também teve uma filha em 1886; dO casal teve uma filha em 1887; eFrancisca teve três filhos ainda no período da escravidão, em 1880 e 1884.

Observe-se que a maioria dos libertos assumiu como seu o sobrenome da antiga família senhorial, e alguns também transmitiram a seus filhos. O fato comporta significados sociais importantes para as questões aqui em pauta. Talvez o fizessem para homenagear seus antigos senhores ou para assinalar suas novas posições após o fim da escravidão. Como observou Martha Hamiester: Ao que tudo indica, assumir o sobrenome de quem lhe fora dono ou construir um com sua vivência também podia marcar o ingresso no mundo da liberdade. Essa sim, a mais drástica mudança possível nessa sociedade: deixar de ser propriedade de outrem para ser seu próprio senhor.16 Certamente, estar em posse de um sobrenome de elevado prestígio social contribuía para que os libertos e seus familiares se inserissem na nova ordem, pois, ao incorporarem o sobrenome Maia, eles carregavam um pouco do prestígio da família, como suas relações sociais, bens imateriais importantes num momento em que procuravam se afirmar como homens e mulheres livres.

De acordo com Russel-Wood, Ser capaz de escolher o próprio sobrenome impõe à pessoa que faz a escolha um substancial fardo psicológico e emocional. Uma opção destas abre as cortinas das janelas do eu interior da pessoa. A pesquisa das práticas de escolha do sobrenome no Brasil [...] tem o potencial de revelar valores, prioridades e desejos, como um africano ou afrodescendente, escravo, alforriado ou nascido livre, via a si mesmo e como era a identidade que desejava que os outros reconhecessem. As práticas de escolha do sobrenome têm o potencial de levar o historiador àquela parte do individuo que não é revelada pelos códices e pode conter a chave da compreensão de como um escravo ou liberto de cor gostaria de ser identificado. 17 Assim, assumir o sobrenome dos antigos proprietários faz parte de um complexo processo de construção identitária, em que o sentimento de identificação com a antiga família senhorial, que remete a uma relação de submissão, se mistura ao desejo de se apossar de referenciais identitários que fossem apoio na afirmação da condição de pessoas livres. Outrossim, o sobrenome comum lhes conferia o sentimento de pertença a um mesmo grupo, uma comunidade, reforçando os laços estreitos que possuíam, mediante os vínculos de parentesco e o longo período em que suas famílias viveram juntas em cativeiro.

Consoante Ira Berlin, para os libertos, a questão da nomeação, como chamou a atenção Russel-Wood, se revestia de significados profundos. O ato de assumir um novo nome significava a celebração da liberdade. Pode ser entendido como símbolo da libertação pessoal, o primeiro passo para se distanciarem da antiga condição. Para o autor "esse gesto de autodefinição invertia o processo de escravização e confirmava a recém-obtida liberdade".18 Nos Estados Unidos, a maioria dos libertos assumiram sobrenomes diferentes do que tinham seus antigos senhores, e foi comum entre eles a recusa dos nomes que tinham quando estavam em cativeiro. Em outros casos, porém, eles entendiam que a ligação com os ex- senhores, homens de prestígio, era uma forma de conseguirem algum apoio no processo de inserção na nova ordem. Desse modo, assumir seus sobrenomes era uma boa estratégia para alcançarem mobilidade social. 19 No caso aqui analisado, a relação de proximidade com a antiga família senhorial também se apresenta de outras formas nos registros. Cecília Maia, por exemplo, quando sua filha veio a morrer, em 1900, indica-se no registro que a criança faleceu na casa de Dona Eliza Augusta da Maia. O mesmo aconteceu com a filha de Theodora e Raimundo Dias, que faleceu no mesmo ano, e também com Gonçalo Alves da Maia, que veio a óbito em 1908.

Pelas informações se presume que muitos ex-escravos continuaram muito próximos à ex-senhora, trabalhando para ela e, possivelmente, conservando certo grau de submissão, podemos supor, que a doação das terras, como algumas alforrias concedidas, deve ter reforçado os vínculos de dependência, corolário desse tipo de relação. Porém, é importante notar que, em nenhum registro pesquisado, a referida senhora foi convidada para ser madrinha de algum dos filhos de seus ex-escravos, o que mostra claramente que essa proximidade tinha seus limites, que uns dos mais importantes meios (talvez o mais importante) pelos quais as pessoas estreitavam e fortaleciam suas relações nesse período (e em períodos anteriores) era por meio do compadrio.

Nesses casos, os ex-cativos preferiam convidar outras pessoas, como os antigos companheiros de cativeiro ou vizinhos, com os quais tinham fortes vínculos, como pode ser exemplificado com o senhor Antônio Casimiro Lopes, morador do bairro dos Areias (bairro onde ficava a sede da antiga fazenda da família Maia), o qual, nas últimas décadas de vigência da escravidão, foi a pessoa mais solicitada para participar de celebrações batismais no grupo de cativos e, no pós-abolição, também pode ser localizado nos registros como padrinho de uma das filhas do ex-escravo Adão da Maia, em 1889. 20 Importa ressaltar que, embora Adão fosse indicado nesse documento com o sobrenome Maia, ele aparece, em registros posteriores, designado como Adão Lopes da Silva, sobrenome que acompanha toda a sua descendência, junto de seu próprio nome (Adão). Diante dos fortes vínculos que mantinha com Casimiro Lopes, não é descabido pensar que, no passar dos anos, em vez de Maia, ele tenha preferido assumir o sobrenome Lopes pela relação de proximidade com seu compadre, um português comerciante que, desde longa data, participava de seu círculo de alianças.

