Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

BrBRHUHu0034-73292001000200002

BrBRHUHu0034-73292001000200002

National varietyBr
Year2001
SourceScielo

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

Reflexões sobre a Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Intolerância Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata

Introdução A recente Conferência Mundial da ONU contra o Racismo, que reuniu mais de seis mil representantes de governos e Organizações Não-Governamentais em Durban, na África do Sul, ameaçou fracassar por causa de profundas divergências de opinião sobre dois assuntos: a política israelense contra os palestinos e a terminologia da condenação da escravidão e do tráfico transatlântico de escravos. Para que não haja dúvidas, é importante lembrar que a parte polêmica da condenação do tráfico de escravos se refere ao comércio triangular do sistema atlântico entre 1450 e cerca de 1850 e à escravidão nas Américas durante esta época. Depois da retirada dos Estados Unidos e de Israel, a Conferência se radicalizou. Foi salvada em amargas e "frenéticas" negociações nos bastidores e por uma prorrogação de mais um dia. Confrontados com a intransigência dos Estados europeus, os delegados africanos mais radicais recuaram e aceitaram um documento final de compromisso. As afirmações deste documento final acerca do tráfico transatlântico de escravos provocaram as mais diversas interpretações ' de uma "vitória" decisiva dos europeus (uma vez que desculpas explícitas e indenizações não foram pedidas) até celebrações de ONGs, que vêem na condenação do tráfico como crime contra a humanidade, um fundamento jurídico para se abrir processo de indenização na justiça. Uma coisa parece certa: a questão de reparações pelo sofrimento e danos causados pelo tráfico transatlântico de escravos está longe de ser encerrada e manterá um grande peso no cenário da política internacional ' influenciando as relações Norte-Sul ' e nos discursos da política interna nos Estados Unidos. O problema se coloca também para a sociedade e política brasileiras, uma vez que o Brasil é citado como integrante do grupo dos países que teriam sido beneficiados com o tráfico. Além desta dimensão nas relações internacionais, a questão da herança da escravidão no Brasil se apresenta como um dos principais tópicos na política doméstica, em função das desigualdades sociais e das discriminações nele sofridas pela população negra.

Indenizar as vítimas da escravidão: evolução das idéias A reivindicação de indenização para as vítimas do tráfico de escravos e da escravidão no sistema atlântico se desenvolveu historicamente em três vertentes. A primeira surgiu nos Estados Unidos, exigindo indenizações (ou reparações) para os ex-escravos e seus descendentes. De uma certa maneira, a idéia de compensação estava presente nas forças de emancipação nos anos 60 do século passado, quando o Partido Republicano prometeu aos ex-escravos o pagamento de "forty acres of land and a mule". Como se sabe bem, esta promessa, que foi pensada com o propósito de permitir a existência dos ex-escravos como pequenos produtores agrícolas, nunca foi honrada. Os negros norte-americanos foram jogados em uma miséria profunda e relegados a um status inferior pelas legislações segregacionistas. A exigência de reparações pelo sofrimento durante os "400 anos" de exploração da mão-de-obra negra sem remuneração se manteve como um elemento central do pensamento negro (entre outros, de Martin Luther King) e, subseqüentemente, dos movimentos sociais e de direitos civis nos Estados Unidos. Nos anos 1980 e 1990, popularizou-se na cultura negra urbana, resultando na fundação de vários grupos dedicados a esta causa (National Coalition of Blacks for Reparation in America; Transafrica, December 12th Movement; National Black United Front). O Congresso Nacional norte-americano, face à moção principalmente dos membros negros ("Black Caucus"), debateu em várias ocasiões, projetos de lei sobre desculpas, indenizações e monumentos de homenagem às vítimas do tráfico e da escravidão.

O movimento ganhou mais força a partir do final dos anos 1990 quando, mais líderes do movimento de direitos civis, inclusive Jesse Jackson, e amplos setores da sociedade americana, passaram a apoiar as reivindicações.1 Supostos precedentes tinham sido criados pelas indenizações pagas a vítimas de outras injustiças do passado (por exemplo, aos sobreviventes judeus do Holocausto, à mão-de-obra escrava explorada pelos nazistas, no caso da Alemanha, e aos americanos de origem japonesa, internados pelo Governo americano durante a Segunda Guerra Mundial)2. No ano 2000, o movimento ganhou, com a publicação do livro: "The Debt: What America Owes to Blacks" de Randall Robinson, o seu "manifesto moderno".3 As opiniões sobre a forma das indenizações variam entre os grupos e indivíduos engajados, mas percebe-se uma clara tendência de se buscar compensação financeira através de decisões judiciais. O debate público nos Estados Unidos é muito polarizado e apresenta, nas suas margens, formas de raciocínio pouco éticas. De um lado, a forte presença de ideólogos ultraconservadores e da extrema direita4, negando veementemente qualquer culpa histórica e descartando rigorosamente qualquer tipo de reparação, dificulta posicionamentos mais críticos sobre as reivindicações, em função do perigo de se aproximar deste ideário ultraconservador. De outro lado, certos argumentos articulados por frações do movimento negro, especialmente por Louis Farrakhan e seus militantes, hierarquizando o sofrimento histórico e justificando reparações pelo fato de que "o Holocausto negro" teria sido mais grave do que o "Holocausto judeu", demonstrando, assim, inveja das indenizações recebidas "pelos judeus", imprime ao debate uma direção desumana.5 A imagem do "holocausto negro", com todas as possíveis conseqüências,, implícitas e explícitas, de comparação, inveja e competição pelo "maior sofrimento", ainda desfigura o debate. Fala-se no "most horrendous holocaust in human history"6, ou escravidão e colonialismo são denunciados como um "double Holocaust".7 É certamente difícil compreender como se conseguiria o reconhecimento do sofrimento de um grupo, relativizando ao mesmo tempo o sofrimento de um outro.

Internacionalmente, as reivindicações de indenização das vítimas do tráfico de escravos datam dos primórdios do pensamento pan-africanista na diáspora, desde o fim do século XIX. Mais recentemente, esta idéia popularizou-se na África, principalmente na Nigéria e em Gana, em função das atividades de grupos e indivíduos, muitos em contato com os movimentos norte-americanos. Destacam- se, entre outros, a "Afrikan World Reparations e Repatriation Truth Commission (AWRRTC)" (Gana) e a "Nigerian Civil Society", do falecido milionário nigeriano Moshood Abiola, que organizou a primeira Conferência de Reparações em 1990, em Lagos. Outros eventos se seguiram: Abuja (1993), Quidah (1999), St. Louis, USA (1999) e Accra, também em 1999. No centro das reivindicações destes grupos e convenções não estão os descendentes dos escravos nos Estados Unidos, mas sim e principalmente o próprio continente africano, enquanto vítima de 400 anos de tráfico e colonialismo. Estes grupos, apesar de articular variadas reivindicações concretas, dentre elas o direito de retorno dos africanos da diáspora à África, concentram-se principalmente em indenizações financeiras. A AWRRTC, por exemplo, exige, além da anulação da dívida externa africana, o pagamento de 777 trilhões de dólares (isto é, 777 com doze zeros, soma que representaria, segundo alguns cálculos, 26 vezes o atual produto interno bruto do mundo) pelas nações e instituições da Europa Ocidental e das Américas que teriam se beneficiado com o tráfico de escravos e colonialismo.

