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EuBRCVHe0004-28032007000300004

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National varietyEu
Year2007
SourceScielo

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Índices plaquetários em indivíduos com doença hepática alcoólica crônica ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Índices plaquetários em indivíduos com doença hepática alcoólica crônica

Platelet indices in chronic alcoholic liver disease patients with thrombocytopenia

Ana Cláudia CostaI, II; Barbara RibeiroII; Elísio CostaI IDepartamento de Tecnologias de Diagnóstico e Terapêutica da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Bragança IIServiço de Patologia Clínica do Hospital Distrital de Chaves, Bragança, Portugal Correspondência

INTRODUÇÃO O consumo de álcool é aceite socialmente, mesmo quando consumido em doses muito elevadas. Por esta razão, o alcoolismo é actualmente um problema de saúde pública mundial, sendo doença encontrada em indivíduos de diferentes níveis socioeconómicos e de diferentes grupos étnicos, tendo repercussões negativas e consequências nefastas a nível orgânico, social e psicológico(2, 4, 9). Uma das principais consequências orgânicas associadas com o alcoolismo é a doença hepática alcoólica crónica (DHAC), sendo o seu diagnóstico precoce difícil, uma vez que nem sempre é fácil fazer relação directa entre o consumo de álcool e a doença hepática(8, 12).

Estão descritos muitas alterações orgânicas associadas ao consumo excessivo de álcool, nomeadamente a nível da medula óssea. Estão descritas alterações nas linhas eritróide, granulocítica e megacariocítica, isoladamente ou concomitantemente, assim como alterações hematológicas a nível periférico, sendo as mais evidentes a anemia, a leucopenia, trombocitopenia e aumento no volume globular médio (VGM)(6, 9).

A trombocitopenia é um dos achados laboratoriais mais comuns na DHAC, estando habitualmente associada com hipertensão portal e a aumento da sequestração esplénica. A etiopatogenia desta trombocitopenia não está ainda totalmente esclarecida. Várias hipóteses têm vindo a ser levantadas e estudadas, nomeadamente, o aumento da sequestração esplénica, a produção inapropriada pela medula óssea, e diminuição da sobrevida das plaquetas em circulação(3, 15, 16).

O objectivo deste estudo foi detectar alterações nos índices plaquetários em indivíduos com DHAC que desenvolveram trombocitopenia, e determinar o seu grau de correlação com outros parâmetros hematológicos.

MÉTODOS Foram incluídos neste trabalho todas as amostras que deram entrada no serviço de Patologia Clínica da Hospital Distrital de Chaves, Portugal, provenientes de doentes com DHAC que apresentassem trombocitopenia (contagem de plaquetas inferior a 150103/µL), durante um período de 10 meses. Em todos os casos, para além de se registar a idade e o sexo, foi efectuado hemograma completo, incluindo contagem de plaquetas e os índices plaquetários, utilizando o aparelho automático Cell Dyn3500 (Abbott Diagnostics, Califórnia, EUA). Foi incluído um grupo controlo, constituído por indivíduos emparelhados por idade e sexo, com o grupo de doentes. Estes indivíduos foram seleccionados na avaliação laboratorial pré-operatória e não apresentavam alterações nos parâmetros hematológicos, nem indicadores laboratoriais de infecção/inflamação.

No tratamento estatístico dos resultados foi utilizado o teste tStudent para comparação de médias e a correlação de Pearson para determinar o grau de correlação entre os diferentes parâmetros analisados. Foi considerado como significativo valores de P inferiores a 0.05.

RESULTADOS Durante o período em que decorreu o estudo, foram seleccionados um total de 65 indivíduos, divididos em dois grupos: controlos (n = 35) e com DHAC e trombocitopenia (n = 30). A média de idades era de 49.7 anos (variando entre os 35 e os 74 anos) e a percentagem de indivíduos do sexo masculino era de 89%.

Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa (P>0.05), na idade e distribuição por sexos entre os dois grupos (controlo vs doentes). Os indivíduos com DHAC apresentavam evidência de hipertensão portal e esplenomegalia.

Os achados laboratoriais estão sumariados na Tabela_1. Os doentes com DHAC apresentam uma contagem de eritrócitos, hemoglobina, hematócrito e valores absolutos de leucócitos totais, linfócitos, neutrófilos e plaquetas significativamente inferiores aos encontrados na população controlo (P<0.05). O VGM, a hemoglobina globular média e o RDW ("red cell distribution width") apresentam valores significativamente superiores (P<0.05) no grupo de doentes.