Seja como for, esse caso específico não é isolado no que toca à permanência do nome próprio de algum antepassado como sobrenome entre as futuras gerações, seja no registro formal e/ou nas designações informais, nas relações cotidianas, que produzem referenciais de pertencimento familiar, que também se reproduzem no passar dos anos (mesmo que não ganhe a formalidade dos registros).

Como se pode observar pelas informações dispostas no Quadro_2, não é possível esse tipo de análise para todos os grupos familiares, pois a documentação pesquisada, na maioria dos casos, traz o primeiro nome das crianças. Para alguns deles, porém, pudemos localizar informações adicionais que permitiram estender o exame sobre a prática da nomeação, como no caso da família de Matias Antônio de Souza, João Delfino e outras.

Em relação à família do ex-escravo João Delfino (ver Quadro_2), não sabemos ao certo qual era o seu sobrenome. Delfino, nesse caso, indica a família a que pertence; ele é filho da ex-escrava Delfina, que teve três rebentos no final do século XIX, ainda no período da escravidão (Bento, João e Cecília).21 Os nomes listados foram obtidos pelos relatos orais22 e colocam em evidência a importância da memória dos antepassados, sendo seus nomes repetidos como principal referência de pertencimento familiar no passar das gerações.

Caso semelhante é o da família de Gonçalo Alves da Maia. Filho dos antigos escravos Lucas e Mariana,23 Gonçalo foi um dos escravos que alcançaram a liberdade antes da Lei Áurea, em 1885, por ocasião do inventário de seu senhor Francisco Felipe da Maia.24 Em 1889, localizamos seu nome em um registro civil em que é anotado o nascimento de sua filha, Maria do Carmo.25 Ao declarante, Venâncio Antônio Cesar, não escapou que os avós da criança eram "Lucas de Tal e Mariana de Tal".26 Nesse mesmo corpo documental (registros civis), o localizamos, em 1908, quando foi registrada sua morte. Vale a pena transcrever o registro: Em cartório compareceu o cidadão Matias Antônio de Souza, casado, lavrador, residente neste distrito (...) declarou o seguinte: que hontem vinte do corrente mês de maio as onse horas da noite no lugar denominado "Sertão Grande", distrito desta cidade, em casa de Dona Eliza Augusta da Maia faleceu Gonçalo Alves da Maia de cento e dez anos de idade, preto, natural desta cidade de Jaguary, Minas, residia neste distrito, lavrador, casado com Maria Thereza de Jesus, filho dos finados Lucas da Maia e Mariana Alves (...). Declarou mais que deste casal ficou cinco filhos que são: Maria de 18 anos, Benedita de 16 anos, Mariana de 12 anos, Martimiana, de 6 anos e Lucas de 12 anos gêmeo com Mariana. 27 O relato de Matias é revelador ao informar com precisão os laços familiares mais estreitos de Gonçalo. Chama atenção o nome dado aos filhos gêmeos: Lucas e Mariana. Receberam o nome dos avós, num ato possivelmente de homenagem que Gonçalo prestou a seus pais, registrando, desse modo, para outras gerações a importância da memória dos antepassados. Pelo seu inventário28 realizado em 1964, podemos localizar algumas informações adicionais sobre sua família. Na descrição dos nomes dos herdeiros, além de ser identificado que todos receberam o sobrenome Maia, são citados ainda os nomes de duas netas, às quais foi dado o nome do bisavô (Lucas) como segundo nome. São elas: Benedita Lucas da Silva e Maria Lucas Maia, a primeira, filha de Maria Maia e a segunda, de Lucas Maia.

Fica claro, assim, que a noção de família não se restringia ao núcleo doméstico primário, mas ultrapassava gerações, ligando-se aos integrantes falecidos da parentela, aos antepassados.

Por fim, queremos apresentar alguns fragmentos da história de Matias Maia, o liberto de que conseguimos reunir maior número de fontes, o que possibilitou a oportunidade de aprofundar um pouco mais a análise de suas relações familiares.

São particularmente interessantes alguns registros sobre o nascimento de seus filhos e netos que iluminam certos aspectos sobre a vida pretérita da família, quando ainda viviam em cativeiro. Em 1919, ele procurou o cartório para que o tabelião tomasse nota do nascimento de sua filha, chamada Thereza. Sobre os avós paternos da criança, ele informou que eram Domingas Maria de Jesus e Antônio de Souza, ambos falecidos na época.29 Em todos os assentos batismais dos seis filhos de Domingas (mãe de Matias), que ocorreram entre 1849 e 1872, não foram mencionados o nome do pai, sendo identificados como filhos naturais, de pai incógnito.30 Dessa forma, o registro citado acima é revelador, ao colocar à luz um relacionamento que se presume ter sido estável, mas que não pudemos identificar com as fontes disponíveis para o período em que estavam em cativeiro. É muito provável que Antônio também tivesse sido escravo, embora em outra propriedade, pois, além de não constar nos documentos consultados deste período (anos em que ocorreram os nascimentos dos filhos de Domingas) um escravo adulto com esse nome, na posse da família proprietária, Antônio não é referido pelo sobrenome Maia no pós-abolição, o que o diferencia de todos os ex-escravos (menos de seu filho) da antiga família senhorial. Se estivermos certos, esse seria um dos motivos para que a união do casal se mantivesse no plano consensual.