O terceiro momento de evolução foi alcançado quando a idéia de reparações revestiu-se de um caráter mais oficial, sendo apoiada por representantes de governos africanos. Diversos governos africanos enviaram representantes às conferências de reparação. Em 1993, a Organização de Unidade Africana (OUA) debateu o tema em uma sessão especial, chegando a uma resolução ambígua sobre o assunto, que fala em dívida histórica e reparações, sem especificar, entretanto, o caráter financeiro destas reparações. Finalmente, em múltiplas reuniões multilaterais de preparação da Conferência, de nível, caráter e representatividade bem diversos, todas as vertentes se encontraram, antecipando o confronto que, afinal, caracterizaria o encontro de Durban. A posição africana era estava longe de ser unânime, e as diversas resoluções oscilaram entre posições mais "radicais" (declarando o tráfico transatlântico um crime contra a humanidade, insistindo em desculpas formais por parte dos países ocidentais envolvidos e exigindo reparações pelas destruições causadas pelo tráfico) e mais "moderadas" (por exemplo, aceitando declarações de arrependimento em vez de desculpas). Na "Declaração de Dakar" (janeiro de 2001), os delegados dos Estados africanos afirmaram "... that the transatlantic slave trade is a unique tragedy in the history of mankind, a crime against humanity which is unparalleled, not only in its abhorrent barbaric feature but also in terms of its enormous magnitude, its institutionalized nature, its transnational dimension and especially its negation of the essence of human nature of the victims. Further affirm that the consequences of this tragedy accentuated by those of colonialism are still present in the form of damage caused to the descendants of the victims, the perpetuation of the prejudice against Africans in the Continent and Blacks in the Diaspora, and the hindrance of the development of Africa." Entretanto, duas semanas antes da abertura da Conferência em Durban, em mais uma rodada de negociações difíceis em Genebra, a África do Sul conseguiu forçar o bloco africano a assumir uma posição mais moderada.

Em Durban, este frágil consenso entre os Estados africanos implodiu, bem como a posição conjunta da União Européia, acarretando um evento muito tumultuado e ameaçado de encerramento sem documento final. O estopim do abandono das posições anteriormente negociadas e acordadas foi a saída dos Estados Unidos da Conferência em função de tentativas de denunciar o sionismo como doutrina de supremacia racial. Muitos delegados, especificamente o Black Caucus dos próprios Estados Unidos, interpretaram a postura norte-americana na questão do de Israel como um bom pretexto para não enfrentar as discussões sobre escravidão, e intensificaram, junto aos países africanos, o lobby em favor de uma linha mais dura. Os países africanos se dividiram entre posições mais "pragmáticas", como a da anfitriã África do Sul e a do Senegal, cujo Presidente Abdoulaye Wade chegou a chamar a idéia de reparações de absurda e ofensiva, e Estados mais "radicais", liderados ' ironicamente ' pela Nigéria, Zimbábue, Zâmbia e Namíbia. Ironicamente ' porque a Nigéria teve problemas próprios com a escravidão no passado mais recente, uma vez que abrigou em seu território (posterior) o Califado do Sokoto, o maior Estado escravista do mundo na segunda metade de século XIX, e porque as regiões dos outros três Estados nunca foram atingidas pelo tráfico transatlântico. O resultado da radicalização da posição africana foi um novo documento, exigindo desculpas individuais pelo tráfico e colonialismo de cada um dos Estados ocidentais antigamente envolvidos, a denúncia do tráfico como crime contra a humanidade, reparações e cancelamento de dívidas e apoio à "Nova Iniciativa Africana". O líder cubano, Fidel Castro, chegou a apoiar a posição mais radical, afirmando que os descendentes de escravos na África e em outras partes do mundo deveriam ter o direito de exigir reparações das superpotências".8 A partir daí, "all hell broke loose",9 e a iniciativa africana se revelou como um terrível erro tático. A União Européia havia sido dividida entre Estados com forte envolvimento no tráfico transatlântico e um passado escravista, que rejeitaram uma desculpa formal, temendo processos de indenização na justiça, e os outros onze Estados, que eram dispostos a ir além da declaração de arrependimento e a aceitar pronunciar desculpas. Confrontados, porém, com tal beligerância africana, os países da União Européia cerraram fileiras e acabaram apoiando a posição britânica por unanimidade. A conseqüência da intransigência européia e o fruto de esforços diplomáticos frenéticos, principalmente por parte da África do Sul10, foi a celebração de um documento final ambíguo ' aliás, não vinculante ' que não contém desculpas, mas denuncia a escravidão e o tráfico de escravos como crimes contra a humanidade, sem mencionar reparações.

Nas discussões do tráfico transatlântico da escravidão e das reparações a diplomacia brasileira assumiu uma posição intermediária: de um lado o Brasil se mostrou favorável a um pedido formal de desculpas pelos Estados ocidentais envolvidos no tráfico, e de outro, foi contrário à idéia de indenizações financeiras.11 O Brasil participou no evento com uma grande delegação, envolvendo altos custos por parte do Governo. O Brasil credenciou oficialmente 185 pessoas de integrar a delegação do país, às quais se juntaram mais de 320 brasileiros representando entidades da sociedade civil. Com a exceção do discurso em plenário no dia 1 de setembro, do Ministro da Justiça, José Gregori, que foi criticado como vago, evasivo e de uma "generalidade insultante",12 a atuação brasileira pode ser considerada como relevante, consistente, e bem preparada. Também o papel do diplomata e Secretário Nacional de Direitos Humanos, Gilberto Sabóia, que assumiu a chefia da delegação, depois da volta para o Brasil do Ministro Gregori, nas difíceis negociações do documento final da Conferência, foi elogiado. Além de ter participado nas conferências preparatórias internacionais, o Brasil tinha iniciado um processo de discussão que envolveu tanto o governo como militantes de ONGs e representantes da sociedade civil, resultando na formulação de um documento base cujas posições chegaram a orientar a postura brasileira em Durban.13 Os posicionamentos neste relatório, que nas suas próprias palavras representariam um compromisso e refletiria "em boa medida formulações em que foi possível obter posição de consenso entre o Governo e as organizações não-governamentais brasileiras", foram, em grande medida, defendidos durante toda Conferência.