Relativamente aos índices plaquetários foi encontrado no grupo de doentes um aumento estatisticamente significativo no PDW ("platelet distribution width") (19.01 ± 1.78 (%) vs 17.76 ± 1.15 (%), P= 0.004) (Figura_1) e diminuição estatisticamente significativa no plaquetrócito (PCT) (0.082 ± 0.031 % vs 0.192 ± 0.049 %, P<0.005) (Figura_2). Em relação ao volume plaquetário médio (VPM) não se encontraram diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos. Foi encontrada correlação estatisticamente significativa entre a contagem de plaquetas e os outros parâmetros hematológicos analisados (Tabela 2).

DISCUSSÃO A trombocitopenia é reconhecidamente um achado comum associado com a ingestão de álcool. Contagem de plaquetas inferiores a 100x109/L ocorrem em aproximadamente 3% dos alcoólicos de longo tempo(2, 4, 9). A etiologia desta trombocitopenia não está ainda completamente esclarecida, tendo vindo a ser associada com aumento da sequestração esplénica, produção inapropriada pela medula óssea, e diminuição da sobrevida das plaquetas em circulação(10, 14).

Alguns estudos in vitro e experimentação animal têm demonstrado que doses elevadas de etanol são capazes de inibir o crescimento de colónias formadoras de megacariócitos e a diminuição dos níveis séricos de trombopoietina. Sendo o défice de produção a etiologia mais consensual para a trombocitopenia associada com o consumo de álcool(1, 5, 7, 9, 10, 11, 13, 14). Nos doentes desta série, em que o critério de inclusão era a presença de trombocitopenia, encontrou-se associada a presença de anemia e de leucopenia. A presença desta pancitopenia, associada à esplenomegalia e à hipertensão portal que estes doentes apresentam, sugere que a sua etiologia mais provável é a sequestração esplénica, que todas as linhas celulares hematopoiéticas estão afectadas. No entanto, apenas o exame da medula óssea poderia dar informação mais definitiva sobre os efeitos do álcool na hematopoiese, o que não foi efectuada nestes doentes.

Os contadores hematológicos existentes, na maioria dos laboratórios clínicos, disponibilizam sem custos acrescidos, os resultados dos índices plaquetários que na maioria das vezes não são valorizados na prática clínica corrente. Uma das principais razões para isto acontecer está relacionada com o facto destes índices não terem sido ainda muito estudados, nomeadamente no que se refere à sua utilidade em termos de diagnóstico. Na literatura existem poucos trabalhos que tiram partido dos índices plaquetários no estudo de doentes com DHAC(11).

Este trabalho tenta efectuar essa abordagem, tendo-se demonstrado um aumento do PDW e uma diminuição do PCT nestes doentes. O primeiro parâmetro relaciona-se com anisocitose plaquetária e o segundo, está directamente relacionado com o volume que as plaquetas ocupam. Adicionalmente, foi encontrada boa correlação entre o número de plaquetas e índices plaquetários entre si, e também boa correlação entre a contagem de plaquetas e a maioria dos outros parâmetros hematológicos estudados. O PDW aumentado, encontrados nos doentes da presente casuística, poderá estar relacionada com o esforço que a medula óssea está a fazer no sentido de contrariar a trombocitopenia associada ao hiperesplenismo encontrado nestes doentes ou então, estar relacionada com os efeitos directos do álcool sobre as plaquetas. No entanto, mais estudos são necessários para que conclusões definitivas possam ser tiradas, nomeadamente estudos ao nível da medula óssea, estudos in vitro onde possam os efeitos directos do álcool nas células sanguíneas possam ser melhor caracterizados ou então, estudos em animais onde sejam criadas as condições in vivo.

Em conclusão, os doentes com DHAC apresentam alterações nas três linhas hematopoiéticas associadas com o hiperesplenismo. Adicionalmente, os eritrócitos e as plaquetas, apresentam evidência de alterações morfológicas, demonstráveis pelos respectivos índices, que poderão estar associadas com aumento da activa hematopoiética da medula óssea, resultante do hiperesplenismo ou por efeito directo do álcool.


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