A importância do pai entre os filhos é ainda evidenciada pela iniciativa de Matias de assumir, como seu segundo nome, o nome de seu pai, sendo, assim, registrado como Matias Antônio de Souza.

Outro documento em que Matias se apresenta como declarante de um nascimento tira do ocultamento a paternidade da única filha que teve Maria das Dores, chamada Josefina Maia, nascida em 1878.31 Quando Josefina teve seus dois primeiros filhos, em 1904 e 1906, os avós maternos da criança informados nos registros são Matias Antônio de Souza e Maria das Dores, esta, indicada como falecida, quando nasceu o seu primeiro neto.32 Novamente, o cruzamento de dados traz à tona um arranjo familiar, em que a presença paterna era desconhecida, situação que, em tempos passados, poderia ser interpretada como indício das uniões instáveis que os cativos mantinham entre eles. Em outros termos, a ausência de normas morais que orientassem a construção de suas relações afetivas e sexuais, por sua vez, trazia consequências danosas para as crianças, que cresciam sem a referência paterna e, na pior das hipóteses, poderiam introjetar como pai a figura do "patriarca branco", seu senhor, configurando- se, desse modo, um dos mecanismos de aculturação.33 Josefina não cresceu sem a presença paterna, além do que teve à sua volta uma família numerosa, com tios, primos e avós.34 Estamos longe, portanto, de qualquer interpretação sobre as relações entre os cativos e libertos que tenham em sua base a ideia de anomia social.

É provável que Maria das Dores tenha falecido antes do fim da escravidão, uma vez que, nos anos posteriores à abolição, Matias é indicado nos registros de nascimentos como casado com Albertina Maria de Jesus. Embora não tenha sido possível rastrear a construção de sua família nos anos posteriores vindouros, pelos registros civis e paroquiais e pelo seu inventário, datado de 1953, pudemos saber um pouco mais sobre sua parentela.

Como exposto no Quadro_2, Matias teve nove filhos, e a observação sobre as designações nominativas logo chama atenção pela presença do nome próprio Matias, posto como segundo nome em quase todos eles, tornando-se assim um referencial de pertencimento familiar, identificando a parentela no conjunto das outras famílias. Como no caso da família de Gonçalo, a dois de seus filhos foram dados os nomes dos avós, Antônio e Domingas. As mesmas considerações feitas são válidas aqui. Aliás, vale lembrar que essa prática de homenagear os pais ou outros parentes, ainda vivos ou falecidos, colocando seus nomes nos filhos era comum nas comunidades das senzalas, o que reforça as constatações da historiografia sobre a importância da família para os homens e mulheres submetidos à escravidão.

Em síntese, os egressos do cativeiro, ao contrário do que se apregoou em anos passados, não eram despidos de imperativos culturais que mobilizassem a construção de famílias como base de organização social, encontrando-se, porém, deficitários de bases de socialização, imprescindíveis para a vida em liberdade, o que teria ocorrido como herança do cativeiro. Longe disso, o que observamos por esses dados é uma noção de família que rompia os limites do núcleo primário e se estendia no tempo atravessando gerações, o que se apresentou como eixo estruturador da vida desses ex-escravos.

A família se constituía no principal apoio para se inserirem na sociedade pós- abolição e para isso eles moverem grandes esforços. A busca pelo casamento civil e pelo registro do nascimento dos filhos mostram o desejo de verem suas uniões e arranjos familiares reconhecidos e respeitados pela sociedade envolvente e pelas autoridades instituídas. A prática da nomeação também é reveladora da forma como eles procuraram se inserir na nova ordem. Ao assumirem o sobrenome da antiga família senhorial, eles buscavam certo reconhecimento social, advindo do prestígio familiar que os ex-senhores possuíam, bem como a conquista de aliados na tarefa premente de inserção social e distanciamento da antiga condição, da superação do estigma da condição pretérita.

Serra dos Pretos: a memória do cativeiro As terras recebidas em legado estavam incrustadas nas serras que faziam parte da fazenda do antigo senhor e se constituíam em terras de cultura e de campos.

De posse delas, os libertos puderam construir suas vidas conforme valores e normas que lhes eram próprios. Ou seja, o fato de manterem uma vida comunitária em suas próprias terras possibilitou maior liberdade na condução e organização da vida cotidiana, o que os distanciava da trajetória de outros libertos que desenvolveram suas vidas em pleno contato com pessoas nascidas livres. Não queremos dizer que os ex-escravos da família Maia tenham procurado conduzir suas vidas no isolamento, mas indicar que havia condições favoráveis para se organizarem com mais autonomia; para criarem modos de vida com traços característicos próprios, como a manutenção e reinvenção de práticas culturais que lhes foram transmitidas por seus antepassados; para o fortalecimento de laços comunitários e o desenvolvimento de elos de pertencimento comunitário territorializado.

Todavia, essas mesmas condições que abriram oportunidade para a condução de uma vida mais independente, também contribuíram para a manutenção da memória da escravidão no entorno da comunidade. Isto é, a "fazenda dos pretos",35 também atualizava, no passar das gerações, a memória do cativeiro na sociedade circundante daquele grupo.

A análise de alguns inventários de ex-escravos pertencentes ao grupo legatário, realizados no decorrer do século XX, e de um segundo inventário da antiga família senhorial, feito na década de 1940, nos permite aprofundar essas questões.

É de 1926, no inventário de Antônio Rosa da Maia (ex-escravo),36 a primeira referência que encontramos do local em que os libertos residiam como Fazenda dos Pretos. Nos registros civis anteriores e posteriores somente se indica bairro do Sertão Grande ou Bairro dos Areias.