Embora denuncie o tráfico transatlântico como "grave violação aos direitos fundamentais da pessoa humana", é um documento quase exclusivamente voltado à situação interna brasileira que segue princípios universalistas na medida em que aborda as diversas manifestações de racismo, intolerância e preconceito no país e não discrimina entre as comunidades afetadas. É político e pragmático na medida em que faz sugestões concretas de combate às discriminações. Exige do Estado brasileiro o reconhecimento da "sua responsabilidade histórica pelo escravismo e pela marginalização econômica, social e política dos descendentes dos africanos" e a adaptação de "medidas reparatórias às vítimas do racismo, da discriminação racial e de formas conexas de intolerância, por meio de políticas públicas específicas para a superação da desigualdade." Significa que são reivindicadas reparações sim, entretanto não como indenizações financeiras individuais, mas na forma de políticas públicas concretas de combate à desigualdade racial. Estas medidas sugeridas incluem, entre outras, a criação de um fundo de reparação destinado a financiar políticas educacionais, cursos preparatórios para o ingresso de negros nas universidades e cotas ou "outras medidas afirmativas que promovam o acesso de negros às universidades públicas." O Brasil defendeu estas posições em Durban até o ponto de contrariar países africanos e árabes na questão de incluir no texto final da Conferência um amplo número de vítimas de discriminação (entre elas, pessoas discriminadas por causa da sua orientação sexual). Muitos representantes de ONGs brasileiras e pessoas de destaque como a Vice-Governadora do Rio de Janeiro, Benedita de Silva, foram além das posições deste compromisso, demonstrando, assim, um pensamento mais radical.14

Tráfico de escravos ' perspectivas historiográficas Considerando a grande relevância da questão, mas sem a ilusão de que esta venha a ser resolvida mediante um raciocínio científico, vale a pena avaliar os argumentos centrais do debate sob uma perspectiva historiográfica. Trata-se de uma discussão sobre culpa e responsabilidade históricas, sobre justiça social e sobre o relacionamento com um passado que, de acordo com os valores éticos atuais, é altamente condenável. Surgem, daí, quatro pontos polêmicos: Em primeiro lugar, centra-se a análise em saber se uma injustiça cometida no passado justificaria hoje uma indenização. Além disto, quem foram "os culpados" pelo tráfico e pela escravidão? Quais foram os beneficiados? Quem foram as vítimas e quem são os seus descendentes hoje? A primeira questão representa um problema de ética política na atual conjuntura, enquanto as últimas três questões envolvem um estudo historiográfico sobre a natureza e as repercussões do sistema atlântico e do tráfico de escravos na África.15 Vamos esboçar cada um destes problemas.

A possibilidade de sanar uma injustiça do passado através do pagamento de reparações tem uma dimensão jurídica e moral. Juridicamente, os militantes pretendem invocar a doutrina legal do enriquecimento ilícito e argumentam que a caracterização do tráfico como crime contra a humanidade justificaria o pagamento de indenizações aos descendentes das vítimas pelos governos daqueles Estados que se teriam beneficiado da mão-de-obra "gratuita" dos escravos16.

Além disso, exemplos recentes de pagamento de indenizações em favor de outras vítimas de injustiças no passado teriam criado precedentes.

Os contra argumentos jurídicos são muitos e foram articulados veemente, especialmente pela Grã-Bretanha, na Conferência de Durban: a escravidão era, na época, não somente uma instituição legal, mas também praticada ' além das Américas ' em muitas outras sociedades como na China, na Índia, na Coréia, no mundo árabe, no Império Otomano, na Rússia e na própria África. Os casos mais recentes de indenizações não representariam precedentes porque envolvem vítimas diretas ou injustiças históricas que também nas leis do período eram consideradas crimes. O lado jurídico é, pois, complexo e certamente vai ser julgado em tribunais dos Estados Unidos. Entretanto, o foco nos aspectos jurídicos desvia das questões mais profundas e principais. Trata-se, no fundo, de um problema ético e moral, que deveria ser resolvido através de um amplo debate, buscando um consenso ético entre as sociedades e comunidades envolvidas. Por muitas razões, é oportuna a concessão de um direito a indenizações não somente às vitimas diretas de violações de direitos humanos, ainda vivas, mas também aos seus descendentes. Mas este princípio deveria ter limites práticos no que concerne a punição e indenização de injustiças do passado, levando-se em conta que a história humana é repleta destes acontecimentos. Seria inoportuno, com certeza, pagar indenizações aos descendentes das vítimas inglesas do escravismo romano como foi sugerido, com a intenção de ridicularizar o princípio das reparações.

Para escapar deste dilema, a ONG Human Rights Watch sugeriu que deveriam receber reparações, em respeito a violações de direitos humanos no passado, somente indivíduos ou grupos que continuam sofrendo os efeitos destas violações na atualidade. Mas este raciocínio não responde à complexidade toda do problema da escravidão. É certo que o tráfico e a escravidão atlântica influenciaram profunda e permanentemente a imagem ocidental da pessoa negra, e, assim, têm efeito até na atualidade17. A "racialização" da escravidão, isto é, a associação de escravo com um ser de cor negra e a imaginação "do negro" como uma "categoria racial inferior" têm as suas origens no tráfico transatlântico e perduram até hoje, como figuras de raciocínio e pensamento de longa duração.

Vários pronunciamentos na Conferência de Durban enfatizaram este vínculo entre o tráfico transatlântico de escravos e os racismos da atualidade18.

De outro lado, a discriminação que os negros estão sofrendo nas sociedades como as do Brasil ou dos Estados Unidos não representa uma mera continuação do regime da escravidão, mas reflete uma injustiça que se efetivou depois do fim daquele sistema e do tráfico. Foram as infames leis "Jim Crow" e a prática discriminatória e segregacionista nos Estados Unidos, seguindo à emancipação, que iniciaram uma nova era de discriminação do negro. No Brasil, a população negra é discriminada apesar da Emancipação e apesar de um grande número de leis e artigos constitucionais que prometem plena igualdade. A discriminação é nova, "moderna", escondida, indireta e informal, contrariando o espírito e as letras das Constituições do século XX, e representa, assim, uma violação atual de direitos humanos, que deveria ser combatida e reparada nesta qualidade.

As questões dos "culpados", dos beneficiados e da identificação dos descendentes das vítimas do tráfico e da escravidão da época representam problemas quase insuperáveis. A visão maniqueísta de muitos reparacionistas, que equiparam culpados e beneficiados com aqueles países ocidentais, cujos cidadãos estiveram envolvidos no tráfico ou tiveram escravos, e as vítimas com os descendentes dos escravos no Novo Mundo e com o continente africano, que teria sido devastado pelo tráfico e, assim, condenado ao subdesenvolvimento, não alcança a complexidade do problema, mas representa figuras de raciocínio que chegaram a dominar os discursos na Conferência de Durban. Especialmente os delegados dos Estados africanos esforçaram-se em destacar o continente africano inteiro como vítima e a miséria e o subdesenvolvimento atual como conseqüência direta do sofrimento da época do tráfico transatlântico. O Ministro de Justiça da Nigéria alegou que "our current state of development is directly tied to the crimes committed during the slave trade ...", o representante do Senegal Human Right Committee argumentou que o tráfico de escravos "was a unique atrocity that resulted in millions of victims and put Africa into poverty", o Ministro de Relações Exteriores da Tanzânia queria lembrar que "slavery and colonialism are also responsible in a big way, for poverty, underdevelopment, marginalization and economic disparity in Africa and among the people of African descent in the diaspora" e, finalmente, o seu colega de Lesotho culpou o tráfico e o colonialismo pelo subdesenvolvimento africano, a pobreza, a dívida externa, as guerras civis e a falta de acesso dos produtos africanos aos mercados internacionais19. Estas figuras argumentativas entraram também no fundo ideário das organizações não-governamentais. Argumenta, por exemplo, o "African Reparation Movement" (RU): "There is an abundance of proof that Africa was the cradle of civilisation centuries before the birth of Christ. As well as the architectural wonders of the Pyramids, the Sphinx, the Luxor Palace etc. Africa was far ahead in medicine, agriculture and transport. The ancient kingdoms of Songhai, Benin, Ashanti and others were highly organised and were supported by ancient universities like Timbuctoo.

At this time Europe was undeveloped and America was non-existent.

Africa's development was interrupted around the 14th century by the heinous institutionalised enslavement. For a period of over 400 years, enslavement robbed Africa of her best and strongest women, men and children. They were put in chains like goods and chattel and transported to the Americas to plant cotton and sugar cane to export to Europe for the Industrial Revolution. The result of the work of the enslaved was to enrich the countries of their "masters" whilst their countries' development was hampered."20 Esta citação demonstra, com muita clareza, os problemas acarretados recorrendo à História de uma maneira simplista e maniqueísta. É evidente que os símbolos citados da civilização africana da época pré-tráfico eram altamente ligados à escravidão africana e ao tráfico de escravos antes do surgimento do sistema atlântico. O fato de que os monumentos egípcios foram construídos utilizando ampla mão-de-obra escrava é bem conhecido. Muitos reinos pré-coloniais, como Songai e Benim, citados no documento pela sua grandeza, usavam também escravos em grande número, conduziam regularmente expedições armadas para a captura de escravos nas comunidades vizinhas e mantinham um tráfico importante de escravos com a África do Norte e o Próximo Oriente, através do deserto do Saara21.

Estima-se que anualmente foram exportados cerca de 10.000 escravos pelas rotas transaarianas antes da chegada dos Portugueses ao litoral da África Ocidental22. O caso do citado reino de Asante, no atual Gana, é especialmente interessante, porque surgiu como um dos grandes beneficiários do tráfico transatlântico de escravos. Quando os portugueses chegaram pela primeira vez, em 1471, nos Akan, na região que desde então foi chamada de Costa do Ouro, com o objetivo de contornar o comércio transaariano de ouro e comprar diretamente das minas, descobriram que umas das poucas mercadorias que os Akan aceitavam em troca eram escravos. Entre 1500 e 1535, os portugueses compraram entre 10.000 e 12.000 escravos no reino de Benim (e nos Igbos vizinhos) para satisfazer a demanda de mão-de-obra escrava na Costa de Ouro. Dentro deste contexto, surgiu o reino de Asante como um Estado poderoso que sabia transformar as riquezas do comércio em poder político e militar. O novo Estado, que chegou a conquistar os seus rivais Akan, estabeleceu controle e monopólio sobre o comércio de escravos. Adquiriu escravos em grande número, para uso interno e exportação, em guerras e como tributo dos vizinhos não-Akan. No século XVIII, Asante, sendo um dos símbolos de prosperidade africana pré-colonial, transformou-se em um dos grandes beneficiários do tráfico transatlântico e certamente não pode ser considerado como vítima deste comércio.

O exemplo Asante demonstra as limitações da discussão sobre culpa, responsabilidade e lucro do tráfico apenas sob a perspectiva da participação européia. A tragédia do tráfico transatlântico não consiste somente no fato de que traficantes europeus compraram cerca de 11 milhões de africanos, transportando-os em condições horrorosas e desumanas para o Novo Mundo, onde foram explorados como mão-de-obra, negando-lhes os direitos básicos de uma existência humana. A tragédia do tráfico consiste também, especialmente sob uma visão moral e ética, na disposição de africanos de capturar e vender para os europeus estes 11 milhões de irmãos23. "Atlantic slave trade was made possible", argumenta A. G. Hopkins, "by an alliance of European shippers and African suppliers, who agreed, in effect, to exploit the less powerful people of the Continent."24 O lado africano desta aliança consistiu em reis, aristocracia e big men de Estados poderosos e especializados na captura e venda de homens (como Asante, Daomé, os reinos Ardra e Hueda no Golfo do Benin, os reinos de Ndongo, Kasanje e Lunda em Angola), numa rede de grupos de traficantes e comerciantes (como por exemplo, os Soninke na Senegambia, os Aro na Igbolândia, os Bobangi no rio Congo) e comerciantes africanos e mestiços no litoral. Neste sistema africano de comércio, um capturado passava, às vezes, por muitas mãos até chegar a ser embarcado num navio europeu. Sabe-se de uma moça Igbo que foi vendida seis vezes em menos de 200 quilômetros de viagem até a costa25. O lado europeu do sistema transatlântico foi formado por traficantes de muitas nações (entre elas, dinamarqueses e outros escandinavos, brandenburgueses, holandeses, portugueses, brasileiros, espanhóis, franceses e ingleses). Como bem se conhece, o tráfico transatlântico foi dominado sucessivamente pelos portugueses, holandeses e, a partir do final do século XVII, pelos ingleses.

Mediante este sistema transatlântico foram embarcados, entre 1450 e 1900, em torno de 13 milhões de pessoas; dentre estes 9,6 a 11,8 milhões chegaram com vida nas Américas26. 42% delas foram para as ilhas do Caribe, 38% para o Brasil e menos de 5% para os Estados Unidos. Durante o mesmo período, cerca de 6 milhões de africanos foram vendidos no tráfico oriental (para a África do Norte, o Próximo Oriente e a Península Árabe, a Índia e as ilhas no Oceano Índico). Cerca de 8 milhões de escravos permaneceram, também neste período, na própria África, sendo explorados pelos poderosos deste continente. O tráfico transatlântico viu seu apogeu em torno de 1800, enquanto em 1850 foi efetivamente abolido. O tráfico oriental existiu desde antes do surgimento do Islã, expandiu a partir de 1750 e teve o seu clímax em torno de 1850. A partir de 1830/1850 a escravidão e o tráfico se transformaram em fenômenos predominantemente africanos. Com o fim da exportação de escravos para as Américas, eles chegaram a ser usados em grande número no próprio continente.

Enquanto a população escrava na África e no Novo Mundo, calcula-se, era aproximadamente a mesma entre 1600 e 1800, a partir de 1850 existiam mais escravos na África do que nas Américas. Os poderosos traficantes e guerreiros se tornaram latifundários, produzindo, com a utilização de mão-de-obra escrava, para os mercados domésticos e do exterior. Novos Estados surgiram, como o Califado de Sokoto no norte da atual Nigéria, que desenvolveram uma economia complexa e cresceram em riqueza em função dos seus escravos, capturados, no caso de Sokoto, em assaltos brutais aos povos vizinhos não-islâmicos. Estas sociedades escravistas do século XIX experimentaram, todavia, o mesmo tipo de resistência como o Novo Mundo: de rebeliões de escravos a quilombos27.

É importante reconhecer que o Novo Mundo se tornou a destinação mais importante, e certamente a mais dinâmica, do tráfico, sem ser, porém, a única.