Antônio Rosa da Maia era filho de Domingos e Maria Rosa, irmão de Domingas, de Paulo e outros; tinha 90 anos quando faleceu, era viúvo e não deixou filhos. Na época do inventário, não contava com mais nenhum irmão vivo, somente dois sobrinhos, Matias Antônio de Souza e Ricardo Alves da Maia, ambos filhos de Domingas. É interessante notar que nas declarações feitas pelo inventariante, no caso seu sobrinho Matias, não se fez nenhuma referência à cor de Antônio ou seu passado escravo. Sobre o local em que se situavam as terras a serem inventariadas, informa-se somente que se localizavam no bairro do Sertão Grande. Matias não se refere ao lugar onde seu tio e ele próprio moravam como Fazenda dos Pretos. O termo é utilizado pelos louvados, Agenor do Carmo, avaliador judicial, e João Guilherme de Macedo, louvado das partes, na descrição e avaliação dos bens. Assim é descrita a propriedade: "uma parte do terreno de cultura em comum com Mathias Maia de Souza e outros situada na Fazenda dos Pretos, Bairro Sertão Grande".37 Embora seja óbvio, é importante ressaltar que a referência dos louvados ao local naqueles termos indica que tal expressão estava em uso, correspondia a um local sabido por "todos", portanto, servia como indicação importante para precisar a localização das terras.

Em relação às declarações de Matias, mesmo levando em consideração que as eram "filtradas" por uma linguagem burocrática, própria da documentação, existia espaço para informações mais específicas, como o fizeram os louvados que, antes de citar o bairro, apontaram que se tratava da Fazenda dos Pretos. Desse modo, podemos considerar que, a não referência de Matias Antônio de Souza (inventariante) às terras onde ele mesmo e sua família moravam como Fazenda dos Pretos é indicativo dos significados desqualificadores que, na época, ainda comportavam o termo "preto". Contudo, diante disso, se poderá argumentar corretamente que, entre as informações prestadas pelo inventariante, foram consideradas aquelas que o advogado das partes considerou necessárias indicar e, portanto, o fato de não aparecer no documento tal referência não indica, necessariamente, uma recusa do mesmo em referir-se à localidade naqueles termos.

De qualquer forma, diante da impossibilidade de saber ao certo o significado do silêncio, podemos assinalar que, quando analisamos os registros civis e nos deparamos com algum dos ex-escravos da família Maia, em nenhum documento foi mencionado o lugar em que residiam como Fazenda dos Pretos ou Serra dos Pretos, fazendo-se referência somente ao bairro Sertão Grande. Especialmente quando consideramos os registros feitos em 1889, quando o tabelião registrou várias informações sobre as pessoas que procuraram o cartório, isso não pode passar despercebido. Em suma, o que se quer ressaltar aqui está claro, e o fazemos a partir de novas pesquisas sobre o pós-abolição: a recusa dos libertos pelas classificações raciais presentes no período anterior, que impingia sobre eles a marca do cativeiro, o estigma do passado escravo.38 Destarte, acreditamos não ser exagero afirmar que Matias, seus parentes e muitas outras famílias egressas do cativeiro não viam com bons olhos, no momento em que era premente sua afirmação como homens e mulheres livres e não libertos ou ex-escravos, a denominação de suas terras com um termo cujo significado remetia ao cativeiro.

Com o passar das gerações, à medida que a escravidão ficava mais distante no tempo, a expressão certamente foi perdendo sua carga negativa e passou a ser assumida pelos próprios moradores, mas nas primeiras décadas, após a escravidão, seu uso causava, possivelmente, certo desconforto, visto que, se no século XIX os termos "preto" ou "negro" eram sinônimos de "escravo", no período pós-abolição sua menção era uma referência direta ao passado escravo e por isso não convinha ser mencionado.

O exame de outros inventários assinala a permanência de uma forte memória da escravidão referente ao grupo. É intrigante como em alguns documentos localizados, o passado escravo é colocado de forma explícita, mesmo depois de décadas do fim da instituição.

Em 1946, mediante disputas acirradas entre posseiros e herdeiros, que se arrastavam por décadas, pela posse das terras da fazenda que pertencera a Dona Eliza Augusta da Maia, é reaberto o inventário de seu marido, Francisco Felipe da Maia. Não custa lembrar que o casal proprietário não teve filhos. Com a morte de Dona Eliza, no início do século XX, os herdeiros iniciaram um processo conflituoso para organizar a posse das terras e seus rendimentos, que vai se resolver em 1946, com a reabertura do inventário de Francisco Felipe e uma consequente nova partilha das terras, que, na época, tinham a extensão de 2.000 alqueires em um bloco.39 A leitura maçante do processo de dois volumes nos colocou diante de documentos no mínimo inquietantes. Na apresentação das terras assim lemos: Imóvel [...] se constitui de um trecho de terras [...] situados nos bairros Ribeirão Fundo e Sertão Grande. Neste distrito da Comarca de Camanducaia possuindo as seguintes confrontações: Com os escravos de D. Eliza Augusta da Maia (propriedade) e com as propriedades de Antônio Casimiro Lopes, José Procópio Silveira, Maria, viúva de João Batista de Sene [...] até divisar com os mesmos ex-escravos onde começa e finda a divisa. Confrontações estas que se referem a proprietários vizinhos no ano de 1920 40 (grifos nossos).