Existia um tráfico ocidental de grandes proporções, assim como havia o tráfico e a escravidão dentro da própria África. Nas discussões em Durban, os delegados africanos recusaram-se a tratar o tráfico fora do sistema atlântico com o mesmo rigor moral e com as mesmas categorias éticas universalistas do que o tráfico transatlântico. Embora as ONGs tenham feito uma tentativa de incluir os tráficos do Saara e do Oceano Indico na denúncia como crimes contra a humanidade, nos discursos no plenário este lado ficou ausente. Os delegados africanos justificaram esta ausência pelo que consideraram como diferenças fundamentais entre escravidão africana e o sistema atlântico: "It's like apples and oranges", explica o ministro de Justiça da Costa do Marfim. "In Africa, you are talking about "subsistence slavery" between neighbours. One people would go to war against their enemy. They would take prisoners and make them work on their plantations or work as domestic servants. But nothing to the degree of the trans Atlantic slave trade. (...)."28 A escravidão e a venda de escravos existiram em muitas sociedades africanas antes do início do sistema atlântico. Mas isto não significa que a venda de escravos através do Atlântico representasse uma simples continuação do comércio anterior. Os escravos foram "feitos" em função da demanda externa, e as sociedades africanas ' mais exatamente as classes governantes daquelas sociedades que se haviam especializado na venda de escravos ' adaptaram as suas instituições para satisfazer esta demanda. No início do processo, dava-se a captura da vítima ou a transformação de um homem livre em escravo por outros mecanismos. Os escravos eram adquiridos pelos seguintes meios: guerra, saque e ataque regular (os dois métodos mais comuns), seqüestro, condenação nos tribunais, acusação de bruxaria, como tributo, pela transformação de outras relações de dependência em escravidão ou também, mas não freqüentemente, como resultado de auto-escravização. Alguns escravos vendidos nasciam escravos. A captura e a comercialização, no continente africano, estavam nas mãos de traficantes africanos, desde os poderosos dirigentes estatais até pequenos intermediários. Sempre, o tráfico dependia dos Estados africanos pré-coloniais e das decisões das suas classes dirigentes. A rede africana de captura e comercialização de seres humanos era altamente organizada e eficiente. A participação africana não se reduzia à "colaboração individual", como foi sugerido por alguns historiadores29, mas tinha o mesmo carater sistemático e duradouro da participação européia. A relação entre os traficantes africanos e europeus "was not that of employer and employee, but of two complementary and more or less equal partners", argumenta A. G. Hopkins30. Os africanos conseguiam barrar efetivamente a entrada dos europeus no continente ou a formação de monopólios de compra no litoral.

Quem lucrou com o tráfico transatlântico? Esta questão abrange várias dimensões. Inicialmente, é importante ressaltar que houve muito lucro no plano individual. Os "proprietários" dos escravos no Novo Mundo se beneficiaram com a mão-de-obra das vítimas, bem como o fizeram os proprietários de escravos na própria África e no Oriente Próximo e Médio. Os barões de açúcar na ilha (britânica) da Jamaica acumularam fortunas de grande porte e ostentavam as suas riquezas, assim como os plantadores escravistas de algodão no sul dos Estados Unidos. O tráfico trouxe lucro para os capitães europeus dos navios.

Entretanto, os lucros eram menos astronômicos do que comumente pensado: uma média de 10%, comparável com outras atividades de comércio da época31. Lucraram também os comerciantes africanos ou afro-europeus radicados no litoral do continente africano. Por exemplo, o famoso Francisco Felix de Souza (o Chachá de Souza), traficante baiano, efetivamente africanizado, em Uidá (Daomé), acumulou uma fortuna que na época foi estimada em 120 milhões de dólares32. E se beneficiaram ainda, em termos de mercadoria, prestígio, poder e seguidores, os dirigentes e big men das sociedades africanas que decidiram capturar e vender os seus irmãos africanos.

Os escravos representavam, na época, para os proprietários das plantações e latifúndios do Novo Mundo a mão-de-obra mais barata disponível. Mas isto não significa que os africanos venderam os cativos por bugigangas. No século XVIII, por exemplo, as mercadorias ' a serem trocadas por escravos ' representavam cerca de dois terços dos custos de uma viagem de um navio escravista. Escravos foram trocados no litoral africano basicamente pelos mesmos produtos que o sistema atlântico vendeu para os colonos brancos nos Estados Unidos: têxteis, ferro, instrumentos agrícolas, armas, bebidas alcoólicas, entre outros33.

Mas a discussão sobre o benefício do tráfico e da escravidão vai muito além do lucro individual. Argumenta-se, entre os reparacionistas, de que teria existido um vínculo direto entre a escravidão no sistema atlântico, e os seus lucros, e a riqueza atual do Ocidente. Esta suposição leva a outra área de grande debate historiográfico na qual não existe consenso entre os experts. Em relação aos Estados Unidos, os críticos da idéia de reparações argumentam que não ligação direta entre as fortunas dos donos de escravos no Sul (que teriam representado em torno de 10% da população da época) e a industrialização (responsável pela economia rica e diversificada do século XX) dos Estados Unidos. Pelo contrário, argumenta-se que a escravidão e o poder dos escravistas do Sul (retrógrados econômica, social e politicamente e, per se, mercantilistas, anti-modernistas e anti-liberais) tinham que ser quebrados para permitir o triunfo da industrialização no país. Esta derrubada do setor escravista teria sido realizada pela Guerra Civil (1861-1865), com custos de vida enormes nos dois lados e destruindo muitas das fortunas acumuladas no Sul durante o período da escravidão.

A outra área de grande debate sobre um possível vínculo entre as riquezas do Ocidente e a escravidão se refere à suposta contribuição do sistema atlântico para a industrialização inglesa ' pioneira na indústria moderna. Desde a publicação, em 1944, do influente livro do historiador ' e posterior Primeiro Ministro ' de Trinidad, Eric Williams, intitulado: "Capitalismo e Escravidão", esta questão vem fascinando os historiadores, ainda que não tenha gerado um mínimo de consenso na comunidade acadêmica34. Numa primeira reação, a tese de Williams de que os lucros da escravidão no Caribe inglês (principalmente na ilha açucareira da Jamaica) e do tráfico de escravos tenham contribuído significativamente para o crescimento do capitalismo industrial na Inglaterra no final do século XVIII, foi rejeitada. Descobriu-se que o capital inicial da industrialização inglesa vinha da agricultura e do comércio com a Europa e não do sistema atlântico35. Este enfoque na questão da geração de capital é considerado insuficiente pelos modernos discípulos de Williams. Argumentam que se fossem consideradas todas as atividades econômicas no sistema atlântico, juntamente com as repercussões (linkages) na Inglaterra e todos os lucros destas atividades, o complexo do açúcar nas ilhas do Caribe teria contribuído, ao final do século XVIII, com algo em torno de 8 a 10% da renda nacional britânica36. Porém, os adversários questionam seriamente estes cálculos ' da mesma maneira com que, à época, Adam Smith criticara o sistema colonial como ineficiente ' e enfatizam que nem o trafico nem a escravidão teriam gerado lucros para Grã-Bretanha37. Argumenta-se também que os custos sociais da manutenção do sistema atlântico e a concessão de privilégios, subsídios e proteção mercantilista para os barões de açúcar no Caribe, teriam eliminado qualquer possibilidade de lucro para a sociedade inglesa38. Posições intermediárias surgiram no debate39, que também oscila quanto ao enfoque temático, privilegiando ultimamente mais a questão de mercados, produtos e cultura no lugar de capital40. Trata-se, contudo, de um debate aberto, sem consenso, baseado em poucos hard factse dados empíricos seguros. É um debate que deixa as questões chaves mais indecisas do que permite um postulado de verdades simples, e cujas conclusões não servem para apoiar nem as teses dos reparacionistas nem as dos seus adversários.