A questão a perturbar é como um conjunto de famílias, passados mais de trinta anos do fim da instituição da escravidão (tendo por base o ano 1920) são classificados como escravos e ex-escravos? Sem identidade própria, os proprietários das terras não mereceram ser indicados por seus nomes e sobrenomes, tendo sido simplesmente colocados na vala comum da condição petrificada de escravos, ou melhor, escravos de Dona Eliza. Dito isso parece ser o bastante. A única identidade é dada pela referência ao pertencimento senhorial que parece se "naturalizar".

O mesmo trecho é repetido por diversas vezes no decorrer do documento. A naturalidade com que o termo "escravo" aparece impressiona: eles são vizinhos confrontantes em 1920! O uso de categorias pelas quais os libertos lutaram para que ficassem no passado vem à tona como referência qualificadora, impingindo sobre eles a condição servil, a vil condição de escravos. Será possível considerar que a referência no processo traz à tona uma leitura mais geral, compartilhada pela sociedade local sobre aquele grupo de famílias? Mais dois inventários, referentes aos próprios ex-escravos, realizados em anos aproximados ao citado acima, permite aprofundarmos a análise.

O primeiro deles é de 1959, referente ao mesmo senhor que encabeçou a feitura do inventario de Antônio Rosa da Maia, o senhor Matias Antônio de Souza (Matias Maia).41 Quando foi feito seu inventário, se tinham passado mais de vinte anos de sua morte, ocorrida em 1938. O requerente nesse caso é seu filho, Amadeu Matias Filho, residente na Fazenda dos Pretos, como informado por ele próprio.

O que chama a atenção no processo é o auto de divisão da Fazenda dos Pretos, anexo ao inventário. O documento elaborado em 1953 traz a divisão dos quinhões de terras a partir dos antigos legatários. Em relação às terras que caberiam a Matias se traz a seguinte descrição: Pagamento e demarcação feitos ao espólio do escravo Matias Maia, na quantia de CR$22.752,87, deduzida sua parte nas despesas. Haverá para seu pagamento: No imóvel denominado Fazenda dos Pretos, situado no bairro do Sertão Grande desta Comarca [...] dentro das seguintes demarcações: Começam na barra das Areias com o córrego do Paiol [...] confrontando com a fazenda D. Eliza e canto das divisas do escravo Antônio Rosa da Maia [...] canto das divisas do espólio do escravo Candido Alves da Maia [...]. Haverá mais para completar o pagamento deste espólio no mesmo imóvel, na gleba a área de 3h, 79a com as marcações: [...] Canto das divisas do espólio do escravo Faustino Alves da Maia [...]. Canto das divisas do espólio dos escravos Adão Lopes da Silva e Silveria42 (grifos nossos).

Todas as pessoas referidas no documento haviam falecido décadas após o fim da escravidão, entretanto, o fardo do passado em cativeiro não fora apagado, de tal modo que, em 1953, eles ainda são referenciados pela condição pretérita. É interessante notar-se que, em 1926, quando da feitura do inventário de Antônio Rosa da Maia, não referência alguma ao seu passado escravo; simplesmente se informa, na descrição de seu patrimônio, que eram terras havidas por legado de Francisco Felipe da Maia. No entanto, no documento citado, de 27 anos após sua morte, é a antiga condição que serve como referencial para qualificá-lo.

Não havia necessidade legal para tal procedimento. Mesmo considerando-se que o documento que dava base à posse da terra ao grupo havia sido realizado quando ainda eram cativos, não era justificativa para que, décadas posteriores, eles fossem referidos pela antiga condição. Portanto, se os homens integrantes do poder público local, responsáveis pela realização dos documentos, cravaram junto a seus nomes o termo "escravo", é que havia uma forte identificação dessas pessoas com o passado em cativeiro. Ser dono daquelas terras implicava ter sido cativo e, ao que parece, para sempre prisioneiro dessa condição.

Gonçalo Alves da Maia faleceu em 1908, mas seu inventário foi realizado em 1964 por Antônio Gonçalves de Morais, que havia adquirido parte das terras que pertenciam ao referido senhor por compra de seus descendentes e como cessionário dos direitos hereditários que requereu com a realização do processo. Logo na primeira página do processo, no requerimento de inventário, as informações sobre Gonçalo são as seguintes: Diz Antônio Gonçalves de Morais, brasileiro, lavrador [...] residente e domiciliado no bairro do Sertão Grande, por seu procurador que [...] faleceu neste município, no bairro acima referido, onde era residente e domiciliado Gonçalo Alves da Maia, escravo legatário de Francisco Felipe da Maia, brasileiro, lavrador casado que foi pelo regime de comunhão universal de bens com a falecida Tereza de Jesus [...]43 (grifo nosso).

Mais à frente, em procuração que o inventariante passou ao advogado Guilherme Marzagão para que encaminhasse a realização do inventário, repete-se a mesma qualificação: "Gonçalo Alves da Maia, escravo legatário de Francisco Felipe da Maia".44 No termo de declarações do inventariante ele informa: "o inventariado chamava-se Gonçalo Alves da Maia, primitivo escravo legatário de Francisco Felipe de Maia".45 Na descrição dos bens, é usado o mesmo auto de partilha da Fazenda dos Pretos citado no inventário de Matias Antônio de Souza, de 1953. Da mesma forma, os confrontantes das terras do espólio de Gonçalo e ele próprio são referidos como escravos.

É impressionante que, 70 anos após o fim da escravidão, a referência à condição escrava teimasse em permanecer, mesmo dentro de um contexto em que não mais fazia sentido, ou pelo menos não devia fazer como classificação.