Quem são os descendentes atuais das vítimas do tráfico? Esta questão também é mais complexa do que os reparacionistas, que simplesmente equiparam os africanos na diáspora bem como o continente africano como legítimos descendentes das vítimas diretas, habilitados a receber as reparações, alegam.

As dificuldades da identificação dos que teriam direito à reparação nos Estados Unidos, onde a comunidade negra é bastante diferenciada socialmente, estão condensadas na pergunta do atual Secretário de Estado, Colin Powell, se ele receberia indenização ou iria pagá-la. Vimos, também, que na África não houve somente vítimas mas também beneficiados pelo tráfico e pela escravidão. Da mesma forma que deve existir no sul dos Estados Unidos uma certa continuidade entre as elites do período escravista e posterior, podemos, por exemplo, encontrar muitos descendentes de traficantes ou donos de escravos nas altas camadas do Estado e da sociedade na Haussalândia, no Norte da Nigéria. Mesmo entre as pessoas mais comuns na África atual, encontram-se muitos descendentes dos envolvidos no tráfico. Podemos, ainda, pensar nos milhares de descendentes dos oitenta filhos homens de Chácha de Souza no atual Benin, certamente na sua maioria homens comuns mas, mesmo assim, descendentes de um dos maiores traficantes de escravos de todos os tempos. Eles têm direito à indenização ou reparação? Para escapar deste dilema, os reparacionistas argumentam que o continente africano como um todo teria sofrido as conseqüências desastrosas do tráfico transatlântico e que o atual subdesenvolvimento do continente se explicaria pelo rapto da sua população durante quase 400 anos.

É inquestionável que se tem no tráfico transatlântico, como na exportação de escravos para outras regiões e na ampliação da escravidão no próprio continente, uma das grandes tragédias da humanidade, que, severamente, afetaram as sociedades atingidas. Mas associar o tráfico com transformações mais sistemáticas e profundas, como desenvolvimento, crescimento econômico ou tecnologia, logo alcança os limites da nossa compreensão. a questão mais óbvia ' as conseqüências demográficas ' revela-se de muita complexidade e está sujeita a interpretações polêmicas. O tráfico causou um declínio da população na África ou somente uma estagnação? Os especialistas não têm respostas consensuais. Existem vários cálculos e projeções, envolvendo variáveis como o fluxo das pessoas, taxas de fecundidade, possíveis compensações pela introdução de alimentos mais produtivos e nutritivos (milho e mandioca) e pela poligamia, uma vez que foram levados para as Américas principalmente homens41. O efeito variava também dramaticamente entre as regiões. relatos de regiões cujas populações foram devastadas pelo tráfico (mas, por vezes, com uma rápida recuperação depois da abolição), assim como existem grande áreas jamais atingidas, e que tiveram, ao longo tempo, uma dinâmica populacional e um grau de desenvolvimento tecnológico idênticos às regiões de fornecimento de escravos.

E o que significa estagnação do crescimento populacional para o desenvolvimento em sociedades agrárias? No contexto da industrialização precoce da Grã- Bretanha, no final do século XVIII, o crescimento populacional ampliava o mercado interno e fornecia a mão-de-obra necessária para o take-off. Ao contrário, na China da Dinastia Ch'ing o alto crescimento populacional levou a sociedade do século XIX ao superpovoamento, fomes e guerras civis. No contexto das sociedades agrárias subdesenvolvidas da atual África, crescimento populacional acentuado certamente aumenta a demanda por recursos escassos.

Estabelecer um vínculo de argumentação entre tráfico de escravos e subdesenvolvimento da África não é fácil, não é consensual e certamente não pode ser suposto a priori. Mas parece certo que o êxodo das suas populações, as grandes redes comerciais mantidas em função disto e as riquezas criadas no continente pelo comércio em seres humanos não estimularam muita mudança na África. Econômica e tecnologicamente, a África de 1850 parecia muito com a de 1500.

Escravidão do passado versus direitos humanos de hoje? Um último argumento deve ser trazido a este raciocínio histórico, voltando-se, assim, à atualidade e à Conferência de Durban. Na medida em que a discussão sobre reparação estimula uma reflexão sobre escravidão, injustiça social e discriminação racial atual, ela deve ser considerada altamente desejável e positiva. Observa-se esta repercussão positiva no Brasil. Lamentavelmente, na Conferência de Durban aconteceu o contrário. O polêmico tema das reparações de um mal que aconteceu 300 anos atrás desviou as atenções do "Racismo, (d)a Intolerância Racial, (d)a Xenofobia e (d)a Intolerância Correlata" da atualidade. A leitura das atas e das comunicações da Conferência deixa uma forte impressão de que a insistência dos Estados africanos com o tráfico transatlântico do passado se impôs sobre as preocupações da grande maioria das ONGs com racismo, xenofobia e desrespeito aos direitos humanos da atualidade.

O tratamento da escravidão atual na África é sintomático deste desvio de foco da atualidade, e com isto, da responsabilidade direta dos governos africanos.

Quando as Nações Unidas comemoraram no dia 23 de agosto o "International Day for the Remembrance of the Slave Trade and its Abolition" tiveram de admitir que, hoje em dia, mais pessoas estão sendo escravizadas e traficadas do que no auge do sistema atlântico. A ONU fala em 700.000 pessoas por ano e a Anti- Slavery International estima o número total de escravos hoje em dia em 27 milhões, o que seria muito mais do que todos os escravos levados para as Américas42. Cenas bizarras acontecem na África de hoje, enquanto os Estados africanos insistem em reparações pelo tráfico transatlântico do passado, e o ministro de Justiça do Sudão, Ali Mohamed Osman Yassin43, condena o tráfico (transatlântico do passado) como "appalling tragedy in its abhorrent barbarism, enormous magnitude, institutionalized nature (...) and particularly in its negation of the essence of the victims". Grupos de direitos humanos dos Estados Unidos compram e liberam escravos em grande número no Sudão. Um grupo, o Christian Solidarity International, afirma ter liberado mais do que 4.000 escravos, que tinham sido capturados pelas milícias aliadas do governo do Sudão. Este governo, aliás, mantém a posição de que não se trata de escravos, mas de vítimas de seqüestros44.

O enfoque no tráfico de escravos do passado encobriu também, efetivamente, o tema das perseguições étnicas e raciais e da politização da etnicidade pelos governos, especialmente no continente africano, práticas comuns que causam um número imenso de vítimas no continente. A isto se associa a questão da legitimidade e da credibilidade. É certamente muito difícil digerir a insistência do Presidente de Zimbábue, Robert Mugabe, em indenizações pelo sofrimento do tráfico transatlântico enquanto mais de 20.000 vítimas e seus parentes, civis e inocentes, da campanha contra o povo dos Ndebele e a ZAPU, conduzida pela Quinta Brigada ("Gukarahundi") em 1983, nem ouviram desculpas ou receberam indenizações45. Esta falta de legitimidade em levantar questões de moral e ética pode ser constatada em respeito a vários dos Chefes de Estados africanos reunidos em Durban. Mas isto não significa que a discussão de reparações per se seria condenável. Entretanto, na medida em que é instrumentalizada para desviar as nossas preocupações com "os males do presente", esta discussão se revela altamente retrógrada e desumana.