Creio que a questão mais importante a se considerar é a de que as referências constantes ao passado escravo nesses documentos são indicativas de uma leitura mais geral, compartilhada pela sociedade em que a comunidade da Serra dos Pretos se inseria. O documento de delimitação das terras, antes pertencentes a Dona Eliza, presente no inventário de Francisco Felipe, citado anteriormente, reforça esse argumento, que, nesse caso, não se trata de um documento sobre as terras da "fazenda dos pretos", mas sobre uma propriedade nas suas imediações. Verifica-se ali, que expressões como "escravos de Dona Eliza", "ex- escravos de Dona Eliza", que são referenciais classificatórios de dominação, romperam o tempo em que foram elaborados e empregados, permanecendo como válidos, mesmo após o fim da instituição da escravidão. Destarte, arriscamos dizer que, no transcorrer do tempo, permaneceu, na sociedade envolvente, uma forte memória da escravidão sobre aquelas famílias que residiam na Serra dos Pretos.

A liberdade, como fica explícito, não significou uma ruptura drástica com a desqualificação do passado em cativeiro e com as hierarquias sociais vigentes na antiga ordem. A equiparação civil que, em tese, deveria dar base ao tratamento aos indivíduos, desde abolida a condição "servil", não serviu de parâmetro na forma de remeter aos libertos e seus familiares na documentação analisada. Ao contrário disso, reafirmam-se os antigos "lugares sociais".

Quiçá estamos tratando com documentos limites, ou seja, excepcionais. Ainda que uma história do pós-abolição esteja ainda engatinhado, não deve ter sido comum a continuidade do uso de categorias específicas a um sistema de organização econômico e social, desmantelado no século XIX, em documentos públicos do século seguinte. Todavia, o fato de não serem estatisticamente representativos, como se presume, não fazem deles impróprios para análise do problema de investigação aqui em questão. Na verdade, algum tempo, historiadores têm mostrado como casos excepcionais podem iluminar a compreensão sobre realidades comuns, mas pouco documentadas. Na particularidade e singularidade de certos casos se podem flagrar processos mais amplos, imperceptíveis de outro modo.46 Dessa maneira, acreditamos que a reiteração da memória da escravidão ,evidenciada nos corpos documentais sobre pessoas que viveram na comunidade da Serra dos Pretos, ou flagrada em documentos que fazem a alusão a elas, joga luz para que possamos compreender melhor a construção dessas comunidades no pós- abolição. Embora cada comunidade tenha suas especificidades, elas guardam certas semelhanças, sobretudo aquelas iniciadas no pós-abolição, mediante a doação de terras feitas pelos antigos senhores, como no caso aqui estudado.

faz algumas décadas que elas têm chamado a atenção de antropólogos, que se fascinam pela possibilidade de estudar "comunidades negras", com suas características socioculturais próprias, nas quais poderiam ser verificadas práticas culturais de origem africana. A leitura se faz mais no nível sincrônico, em que as várias facetas da vida cotidiana da comunidade são postas à luz.47 Mais recentemente, historiadores têm se debruçado sobre o entendimento do processo histórico de construção dessas comunidades e suas trajetórias,48 mas, não raras vezes, esbarram na falta de fontes que permitam um estudo detalhado sobre as famílias que integram esses grupos. A pesquisa em tela diz respeito a um grupo que nem mesmo conseguiu se manter até o presente como comunidade estruturada, como ocorreu com diversas delas, desmanteladas no decorrer do século XX. Consoante Maria Helena Machado: A precariedade da formação de comunidades e bairros rurais de negros, as dificuldades em legalizar suas posses e a desatenção dos contemporâneos com relação a essas comunidades fizeram com que elas desaparecessem sem deixar vestígios, a não ser em casos excecionais, nos quais a ocupação de terras por libertos chegou a afrontar interesses mais fortes, exigindo a intervenção dos poderes constituídos "Policia, Justiça Cível ou Criminal" e, por consequência, o inevitável registro da existência de tais comunidades.49 Diante disso, a comunidade estudada apresenta possibilidades de pensarmos, de forma mais ampla, as dificuldades enfrentadas por esses grupos para se inserirem na nova ordem social como homens e mulheres livres na condição de cidadãos. A reiteração da imagem do escravo e do ex-escravo, passadas décadas após o fim da instituição, evidencia o quanto esse processo foi complexo e difícil de constituir-se, permanecendo como que enraizada no imaginário social a identificação do grupo com o cativeiro. Desvencilhar-se do estigma da antiga condição parece quase impossível, pois a memória do cativeiro, além de estar inscrita na cor de suas peles, era a base de explicação da própria existência da comunidade sobre aquelas terras.

Em suma, evidencia-se, então, como o território da liberdade é pantanoso, "pois muitos dos sinais que sacralizam a subordinação e a sujeição tornaram-se partes de um ambíguo terreno no qual ex-escravos e 'livres de cor' tornaram-se cidadãos em estado contingente: quase-cidadão".50 A questão evidentemente não se resume às "comunidades negras". Embora tenhamos dado maior atenção a elas, é certo que, para todos os libertos e seus descendentes, o passado escravo se constituiu num desafio que tiveram que enfrentar constantemente.

Conclusão As trajetórias que podemos acompanhar iluminam o entendimento de alguns dos muitos aspectos do que esteve para "além" da escravidão no Sudeste, no que se refere às experiências dos ex-escravos. O valor conferido à família e às relações comunitárias é um deles. A manutenção e a expansão dos laços construídos durante o período de cativeiro foi o primeiro passo para os libertos reorganizarem suas vidas após o fim da escravidão.