Conclusão O Ocidente deveria indenizar as vítimas do tráfico transatlântico de escravos? Quais seriam as conclusões deste ensaio? Em primeiro lugar, ficou evidente que o problema se apresenta com muito mais complexidade que aparece no debate público, seja no lado dos reparacionistas seja no lado dos seus opositores. É necessário diferenciá-lo entre três situações distintas: o tráfico negreiro em si (que é o enfoque deste ensaio), a escravidão no Novo Mundo e a questão do colonialismo. Embora historicamente com vinculações, cada um dos problemas leva a discussões e a possíveis repercussões políticas específicas na atualidade. Da mesma maneira, é importante diferenciar entre reparações (com o objetivo de melhorar a situação coletiva de uma comunidade na atualidade) e indenizações financeiras individuais, uma abordagem considerada problemática e inadequada à gravidade do problema aqui apresentado.

Neste ensaio foi apontada também a problemática, envolvendo indenizações com respeito a um passado relativamente distante. Foi argumentado que, sob a perspectiva de um discurso moral e ético acerca da culpa e da responsabilidade, demonstraria uma ausência de honestidade, culpando-se exclusivamente "o ocidente" e não levando em consideração os traficantes africanos e as outras regiões do mundo, receptores de escravos africanos, como partes integrantes desta grande tragédia da humanidade.

Com certeza, a culpa histórica do continente africano, em função da participação das suas elites no tráfico, não diminui em nada a culpa dos demais envolvidos, como o Ocidente. Os Estados Unidos e o Brasil têm todo direito e obrigação de decidir ' independentemente de haver ou não uma culpa dos demais envolvidos ', num debate amplo e profundo, que são devedores, moral e financeiramente, dos descendentes do escravos. Neste debate, contudo, dificilmente pode-se recorrer a um argumento historiográfico de culpa exclusiva de "ocidente". O enfoque exclusivo na "culpa única" do ocidente emprega imagens e figuras de raciocínio que correspondem, na sua versão mais moderna, à idéia de que a atual miséria da África é exclusivamente da responsabilidade do Primeiro Mundo, livrando, assim, as elites africanas atuais da própria culpa em termos de guerra, pilhagem, corrupção e desgoverno. Ligado a isto, foi apontada a possível e lamentável tendência no discurso sobre reparação, especialmente quando aparece como um problema das relações internacionais do continente africano com os países do ocidente de, efetivamente, substituir o combate às atuais injustiças pela indenização àquelas do passado. Esta tendência revela o grande perigo da discussão sobre indenização: desvia nossas atenções dos "males" de hoje e permite às elites africanas se projetarem como legítimos representantes das vítimas do passado46. Na medida em que as elites africanas monopolizem o discurso sobre escravidão e consigam apropriá-lo para servir seus interesses políticos e econômicos, existe o perigo que os fracos e pobres no continente africano se tornem, mais uma vez, vítimas deste tráfico ' desta vez, da apropriação da sua memória histórica.

Para não deixar dúvidas, reitera-se que não se argumenta que o continente africano não devesse receber recursos financeiros do Ocidente ' pelo contrário.

Mas estes recursos não deveriam chegar às mãos das atuais elites sem cláusulas sociais e nem se devem basear em visões maniqueístas do mal de um distante passado, mas sim ser orientados por princípios universais de solidariedade humana, correspondendo às necessidades atuais da população do continente em termos de desenvolvimento e de garantia de uma vida digna. Da mesma maneira, é essencial que as sociedades multiétnicas do Novo Mundo, como o Brasil, façam um grande esforço para realizar a igualdade racial, prometida tanto tempo, mas não para principalmente indenizar um mal do passado, mas porque a situação atual dos negros, e de outras populações marginalizadas, fere fundamentalmente os princípios de igualdade racial, um dos princípios básicos da nossa ordem moral e ética.

Notas 1 Por exemplo, a Câmara Municipal da Cidade de Chicago votou quase por unanimidade em favor de reparações.

2 Os "precedentes" assumem também um lugar de destaque nos discursos dos delegados de Estados africanos na Conferência de Durban. Lamentaram, como Ministro das Relações Exteriores do Quênia, que "while all [sic] other groups of victims of the worst crimes agianst humanity have been adequately [sic] redressed for their torment, Africans have not, (...)." Christopher Obure, minister of Foreign Affairs of Kenya, United Nations, Press Release, Plenary, 2 September 2001, RD/D/24, http.....

3 Marable, M.; TBWT Commentary, The Black World Today, 2001.

4 Veja por exemplo: Horowitz, David: 10 Reasons Why Reparations For Blacks Are A Bad Idea For Blacks, And Racist, Too, http://www.frontpagemag.com/dh/2000/ dh05-31-00.htm. Goldberg, Jonah: The U.N.'s Racism Sham and Old Canards, National Review Online, 1/8/2001. http://www.nationalreview.com.

5 Novick, P.; Nach dem Holocaust. Der Umgang mit dem Massenmord, Stuttgart/ München 2001 (orig. the Holocaust in American Life, 1999), p. 252.

6 Declaring the Slave Trade a Crime Against Humanity: The Moral and Legal Basis for Reparations, By Ron Daniels, The Black World Today, 2001.

7 Activists want slavery declared 'holocaust', de Richard Waddington, News 24.com, 01/06/2001.

8 The Sowetan, 4/9/2001 9 Daily Mail & Guardian, 10/9/2001.

10 Business Day (Johannesburg), 5/1/2001.

11 "Brasil na liderança", Jornal do Brasil, 4/9/2001.

12 "Legado da escravidão continua, diz Gregori", estado.com.Br, 2/9/2001.

"Credenciados pelo governo protestam contra FHC", estadao.com.br, 5/9/2001.

United Nations, Press Release RD/D/21, 1/9/2001.

13 RELATÓRIO DO COMITÊ NACIONAL PARA A PREPARAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA NA III CONFERÊNCIA MUNDIAL DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O RACISMO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, XENOFOBIA E INTOLERÂNCIA CORRELATA (DURBAN, 31 DE AGOSTO A 07 DE SETEMBRO DE 2001), agosto de 2001 ' Ministério da Justiça, Secretaria de Estado dos Direitos Humanos.

14 Veja: Declarações dos representantes do Núcleo de Estudos Negros, do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará e da União de Negros pela Igualdade no Plenário, United Nations Press Release, RD/D/44, 7/9/2001. É também importante ressaltar que no Brasil existem muitas iniciativas de enfrentar o legato da escravidão na forma de indenizações. Está por exemplo tramitando no Congresso Nacional um Projeto de Lei (PL No. 3198/2000) do Deputado Paulo Paim, que prevê, entre outros itens, o pagamento, a título de reparação a cada descendente Afro-Brasileiro a valor de R$ 102.000,000.