Todavia, o anseio dos libertos por um espaço socialmente reconhecido e respeitado, de serem inseridos no corpo social sem distinções, ou seja, como cidadãos, encontrou vários problemas. O passado em cativeiro continuou por longos anos a atormentar a vida dos libertos, impingindo-lhes uma imagem de inferioridade.

A pesquisa deixa evidente o quanto a memória da escravidão continuou a ser um elemento qualificador do grupo de famílias da comunidade da Serra dos Pretos. O fardo da condição pretérita acompanhou a trajetória dos libertos, ainda referidos em documentos públicos por sua antiga condição, décadas após o fim da instituição escravista. Havia, portanto, para a sociedade envolvente, uma forte identificação da comunidade com o cativeiro. Não obstante as operações jurídicas e institucionais, postas em andamento com o 13 de maio, as sombras da escravidão, as marcas simbólicas do passado, perduraram por longos anos, fazendo da liberdade um "terreno" profundamente contraditório e complexo.

1Hebe Maria Mattos, "Prefácio", in Frederick Cooper, Thomas C. Holt, Rebecca Scott J., Além da escravidão: investigações sobre raça, trabalho e cidadania em sociedades pós-emancipação (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005).

2Testamento de Francisco Felipe da Maia, 16/11/1877, anexo ao Inventário. Fórum do Município de Camanducaia (Doravante FMC), caixa 842, 95.

3Testamento de Francisco Felipe da Maia, 16/11/1877, anexo ao Inventário. FMC, caixa 842, 95.

4Testamento de Francisco Felipe da Maia, 16/11/1877, anexo ao Inventário. FMC, caixa 842, 95.

5Testamento de Francisco Felipe da Maia, 16/11/1877, anexo ao Inventário. FMC, caixa 842, 95.

6Robert Slenes, "Histórias do cafundó", in Carlos Vogt e Peter Fry, Cafundó: a África no Brasil(São Paulo/Campinas: Companhia das Letras/Editora da UNICAMP, 1996); Maria Helena P. Toledo Machado, O plano e o pânico: os movimentos sociais na década da abolição, Rio de Janeiro: Ed. UFRJ/Edusp, 1994; Elione Silva Guimarães, Terra de preto: usos e ocupação da terra por escravos e libertos (Vale do Paraíba mineiro, 1850-1920), Niterói-RJ: Editora UFF, 2009; Hebe Maria Mattos e Ana Lugão Rios, "O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas", TOPOI, v.5, n.8 (2004), pp.171-98.

7Cf. Hebe Maria Mattos e Ana Lugão Rios, Memórias do cativeiro: família, trabalho e cidadania no pós-abolição, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

8Slenes, "Histórias do cafundó", p.83; Elione Silva Guimarães, Múltiplos viveres de afrodescendentes na escravidão e no pós-emancipação: família, trabalho, terra e conflito (Juiz de Fora - MG, 1828-1928), São Paulo/Juiz de Fora: Annablume/Funalfa, 2006, p.175.

9Machado, O plano e o pânico, pp.21-66.

10Inventário post mortem de Francisco Felipe da Maia, 26/02/1885. FMC, caixa 842, 95. No inventário citado foram arroladas 861 cabeças de gado bovino e 827 de suínos. Segundo Graça Filho, a média de cabeças de gado bovino dos grandes proprietários do Município de São João del Rei era de 146 para primeira metade do século XIX e 133 para segunda. Carla Almeida, analisando 215 inventários, encontrou uma média de 80 cabeças para a Comarca Rio das Mortes, no período de 1780-1822. No Termo de Campanha, Marcos Andrade calculou uma média de 73 para primeira metade do século XIX e 77 para a segunda. Hebe Mattos de Castro, em pesquisa sobre a localidade de Capivary, no período de 1850-1888, computou uma média de 15 cabeças para as fazendas e sete para os sítios. Como se percebe, o rebanho do referido senhor estava bem acima da média encontrada para as localidades citadas. Cf. Afonso de Alencastro Graça Filho, A princesa do oeste e o mito da decadência de Minas Gerais, São Paulo: Annablume, 2002, p.123; Carla M. C. Almeida, "Homens ricos, homens bons: produção e hierarquização social em Minas colonial, 1750-1822" (Tese de Doutorado, Universidade Federal Fluminense, 2001), p.132; Ferreira de Andrade, Elites regionais e a formação do estado imperial brasileiro: Minas Gerais - Campanha da Princesa (1799-1850), Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2008, p.97; Hebe Maria Mattos de Castro, Ao sul da história: lavradores pobres na crise do trabalho escravo, Rio de Janeiro: FGV/Faperj, 2009, p.43.

11Slenes, "Histórias do cafundó", pp.89-96.

12João Fragoso, "Afogando em nomes: temas e experiências em história econômica", TOPOI, v.3, n.5, (2002).

13Registros de Batismos. Arquivo Paroquial de Camanducaia (Doravante APC), livro 16 (1873-1888).

14Eric Foner, "O significado da liberdade", Revista Brasileira de História, v.8, n.16, (1988), p.17.

15Sônia Maria de Souza, "Terra, família, solidariedade: estratégias de sobrevivência camponesa no período de transição - Juiz de Fora (1870-1920)" (Tese de Doutorado, Universidade Federal Fluminense, 2003), p.259.

16Martha Daisson Hameister, "Para dar calor à nova povoação: estudo sobre estratégias sociais e familiares a partir dos registros batismais da Vila do Rio Grande (1738-1763)" (Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006), p.100.

17Anthony John R. Russell-Wood, Escravos e libertos no Brasil colonial, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, p.344.

18Ira Berlin, Gerações de cativeiro: uma história da escravidão nos Estados Unidos, Rio de Janeiro: Record, 2006, p.130.

19Berlin, Gerações de cativeiro, p.130.

20Registro civil de Nascimentos. CRCC, livro 1(1889-1891).

21Registros de Batismos. APC, livros 14 (1869-1872) e 16 (1873-1888).

22Entrevista com Senhor José Mina, realizada no dia 2 de abril de 2011, no bairro do Ribeirão Fundo, próximo à Serra dos Pretos, Município de Itapeva-MG.

Entrevista realizada com o senhor Belmiro Lopes da Silva, no dia 9 de outubro de 2010, na cidade de Cambuí-MG.

23Lucas e Mariana foram escravos da família Maia e alcançaram a liberdade em 1858. Eles se casaram em 1820 e tiveram oito filhos, entre eles, Gonçalo. Cf.

João Lucas Rodrigues,"Serra dos Pretos: trajetórias de famílias entre o cativeiro e a liberdade no sul de Minas (1811-196)" (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de São João del Rei, 2013), p.74.

24Registros de Batismos. APC, livro 16 (1873-1888).

25O primeiro registro que encontramos de Gonçalo após alcançar a alforria é de 1887, quando ele aparece como padrinho em uma celebração batismal de Soltolina, filha de ex-companheiros de cativeiro, Benedito Francisco da Maia e Olímpia da Maia, na ocasião casado e identificado como Gonçalo Alves da Maia.

26Registros de Batismos. APC, livro 1(1889-1891).

27Registro Civil de óbitos. CRCC, Livro 3 (1903-1911).

28Inventário post mortem de Gonçalo Alves da Maia, 16/05/1964. FCM, caixa 883, nº1594.

29Registro Civil de Nascimentos. CRCC, livro 12 (1918-1919). A mesma informação também é fornecida por outra filha de Domingas, Catharina da Maia, casada com Júlio da Maia, quando procuraram o cartório para registrar o nascimento de um dos filhos, em 1904. Registro Civil de Nascimentos. CRCC, livro 5 (1903 -1906).

30Registros de Batismos. APC, livros 11 (1845-1856), 12 (1859-1863), 13 (1863- 1869), 14 (1869-1872).

31Registros de Batismos. APC, livro 16 (1873-1888).

32Registro Civil de Nascimentos. CRCC, Livro 5 (1903 -1906).

33Roger Bastide, As religiões africanas no Brasil, v.1, São Paulo: Pioneira/ EDUSP, 1971.

34Cf. Rodrigues, "Serra dos Pretos", p.149-63.

35A localidade também é chamada por moradores vizinhos da antiga comunidade de Fazenda dos Pretos. Esta designação também aparece em documentos cartoriais do século XX.

36Inventário post mortem de Antônio Rosa da Maia, 24/05/1926. FCM, caixa 845, 1010.

37Inventário post mortem de Antônio Rosa da Maia, 24/05/1926. FCM, caixa 845, 1010.

38Cf. Hebe Maria Mattos, Das cores do silêncio: os significados da liberdade no Sudeste escravista, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.

39Inventário post mortem de Francisco Felipe da Maia, 26/02/1885. FMC, caixa 842, 95.

40Inventário post mortem de Francisco Felipe da Maia, 26/02/1885. FMC, caixa 842, 95.

41Inventário post mortem de Matias Antônio de Souza, 11/07/1959. FMC, caixa 878, 1509.

42Inventário post mortem de Matias Antônio de Souza, 11/07/1959. FMC, caixa 878, 1509.

43Inventário post mortem de Gonçalo Alves da Maia, 16/05/1964. FCM, caixa 883, nº1594.

44Inventário post mortem de Gonçalo Alves da Maia, 16/05/1964. FCM, caixa 883, nº1594.

45Inventário post mortem de Gonçalo Alves da Maia, 16/05/1964. FCM, caixa 883, nº1594.

46Cf. Carlo Ginzburg, A micro-história e outros ensaios, Lisboa: Difel, 1989; Carlo Ginzburg,Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história, São Paulo: Companhia da Letras, 1989; Mônica Ribeiro de Oliveira e Carla Maria Carvalho de Almeida (orgs.), Exercícios de micro-história (Rio de Janeiro: FGV, 2009).

47Cf. dentre outros: Renato da Silva Queiroz,Caipiras negros no vale do Ribeira, São Paulo: Editora da USP, 2006. Ilka Boaventura Leite (org.), Negros no Sul do Brasil: invisibilidade e territorialidade(Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1996).

48Cf. Slenes, "Histórias do cafundó", p.37-102; Mattos e Rios, Memórias do cativeiro, pp.191-230; Guimarães, Terra de preto, pp.129-288.

49Machado, O plano e o pânico, pp.43-4; Guimarães, Terra de preto.

50Olívia Maria Gomes da Cunha e Flávio dos Santos Gomes, "Que Cidadão? Retóricas da igualdade, cotidiano da diferença", in Olívia Maria Gomes da Cunha e Flávio dos Santos Gomes (orgs.), Quase - Cidadão:história e antropologias da pós-emancipação no Brasil (Rio de Janeiro: FGV, 2007), p.13.

Received: August 29, 2013; Accepted: October 02, 2014


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