15 O estudo do sistema atlântico, do trafico de escravos e da escravidão no Novo Mundo e da Abolição tem se desenvolvido em um dos campos mais inovadores e produtivos da historiografia. Veja as discussões bibliográficas: Lovejoy, Paul E.: The Impact of The Atlantic Slave Trade on Africa: A Review of the Literature, 1989. Klein, Herbert, S.: Neuere Interpretationen des atlantischen Sklavenhandels, (Geschichte und Gesellschaft, 16, 1990, pp.

141-160.

16 Veja por exemplo: "The legal basis of the claim for Reparations", by Lord Anthony Gifford, British Queens Counsel and Jamican Attorney-at-Law, paper presented to the First Pan-african Congress on Reparation, Abuja 1993.

17 Human Rights Watch; An approach to reparations, 19/7/2001.

18 Veja, por exemplo: NGO Forum Declaration, 3/9/2001, www.allafrica.com, 3/9/ 2001.

19 Declarations in plenary, WCAR, United Nations, Press Releases, 2/8/2001-6/9/ 2001.

20 African Reparations Movement (UK): Frequently Asked Questions. http:// the.arc.co.uk/arm/home.html 21 Para uma discussão em português no Reino de Benim veja: Costa e Silva, Alberto de, A Enxada e a Lança. A África antes dos Portugueses, Rio de Janeiro, Editoria da USP, Editoria Nova Fronteira, 1992, pp. 628.

22 Manning, P.: Slavery and African Life: Occidental, Oriental, and African Slave Trades, Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1990.

23 A metáfora do "irmão" vem de uma imagem central do movimento abolicionista inglesa do final do século XVIII, popularizada em medalhas feitas por Josiah Wedgwood, o famoso ceramista. Veja entre outros: Jakobsson, S.: Am I not a Man and a Brother? British Missions and the Abolition of the Slave Trade and Slavery in West Africa and West Indies, 1786-1838, Lund: Gleerup, 1972 24 Hopkins, A. G.; An Economic History of West África, London (Longman) 1973, p. 106.

25 Iliffe, J.: Africans. The History of a Continent, Cambridge: CUP, 1995.

26 Curtin, P. D.: The Atlantic Slave Trade. A Census, Madison, Wisc.: The University of Wisconsin Press, 1969. Lovejoy, Paul E.: The Impact of The Atlantic Slave Trade on Africa: A Review of the Literature, JAH, 30, pp. 265-294, 1989. Lovejoy, Paul E.: The Volume of The Atlantic Slave Trade: A Synthesis, JAH, 23, 4, 1982, pp. 473-501. Manning, P.: Slavery and African Life: Occidental, Oriental, and African Slave Trades, Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1990.

27 Manning, P.: Slavery and African Life: Occidental, Oriental, and African Slave Trades, Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1990. Iliffe, J.: Africans. The History of a Continent, Cambridge: CUP, 1995. Lovejoy, P. E.: Plantations in the Economy of the Sokoto Caliphate, JAH, 19, 3, 1978, pp. 341-368.

28 Cote d'Ivoire A Xenophobic Nation? No Way, Says Justice Minister, entrevista, allAfrica.com, 7/9/2001.

29 Veja: Contribuição do Chris Lowe na Lista de Discussão H-Africa, 11/4/2001.

H-Africa@H-NET.MSU.EDU.

30 Hopkins, A. G.; An Economic History of West África, London (Longman) 1973, pp. 78.

31 Klein, Herbert, S.: Neuere Interpretationen des atlantischen Sklavenhandels, (Geschichte und Gesellschaft, 16, 1990, pp. 141-160.

32 Verger, P.: Fluxo e Refluxo do Tráfico de Escravos entre o Golfo de Benin e a Bahia de Todos os Santos dos Séculos XVII a XIX, São Paulo: Ed. Corrupio, 1987. Guran, Milton; Agudas. Os "Brasileiros" do Benin, Rio de Janeiro 1999.

33 Klein, Herbert, S.: Neuere Interpretationen des atlantischen Sklavenhandels, (Geschichte und Gesellschaft, 16, 1990, pp. 141-160.

34 Williams, E.: Capitalismo e Escravidão, Rio de Janeiro: Companhia Editora Americana, 1975, orig. Capitalism and Slavery, Chapel Hill 1943.

35 Entre outros: Engerman, S.L.; The Slave Trade and British Capital Formation in the Eighteenth Century: A Comment on the Williams thesis, in: Business History Review 46, 1972, pp. 430-43.

36 Entre outros: Sheridan, R.B.:The Wealth of Jamaica in the Eighteenth Century, Econ. Hist. Review, vol. XVIII, 1965.

37 Anstey, R.: The Atlantic Slave Trade and British Abolition, 1760-1810, Cambridge 1975.

38 Thomas, R.P.: The Sugar Colonies of the Old Empire: Profit or Loss for Great Britain, Econ. Hist. Review, vol. XXI, 1968.

39 Drescher, S.: Econocide: British Salvery in the Era of Abolition, Pittsburgh, 1977. Manning, op. cit.

40 Davies, R. The Industrial Revolution and British Overseas Trade, Leicester, 1979. Mintz, S.W.: Sweetness and Power. The Place of Sugar in Modern History, New York: Elisabeth Sifton Books. Viking, 1985.

41 Veja entre outros: Manning, op.cit, que apresenta cálculos e projeções bem detalhados, porém exagerando o efeito demográfico do tráfico. Fage, de outro lado, parece ter subestimado a perda demográfica, argumentando que "in West Africa it seems unlikely that the export slave trade would have had any dramatically adverse effect on the size of the population as a whole." (Fage, J.; A History of África, London 1978. Veja também Iliffe, op.cit., que, mesmo sendo um dos scholars mais acentuados na demografia histórica da África, admite grandes lacunas no nosso conhecimento, mas argumenta que o tráfico de escravos tinha sido um desastre demográfico, mas não uma catástrofe.

42 "UN Celebrate End of Slave Trade As Record Number Trafficked", Press Release, 22/8/2001. Anti-Slavery International, Web Page. Veja também as publicações do ILO sobre tráfico de seres humanos e trabalho forçado.

43 United Nations, Press Release, RD/D/24, 2/9/2000.

44 UN Integrated Regional Information Network: "Khartoum Reiterates That "No Slavery Exists", 17/8/2001. The Boston Globe: "In campaign to liberate Sudan's child slaves, money talks", 19/2/1995. Reuters: "UNICEF Criticizes Buying Freedom for Sudan Slaves", 5/2/1999.

45 O relatório sobre os massacres em Matabelelândia, feito pela "Zimbabwe Catholic Commission for Justice and Peace" pode ser consultado na web page do Electronic Mail and Guardian (África do Sul) (http://www.mg.co.za/mgnews/ 97may1/zimreport1.html).

46 O representante do Zimbábue na Conferência, o Ministro de Justiça, P.A.

Chinamasa, por exemplo alegou no seu pronunciamento de falar em nome não dos negros na África e na diáspora, mas de todos os negros do mundo. United Nations Press Release, RD/D/27, 3.9.2001.

Outubro de 2001


Download text